30 de dezembro de 2021

O ano em revista.


   Uma vez mais, a história parece que se repete: 2021 foi um ano terrível, no seguimento de 2020. Pessoalmente, foi um dos melhores -senão mesmo o melhor- anos que vivi. Aqui no blogue, retomei a assiduidade, já que em 2020, devido a todas as mudanças que se efectivaram, me ausentei sobretudo nos primeiros meses do ano. Em 2021, tal não ocorreu. Cheguei a julgar, em 2020, que o blogue iria definhar pouco a pouco, ao ter saído do ventre materno, constituído família e ganhado outras obrigações. Felizmente, consegui mantê-lo, não como prioridade, senão como espaço privilegiado, que acarinho, e que por isso quero e vou manter.

    Farei, à semelhança dos anos anteriores, uma retrospectiva das publicações/acontecimentos que me pareceram mais relevantes, e que abordei aqui, evidentemente, com as respectivas hiperligações. 

     Logo a abrir o ano, morreu-nos Carlos do Carmo, um nome maior do estilo musical por excelência em Portugal. Tivemos ainda eleições presidenciais, que me mereceram a atenção por duas vezes, aqui a segunda. A campanha de vacinação começava na Galiza, com o pessoal sanitário. Eu vacinei-me cerca de um ano depois, por opção, porque decidi esperar que se normalizasse o debate em torno das vacinas. Como referi desde o início, iria vacinar-me quando me sentisse seguro. Vacinei-me este mês com ambas as doses. Pelo meio, em Portugal tiveram outro confinamento da população, e entretanto fiz uma análise aos resultados das presidenciais.

     Em Fevereiro, iniciei a publicação de conteúdos em castelhano, ou espanhol, como preferirem, que vêm alternando com o português e o galego. Viver em Espanha fez surgir em mim a necessidade de combater aquilo que considero ser um regime injusto e desigual, a monarquia, esgrimindo os meus argumentos em dois momentos (um aqui e o outro, com mais propriedade, aqui).

      Em Março, e gradualmente, fui recuperando uma faceta de activista que se havia perdido algures na minha trajectória entre o adolescente e o homem adulto, e a primeira manifestação deu-se aquando do Dia Internacional da Mulher. No mesmo mês, cumpriram-se sessenta anos sobre a Guerra Colonial, um período que deixou tantas feridas no povo português e nos povos africanos. Entretanto, o meu entendimento sobre estas matérias foi mudando no decurso do ano.

     Em Abril, achei por bem assinalar os duzentos anos da extinção da Inquisição em Portugal e, dias depois, o quadragésimo quinto aniversário da Constituição Portuguesa. Terminei, por aqueles dias, um livro que me ajudou decisivamente na formulação das minhas ideias relativamente ao ostracismo a que praticamente todas as sociedades humanas sujeitaram as mulheres através dos tempos: O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir. Sessenta anos antes, Gagarin chegava ao espaço, inaugurando uma primazia soviética que não se manteria muito mais. O Diesel comemorava o seu primeiro aniversário connosco.
    A meio do mês, a II República Española perfazia noventa anos desde que afastara a monarquia. Simultaneamente, terminava o livro de Fernando Dacosta sobre uma das mais interessantes e caricatas figuras do panorama intelectual-burguês português da segunda metade do século XX, Natália Correia, no seu Botequim. Já o mês se encaminhava para o final e, antecipando-me ao vigésimo aniversário da sua morte, ocorreu-me escrever sobre Cândida Branca-Flor, que perdemos demasiado cedo.

     Em Maio, escrevi umas palavras acerca das eleições autonómicas de Madrid. Deixei também as minhas impressões das nossas miniférias na Corunha, com uma passagem mais em Santiago de Compostela. Pelo meio, dei por terminado um clássico da literatura que me impressionou pelo relato cru de existências tão difíceis, em As Vinhas da Ira, de Steinbeck, numa edição antiga que a minha mãe me fez chegar.
    Após quase vinte anos do chamado jejum em títulos, o Sporting conseguiu o feito de vencer a liga portuguesa. Como sportinguista que acompanha o futebol à distância, não menos me alegrei com a vitória do clube. Seguiram-se duas perdas no mundo das artes interpretativas: Maria João Abreu, uma morte totalmente inesperada, e Eva Wilma, actriz brasileira que nós, portugueses, nos habituámos a ver em tantas produções que nos chegaram por décadas desde a outra margem do Atlântico. O dia 17 coincidiu com a minha primeira publicação na língua galega, precisamente no Dia das Letras Galegas, também Dia Internacional Contra a LGTBfobia. O Estado espanhol, volta e meia, tem problemas com os fluxos de imigração ilegal proveniente de Marrocos através de Ceuta, e foi esse o tema da crónica de dia 21.

    Meio do ano. Junho começou com uma breve reflexão sobre o Chile de 1973, muito influenciado pelo livro que lia no momento, A Casa dos Espíritos, de Allende, que terminaria dias depois. A SIDA, epidemia que nos acompanha há quarenta anos, preencheu a crónica de dia 6. O Euro 2020, realizado em 2021, estava prestes a iniciar-se, e não é novidade que gosto de acompanhar estas competições internacionais. No dia 14, expus um lado mui pessoal, relativo à minha infância e adolescência, dois períodos conturbados. É, talvez, o texto mais pessoal alguma vez publicado por mim.

     Julho foi o mês das nossas férias grandes. Nesse sentido, apenas aludi ao crime homófobo ocorrido na Galiza, que mais tarde ganhou outros contornos, e ao fim do Euro 2020.

    Durante Agosto, fui expondo em três momentos (umdoistrês) as minhas férias nas Canárias e na Finisterra (aqui). Gostei de ir à Finisterra, mas, sabendo o que sei hoje, teria ficado mais dias nas Canárias. Gastei o dobro do que gastei nas Canárias por metade dos dias. Sempre a aprender. No final do mês, fomos surpreendidos pelo regresso dos talibãs ao poder, no Afeganistão.

     Em Setembro, dei-lhes conta da minha estadia no Algarve, que incluiu a minha primeira passagem por um parque aquático, incluindo a terrível montanha-russa. Foi um momento tenebroso. Jorge Sampaio falecia de doença cardíaca, que se arrastava há anos, e assinalávamos o vigésimo aniversário do 11 de Setembro. Os portugueses escolheram os seus autarcas para os próximos anos.

     No último trimestre do ano, em Outubro, terminei um clássico que me ocupava desde o Verão, Vinte Mil Léguas Submarinas, que li em castelhano, como A Casa dos Espíritos, lido no mesmo idioma. Em Portugal, fazia-se justiça histórica a Aristides de Sousa Mendes, homenageando-o com um cenotáfio no Panteão Nacional. Onze anos antes, em 2011, a ETA suspendia as sua actividade armada. Recordar-se-ão de lhes ter tido que, ao longo ano, fui alterando a minha sensibilidade relativamente a um conjunto de matérias sensíveis. Uma delas diz respeito ao colonialismo português, e deixei-o patente na crónica de dia 26. Mais uma vez atento à realidade do lado de lá da raia, escrevi algumas considerações sobre a crise política que viria a culminar na dissolução da Assembleia da República e na convocação, por parte de Marcelo Rebelo de Sousa, de eleições antecipadas para Janeiro de 2022. Regressando à margem norte do Rio Minho, suscitou-se uma polémica enorme em torno da decisão de uma magistrada que fundamentou a sua decisão de entregar a custódia de uma criança a um dos progenitores pelo outro viver na “Galicia profunda”, e foi assim que o redigiu no acórdão. A minha reacção não se fez esperar, em galego.

      Em Novembro, penúltimo mês do ano, tive conhecimento de um caso de homofobia internalizada na televisão portuguesa. Quis recordar, porque se tratou de um acontecimento decisivo no evoluir da situação social e política em Timor-Leste, o Massacre de Santa Cruz. Enquanto isso, terminava salvo erro o terceiro livro em castelhano do ano, uma obra que no início deste século gerou uma enorme polémica ao versar sobre um sector sensível junto da opinião pública, O Código Da Vinci. Num ano particularmente rico em efemérides de relevo para mim, assinalei o trigésimo aniversário sobre a morte de Freddie Mercury

       Finalmente, no decurso do actual mês, mais uma abordagem à SIDA, por ocasião do Dia Internacional Contra a SIDA. Sofro de insónias recorrentes e, na decorrência disso, vi um vídeo em que mais uma vez a a ridicularização de pessoas LGBT levou à minha indignação. Os 43 anos da Constituição Espanhola proporcionaram-me mais um momento para expor as minhas considerações sobre Espanha. Para terminar o balanço, falei-lhes das nossas mini mini (duas vezes para que fique bem patente que foram mini) férias em Vigo e em Leão.


      Está feito. Resta-me desejar-lhes um excelente 2022. Creio que, a nível conjuntural, necessitamo-lo. Feliz ano para todos e, assim espero, cá nos veremos.


A vermelho, as hiperligações para os artigos correspondentes.

27 de dezembro de 2021

León.


    León es una ciudad española con aproximadamente 125.000 habitantes, capital del antiguo Reino de León y actualmente de la provincia homónima. Nosotros, M. y yo, elegimos esta ciudad para nuestras mini vacaciones. M. necesitaba descansar después de un mes infernal de doce turnos (hasta este momento, trece). Es demasiado, incluso para él. La ciudad no queda muy lejos de Galicia. Finalmente, menos de doscientos kilómetros. El trayecto se hace de tren, de una forma muy cómoda.

    El primer día decidimos pasear por sus calles, conocerla, disfrutar de las decoraciones de Navidad. Me pareció cosmopolita, más que cualquier ciudad gallega, excepto Vigo, quizás.


La Catedral de León es una de las más bonitas, de todas las que he visto


    El segundo día fuimos a su hermosa catedral, cuyas vidrieras son las segundas mayores de Europa. La verdade es que me encantó. Antes de eso, por la mañana, decidimos visitar el Museo de León, con una rica colección de la historia de los primeros pobladores de la provincia, de la ciudad y del antiguo reino. Junto a la catedral, hay un museo relacionado con ella. Llegamos a las 17h, justo a tiempo para la visita guiada. Éramos cuatro, y conocimos más sobre la catedral y su arte.


Dos monjas visitaban la catedral, y les saqué esta foto, de espaldas


     El tercer día, lo aprovechamos para pasear un poco más por la ciudad y visitar un antiguo convento, el Convento de San Marcos. Regresamos al final de la tarde.


Estatua al Peregrino, una de las más famosas de León


     Os dejo algunas fotos y las impresiones del escritor británico Frances Elliot sobre León, en 1882:

“León posee un hechizo que percibo pero que acaso no puedo expresar, el de una antigua capital caída, no mancillada, con algo todavía de la majestad del antiguo reino, aunque tal reino haya dejado de existir... la dejé con pesar y volvería a ella con alegria”.

Todas las fotos son mías, y su uso se dará bajo autorización.


24 de dezembro de 2021

Feliz Natal!


  Os leitores e seguidores extremamente atentos -que não os há- teriam reparado que, este ano, não escrevi uma carta ao menino Jesus. Creio que me afastei definitivamente de deuses. Em todo o caso, se o tivesse feito, ter-lhe-ia apenas a agradecer. Nada pediria, afinal, o que pode querer uma pessoa que tem tudo? Perdoem-me a sinceridade. A vida, por fim, parece que me recompensou de tantos anos maus. Saúde, vou tendo; tenho o suficiente para viajar, para manter a minha casa ao meu gosto e comprar tudo o que necessito, e uma pessoa, o M., que me quer tanto. Que todos pudessem ter o que tenho!

   Dentro de uns dias, se tudo correr bem, dar-lhes-ei conta da nossa viagem de Natal a Leão, uma cidade que me encantou. Por ora, desejo-lhes um Feliz Natal, creiam ou não em deuses. O Natal é quem gostamos, é luz, é brilho, é música, é gastronomia. É tudo o que queiramos!


O nosso presépio


19 de dezembro de 2021

La Navidad en Vigo.


   Creo que lo que distingue a Vigo del resto de las ciudades españolas, y no solamente del Estado, es que Vigo se transforma con la Navidad. Toda la ciudad vive las fiestas como si fueran el centro de todo. Vigo entera está decorada, todas sus calles, llenas de gente de todas partes. Muchos portugueses también. Su alcalde sabe que hay una fuente de ingresos allí, y que pronto recupera los gastos con el mantenimiento de todo aquello. La ciudad parece un parque gigante para todas las edades.

    No hay comparación posible con Lisboa, que aunque tiene espíritu navideño, no lo vive a plenitud. Su noria, la de Lisboa, es mucho más pequeña y lenta. Nada que ver. De verdad, disfruté muchísimo pasar la noche en Vigo. Yo soy un chico de la gran ciudad, a diferencia de M., un chico del campo. Poco después de que llegamos, M. ya se sentía aburrido por tanta confusión.

    Como me dijo un amigo, cualquier ciudad española promedio es más cosmopolita y mejor equipada con bienes y servicios que cualquiera de las ciudades promedio portuguesas, y Vigo ni siquiera se encuentra entre las diez ciudades más grandes de España. En mi opinión, más cosmopolita que Oporto. Eso sí, la personalidad de los españoles, a los que les gusta las fiestas y salir, ayuda a cambiar la percepción del movimiento -de la vida- en una ciudad.

     Fue un encanto. ¡Una pasada! Les dejo unas fotos.


La noria gigante, la principal atracción de la ciudad



Una de sus preciosas calles decoradas de Navidad


La bola, también gigante


Todas las fotos son mías, y su uso se dará bajo autorización.

16 de dezembro de 2021

Enfim, é Natal!


   Não sendo crente, adoro o Natal pelas luzes, as decorações, as canções natalícias -dos velhos clássicos aos hits mais recentes- e o espírito que se instala, seja ele de solidariedade ou mero consumismo. Dirão os cristãos que é hipocrisia, esquecendo-se eles de que tomaram uma festividade que não era sua, pagã, assimilando-a e convertendo-a na mais importante e simbólica festa do Cristianismo. De hipócritas e loucos, todos temos um pouco (ou muito).

   Pelo contrário, nunca estive rodeado de pessoas que partilhassem esta minha afición pelo Natal. Os meus pais rendiam-se ao meu entusiasmo, e no presente o mesmo ocorre com o meu marido, isto é, sou eu quem decora a casa, quem se preocupa com o mais ínfimo dos pormenores. E vivo-o intensamente. No ano passado, o primeiro em Espanha e no novo apartamento, tive de comprar tudo, da comum árvore ao prato de sobremesa. Natalício, claro.

   Estamos a dias da nossa viagem a Leão, aproveitando umas miniférias que o M., a custo, conseguiu. Antes disso, vamos a Vigo ver as decorações navideñas, como aqui lhes chamam, que são das melhores do mundo. Ouvi por aí que Vigo compete com Nova Iorque. Não sei se será verdade. O que posso garantir é que o seu alcalde iniciou a quadra dizendo que Vigo inaugurava assim os festejos de Natal em todo mundo. Ao menos eles acreditam nisso. Deixo-lhes uma foto da minha árvore.




7 de dezembro de 2021

Constituição Espanhola, 43 anos depois.


   Ontem foi feriado aqui em Espanha, ou festivo, como eles lhe chamam. A 6 de Dezembro de 1978, o projecto de Constituição para Espanha, que haveria de culminar na actual Constituição, foi aprovado em referendo por cerca de 90% dos espanhóis. Após quarenta anos de ditadura e ansiando por liberdade, os espanhóis correram às urnas e deram a sua aprovação a uma Magna Carta que, entre muitas disposições, criava o actual Estado autonómico, dando lugar a que cada nação histórica pudesse reivindicar a sua cultura e língua. A Constituição, no seu artigo segundo, fala da Nação espanhola e, mais à frente, das nacionalidades que a integram. Um conceito um pouco estranho. Em ditadura e em democracia, Espanha nunca soube lidar bem com a sua diversidade interna.

  Sem querer extenuá-los por minucioso, o problema do Estado espanhol remonta à sua edificação, construído nos moldes do actual Estado francês: uma língua, uma nação, uma unidade inquebrantável. Tentou-se, com pouco êxito, atenuar-se ligeiramente este pendor centralista que só reconhece uma identidade no actual texto constitucional, porém, a realidade tem-se revelado distinta daquilo que a Constituição faz prever. Quarenta e três anos depois, a monarquia não representa qualquer unidade, contrariamente àquilo que dita a lei fundamental espanhola, e as diversas nações que compõem a Espanha sentem-se injustiçadas perante uma política de estado que manifestamente favorece o castelhano, a cultura castelhana e uma ideia de Espanha uniforme cultural e linguisticamente. Algumas com mais sucesso, como a Catalunha e o País Basco, e outras, como a Galiza, que timidamente começam a ganhar consciência nacional.

   A tudo isto se soma a monarquia, restaurada por Franco, que assenta nuns princípios que não mais encontram acolhimento e aceitação entre os povos de Espanha. A inviolabilidade do Rei e a sua irresponsabilidade são dois deles. Os cidadãos não confiam na instituição, apercebem-se de que ao contrário de ser um modelo de honestidade e transparência, o monarca espanhol, sobretudo o antecessor, vale-se da sua posição privilegiada para obter ganhos e vantagens pessoais, conseguindo ludibriar os mecanismos de actuação da justiça. Num estado europeu e numa sociedade com acesso à informação como a espanhola, tal situação, além de intolerável, é foco de um permanente mal-estar que provavelmente terá um mau fim.

   Há muito que se fala na reforma da Constituição, que as sucessivas forças políticas adiam ad aeternum. O monarca continua inviolável e irresponsável, pisoteando-se o princípio da igualdade, e a Constituição continua a não referir as nações históricas do Estado pelo seu nome, entre outras mudanças que se vêm reivindicando. Há uns anos, durante o governo da direita, aprovou-se uma lei de segurança, conhecida popularmente como ley de la mordaza, que restringiu o alcance de inúmeros direitos civis, nomeadamente o de manifestação. A extrema-direita ganha terreno e acentua as discrepâncias numa sociedade fragmentada.

  Vejo com apreensão o futuro deste Estado. Em 1978, Espanha encaminhou-se no sentido da democracia, mas os vícios de décadas de franquismo transitaram para o novo regime. Franco e o franquismo continuam a pairar como uma sombra sobre Espanha. Não haverá qualquer paz social no que sobra da península para lá da fronteira com Portugal enquanto a herança do ditador não for completamente repudiada.

4 de dezembro de 2021

A heteronormatividade e a perseguição pelo modelo masculino ideal.


   Andava eu ontem, no meio das minhas insónias, a divagar pelo Youtube, e deparei-me uma vez mais com o que não é uma novidade naquele país, embora se torne rotineiro: a ridicularização, inclusive por LGBTQi+, no caso gays, de pessoas mais femininas. Em Portugal, já se aceita que um gay o seja, mas que não o pareça. Um homem mais feminino é alvo de constantes piadas e achincalhamentos.

   É um dos grandes problemas que a comunidade gay tem. Continuam, muitos, eu diria a grande maioria, a idealizar um protótipo de homem perfeito: sem trejeitos, desportista, musculado, e por aí fora. Aqui mesmo, no mundo dos blogues, vemos como publicam fotos de homens que preenchem esse estereótipo de masculinidade ideal. A comunidade LGBTQi+ é diversa. Não obedece a um padrão. Cada qual pode ter as preferências que quiser, mas deve ter em conta de que o que distingue a comunidade LGBTQi+ dos heterossexuais é isso mesmo: a fuga, consciente ou não, desse modelo de postura e comportamento.

   Imagino que para muitos rapazes e homens seja mais fácil viver a sua sexualidade dentro do padrão heteronormativo. Uma vez mais, não podemos querer que seja a norma, e temos ainda de ter presente que assim favorecemos a que não nos vejam dentro da nossa histórica diversidade.

   A minha experiência foi talvez distinta da da maioria. O meu pai, nos idos anos 70/80, trabalhou no mítico Scarllati, o primeiro bar com espectáculo de transformismo. Sendo heterossexual, não é machista. Da mesma forma, a minha mãe não tem preconceitos com os LGBTQi+. Isso favoreceu a que tivesse crescido sem armários. Nunca tive nenhum. Cresci espontaneamente, sujeitando-me à ignorância, à maldade e à intolerância alheias. Facilmente se deduz que não sou masculino -ou o que quer que signifique essa construção social. Sou como sou. Tive, como muitos, acredito, paixonetas por rapazes masculinos, pretensamente heterossexuais, desportistas, o que considero ser normal na adolescência. Quando crescemos e continuamos a alimentar esse ideal, provavelmente frustramos as nossas expectativas. Tornamo-nos infelizes. Esse estigma da masculinidade heteronormativa, tóxica, como lhe queiram chamar, continua a atravessar a comunidade LGBTQi+ e a condicionar a luta pela igualdade na diferença, pelos direitos civis e pelo respeito. Se não nos vemos a todos com bons olhos, se continuamos a desejar o que não somos e não podemos ter, qual o sentido de tudo isto?

1 de dezembro de 2021

Dia Mundial de Luta Contra a SIDA.


   O VIH infecta uma criança a cada dois minutos no mundo. Aproximadamente 300.000 crianças foram infectadas apenas no ano transacto. Se nos países industrializados não mais representa uma ameaça sanitária e social, noutras zonas do globo desfavorecidas -também por culpa dos europeus- um diagnóstico de VIH continua a ser uma sentença de morte.

  Se bem que estudos recentes nos indiquem uma crescente displicência no uso de métodos de protecção face ao VIH na Europa, designadamente o uso do preservativo, não é aqui que o vírus é um flagelo. Na África Subsaariana é-o. Alguns daqueles países têm uma população adulta infectada na ordem dos 40%. Oitenta e oito por cento das mortes de crianças por SIDA ocorreram na mesma região.

   São os números preocupantes de um vírus a que muitos preferem voltar a cara, como se fosse um pesadelo do passado. Estão enganados. Para cada uma daquelas pessoas, é um pesadelo bem actual.

   Este dia foi instituído pela primeira a 1 de Dezembro de 1988. Aproximadamente 36,3 milhões de pessoas morreram desde que a pandemia de VIH começou. Até 2020, 37,7 milhões em todo o mundo viviam com o vírus. Embora 84% dos infectados conheça o seu estado serológico, 6,1 milhões desconhecem-no. Mais de metade das pessoas infectadas são mulheres e meninas. Os dados são da ONU SIDA.



27 de novembro de 2021

Freddie Mercury, trinta anos.


   Há dias, a 25, assinalou-se o trigésimo aniversário da morte daquele que, na minha opinião, foi o maior vocalista de sempre. Há-os bons. Freddie foi completo. Reunia em si não somente a voz, inconfundível e portentosa, bem assim como um carisma, em palco e fora, que o imortalizaram. Como ele, há um em cada cem anos.

   A minha relação, se lhe podemos chamar assim, com os Queen e com Freddie à cabeça, porque ele e a banda se confundem, começou cedo, em casa. O meu pai era um fã incondicional do grupo, e aos fins-de-semana colocava sempre os seus discos a tocar. Discos, de vinil. Fui-lhe ganhando o gosto e, hoje, creio poder afirmar que a memória de Freddie é praticamente consensual entre os críticos e o grande público.


  Freddie teve um terrível golpe de azar. Contraiu, como milhões, a infecção por VIH demasiado cedo. Houvesse sido um pouco mais tarde e teria chegado aos nossos dias, fazendo a medicação adequada, que naqueles tempos era apenas uma miragem. Não sendo das primeiras figuras públicas de alcance internacional a morrer de SIDA, foi talvez a que mais visibilidade teve. Não nos esquecemos das suas derradeiras aparições, e inclusive em trabalhos dos Queen, nomeadamente no último álbum com Freddie vivo, Innuendo (1991), onde já se nos aparece muito magro e debilitado. Freddie sabia que se ia, e nós acompanhavamo-lo, no fundo, na expectativa de que esse dia não chegasse. Chegou, por fim, naquele final de Novembro de 1991, um dia depois de enviar um comunicado para a imprensa onde reconhecia que padecia de SIDA.

  Longe de cair no esquecimento, a sua voz e as gravações dos concertos que deu com os Queen continuam a ver-se e ouvir-se praticamente todos os dias. Parece-nos incrível que tenha partido, afinal, nunca nos deixou.



26 de novembro de 2021

O Código Da Vinci.

 

   Com vinte anos de atraso, é certo, mas ontem terminei O Código Da Vinci, a obra mais célebre de Dan Brown, que começara há umas semanas. Recordo-me de, ali por meados de 2003, o livro surgir todas as semanas no topo das tabelas portuguesas, e não só, dos livros mais vendidos. Sem tirar o mérito ao autor, o que fez de O Código Da Vinci um best-seller foi sobretudo a polémica que gerou. Tudo o que envolva o religioso vende. No livro, Dan Brown pega em teorias alternativas em torno da existência de Jesus Cristo e cria um enredo com elas. Neste caso, o mistério do Santo Graal e da hipotética relação sentimental de Jesus com Maria Madalena. Um escândalo. 

  Em rigor, pouco sabemos do Jesus histórico. O que sabemos, além do que vem nos evangelhos, são pequenos escritos de autores que não foram contemporâneos de Jesus. Há historiadores romanos das décadas e dos séculos seguintes que se referem ao proclamado Rei dos Judeus. Os historiadores actuais baseiam-se nessas fontes romanas de autores não-cristãos para afirmar que Jesus existiu realmente, e tudo parece indicar que sim. Tendo existido, e vamos presumir que sim, é quase certo que foi uma figura bastante diferente daquela que nos relata a Igreja (católica e não só). Um pregador, um homem que anunciava um novo reino, mas provavelmente que se casou e teve filhos. Se investigarmos acerca da sociedade judaica do tempo de Jesus, verificamos que o casamento era praticamente uma imposição social, e que os que não se casavam eram proscritos.

   Um Jesus sujeito aos vícios e pecados humanos colidia com a imagem que a Igreja Católica (agora sim) foi criando da pessoa de Jesus: o Deus Filho que, entretanto, se fez carne para nos salvar. Não é necessário que Dan Brown o diga; intuímos que muito sobre o Jesus histórico se eliminou deliberadamente nos primeiros séculos do cristianismo primitivo. Quem foi realmente, é difícil precisar. O que podemos, sim, é conhecer o contexto em que viveu, e daí obter um padrão de condutas.

  A narrativa tem interesse enquanto policial. No argumento central, exigia-se mais profundidade. A sequência que Dan Brown criou é lógica, todavia, eu senti alguma superficialidade num tema tão complexo e vasto. Também funcionará como atractivo a explorar a cidade de Paris, sobretudo (e Londres). Quem não foi ao Louvre, ficará com vontade de visitar o museu mais famoso do mundo.

    Li-o em castelhano, a título de curiosidade.


20 de novembro de 2021

Porque não o esqueceremos.


   Foi há trinta anos, a 12 de Novembro de 1991, que ocorreu o massacre de Santa Cruz, em Timor-Leste (oficialmente Timor Português, anexado à Indonésia, ilegal e ilegitimamente, a 7 de Dezembro de 1975, no seguimento da declaração unilateral de independência por parte dos timorenses nove dias antes). De 1975 a 1991, Portugal, de forma praticamente isolada, clamou nas Nações Unidas para que a comunidade internacional pusesse cobro ao genocídio da população timorense. A Indonésia era um aliado dos EUA naquela região do globo, e apoiou, pelo menos com a inércia e o silêncio, a anexação ordenada por Suharto. A independência timorense havia sido proclamada pela FRETILIN, partido ideologicamente próximo ao marxismo.

   Naquele dia, um grupo de jovens dirigiu-se ao cemitério de Santa Cruz para prestar homenagem a um rapaz falecido que pertencera à resistência timorense. O exército indonésio abriu fogo indiscriminadamente, matando, ao todo, mais de 300 pessoas. Um repórter britânico estava presente no local e filmou o massacre, dando a conhecer ao mundo as atrocidades dos indonésios. Max Stahl, era o seu nome, e faleceu em finais de Outubro deste ano, por coincidência.

  A partir de então, a causa timorense ganhou fervorosos adeptos lá fora. Organizaram-se protestos, compuseram-se e entoaram-se canções. Timor haveria de conquistar a sua independência em 2002, num processo iniciado em 1999, já a Guerra Fria terminara e a soberania do país não representava qualquer perigo à hegemonia norte-americana na região. Presentemente, o dia é feriado em Timor-Leste. É o Dia da Juventude, em memória dos que tombaram pela liberdade.

15 de novembro de 2021

Pose.


   Terminámos esta noite as três temporadas de Pose, quiçá a série que mais prazer me deu ver. Até agora, o primeiro lugar pertencia irredutivelmente à Guerra dos Tronos. Neste momento, não sei se a primazia se mantém. As duas primeira temporadas, vimo-las pela Netflix, e a última, descobrimos que não está disponível na HBO Espanha, ainda que na portuguesa, sim, conste. Não houve outro remédio que sacá-la da internet.

   A Pose conjuga elementos que a tornam na minha série preferida: desde logo, é ambientada sobretudo nos 80, com todo o glamour e os excessos da época; depois, aborda um universo em que me revejo: gente diferente, “fora da caixa”, que se marimba para as convenções sociais estabelecidas e leva a vida à sua maneira, encarando-a de frente. Há ainda a epidemia de HIV, um período que me aguça a curiosidade pelo impacto que teve numa comunidade já bastante afectada pelo preconceito e disfuncionalidade. 

  Uma palavra ainda ao desempenho dos actores. Falamos de transexuais e homossexuais fora do ecrã, gente que conhece a dor, o abandono e a humilhação, e talvez por isso lhes tenha sido tão fácil recriar aquele universo complexo, de relações familiares frágeis, mas que, simultaneamente, consegue ser uma fortaleza de união e entreajuda com quem partilha das mesmas experiências e vivências.

    A Pose é daquelas séries que vão deixar saudades. Muitas.





8 de novembro de 2021

A que lado pertences.

   

    Nisto das insónias -durmo sempre mal quando o M. está de plantão- ponho-me a divagar pelo Google, e dei com uma polémica com o Quintino Aires. O psicólogo, ou psicolinguista, como se denomina, fez questão de sublinhar a sua discordância face à comunidade gay, que considera um “gueto”, e às marchas do orgulho. Por isso, viu-se afastado da TVI.

   Não vou criticar o Quintino Aires. Vou procurar alertá-lo para o seu procedimento, porque eu incorri no mesmo. Durante alguns anos, fiz pandilha com os críticos da comunidade gay; considerei-a um gueto. Não gostava das marchas. Considerei-as um espectáculo de mau gosto. Fui, quiçá, mais longe que Quintino Aires: sendo LGBT, defendi a família tradicional, o Deus dos que me discriminaram na infância, adolescência e parte da idade adulta. Fi-lo a tudo, continuando a reconhecer-me como homossexual. Porquê? Nem eu o sei dizer.

   Até que, a determinado momento, procedi a um exercício de introspecção, recuei às minhas memórias mais primitivas e perguntei-me: “Quem és, afinal?” Aquele homem que não se revia na dita comunidade, que diabolizava as marchas, fora um menino delicado, que usava a maquilhagem da mãe e os seus sapatos. Mais, era um homem que não tinha nada que ver com aqueles que defendia, com os seus modelos de família, com as suas orientações políticas e considerações sociais. Apercebi-me a tempo, creio, a onde pertenço.

   O Quintino Aires, ainda que não o reconheça, e está no seu direito, pertence à comunidade LGBT. Foram elas, as travestis e os transexuais, os primeiros a dar a cara pela nossa visibilidade. A cara e o corpo. Sofreram todo o tipo de violência. Os gays também, nas suas marchas reivindicativas, que juntamente com as travestis e transexuais não se escondiam atrás de uma família tradicional e de um bom nome.

    Quintino Aires, com o seu discurso, está a alimentar os mesmos que nos odeiam: a extrema-direita e a direita conservadora. Não se pense que os direitos que a tanto custo conquistamos estão seguros, sedimentados. Foram-nos reconhecidos através de um processo político que levou um longo e prévio debate social. O mesmo processo político que nos reconheceu os vários direitos sociais de que desfrutamos pode, amanhã, ser desencadeado para reverter os nossos logros. Com isto, quero dizer que a luta se faz a cada dia, e que Quintino Aires e outros que partilhem das suas convicções ajudam a fortalecer o discurso dos que não duvidariam um minuto sequer a colocar-nos de novo nos anos negros da discriminação legal e do preconceito social. 

6 de novembro de 2021

Halloween.


   Nunca liguei ao Halloween, que inclusivamente é uma tradição anglo-saxónica que os EUA exportaram. Na Galiza e no norte de Portugal, existe o Samaín, e no dia 1 de Novembro as crianças do interior andavam a pedir o Pão-por-Deus de porta em porta. Hoje em dia, pedem doces. Adiante. Este ano (e já no ano passado), fantasiei-me de vampiro e decorei a casa. Qui-lo fazer, da mesma forma que decoro a casa pelo Natal (que se aproxima a passos largos; o frio já se faz sentir -hoje temos 2°C).

    Deixo-lhes uma foto.





30 de outubro de 2021

Galicia profunda.


   A semana pasada houbo unha polémica en Galicia despois dunha xuíza ter negado a custódia dun cativo á sua nai coa xustificación de que o neno iría crecer na Galicia profunda, e foi este o argumento que utilizou na súa decisión, que foi amplamente comentada pela prensa e nas redes sociais. Claro que isto tivo unha repercursión mói grande en Galicia, que é unha rexión histórica rural, sobre todo, provocando indignación na xente. O que muitos dixeron, e con algunha razón, é que un neno non necesita da cidade para ser feliz. Eu entendino doutra forma. Realmente, non necesitamos dunha cidade para ser felices, pero tampouco podemos ignorar a realidade: as oportunidades están nas cidades. O rural queda cada vez máis deserto, sen xente ou servizos. É unha realidade á que non debemos ignorar, e probablemente foi ese o entendemento da maxistrada. A expresión que usou non foi feliz, e iso ela ignorouno.

   Eu vivo na Galicia profunda, a 70km da cidade máis próxima. Unha vila preciosa, por certo, pero estou consciente de que aquí non hai nada, aínda menos traballo; vivimos aquí porque M. obtivo a súa interinidade no centro de saúde, ou sexa, un posto fixo. Aínda que sexa médico, antes traballaba aquí e alí, nunha e noutra vila. A vida de médico non é tan fácil como a xente pensa, e menos en inicio de carreira. Para o que estudan, os profisionais de saúde merecían máis consideración do estado e da sociedade.

    O feito de recoñecer que no rural galego non hai nada non quita a responsabilidade ao estado central e ao goberno autonómico, que deben facer máis para promover os servizos necesarios ás xentes que viven no interior. Evidentemente, un maxistrado debe ter en consideración a vontade presumida do menor, no caso, e o que sexa mellor para o seu futuro. A súa ponderación, independente, pode colidir coa sensibilidade popular, pero eu quero crer que non o fixo de modo arbitrario. A verdade pode ser cruel.

Texto escrito en galego.

28 de outubro de 2021

Crise Política.


      A crise que a não-aprovação do Orçamento do Estado para o ano vindouro gerou entre as instituições e os órgãos de soberania aproximou-me de novo da política portuguesa, a ponto de ontem ter sintonizado a minha aplicação da NOS no MacBook, que depois liguei à televisão, acompanhando a emissão da votação na generalidade que se deu no hemiciclo. Como sabemos, o OE foi rejeitado pela maioria dos deputados, com votos contra de praticamente todos os grupos parlamentares. Era uma decisão esperada e anunciada.

    A novidade desta crise, que tivemos muitas nestas décadas de democracia, é que jamais um OE deixou de ser aprovado (quando o comentei com o M., fez-me chegar de que aqui em Espanha tal nunca ocorrera; os partidos negoceiam até se chegar a um entendimento que permita a viabilização). É um inédito. Por outro lado, o Presidente da República afirmou publicamente que dissolveria a Assembleia da República, no uso de uma das suas competências, se o OE fosse chumbado. Adivinhava-se o cenário de eleições antecipadas, quando tão-pouco sabemos se saímos da crise provocada pela pandemia.

    Houve, através dos tempos, inúmeras dissoluções da Assembleia da República. Também agora poderá haver algumas novidades resultantes da conjuntura social e política. É que as sondagens, que valem o que valem, não parecem indicar uma predisposição do eleitorado a escolher uma solução diferente àquela a que o Presidente agora se opõe; trocando por miúdos, se o povo, nas eleições, vota num governo do PS, Marcelo Rebelo de Sousa sai desautorizado pelos anos de mandato que lhe restam, e são praticamente cinco. Imagine-se o que será um cenário de cinco anos de um governo fraco, com uma extrema-direita pujante e um presidente desautorizado. 

   Seguramente que Marcelo Rebelo de Sousa o previu, como bom estratega que é, que se antecipa às jogadas e está sempre um passo à frente dos adversários, se bem que confesso que não sei o que motivou a sua decisão. Não acredito que dê o dito por não dito, passo a expressão. A boa nova é que, nas legislativas, parece que posso votar por via postal, estando recenseado no estrangeiro.

26 de outubro de 2021

Descolonizar a cabeça.


    A minha posição nesta matéria tem mudado ao cambiante da sensibilidade. Ultimamente, tenho-me afastado das visões românticas do colonialismo. Se julgamos que o nosso valor está nas conquistas dos séculos passados, muito pouco temos para dar. Sem floreados, em que é que consistiram os descobrimentos portugueses, espanhóis, franceses, holandeses, ingleses etc? Conquistas através da força, desrespeitando-se os povos autóctones, as suas culturas, tradições, usos, costumes e línguas. Impusemo-nos valendo-nos da nossa superioridade bélica. Chegámos a territórios que nos pareceram climaticamente convidativos, ricos em minérios, biodiversificados, com potencial agrícola para as grandes plantações e com populações que desconheciam o nosso deus, prontas para ser evangelizadas (isto sobretudo no caso dos ibéricos). Parece-nos razoável? A mim, não.

   A Europa é um continente disposto numa miríade de realidades políticas pequenas, se excluirmos a Rússia, cuja principal parcela de território se encontra na Ásia. É tudo uma questão de tamanho. É-o assim com os homens e os pénis (Freud explica-o), com as mulheres e as maminhas e com os Estados e os seus impérios. Quanto maiores, mais galvanizados se sentem. Entendo a motivação, mas cada vez mais a considero escusável, irrealista e inclusive deplorável. Sentir orgulho sobre uma história de horrores é próprio de gente sem um pingo de noção, e numa era em que as relações se fazem de igual para igual entre os estados, ou seja, sem esse respeito reverencial dos colonizados pelos colonizadores, eu imagino o constrangimento de uns e os risos cínicos de outros quando se sentam à mesa, para tratar de negócios, empresários mexicanos e espanhóis, por exemplo. É absurdo. Não vale a pena supor que o mundo, lacto sensu, vê a Europa como o berço da civilização porque não o vê; que vê no colonialismo todas essas glórias de uns velhos do restelo presos ao passado porque não o vê. Bem antes pelo contrário. Convinha que começássemos a tomar consciência da realidade e a perceber que somos herdeiros de um passado mais embaraçoso do que digno de alarde.

20 de outubro de 2021

ETA.


   Han pasado diez años desde que ETA suspendió definitivamente sus operaciones armadas. Euskadi Ta Askatasuna, en euskera, defendía la independencia total del País Vasco español y francés y la creación de un Estado socialista revolucionario.

  Aunque discrepo profundamente de sus métodos, la lucha por la libertad de un pueblo no siempre adquiere un carácter pacífico, que es lo que todos queremos (y la historia tiene varios ejemplos de eso).

   La diplomacia es el camino. ETA ha cometido delitos terribles, ha matado a inocentes y ha provocado el pánico entre los españoles durante décadas, desde el comienzo de su actividad, en 1959, todavía en la dictadura franquista, hasta 2011, cuando anunció que terminarían los atentados. Murieron más de 800 personas en sus más de cincuenta años de existencia.

19 de outubro de 2021

Aristides de Sousa Mendes.


   Aristides de Sousa Mendes esteve décadas na penumbra até ser reabilitado já na democracia. Salazar devotou-o à miséria absoluta, jamais lhe perdoando o acto de desobediência, ao mesmo tempo que o ex-cônsul recebia todos os louvores e honras póstumas em Israel.

    O diplomata foi um dos poucos heróis que Portugal teve no século XX. Com prejuízo pessoal, o que ainda se torna mais raro, sem qualquer aproveitamento, colocou-se em risco, pagou com o ostracismo e a pobreza e salvou vidas. Milhares. Milhares que beneficiaram dos seus vistos e conseguiram escapar aos campos de concentração e extermínio nazis. Não há homenagens suficientes que se possam prestar a alguém assim. É de um humanismo, altruísmo e espírito de solidariedade ímpares.

    Hoje, finalmente, o Panteão Nacional recebe-o junto a vários dos seus grandes (alguns estão a mais, mas isso é tema de outra conversa). Os despojos continuarão na sua terra natal, por vontade expressa da família, mas o cenotáfio e as inscrições estarão lá, para sempre, de forma a que nenhuma geração se esqueça da grandeza de Aristides de Sousa Mendes.

2 de outubro de 2021

Veinte Mil Leguas de Viaje Submarino.


    Terminé hoy las Veinte Mil Leguas de Viaje Submarino, el clásico de la literatura de ese gran autor de ciencia ficción que fue Julio Verne. Honestamente, y aunque la obra sea sorprendente, puede resultar agotadora, porque Verne se preocupa demasiado en enumerar y describir exhaustivamente todas las especies marinas con las que el Profesor Aronnax se depara mientras sigue su viaje en el Nautilus, la bestia que provocó tanto espanto en los buques de su época y respectivas tripulaciones. 

     La historia tiene lugar en todos los océanos del planeta. Sus personajes, el Prof. Aronnax, su pupilo Conseil, el imprevisible arponero Ned Land y el misterioso Capitán Nemo viven sus aventuras a bordo del submarino, mostrándonos un impresionante mundo subacuático lleno de monstruos de dimensiones colosales, continentes perdidos y cavernas misteriosas.

   Verne anticipó una revolución en los mares. Su aparato es común en nuestros días. Sentimos el asombro que la electricidad y sus potencialidades le despiertan. En este momento de evolución tecnológica, muchos de los logros de Nautilus no nos impresionan. Lo mismo no pasa con el Capitán Nemo. Nada sabemos de su origen y sus motivaciones. De modo similar a lo que le pasó al Profesor Aronnax, nosotros también nos dejamos atraer por la seguridad del capitán en todas sus decisiones, su temperamento inflexible, su carácter y terquedad.

     Fue mi primera lectura de Verne, y estoy seguro que no será la ultima. Sé que Verne reservó todo lo que queremos saber del Capitán Nemo en una obra llamada La Isla Misteriosa, que tengo que comprar. Fue, de igual forma, mi segunda lectura en castellano después de La Casa de los Espíritus.

27 de setembro de 2021

Autárquicas portuguesas 2021.


   Imagino que este tenha sido o acto eleitoral português que menos me disse. Não acompanhei a campanha, nem a noite de ontem. Soube, aliás, do favoritismo do PS à maioria das autarquias portuguesas através de um jornal espanhol. Pois bem, apenas hoje de manhã me inteirei, e parcamente, dos resultados, e achei por bem dizer algo.

    O PS perdeu Lisboa. Num país centralista e centralizado como Portugal, perder ou ganhar a capital tem um enorme simbolismo, e ainda que os socialistas, ao que parece, tenham logrado a governação da maioria das autarquias, perderam Lisboa para o seu principal rival, perderam Coimbra e no Alentejo não conseguiram consolidar a sua posição. Há desde logo três ilações que se retiram deste resultado: a somar ao revés de deixar cair Lisboa, Costa vê partir a cidade em que foi autarca por vários anos e não consegue convencer o país da vitória socialista. O sentimento instalado na população é outro. Para o PSD, inicia-se outro ciclo, provavelmente, galvanizam-se os militantes e simpatizantes, dá-se uma bomba de oxigénio a Rui Rio e antecipa-se o que poderá ser o dia seguinte às legislativas. Sem Rio, acredito eu. O Bloco de Esquerda tem um resultado global mau. O CHEGA perde o desafio de se colocar como terceira força política a nível local, mas consegue mais vereadores do que a extrema-esquerda. É um partido feito à imagem do seu fundador. Bem demonstrativo disso foi a necessidade de se colocar uma foto de Ventura a acompanhar as dos respectivos candidatos em cada povoação. No dia em que Ventura sair, prevejo um desaire completo. Sobre o PCP, devo dizer que nada sei de substancial. Perdeu algumas autarquias, manteve outras, os seus tradicionais redutos comunistas. O PAN e o Iniciativa Liberal tiveram resultados igualmente pouco animadores. O PAN não consegue convencer o eleitorado com o seu programa além da defesa dos animais e ao Iniciativa Liberal, suponho, há um longo caminho a percorrer para ganhar vantagem face aos tradicionais partidos. No poder local, como é mais próximo das populações, o partido ainda se ressente dessa falta de peso histórico, de trabalho feito. Nas eleições autárquicas, não é incomum que candidatos independentes, porque têm a simpatia das pessoas, consigam levar vantagem aos candidatos dos partidos.

    A abstenção foi elevadíssima. Já o sabemos e já o esperávamos. Se há vencedores, e alguns dizem que todos perderam, ela foi a vencedora, como o é sempre.

20 de setembro de 2021

Paseos.


    Ayer, M. yo y unos amigos salimos a pasear por varios concejos de la región. El domingo empezó con la misa del Santo Cristo y de la Virgen Dolorosa, las festividades del pueblo, con un dato curioso. Cuando M. y yo llegamos a la iglesia, ésta se encontraba llena de gente, ya con algunos de pie. Había miembros de la protección civil, por esto de la pandemia, y no dejaban que nadie más entrara en el espacio; sin embargo, una de las chicas de la institución nos invitó a entrar, bajo la condición de nos quedarmos de pie. El cura nos vio y pedió a uno de los miembros de la protección civil que nos dijera que podríamos subir al altar y quedarnos junto a él. Toda la gente nos miraba, sorprendida. Fue una actitud muy bonita del cura, y una demostración de que la homosexualidad en España no es un tabú como en Portugal. Incluso en un pueblecito del rural y por los sacerdotes, todos nos aceptan. La Iglesia de España debería romper con la autoridad de Roma. Seguro que sería la iglesia cristiana más abierta y tolerante del mundo.


La presa de Chandrexa de Queixa


    Por la tarde, fuimos a comer a un restaurante en Chandrexa de Queixa, y después de gira por los pueblecitos de aquí, que son preciosos, y además me subí a un columpio -y mirad que no soy temerario-. Gané confianza, y unos minutos después ya me balanceaba. M. me sacó unas fotos geniales. Esta región donde vivimos, en medio de la montaña orensana, es hermosa. Los valles y las montañas nos dan una idea de profundidad impresionante. Es todo nuevo para mí, un chico de la gran ciudad. Puedo deciros que estuvimos, además de en Chandrexa de Queixa, que ya conocíamos, en Vilariño de Conso, o Bolo (As Ermitas), Viana, A Veiga, y es probable que me olvide de algún pueblo más.

    Me gustaría hablaros de una casa preciosa, la Casa das Pedriñas (en gallego), que fue construída en 1970, toda en piedra. Se sitúa en A Veiga. Es una de las atracciones del pueblo, y es la foto que os dejo aquí.
    

Precisosa, ¿a que sí?



12 de setembro de 2021

11/09/01, 20 anos.

   
   Foi há precisamente 20 anos, mas poderia ter sido ontem. As memórias permanecem nítidas. Tinha faltado ao primeiro dia de aulas por capricho. Ia almoçar com os meus pais quando se deu o primeiro embate. Julgou-se um terrível acidente. No momento em que nos preparávamos para nos sentarmos à mesa, já com os olhos postos na televisão, surge um segundo avião que nos deu a certeza de que tudo fora deliberado.

   Mudou o mundo e o nosso entendimento sobre ele. O 11 de Setembro, tão dramático que se apropriou de uma data do calendário, deu início a uma nova era no dealbar do século XXI. Uma era securitária, de guerras preventivas, de choque entre civilizações e religiões, de incumprimento dos preceitos do direito internacional. Todos passámos a ser potenciais vítimas e suspeitos. Os seus efeitos prolongar-se-ão por tempo indefinido.




10 de setembro de 2021

Jorge Sampaio (1939-2021).


   Em Portugal, quem morre perde todos os defeitos. Os erros eliminam-se, apagam-se das biografias pessoais. Jorge Sampaio, falecido hoje, não era uma figura que inspirava antipatia. Não era, efectivamente. Consta, do seu percurso político, o activismo contra a falta de liberdades na fase final do Estado Novo, a luta pela implementação e consolidação da democracia e, décadas depois, o empenho na defesa dos direitos humanos. A César o que é de César. Entretanto, moveu-se por interesses de natureza partidária e afinidades políticas. Fez um juízo, já si discricionário, de instabilidade em 2004, quando havia uma maioria parlamentar favorável. A sua actuação conduziu à vitória do PS, o que é normal em democracia, porém, à ascensão de uma figura sinistra chamada José Sócrates. Esse feito, que leva a assinatura de Sampaio, em grande medida, tem sido assinalado hoje, e é bom que o seja.

    O seu segundo mandato conheceu períodos conturbados, desde logo em finais de 2001, quando Guterres pediu a demissão (na sequência da derrota nas autárquicas) e a dissolução do parlamento levou à vitória do PSD de Durão Barroso e, três anos depois, o já citado episódio com o governo de Santana Lopes. E se é certo que as análises à distância e quando não se ocupam cargos de responsabilidade são mais fáceis, Sampaio abriu um precedente inédito, que tentou justificar, ou explicar mais tarde, e que ele soube, e nós sabemos, que a bem ou a mal escreveu a página das suas memórias, que são as nossas, que melhor recordaremos pelos piores motivos.

9 de setembro de 2021

Aquashow.


    Durante a minha estadia no Algarve, um amigo levou-me a um parque de diversões aquático pela primeira vez. Eu não sou nada aventureiro, nada. Ver aquelas atracções todas, com escorregas, montanha russa, pistas etc, encheu-me de medo. Não queria ir, mas com tanta insistência acabei por aceitar. Além disso, e embora não seja nada aventureiro e corajoso, sou tremendamente curioso, e há um lado em mim que quase me obriga a viver certas experiências para ter o que contar.

    O parque fica situado em Quarteira. É enorme, e eles dizem -o meu amigo corroborou- que é o mais completo do país. Está dotado, a par das atracções que o tornam apetecível, de piscinas: tropical, para nadar e uma que, de tempos a tempos, gera ondas artificiais. Dispõe ainda de uma piscina-jacuzzi de água quente com tempo cronometrado, senão muitos (incluindo eu) não sairiam dali.

   Das ditas atracções, umas são pistas individuais sem bóia, ou seja, lançamo-nos sem qualquer acessório; depois há aquelas individuais com bóia e algumas que permitem duas ou mais pessoas numa bóia. Escusado será dizer que eu não me atrevi a entrar em nenhuma individual, por medo, e fiz praticamente todas a dois ou mais (éramos três). E fui à montanha russa.

    O que mais receio me provocou foi a velocidade que as bóias atingem. Impulsionadas pela água (algumas com jactos), aquilo vai por ali afora de modo descontrolado. A bóia gira, inclusive pode-se virar, e nós no meio. Não houve nenhum momento em que me tenha sentido em perigo -é um parque moderno, concorrido, com fiscalização. É aquela sensação de descontrolo e desgoverno, aliados à novidade, que me fizeram ficar apreensivo. Longe vão os tempos daqueles parques aquáticos em Portugal que levaram à morte de duas crianças.

    Em que atracções andei? Pois bem, foram elas: o Riverslide, o Shark Slide, a Montanha Russa, o Thunder Cruise, o Mammothblast e o Lazy River, mais as piscinas. Houve alguns em que, mesmo acompanhado, não tive coragem de me meter. Para mim e para uma primeira vez, foi mais do que poderia esperar (acreditei que nada faria).

     Uma vez que andamos pelo parque, que é extenso, e deixamos os nossos pertences por ali mesmo, nos vários jardins habilitados para o efeito, não levei o telemóvel, por precaução. Assim mesmo, eles têm um staff encarregue de nos tirar fotos (que depois vendem a um preço escandalosamente elevado para o que é). Porque foi um inédito e provavelmente não me meterei de novo em algo assim, comprei as minhas fotos na montanha russa e na piscina de ondas. Duas recordações.

6 de setembro de 2021

Férias (V) - O Algarve e a inquietação.


   Fica desde já prometido que esta é a minha última publicação sobre umas férias que começaram nas Canárias, passaram pela Finisterra e terminaram, como vem sendo habitual desde há uns anos a esta parte, no Algarve, em Vilamoura, onde estive praticamente quinze dias. E já temos planos para uma viagem, no final de Outubro, a Roma, Florença, Atenas ou Amesterdão, que o M. ainda tem quinze dias por gozar. Tenho andado a pensar acerca da cidade a escolher, com ligeira preferência pela capital italiana.

   Cada vez se torna mais difícil para mim ir a Portugal. O único que me liga àquele país é a minha mãe, e eu diria também o meu pai (porque fica bem), se bem que, em verdade, há anos que não lhe ponho os olhos em cima. Falamos diariamente pelo chat. Não necessito de mais.

    O Diesel ficou no apartamento. O M. cuidou dele como pôde, que a vida de um médico com plantões de 48h não lhe permite muito mais. Levava-o a passear quando chegava a casa ou nas horas mortas, uma a duas vezes por dia, o que é pouco. O cãozinho também é outra fonte de preocupações quando me ausento, e a última vez fora há precisamente um ano. Não o deixei de novo no hotel para animais porque o M. me garantiu que ele ficava bem. E ficou. Alguma solidão passou, mas ficou bem, na sua casa, na sua cama.

    Quando estou , a cabeça e o coração ficam cá. A sensação, ao regressar, é a de um dever cumprido, e é assim que encaro todas as minhas idas a Portugal. Não é um prazer. É um dever. Um dever que, espero, só se imporá de novo dentro de um ano. Agora, quero desfrutar de novo da minha casa, do Diesel e do M., que tanto me necessitam e que são, em rigor, a minha família.

21 de agosto de 2021

Afeganistão.


     Quando soube o que ocorrera, julguei ter recuado a 2001. Julgámo-lo todos, e mais ainda os afegãos, que de pouca liberdade gozaram para, ainda assim, lha tirarem. Os talibãs tomaram a capital, que o país nunca o deixaram de todo, e agora? Vamos ter de novo mulheres proibidas de sair à rua, pessoas açoitadas por usarem uns jeans, homossexuais executados impiedosamente?

   Ouço dizer que "os talibãs talvez não venham a ser o que foram". Há quem esteja disposto a reconhecê-los. Parece mentira. Apoiados pelos EUA durante a guerra com a União Soviética, que também se posicionavam por detrás do governo fantoche que estava em Cabul, creio que o menos importante será discutir de que lado se está. Só pode haver um lado aqui: o dos direitos humanos. É esse que me move, é esse o de qualquer pessoa interessada em lutar pelo bem-estar e pelos direitos dos afegãos, das mulheres afegãs, das minorias afegãs.

    Se para a salvaguarda desses direitos for necessária uma intervenção no país, que seja decidida pelas Nações Unidas, a única que o pode fazer. O que não podemos é calar, ignorar, transigir, fazer deste caso mais uma moda de redes sociais. Pensemos que podia ser connosco, se tivéssemos tido a pouca sorte de nascer por ali. E pensemos também nas minorias doutros países da região que não desfrutam do alarme social que o governo talibã gerou no ocidente. É que as violações dos direitos humanos estendem-se àquela região do globo, são comuns a vários países, praticadas por vários governos internacionalmente reconhecidos. Evidentemente que derrubar os talibãs é imperioso. É salvar vidas. Não nos podemos é ficar por aí. Como venho dizendo, o respeito pelas religiões e pela soberania dos estados cede perante a defesa dos direitos humanos, da vida, da integridade física, do livre desenvolvimento da personalidade. Sempre.

19 de agosto de 2021

Férias (IV) - A Finisterra.


   Finisterra, em latim, finis terrae, ou seja, “o fim da terra”. Isso pensavam os romanos quando a baptizaram assim. Julgavam que tinham chegado ao ponto mais a oeste do mundo, mas afinal enganavam-se: esse estava no Cabo da Roca, em Portugal, o ponto mais ocidental da Europa continental.

    A Finisterra é um munícipio galego na província da Corunha, e foi ali que as nossas férias seguiram após termos regressado das Canárias. O avião aterrou em Santiago de Compostela, e no dia seguinte partimos em direcção ao nosso destino. Umas poucas horas de carro.


As águas, límpidas


    O clima daquela região espanhola não poderia distar mais do das Canárias, de forte influência oceânica, que se reflecte na aragem, fresca, e na temperatura da água, gélida. Pude constatá-lo na agreste e perigosa Praia do Mar de Fora, de mar revolto, extremamente impróprio para banhos. A Praia da Langosteira, todavia, é mais conhecida e convidativa.


A Finisterra está intimamente ligada à arte da pesca


    Ficámos hospedados numa casa rural, lindíssima, com piscina e um jardim extremamente agradável. Os seus proprietários eram um casal de dois senhores homossexuais de meia idade. À propriedade, imprimiram-lhe uma faceta antiga na decoração das divisões principais e dos quartos. Sentimo-nos em casa, é um facto. Além disso, tinham uma biblioteca recheada que nos fez as delícias enquanto desfrutávamos daquele sol não tão escaldante quanto o canário. São excelentes anfitriões, e um deles ocupa-se da parte culinária. Os pequenos-almoços, à discrição, eram requintadíssimos. 

    A vila é recomendável a quem quer descansar. Ainda assim, culminando ali o Caminho de Santiago, são de esperar muitos peregrinos.

Todas as fotos foram captadas por mim. Uso sob permissão.

10 de agosto de 2021

Férias (III) - As Canárias.


  Seguindo no nosso roteiro, outra das praias que nos ficou debaixo de olho foi a dos amadores, um pouco depois da praia de Puerto Rico. A Playa de los Amadores é parecida à de Puerto Rico: tranquila, numa baía, onde uma vez mais testei os meus limites. Fui, a nadar, até à zona que delimita a área reservada aos banhistas e a que fica para lá dessa linha marcada por pequenas bóias amarelas.


Esta foto foi tirada por casualidade, e é uma das que mais gosto das férias



   Na sexta-feira, julgámos por bem passar o dia na capital das Canárias, Las Palmas (de Gran Canaria). Las Palmas tem perto de 340 mil habitantes, o que, em Portugal, a tornaria na segunda cidade mais populosa. A sua área metropolitana ascende aos 600.000. Para variar, literalmente, não fizemos praia. Conhecemos a zona histórica, fomos à sua catedral -a Santa Iglesia Catedral-Basílica de Canarias-, que é lindíssima. Conseguimos, a dois minutos de encerrar o elevador que nos leva à torre, subir e apreciar as vistas sobre a cidade. No Patio de los Naranjos, que fica situado ao lado da catedral, visitámos o Museu Diocesano de Arte Sacra. Por último, o Museu Canário, que, honestamente, foi o que me deixou mais na expectativa (ainda na fase anterior à viagem, de pesquisa), pela colecção assombrosa de fósseis humanos, de aborígenes, ou seja, de povos autóctones da ilha que a habitavam aquando da chegada dos exploradores espanhóis e portugueses.


La Plaza Mayor de Santa Ana

  As férias nas Canárias estavam prestes a terminar, mas seguiriam no dia seguinte, após uma breve passagem por Santiago de Compostela, noutro local igualmente encantador. 

Todas as fotos foram captadas por mim. Uso sob permissão.

4 de agosto de 2021

Férias (II) - As Canárias.


   A viagem durou duas horas e meia. Quando chegámos, dirigimo-nos imediatamente ao hotel. Depressa constatámos que se tratava de uma estância predominantemente homossexual pela quantidade de casais compostos por membros do mesmo sexo e bandeiras arco-íris que decoravam janelas e varandas. Demos um pequeno passeio pelas imediações, e desde logo um homem ofereceu-nos uma massagem aos dois. Foi a primeira vez que tal nos sucedeu, e a nossa reacção, em uníssono e imprevista, foi um “no, gracias”. Foi o meu primeiro confronto directo e inequívoco com uma sociedade muito mais aberta do que a portuguesa. Há inclusive, na zona, um centro comercial dedicado exclusivamente ao público homossexual e inúmeras lojas gay; dentro delas, lojas para bears, por exemplo. Vi um pénis em formato de vela, com as cores arco-íris, que tentei adquirir mais tarde, sem sucesso porque a loja estava fechada.


As vistas desde a varanda do nosso quarto


   No primeiro dia, ficámo-nos pela praia do inglês, ou seja, a praia que corresponde à zona do hotel. É uma praia imensamente frequentada, de areia escura. A ilha tem origens vulcânicas. De manhã, deixámo-nos ficar na piscina a relaxar. O hotel dispunha de piscinas de hidromassagem, além de solário, sauna e ginásio. Apenas experimentámos a hidromassagem. À noite, estávamos tão cansados que não saímos.


Uma pomba no areal


    No segundo dia, e uma vez que não estávamos distantes, fomos conhecer as dunas de maspalomas, e o nome já indica que são dunas, mas umas dunas totalmente distintas daquelas que conhecemos na península. São dunas que mais se assemelham a um deserto. Um microssistema com interesse, que termina numa praia. Se visitarem a ilha e eventualmente as dunas, não aconselho a que o façam à hora de maior calor. A temperatura da areia é verdadeiramente escaldante.


As Dunas de Maspalomas


   No terceiro dia, invertemos “o esquema”: começámos pela praia, desta feita na praia de Puerto Rico, uma praia formada por uma baía. As águas eram muito mais calmas que as da praia do inglês. Alugámos o chapéu e as espreguiçadeiras, como de resto fizemos sempre que as praias os tinham, e passámos uma tarde agradabilíssima.


A Praia de Puerto Rico


     No quarto dia, dirigimo-nos bem cedo ao norte da ilha, uma viagem que nos levou três horas, mas que considerámos essencial, até porque nunca havíamos visitado piscinas naturais. Fomos às piscinas naturais de Agaete, um paraíso natural formado pela erosão das rochas de origem vulcânica. O oceano foi esculpindo fossas e transformando-as gradualmente em piscinas. A única acção do homem foi dotar as piscinas de escadas para que os banhistas possam subir e descer.


As encantadoras Piscinas Naturais de Agaete



     Os restantes dias ficam para publicação ulterior.

Todas as fotos foram captadas por mim., Uso sob permissão.