27 de junho de 2020

A Galiza fluvial.


    Teve de ser aqui, numa das comunidades autónomas mais a norte do Reino de Espanha, que mergulhei pela primeira vez tão cedo, considerando a época do ano. Pois bem, no mês passado pude desfrutar de uma tarde no Embalse d'As Guístolas, aqui perto, e, já na semana passada, na praia fluvial O Caneiro, também a escassos quilómetros.

    As Guístolas são uma barragem no Rio Návea. Proibido está mergulhar ou tão-pouco nadar a uma distância inferior a 200 metros. Receei um pouco nadar por ali, e evidentemente que não me afastei da margem. Ver as comportas lá ao longe atemorizou-me e comprometeu a minha liberdade ao me ver na água. Valeu pelas lindíssimas paisagens daquele vale verdejante.


Bonito lugar, não?


    Em contrapartida, O Caneiro é um encanto sem perigos. Trata-se de uma praia fluvial no Rio Bibei. A água, como se imagina, é gelada, no entanto, para quem gosta de nadar, diria que a temperatura não é um obstáculo. Treme-se de início e, quando damos por nós, já estamos a gozar aquela água doce e límpida, com uma nascente do lado direito.


Uma água tremendamente fria, mas um local magnífico


Um pequeno paraíso escondido


    Uma experiência diferente, visto que jamais nadara noutro local que não fosse uma praia dita comum, de mar ou oceano. De quando em vez, pesquisava sobre praias fluviais em Portugal e pensava: Porra, que bonitas! Foi aqui, no país vizinho, que me estreei. A Galiza, como é sabido, tem uma paisagem distinta daquela que tipicamente associamos a Espanha. Sendo um Estado de nações, cada uma tem os seus costumes, tradições, e é inevitável que o microssistema molde também os hábitos dos povos. Esta Espanha natural, selvagem, nada tem que ver com a Castela das fortificações e dos moinhos ou com a Andaluzia das mesquitas árabes. É uma Espanha que facilmente associamos ao tão nosso Trás-os-Montes.

    Deixo-lhes fotos. Quem me acompanha pelas demais redes sociais já sabe que tem acesso a estas e outras.

16 de junho de 2020

A Galiza selvagem.


   Uma das melhores coisas que a Galiza me ofereceu foi poder ter contacto com uma realidade que me era completamente desconhecida: a dos bosques e florestas, dos rios, das barragens, dos castanhos centenários e das pedras gigantes. 

 Quase todos os fins-de-semana nos aventuramos por algum recanto, caminhando por vários quilómetros. Percursos que revelam algo de novo para mim. Quando soube que viria morar no campo, pensei que pouco ou nada teria para ver por aqui. Como estava equivocado! Há sempre algum trilho inexplorado, que inevitavelmente se liga e cruza com outros que jamais percorrera. Da flora à fauna, a Galiza é um território ainda parcamente conhecido dos portugueses. A terra-mãe, tão perto e simultaneamente tão longe dos nossos horizontes.

    Deixo-lhes algumas fotos.

O Castaño de Pumbariños, com mais de 1.000 anos



A Barragem de Chandrexa



Ponte Romana de San Xoan (de Rio)




Unindo Bracara Augusta (actual Braga) a Asturica Augusta (actual Astorga), este troço de estrada romana de aproximadamente 300 quilómetros é dos últimos que existem na península

     

4 de junho de 2020

Do racismo.


   Nos dias que correm, as redes sociais dispõem de um poder decisivo, exponenciando os assuntos, tornando-os virais e afastando-nos das soluções. Da moda das hashtags às reivindicações de justiça popular, instantaneamente morrem sem deixar rasto, como se milhões de publicações houvessem solucionado os problemas. É o que ocorre com o afro-americano assassinado recentemente.

    Por momentos, julguei que voltara aos anos 60 e à luta de Luther King pelos direitos dos negros. Os EUA mantiveram, por décadas, leis raciais duríssimas que faziam impender aos negros uma situação social e jurídica intolerável. As leis mudaram, é certo, mas o preconceito ficou lá. É quase anacrónico falar-se de um racismo tão evidente. O racismo persiste, sobretudo o racismo dissimulado, o racismo do comentário abafado e desdenhoso, o racismo de bastidores, aquele a que o império da lei não chega porque nem conseguiria chegar.

   Não consigo evitar abordar uma temática tão apaixonante no que a Portugal diz respeito. Eu diria que não há um racismo predador em Portugal. Haverá, quando muito, um paternalismo. O português, pelos tempos, julgou-se o tutor do corpo (e das almas...) daquelas pessoas. Esse paternalismo, evidentemente, comporta um sentimento mais ou menos presente de superioridade rácica, embora o português tenha sabido conviver com aqueles povos, miscigenando-se e, na maior parte do casos até, virando costas à Europa, constituindo família por lá. Daí que mereça a pena enquadrar o racismo nas suas diversas vertentes: o racismo não se consubstancia apenas no acto vil de se tirar a vida de alguém pela sua cor da pele; o racismo também se verifica quando julgamos que a nossa cor de pele, a nossa origem, nos dá qualquer ascendente sobre outrem, ainda que estejamos munidos das melhores intenções. O caso português será este último.

   No caso dos EUA, o racismo está relacionado com a própria existência da nação americana, porquanto o esclavagismo negro esteve subjacente à Guerra da Secessão. Nos estados do sul, as atitudes hostis contra as comunidades negras continuam. As raízes do preconceito racial naquele país são demasiado profundas. Levar-se-ão décadas para que o americano médio do sul entenda que o vizinho negro é tão americano quanto si próprio, e que a América branca terá de conviver com a América negra e a América hispânica. Acrescente-se ainda que os EUA terão herdado uma prática social e racial inglesa bem mais dura com os povos nativos do que a portuguesa ou a espanhola. Caso disso é o Brasil, onde a mistura das componentes europeia, africana e indígena é notoriamente maior.

   A aplicação escrupulosa da lei ajudará a demover o cidadão do crime por motivos rácicos. O endurecimento da legislação também. Contudo, uma vez mais, a educação desempenhará aqui um papel decisivo. De pouco valerá ter espelhada na lei determinada concepção ética valorativa quando, nas famílias, se transmite a ideia de que a nossa cor nos faz especiais.