Querido Diário,
Neste momento que te escrevo são duas e vinte da manhã e tenho o rosto molhado. Sim, estive a chorar.
O pai saiu de casa antes do jantar e disse que não voltará. Pouco antes disso, da parte da tarde, o pai discutiu com a mãe na sala de estar. Não falaram alto, mas deu para perceber que algo não estava bem. O Pedro saiu do seu quarto e foi lá ver o que se passava. Eu espreitei pela porta e vi-o a descer as escadas.
Já jantámos sem o pai. Ele veio ao meu quarto, sentou-se na cama e contou-me o que se passa. Disse-me aquelas frases banais, de circunstância, de que vai continuar a ser o meu pai, de que nunca me vai deixar, de que, enfim, separa-se da mãe e só. O meu lugar mantém-se igual. Não sei porquê, mas algo me diz que as coisas não são bem assim e que tudo se vai alterar. Pressinto-o. Nem sei para que lugar ele foi. Levou uma mala com algumas coisas e saiu de vez.
Durante o jantar nem uma palavra se falou sobre a discussão. Jantámos os três em silêncio. O Pedro lá olhava para mim para ver se eu estava bem e pouco mais.
Apetecia-me falar com alguém, explodir, gritar! Sinto-me impotente! Não posso fazer nada para mudar o que já está feito. Resta-me esperar, esperar pelos desenvolvimentos...
Queria desaparecer daqui, fugir, embora não saiba para que lugar. Gostava que o Luís me viesse buscar e me levasse para qualquer lugar. Sei lá, fugíamos ou algo do género. Oh, seria estúpido! A mãe colocaria a polícia à nossa procura e rapidamente nos encontrariam. Ou então podíamos ir para Espanha, França, sei lá, para bem longe daqui. As fronteiras estão abertas. Seria tão fácil...
Sabes, a cabeça pesa-me apesar de não ter sono algum. Sinto as pálpebras pesadas e doridas. A almofada está molhada. Acho que vou dormir com o Simba, bem agarrado a ele. O teu lugar é que é mesmo insubstituível. És o meu fiel confidente e ouvinte. E sempre o serás ( pelo menos até terminarem as tuas páginas ).
Adoro-te,
Beijinhos,
M.