Há poucos dias atrás, o Financial Times, num - aliás excelente - artigo de opinião, sugeriu de forma irónica e, de certo modo, engraçada, que Portugal poderia ser anexado pelo Brasil de forma a resolver os problemas gravíssimos que o país atravessa. O artigo, segundo consta, foi mal recebido pela opinião pública portuguesa, naquilo que eu considero uma verdadeira manifestação de nacionalismo bacoco do mais démodé possível... O artigo definiu-se a si próprio como irónico.
Para além da evidente conclusão - óbvia - de que os portugueses não têm sentido algum de humor, este artigo teve a extraordinária capacidade de suscitar o meu interesse. Com tanta notícia a que estamos sujeitos diariamente, um artigo tem de ser verdadeiramente acutilante para merecer a minha atenção.
Anexação de Portugal pelo Brasil. Parece descabido? A mim, não.
Creio que será necessário esclarecer alguns pontos que me parecem essenciais para atingir o que pretendo.
A separação política entre Portugal e o Brasil não se processou de forma análoga à que ocorreu entre Portugal e as ex-províncias ultramarinas. Para ser mais claro - e não me alongando muito porque facilmente encontram a informação histórica que está disponível na net - Portugal e o Brasil ainda hoje poderiam ser um único país.
Recuando no tempo, estamos nos inícios do século XIX. Vou ser muito genérico. Portugal foi invadido pelas tropas napoleónicas, em 1807, e o rei D. João VI "retirou-se" estrategicamente (?), vulgo fugiu, para o Brasil, levando consigo toda a Corte Portuguesa num número que ascendia às quinze mil pessoas. Em 1815, e uma vez que não fazia qualquer sentido o rei habitar numa colónia, o Brasil ascendeu à categoria de reino unido a Portugal: estávamos perante o novo Estado, Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.
Em 1820, com a Revolução Liberal Portuguesa, as Cortes Constituintes exigiram que D. João VI retornasse a Portugal (1821), de forma a jurar a nova Constituição que estava em processo de ser viabilizada e porque não era admissível que o rei português continuasse fora do reino, numa "colónia", tantos anos passados desde que foi definitivamente afastada a ameaça francesa. O rei retorna a Portugal e deixa como regente, no Brasil, o seu filho Pedro (futuro Pedro IV de Portugal, I do Brasil). Não nos esqueçamos de que o Brasil já era um reino. As Cortes Constituintes, não satisfeitas, quiseram mais: para além de exigirem o regresso do princípe herdeiro para a metrópole, para aí concluir a sua educação, pretenderam subalternizar a posição do Brasil, tornando-o novamente uma colónia de Portugal. Os portugueses do Brasil (na época, não eram designados de brasileiros: o termo surgiu com a independência) e D. Pedro não aceitaram: dá-se a Independência do Brasil, em 1822, formalmente reconhecida por Portugal em 1825.
Como é facilmente verificável, o Brasil pretendia manter-se unido a Portugal, não fosse a intransigência das Cortes Constituintes. Hoje, possivelmente, poderíamos ainda ser o grande Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, ou numa forma republicana, quem sabe? A situação do Brasil foi substancialmente diferente da ocorrida nas colónias espanholas da América Latina. Tínhamos tudo para continuarmos unidos, o que seria possível caso não existisse a típica burrice lusitana.
Voltando ao artigo do Financial Times, chegamos facilmente à conclusão de que a ideia não é, de todo, descabida. Claro que uma situação de anexação é totalmente inviável e inaceitável, não por uma perda de status lusitano, mas porque o neocolonialismo a esses extremos seria absurdo. Defendo, isso sim, a criação de uma Federação entre Portugal e o Brasil em pé de igualdade jurídico-legal entre ambos. Os laços históricos, culturais e linguísticos apontam nesse sentido de forma inequívoca.
A União Europeia caminha num processo descendente - sou totalmente eurocético -, logo, o melhor caminho para Portugal, unindo-se, seria com um país irmão e não com países totalmente diferentes, pese embora o facto de partilharem o mesmo espaço geográfico.
Portugal vive dias terríveis e cada vez menos os países mais pequenos conseguirão sobreviver num mundo globalizado.
Mas, não, o nacionalismo ridículo não entendeu a ironia e mais: ressentiu-se de tal ideia.
Que eu esteja enganado, porém, pode ser que sejam absorvidos pelos hermanos, tarde ou cedo, sem possibilidade de qualquer escapatória...
A solução para Portugal, hoje como ontem, está na sua capacidade atlântica.
É nela que vive o futuro do país.