« La vie m'est insupportable. Pardonnez moi »
Foi com esta mensagem, deixada à cabeceira da cama, que Dalida, aos 54 anos de idade, se despedia da vida, do público e dos poucos íntimos que a acompanharam nos derradeiros meses. A sua carreira somava três décadas. Iolanda, de seu nome verdadeiro, nasceu no Egipto, sendo filha de imigrantes italianos. O pai, segundo o filme biográfico, foi preso e enviado para um campo sob a acusação de uma ligação perniciosa aos nazis. Quando regressou, era outro homem. Tornou-se violento consigo, com o irmão e a mãe. Foi o primeiro dos traumas de Dalida, talvez o que influiria decisivamente até à sua morte.
Dalida passou por uma leva de sucessivas desilusões amorosas. Quis casar e ser mãe, « ser normal como as outras mulheres », quando o seu empresário, e futuro esposo, a via como um produto comercial. Constituir família, numa carreira em ascensão, poderia acarretar uma interrupção prolongada e, consequentemente, afastá-la do público. Com um mês de matrimónio, descobriu o amor nos braços de outro homem. Embarcou numa aventura que pouco durou, pois haveria de descobrir que Iolanda, a mulher, estava com a sua recente paixão assolapada, enquanto que Dalida, a artista, continuava a amar o marido.
Os casos e descasos sucederam-se. Três dos homens com os quais se envolveu, incluindo o desditoso marido, haveriam de se suicidar. Dalida não trouxe a morte para si apenas. A beleza, a timidez e aquele jeito muito informal de ser, espontâneo, cativavam os homens, deixando-os desesperados na sua ausência.
Engravidou de um fã, um estudante de vinte e dois anos. Naquela que teria sido a oportunidade de ser feliz e de, finalmente, se afastar da ribalta com um rapaz que não a queria pela fama, faz um aborto, que mais tarde descobre que a impossibilitou de poder vir a ser mãe. Outra mágoa.
Falece-lhe a mãe. Orlando, o irmão e quem geria a sua carreira nos últimos anos, vê a cantora e a actriz, mas não se apercebe dos sinais de exaustão física e psicológica de Dalida, que na década de 60 já havia tentado o suicídio. Finalmente, desiludida com as tragédias que se lhe abateram e sem esperança no futuro, tira a vida na sua casa de Paris.
O filme é a história de Dalida, a artista extraordinária que marcou uma era na Europa com as suas canções populares românticas dos anos 50 e 60, e também na transição, mostrando a sua irreverência e versatilidade na disco, o que a levaria até aos EUA e a uma bem sucedida temporada no Carnegie Hall. Como a artista não se distingue da cantora, eu creio que houve um bom equilíbrio com a sua vida privada.
A actriz que lhe dá corpo, Sveva Alviti, é uma mulher lindíssima - faz totalmente o meu género. Conseguiu recriar a Dalida sensual, mas frágil, extremamente carente de afectos, que todavia se transfigurava em palco e sacava do público ovações entusiastas. Profissionalíssima, Dalida nunca desapontava.
O realizador procurou evitar tornar o filme num melodrama aborrecido e cliché. E bem. O filme é a Dalida. É a infelicidade. E a Dalida e a infelicidade caminharam juntas.