Portugal continua a ser um país muito pequenino, demasiado pequenino, na mentalidade do seu povo. No concurso Miss Portugal, pela primeira vez ganhou uma mulher transexual, e começaram imediatamente as críticas, algumas inclusive de pessoas com responsabilidade na área da saúde mental e com visibilidade pública.
Eu, quando olho para Marina Machete, vejo uma mulher. As categorias de homem ou mulher são mais do que uma questão de cromossomas sexuais. Têm que ver com a identificação social de cada qual com determinado género, masculino e feminino. Em suma, ser homem ou mulher é mais do que o sexo biológico; prende-se a um sentimento de pertença a determinada realidade, e no caso de Marina Machete e de tantos/as outros/as transexuais, são pessoas que se identificam, se vêem, como homens ou mulheres, independentemente do sexo biológico. No seu caso, pensa como mulher, age como mulher, é uma mulher à primeira vista, quando ignoramos que já teve um órgão sexual masculino. Não podemos resumir as pessoas a um órgão sexual, ignorando tudo o resto: a sua identificação, a forma como se assumem socialmente e como os outros as vêem. Além disso, trata-se ainda de empatia e boa vontade. Se no desporto há vozes que se levantam lembrando que, biologicamente, as mulheres transexuais são fisicamente mais fortes do que as mulheres cisgénero e que por isso é injusto que compitam juntas, poderá Marina Machete também ser culpada por ter sido considerada a mulher mais bonita entre as que se apresentaram no certame; por ser mais bonita do que muitas mulheres cisgénero? Pelo menos foi essa a avaliação do júri.