Aproxima-se a data das eleições legislativas. Para muitos tratando-se de mais um acto eleitoral. Deve salientar-se, porém, o carácter prioritário de que estas eleições se revestem. Não é, por assim dizer, uma ida às urnas, ou ao futebol, fazendo subir os índices da abstenção. Votar marca a diferença. Se cada um dos eleitores recenseados votasse conscientemente, atingiríamos um ápice de legitimidade no Parlamento nunca antes visto (exceptuando nas eleições para a Constituinte, em 1975). Não farei, como muitos se propõem, a apologia do voto, ainda menos do útil ou do menos útil. Eu irei votar, sobretudo porque exerço um direito, que a meu ver é também um dever, adquirindo outro em contrapartida: criticar o que me parece errado na condução dos destinos do país. Quem se divorcia da política enquanto cidadão, abdica voluntariamente do direito à revolta, à indignação.
Claro está, respeito os abstencionistas e, de certa forma, compreendo os argumentos que invocam. Demagogias à parte, o sistema partidário desilude e está viciado. Representar a Nação, o ideal, é uma plataforma para outros vôos: uma carreira, prestígio, dinheiro... A miríade de partidos pequenos, segundo as sondagens que nos dão conta das intenções de voto, não atinge, somada, dois por cento. Alguns assumem-se como verdadeiras alternativas, pretendendo dignificar a carreira política, empunhando a bandeira de credibilidade, da seriedade, da honestidade. Tenho dificuldade em acreditar nos propósitos de determinados partidos que surgem como cogumelos por aí. Não tendo intenções de ganhar, seria irrealista pensá-lo, creio que almejam um lugar como digna minoria ruidosa. Eu vejo o Parlamento como um local onde se discute o país, a governabilidade. Não como um espaço de diversão, qual circo. Assim sendo, as cores que se fazem representar, no meu entendimento (como em tudo, "cada cabeça, sua sentença"), são as suficientes. O BE, que apoiei com pouca expressão no início da adolescência, principalmente devido a certas causas que defendiam e com as quais me identificava, não me parece credível; a coligação CDU, sim, com um núcleo histórico composto pelo PCP, que me merece o maior respeito, o PEV, partido simpático, e a ID, quase desconhecida. Pouco tenho a dizer quanto ao PS e à coligação. Não escondo a minha preferência relativa pelo primeiro e a minha repugnância pela segunda, mas não sou político ou filiado, portanto escuso-me a considerações dessa ordem.
Preocupa-me, sim, embora respeite a soberania popular e qualquer resultado que saia do escrutínio do próximo dia 4 de Outubro, que milhões se queixem de políticas que consideram ofensivas dos seus direitos e depois, ao que parece, dêem a preferência à continuidade dos mesmos projectos para o país, à prossecução de uma linha ideológica, que é ideológica (a justificação Troika não me convence, nunca convenceu), que destruiu o tecido social de Portugal. Estes inquéritos a parcelas da população valem o que valem. Alguma base sustentável terão e, antecipando as percentagens, não dissimulo a estupefacção. Parece nitidamente incompreensível. O bom sendo diz-nos para mudar quando algo corre mal, a menos que se acredite, e aí o caso muda de figura, numa recuperação económica tão apregoada e que surge agora, séculos depois de a esperarmos (que o atraso estrutural de Portugal não vem de ontem, nem do mês passado, nem, imagine-se, do tempo de Oliveira Salazar).
Posto isto, seria importante que as pessoas tomassem consciência do quão relevantes serão as próximas eleições, conquanto se pense que nada muda. Nada mudará, decerto, se não prescindirmos de uma tarde reconfortante no sofá, com todo o respeito por quem indiferença sente quanto a estes assuntos.