31 de dezembro de 2023

Vemo-nos em 2024.


   Durante muitos anos fiz um balanço do blogue no dia 31 de Dezembro, com as respectivas hiperligações para os posts que escrevera ao longo dos doze meses anteriores. Dava-me trabalho, e creio que ninguém lhe prestava muita atenção. Também despendia mais tempo neste espaço. O blogue funcionava como uma realidade alternativa à inexistência de uma vida além dos museus e dos cinemas, onde me metia para espairecer. Agora tenho uma vida. Boa ou má, é a minha, a que escolhi, e sinceramente gosto dela. 

   Este ano que agora termina, 2023, não foi um ano mau, embora tenha perdido o meu pai. Mau foi 2022, quando perdi a minha mãe, ainda que tenha viajado muito, tal como viajei em 2023. Estive em Pontevedra, em Lugo, nas Canárias (uma vez mais) e, por fim, há duas semanas, em Londres, na Inglaterra. E por outros lugares mais, sem relevância suficiente para enumerá-los aqui. Para mim, viajar é bom. Adoro viajar, conhecer novos lugares, e há quem não ligue. Eu pensava que toda a gente gostava de viajar, mas não é assim. Também li. Li alguns livros, não tantos como queria, ou como poderia. As redes sociais continuam a ocupar-me demasiado tempo (e, já que falo nisto, uma boa resolução de ano novo seria afastar-me um pouco - não me refiro ao blogue, senão àquilo a que chamo as redes imediatas: X, Facebook etc). Passei bons momentos com o meu marido, o meu cão, a minha gata. Não foi realmente um mau ano. Tenho o meu apartamento, vamos comprar uma casa (sim, com jardim, garagem, isso tudo). A minha vida está encaminhada pela primeira vez, e acho que o mereço. O outro lado da moeda foi bem feio: perdi toda a minha família em menos de ano e meio. 

   Por tudo isto, não me sinto no direito de pedir nada, nem quero. Que continue assim. Resta-me desejar-lhes um fantástico 2024. Por aqui nos veremos, como sempre. Um abraço.

29 de dezembro de 2023

Celga.


   Celga é o nome do exame de galego. Eu apunteime ao Celga para a convocatoria extraordinaria de novembro. Quixen sacar un diploma de galego. Fun ao exame nunha vila non moi lonxe de aquí, Ponferrada, e hoxe sairon os resultados: aprobei. Moitos suspenderon, a maioría, en todos os niveis (xa me dixeron que é o común). O exame de galego parece que é máis difícil que o de castelán. Eu, afortunadamente, fíxeno, e estou feliz por iso. É algo máis que engado ao meu currículo persoal, sobre todo, porque a decisión de facer un exame de galego non tivo nada que ver con opositar para un traballo. Foi unha decisión de carácter persoal. Feito.

28 de dezembro de 2023

Odete Santos (1941-2023).


   É impressão minha ou é comum que morra muita gente conhecida nos dias seguintes ao Natal? Desculpem, foi um pensamento em voz alta. Desta vez, Odete Santos, a histórica militante e deputada do PCP. Independentemente de ideologias políticas, eu admirava Odete Santos pela sua determinação e coragem. Era uma mulher carismática, quiçá a mais carismática das deputadas portuguesas junto a Natália Correia. Enquanto jovem, lutou contra o Estado Novo; defendeu, como advogada, e de forma gratuita, gente necessitada, e já no plano pessoal, em 1988, foi atingida por uma tragédia horrível: a morte do seu filho, Mário, de 16 anos, vítima de acidente de mota. Nada a dobrou. É daquelas pessoas que não deixam ninguém indiferente.

   Odete Santos estava afastada dos holofotes há muito tempo. Há tempos lembrei-me dela, e recordo-me de ter pensado, quase em jeito de vaticínio, “qualquer dia é o seu dia” (isto é mesmo certo). Chegou ontem, aos 82 anos, depois de uma vida repleta de batalhas políticas e desafios.

23 de dezembro de 2023

Feliz Natal!


  Quero desejar-lhes um Feliz Natal, a todos os que me acompanham aqui pelo blogue. Este ano enviei um e-mail a uma pessoa que durante anos esteve muito activa na blogosfera, e com quem me relacionei. Não guardo boas memórias, é certo. Era uma pessoa intriguista, que nem sempre agiu correctamente comigo, todavia, nesta época há que pôr as diferenças de lado e procurar reconciliar-nos com o passado. Pelo menos isso tentei.

   Uma vez mais, umas Santas Festas. Que passem esta quadra tão bonita na companhia dos que lhes são mais queridos. Em jeito comemorativo, deixo-lhes uma foto do meu presépio. Feliz Natal!


A Sagrada Família

15 de dezembro de 2023

Tempo de Natal.


   Gosto muito do Natal. Com todos os infortúnios, cheguei a julgar que perderia o encanto. Tal não sucedeu.
   Este ano, mais uma vez, decorei a casa ao meu gosto. Além da árvore, naturalmente, cada canto tem um detalhinho. Comprei um presépio através do El Corte Inglés. Foi caro, mas é bonito, com todas as figuras, inclusive com umas luzes que simulam fogo. Acresceram aos tradicionais enfeites, aqueles que comprámos em Londres. Deixo-lhes algumas fotos.











14 de dezembro de 2023

Londres.


    O M. tirou as tão desejadas férias, segunda quinzena do ano, porém, muito antes disso já eu começara a conjecturar a nossa próxima viagem, e a escolha recaiu em Londres. Não houve nenhum motivo em particular. Talvez a proximidade ao aeroporto de Vigo. Não me apetecia nada ter de ir até Madrid e, dali, apanhar um avião.

    Adorei Londres. É realmente uma grande metrópole. Os ingleses são atenciosos. Como todas as cidades globais, tem muitíssimo que ver, e dez dias (o tempo que estivemos lá) não é suficiente para se ver tudo. Assim mesmo, chegámos com um plano ambicioso e cumprimo-lo escrupulosamente. Vimos os principais museus (British Museum, Natural History Museum, Tate Modern, National Gallery), depois o Madame Tussauds (um clássico). De monumentos, vimos e entrámos dentro da Abadia de Westminster, do Palácio de Westminster (estivemos nas Câmaras dos Lordes, Comuns etc), Catedral de São Paulo, Torre de Londres, Catedral de Westminster e Tower Bridge. Passeámo-nos pelos bairros típicos de Mayfair, Belgravia, Camden Town, Notting Hill, e ainda demos uma escapadinha até Greenwich, onde estivemos no Real Observatório (sim, o do Meridiano). Não parámos, e ficaram coisas por ver, que não estavam no plano, contudo.


Pouco choveu, e no dia do Palácio de Westminster até tivemos direito a sol


    Não é preciso dizer que recomendo. É imprescindível conhecer Londres. É uma cidade que, pese embora o tamanho, funciona - e aquele metro? Maravilhoso! Chega a todas as partes, e sempre a chegar e a partir.

20 de novembro de 2023

Sara Tavares (1978-2023).


   Sabia que a Sara tivera um cancro cerebral há uns anos. Julgava-o superado, e foi com enorme surpresa e consternação que tive conhecimento da sua morte, tão precoce, com 45 anos. A Sara era aquela menina de voz doce, das primeiras artistas portuguesas saídas de um talent show que conseguiram vingar. Fez da sua carreira o que quis, interpretando temas muito pessoais, sobretudo sonoridades da terra dos seus ancestrais, Cabo Verde. Perde-se uma grande artista, original, e uma referência da cultura musical nacional. Estou muito triste.



19 de novembro de 2023

A actualidade política espanhola.


   Não sei até que ponto o cidadão médio português está a par da actualidade espanhola. Espanha é um caldeirão social, já se sabe. Desde 2017, pelo menos, com a declaração unilateral de independência por parte da Catalunha, que quase todo o discurso político gira em torno dos independentistas e do perigo de sedição. Discute-se agora uma lei da amnistia. Houve eleições há uns meses, o partido mais votado foi o PP, porém, não conseguiu a maioria dos deputados do Congresso para conseguir governar. A investidura de Alberto Feijóo saiu falhada. Há uns dias, o líder do segundo partido mais votado e actual Presidente do Governo logrou a investidura ao conseguir o apoio dos partidos independentistas. Pedro Sánchez quer fazer passar no parlamento espanhol uma lei de amnistia para os envolvidos no 1 de Outubro de 2017, o mesmo que se dizer Puigdemont e demais “conspiracionistas” da DUI (declaração unilateral de independência).

   A já dividida sociedade espanhola ainda o está mais: entre os que apoiam a lei da amnistia e os que acreditam que esta põe em causa a unidade de Espanha, e a mim entristece-me e inclusive indigna-me ver tantos portugueses de responsabilidade, políticos designadamente, a apoiar a tal unidade de Espanha, ignorando que Portugal existe como entidade soberana e independente por contraposição a essa unidade; negando às demais nações peninsulares o direito à liberdade, a liberdade de que Portugal desfruta porque se insurgiu contra a hegemonia espanhola que impede que catalães, bascos e galegos possam escolher entre manter o vínculo a Madrid ou seguir o seu próprio caminho. É hipocrisia, é ignorância, é má vontade e é submissão ao Estado espanhol. 

9 de novembro de 2023

Leaving Neverland.


    Ontem vi uma parte do documentário “Leaving Neverland” sobre os abusos sexuais a crianças por Michael Jackson, e é absolutamente nojento o que aquele homem fez durante anos, justificando-se com uma “infância perdida” e utilizando o seu prestígio universal e incomensurável fortuna para atrair aqueles miúdos. 

   Estou-me borrifando para os fãs de MJ, que montam todo um esquema em sua defesa; só o simples facto de expor aquelas crianças a situações susceptíveis de gerar inquietação e alarme social chegaria para parar o seu próprio comportamento, se fosse bem intencionado, como dizia que era. 

   Desde quando é normal que um homem adulto durma com uma criança com a qual não tem nenhum vínculo familiar? Michael Jackson, independentemente do artista, foi um pedófilo, um predador sexual, que infelizmente não pagou pelo que fez.


8 de novembro de 2023

Francisco, é para ti.


   Honra lhe seja feita. Eu não sou de tributos nem homenagens, porém, neste caso, falo-vos de uma pessoa aqui da blogosfera (Um Deus Caído do Olimpo) que durante anos a fio nos foi avisando dos perigos de ter esta “esquerda” corrupta no poder, primeiro com Sócrates, depois com Costa. Foi criticado, enxovalhado -lembro-me de um velho que andava aqui na blogo, um que tinha um namorado do leste a quem sustentava para não dizer que estava sozinho, um socialista acérrimo-, gozado, e afinal tinha razão. Sim, Francisco, tinhas razão. Tinhas razão em tudo o que disseste; quando nos alertavas para os perigos desta “esquerda” corrupta, designadamente o Partido Socialista, que procura o poder para favorecer os seus membros e dirigentes. Tinhas razão, tal como Manuela Moura Guedes, que também foi perseguida e criticada quando investigava Sócrates, e cuja razão mais tarde se veio a verificar.

    É bastante provável que tenhamos eleições em Janeiro. Por favor, NÃO VOTEM PS. 

7 de novembro de 2023

O fim de uma era.


   Fomos todos (ou nem por isso) apanhados de surpresa com a demissão de António Costa depois de quase 8 anos no poder. Um governo aparentemente estável, com maioria absoluta no parlamento, um presidente da república favorável, com todas as condições de terminar a legislatura. Talvez não termine, e seguramente não com Costa, cujo pedido de demissão foi prontamente aceite por Marcelo. Estão em causa alegados crimes de corrupção e tráfico de influências relacionados com lítio e não-sei-o-quê. O chefe de estado fala ao país na quinta-feira, e tem uma de duas opções: ou dissolve o parlamento e convoca eleições antecipadas, ou, no quadro da actual composição parlamentar, escolhe um outro primeiro-ministro para chegar ao fim da legislatura. Imagino, direi eu, que se decida pela primeira hipótese, devolvendo a voz ao povo.

    Estes casos não dignificam a nação e as suas instituições, e o PS tem sido profícuo em escândalos, primeiro com Sócrates e agora com Costa, já que ambos foram ou serão investigados. Isto abala a credibilidade do país, e parece-me que o PS, dentre todos, é o pior. Estou farto dos socialistas. A verdade é que, com o PS no poder, tudo termina invariavelmente mal. A história tem-no confirmado.


2 de novembro de 2023

Dia de Finados.


   Hoje pus-me a pensar em todas as pessoas que perdi. Foram muitas. Com trinta e sete anos, não tenho mãe, pai, avós (excepto uma avó velha com quem não me relaciono). Em ano e meio perdi toda a minha família, uns para o cancro, outros de morte “súbita”. E sinto-me como aqueles velhotes que já não têm ninguém. Tenho o meu marido, que me ama e cuida de mim. É tudo. Não me resta mais ninguém. Há umas ramificações colaterais que não têm importância, é como se não existissem (refiro-me a tios, primos).

    Não quero que ninguém tenha pena de mim (“olha, coitadinho, não tem família”). Nem tão-pouco o digo para surtir esse efeito. Digo-o como forma de me lamentar, porque, no fundo, é triste. Eu sabia, pelo estilo de vida que levavam, que não teria pais por muitos anos, e admito que sinto inveja quando vejo alguém com a sua mãe. Já não tenho a quem possa chamar mãe. O bom é que não choro. Fiquei impenetrável. Seco. Creio que nada mais me assusta nesta vida, miserável vida, e que me perdoe se peco, quem de direito.

1 de novembro de 2023

Laços de Ternura (1983).


   Há filmes tão bons, com interpretações inesquecíveis, que nos ficam na memória. Posso rever o Laços de Ternura vezes sem conta que não me aborrecerei. Ganhou, em 1984, quase todos os prémios cinematográficos que havia a ganhar. É um drama intenso sobre a relação muito próxima, muito especial, entre uma mãe e uma filha. Depois sobrevem a doença da filha, e o filme ganha um contorno tremendamente dramático. É triste. Deixa-me triste. Nunca fui de chorar com filmes, e também não choro com este. Fala de cancro. Poderia chorar, afinal, a minha mãe morreu de cancro. A minha avó também. Acho que estou impenetrável, como uma pedra dura. Entretanto, identifico a dor alheia, solidarizo-me com ela, até na ficção. É este filme toca nesse ponto, e fá-lo de forma sublime. Tão bom.




26 de outubro de 2023

Marina Machete.


   Portugal continua a ser um país muito pequenino, demasiado pequenino, na mentalidade do seu povo. No concurso Miss Portugal, pela primeira vez ganhou uma mulher transexual, e começaram imediatamente as críticas, algumas inclusive de pessoas com responsabilidade na área da saúde mental e com visibilidade pública.



    Eu, quando olho para Marina Machete, vejo uma mulher. As categorias de homem ou mulher são mais do que uma questão de cromossomas sexuais. Têm que ver com a identificação social de cada qual com determinado género, masculino e feminino. Em suma, ser homem ou mulher é mais do que o sexo biológico; prende-se a um sentimento de pertença a determinada realidade, e no caso de Marina Machete e de tantos/as outros/as transexuais, são pessoas que se identificam, se vêem, como homens ou mulheres, independentemente do sexo biológico. No seu caso, pensa como mulher, age como mulher, é uma mulher à primeira vista, quando ignoramos que já teve um órgão sexual masculino. Não podemos resumir as pessoas a um órgão sexual, ignorando tudo o resto: a sua identificação, a forma como se assumem socialmente e como os outros as vêem. Além disso, trata-se ainda de empatia e boa vontade. Se no desporto há vozes que se levantam lembrando que, biologicamente, as mulheres transexuais são fisicamente mais fortes do que as mulheres cisgénero e que por isso é injusto que compitam juntas, poderá Marina Machete também ser culpada por ter sido considerada a mulher mais bonita entre as que se apresentaram no certame; por ser mais bonita do que muitas mulheres cisgénero? Pelo menos foi essa a avaliação do júri.

24 de outubro de 2023

Professor Doutor Pedro Romano Martinez (1959-2023).


   À semelhança dos Professores Augusto Silva Dias e Eduardo dos Santos Júnior, ambos falecidos precocemente na casa dos sessenta anos, hoje tive conhecimento da morte do Professor Pedro Romano Martinez, meu docente a Direito das Obrigações no ano lectivo 2011/12, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Na recordação fica a imagem de um senhor, educado, refinado, elegante na forma como se apresentava e inclusive na exposição oral da matéria nas aulas. Paz à sua alma. Com os professores que citei acima, é mais uma perda para a ciência do direito, naquela idade em que as pessoas estão na plenitude das suas capacidades intelectuais e maturidade. 





23 de outubro de 2023

Já então a raposa era o caçador.


    Herta Müller ganhou o Prémio Nobel da Literatura em 2009. Na altura, disse-se que Já então a raposa era o caçador era a sua melhor obra. Eu não conheço nada mais da escritora romena. Comprei este livro como compro tantos outros. 

  É uma escrita alegórica aos últimos tempos do regime de Ceausescu, com a pobreza, a perseguição que se traduz num medo gélido, a corrupção -inclusive moral- a uma escala humana, de vivências comuns e quotidianas numa sociedade socialista tipicamente de estilo pró-soviético pelas inúmeras descrições da autora. É uma escrita intrincada, difícil, elaborada e até cansativa, em que a narrativa e os diálogos se confundem muitas vezes, e tudo é dito onde aparentemente, mas só aparentemente, não se diz nada.

16 de outubro de 2023

Voando sobre um ninho de cucos (1975).


   Ele há coisas. Há dias falei-lhes do Barbie, um filme que, pessoalmente, não considero digno de tanto sururu, e hoje venho falar-lhes de um clássico do cinema, Voando sobre um ninho de cucos, de 1975, um filme que ainda não vira, e que vi ontem à noite. Desde logo, é um filme cuja temática me interessa porque aborda os problemas de saúde mental. Em síntese, o personagem de Jack Nicholson ingressa no hospital psiquiátrico, onde se enfrenta a uma enfermeira seca, não diria má, mas de comportamento manipulador com os doentes. E provoca uma revolução que os leva a ser mais conscientes da sua condição de sujeitos que gozam de direitos, e que apesar dos seus problemas, têm vontades próprias, desejos, vontades. O final impressionou-me deveras, não esperava algo tão trágico.

    É um drama com rasgos de comédia que contrabalançam o nervosismo e o distúrbio emocional presente em cada acção e cena. Uma preciosidade sobre a natureza humana frágil e desequilibrada. Considerado um dos melhores filmes de sempre, é-o, efectivamente, quanto a mim.





14 de outubro de 2023

Barbie.


   Vi o filme Barbie. Detestei. Retrata os estereótipos e os papéis de género, numa abordagem fictícia, em que dois mundos paralelos se cruzam: o real, o nosso, levando os seus preconceitos, medos, defeitos para o irreal, onde se cria uma fantasia de empoderamento feminino que se vende às meninas em forma de bonecas que dominam no universo Mattel. Crítica social à parte, custou-me aguentar até ao fim. Mais que aborrecido, é irritante.





9 de outubro de 2023

Conflito israelo-árabe.


    O Hamas lançou o maior ataque de sempre a Israel. Há décadas que o Estado hebreu não era ferido de forma tão dramática, com tomada de reféns e ocupação de partes do seu território. Perguntamo-nos como é possível que os serviços de inteligência israelitas tenham falhado tanto. 

    Eu sou pró-Israel e sionista. Quero que fique assente desde já. Há uma certa esquerda que defende a Palestina, e que omite, por ignorância ou intencionalmente, que aquela terra já pertencia aos judeus muito antes de surgir o Islão. Os judeus foram expulsos durante séculos pelos babilónios, assírios, romanos, e voltaram, progressivamente, à sua terra, ao longo do século XX. A ONU definiu um plano de partilha da Palestina findo o mandato britânico que os árabes não aceitaram. No dia seguinte à declaração de independência de Israel, uma coligação árabe invadiu o recém-criado Estado. A história de Israel desde 1948 até hoje tem sido de defesa da sua integridade territorial e de tentativas, mais ou menos frutuosas, de se legitimar no mundo árabe. Tem aumentado as fronteiras no seguimento das vitórias que logra perante os ataques ao seu território. Não é um inédito de Israel. Geralmente, os vencedores das guerras aumentam o território com as conquistas.

     Uma vez mais, prevê-se uma resposta contundente de Israel, não se sabendo ao certo o que fará respectivamente à Faixa de Gaza, o reduto problemático. A guerra, porém, não começa agora. A guerra tem sido uma constante desde 1948. É talvez o conflito cujo final menos se vislumbra. Reitero, contudo, que são os árabes os responsáveis por todas estas matanças, ao não reconhecerem em absoluto o direito do povo judeu a ter uma terra à qual possa chamar de sua.

21 de setembro de 2023

Seremos sempre uma eterna promessa.


   É com tristeza que acompanho as notícias que me vão chegando de Portugal. Rendas altíssimas, salários baixíssimos, inflação galopante, alimentação caríssima. É impossível viver-se sozinho. Às vezes penso nos jovens que, como eu, já não têm pais. Como farão? Como se aguentarão sozinhos num país que não dá oportunidades? A única solução é emigrar. 

  Portugal é uma eterna desilusão. Sim, é um país pacífico, sim é seguro, sim é bonito, mas de que vale isso tudo se condena os seus à pobreza? Em Portugal já nem se é remediado; é-se pobre. As pessoas andam a contar os tostões nos supermercados, nas lojas, a fazer das tripas coração para chegar ao final do mês. Pessoas com estudos, pessoas que dedicaram grande parte da sua vida a obter um diploma que depois não lhes vale de nada. Absolutamente nada.

   Seremos sempre uma eterna promessa de bem-estar. Um promessa que não se cumpre nem se irá cumprir.

17 de setembro de 2023

Museu do Prado.


    Na quinta-feira (regressámos a casa na sexta-feira), estivemos em Madrid; a segunda vez na capital do Estado para mim e a terceira para o M., que lá estivera anos antes quando foi escolher a especialidade médica.

   Adoro Madrid. Ainda não conheço Barcelona, porém, em Madrid sinto-me livre, tal como me sentia em Lisboa. Nasci e cresci numa cidade. Nas cidades sou quem quero ser, e nestes meios pequenos sou aquilo que posso ser. Como sabem, vivo desde há três anos e meio em meios pequenos, primeiro numa vila com dois mil habitantes e, de momento, e seguramente pelos próximos anos, numa vila com catorze mil habitantes. Não tão claustrofóbica, ainda assim, com gente do rural, com uma mentalidade de rural, que colide com a minha forma de ser e estar.


A porta principal do Museu do Prado, Puerta de Velázquez 


  Falemos de Madrid. Saímos das Canárias em direcção ao aeroporto de Barajas, na quarta à tarde. Passeámos um pouco pela Puerta del Sol, mas quisemos reservar o dia seguinte para visitar o Museu do Prado, já que no início de 2022 pudemos conhecer as principais atracções da cidade, como o Retiro e a Gran Vía, designadamente. Os museus, todavia, não nos foi possível ver na altura, por uma questão de gestão de tempo.

  Bilhetes comprados com antecedência, online, (ainda nas Canárias), estivemos no Prado desde as 10h até às 19h30, exactamente meia hora antes do encerramento. É, seguramente, uma das melhores pinacotecas do mundo, junto ao Louvre, ao Metropolitan, ao Hermitage, etc, etc. Para lhes ser sincero, o Prado exige dois dias para ver tudo em condições: um dia para cada planta. São duas, enormes, pejadas de salas, e uma terceira, mais pequena, que se vê em relativamente pouco tempo. Estivemos 9 horas para ver tudo… Contem com centenas de turistas, incluindo hordas de japoneses…

      Não lhes poderei passar fotos do espólio do museu uma vez que estão proibidas. Uma parvoíce do seu director. No Louvre, cada um fotografa o que quer. Enfim, deixo-lhes uma foto do exterior. 

     As pinturas de Goya, El Greco, Velázquez, El Bosco, Rubens, e por aí fora, são deslumbrantes. Ir ao Museu do Prado é obrigatório para todos quantos gostem de arte. E também podem contar com uma excelente livraria na planta baixa, onde poderão adquirir vários livros de arte (o que fizemos).

15 de setembro de 2023

Canárias.


     Uma vez mais, decidimo-nos pelas Canárias para estas férias de Verão. O mau tempo abateu-se sobre a península justamente no dia em que fomos, e apesar de não ter chegado ao arquipélago (a depressão DANA), a sua aproximação fez-me temer que nos arruinasse os dias de praia. Não aconteceu. Tivemos dias excelentes, às vezes um pouco nublados, mas sobretudo de muito calor, e geralmente bastante soalheiros.


Eu adoro praia. 


    Ficámos na mesma ilha pela terceira vez. Prefiro jogar pelo seguro e repetir o que já conheço, entretanto, encerro por uns anos a Gran Canaria. Três vezes seguidas é quanto baste. Alojámo-nos em Maspalomas, uma das maiores estâncias gays da Europa, mas o curioso é que não o sabíamos da primeira vez que lá estivemos, em 2021. Foi pura casualidade.


A lindíssima praia de Anfi del Mar.


      O ambiente é fantástico. Há noite há sempre festas, muitos gays, bares de cruising… Nem no Príncipe Real (Lisboa) vi tal coisa. A noite gay espanhola não tem nada que ver com a portuguesa. Estão muito à frente. Até têm um centro comercial totalmente LGBT (Yumbo Centrum).


Muito à frente.


     As praias, já sabemos: água morna. As Canárias são Norte de África. 

      Adorei, como em 2022 e 2021, porém, como disse acima, para o ano que vem irei mudar de ilha (Tenerife ou, mais provavelmente, Fuerteventura, onde dizem estar as melhores praias de todas as ilhas).

9 de setembro de 2023

Por Quem os Sinos Dobram.


   Embora esteja de férias -neste exacto momento, escrevo-lhes desde o meu iPad, na piscina do hotel-, antes de que a memória comece desvanecer-se com as novas leituras, venho falar-lhes de Por Quem os Sinos Dobram, uma das obras imortais de Ernest Hemingway.

    Queria poder dizer que adorei o livro, e não é assim. São 500 páginas de uma guerra de guerrilha na Guerra Civil Espanhola, onde acompanhamos o dia-a-dia duma facção republicana que combate nas montanhas. É um retrato cru da guerra, e das relações que se estabelecem (que se podem estabelecer…) num ambiente tão pouco propício. Dos planos que se fazem e não se cumprem, das desconfianças, da obstinação num propósito, da determinação. 

     Hemingway esteve em Espanha aquando do conflito, e daí terá vindo a inspiração para esta obra que é, antes de mais, a guerra tal como ela é, sem lugar a romantizações, não obstante, sem cair no vulgarismo das piores descrições. 

       E, afinal, as ciganas terão razão no que vêem quando nos lêem as mãos?

4 de agosto de 2023

As Jornadas Mundiais da Juventude, uma vez mais.


   Tenho acompanhado estas Jornadas Mundiais da Juventude (nunca antes acompanhara outras) através da plataforma digital da RTP. Não o faço de modo permanente, nem como crente; mais bem como curioso. Gosto de saber tudo, de estar informado, de estar, como se diz vulgarmente, por dentro.

    Independentemente dos custos associados, que qualquer pessoa razoável condena e critica, do que tenho visto têm sido eventos bonitos, cheios de simbolismo, de comunhão e partilha, espiritualidade e alguma transcendência. Hoje mesmo assisti à Via Sacra no Parque Eduardo VII, e foi bonito ver aquelas 800.000 pessoas a comungar dum mesmo propósito com um homem de 86 anos, que sob um sol tórrido também fez a sua Via Sacra diante de milhares em êxtase. 

    Francisco é um reformista. E é isto que os jovens católicos lhe exigem. Os tempos são outros. O Papa disse que a Igreja deve ser de todos. Parou. E voltou a repetir: de todos. Estava subjacente a referência à comunidade LGBT+, que tem necessariamente de incluir. Ouvimos e vemos vários padres e mesmo fiéis e apercebemo-nos -porque nós, homossexuais, sabemos identificar-nos uns aos outros- que a Igreja, enquanto instituição, tem imensos gays. Estamos dentro da Igreja. A Igreja está implantada em países nos quais a comunidade LGBT+ já goza de todos os direitos, e não vale a pena continuar a resistir à marcha do progresso. Este Papa tem feito o possível. Há a ala dura da Igreja e há, naturalmente, católicos que insistem na retórica da exclusão. A meu ver, entretanto, já nada poderá travar o processo de aceitação que Francisco iniciou e que o mundo, pelo menos o católico, espera da Igreja.

30 de julho de 2023

Jornadas Mundiais da Juventude.


   A polémica está instalada, e eu associo-me. Desde os gastos milionários aos transportes públicos, a Câmara Municipal de Lisboa preocupa-se mais com um evento extraordinário do que com a qualidade de vida dos lisboetas. Palcos de custos astronómicos, transportes públicos gratuitos para os peregrinos, ao passo que viver em Lisboa é cada vez mais uma tarefa impossível, incomportável para a carteira do português médio. Não tem que ver com nenhum sentimento anti-religioso; tem que ver com a hipocrisia: para um evento religioso, sim, tudo; para os lisboetas, para as pessoas que vivem na cidade, nada, ou pouco.





   Por parte da Igreja, não esperaria mais. Sabemos como tudo funciona no seio daquela instituição. Luxo e ostentação, sapatos da Prada para o Papa, muito ouro, dinheiro, interesses. Ascetismo e sobriedade apenas na teoria, e sempre desde que se aplique ao fiel. Os números da Igreja, porém, não se resumem apenas às cifras. Há outros, de que todos se parecem esquecer.


29 de julho de 2023

As eleições espanholas.


  No domingo passado, aqui em Espanha realizaram-se as elecciones generales, que em Portugal equivalem às eleições legislativas. Sei, porque assino o jornal Público e vou lendo vários outros jornais portugueses online, que o acto eleitoral foi acompanhado exaustivamente no nosso país. É habitual; os portugueses interessam-se por política internacional, e sendo Espanha um país vizinho e amigo, mais ainda.

    Eu participei eleitoralmente. Adquiri a cidadania espanhola em 2021. Estas foram as primeiras legislativas após a minha vinda para o país, e coincidiu que já tivesse adquirido a nacionalidade. Votei nos nacionalistas galegos, o BNG, um partido com pouca expressão a nível nacional, e inclusive na Galiza. Manteve o deputado que elegera anteriormente.

    Os resultados contrariaram todas as expectativas e sondagens. O PP de Alberto Feijóo não conseguiu a maioria absoluta, e nem com o apoio do VOX, de extrema-direita, consegue os 176 deputados necessários para consegui-la. Esperava-se um desastre para o PSOE de Sánchez, após 4 anos de dura governação (com uma pandemia e a guerra da Ucrânia), todavia, os socialistas não se saíram mal. É verdade que não necessitam apenas do Sumar (a quarta força política que saiu do escrutínio popular), estando também nas mãos dos nacionalistas catalães, incluindo do Junts, o partido de Puigdemont, que pode vir aqui a desempenhar um papel decisivo.

   Adivinha-se um impasse. A governabilidade do país vê-se custosa à esquerda e à direita. As alianças são difíceis e pouco prováveis, dum lado e do outro, e já são muitos os que vaticinam novas eleições para o final do ano…

2 de julho de 2023

Dia Mundial das Bibliotecas (01/07).


  Adoro comprar livros. Antes de viver aqui (em Portugal ainda), tinha-os meio espalhados por todas as partes. Quando finalmente arrendámos um apartamento, decidi montar uma biblioteca/escritório. E agora que o comprámos, a biblioteca/escritório é definitivamente uma realidade (excepto se o arrendamos um dia e nos mudamos, o que de momento não equacionamos).

   Continuo com livros pela sala (no móvel), na estante do corredor, mas agora há o escritório, com um sofá e um candeeiro, um espaço que quis de leitura, embora nunca lá tenha lido. E são vários os títulos. Não me dei ao trabalho de os contar, se bem que são centenas (quando a minha mãe faleceu, fui a Portugal buscar os livros que deixara lá).

  Tendo a privilegiar os clássicos da literatura universal e os ensaios. Também os livros históricos. Meti na cabeça a ideia que iria comprar todos os grandes clássicos da literatura, e já só me falta um por outro. Outra coisa é que dedique tanto tempo a lê-los como a comprá-los, porque… já não há espaço.

23 de junho de 2023

Mais uma morte.


   Perdi o meu pai. Depois da minha mãe, da minha avó, o meu pai foi encontrado morto esta tarde, em casa. Em menos de dois anos, perdi todas as minhas referências, os meus progenitores, as pessoas que cuidaram de mim durante anos. Quando é que a morte decide abandonar-me de vez ou, pelo contrário, levar-me com ela, independentemente de onde vá parar? Já não aguento mais.

12 de junho de 2023

A liberdade de expressão em Espanha.


   Ainda pensei em se escreveria este post em castelhano, no entanto, decidi-me pelo português, afinal, o público-alvo deste texto é o português. E porquê falar de liberdade de expressão em Espanha? Terá algo assim de tão especial? Sim, respondo, tendo em conta que não se parece em nada àquela de que desfrutamos em Portugal. Urge voltar atrás.

  Portugal, em 1974, teve uma revolução, que expurgou da sociedade os traços do antigo regime. Espanha, em 1975, com a morte de Franco, iniciou um processo a que se viria a chamar de transição. Esta transição, contudo, foi lenta. Começou com Juan Carlos (designado herdeiro e chefe de estado após a sua morte, por Franco) a jurar respeitar as leis franquistas. Gradualmente, o monarca foi-se afastando desse modelo e preparou o país para a democracia. Em todo o caso, ela não se consolidou como em Portugal. Há restos, sobras, resquícios do franquismo nas instituições e, inclusive, nas atitudes e comportamentos das pessoas. Aqui, não se respira tanta liberdade como em Portugal. Refiro-me particularmente às liberdades de expressão e opinião (há organizações internacionais que perfilham exactamente do mesmo entendimento, colocando Espanha muito por baixo de Portugal na sua lista de países livres).

   Desde que vivo no Estado espanhol, tenho passado, a nível pessoal, por episódios de censura e intimidação, o último dos quais nas páginas públicas, de redes sociais, do concelho onde resido. Perante um comentário inócuo, levemente irónico, respeitoso, num tom normal em democracia, fui bloqueado, e não somente na plataforma onde me manifestei como nas demais. Proscrito, isso mesmo. Foi um exemplo. Tem-me sucedido um pouco de tudo, até mesmo com vizinhos.

   Espanha não é um bom país para se viver, remato. O pouco mais que se ganha, em termos salariais, não justifica o retrocesso e recuo na nossa liberdade, ao fazermos uma mudança a partir de Portugal. Como costumo dizer, é um país com todos os problemas que Portugal tem e outros que não tem. Aparentemente belo, quando passamos a viver aqui, vamo-nos dando conta de que tudo assenta numa fina camada de verniz, que estala sem a menor dificuldade, revelando-se uma sujidade antiga, difícil de sair.


5 de junho de 2023

Pontevedra.


    Neste fim-de-semana, aproveitando dois dias livres que teve (são tão raros), surgiu-lhe, ao M., a ideia de fazermos uma escapadinha até Pontevedra, uma vez que se tratava da única cidade galega, de entre as mais importantes, que me faltava conhecer. E assim foi. Sem grandes planos, munimo-nos das mochilas e fizemos os tais duzentos e picos quilómetros até à costa galega (vivemos exactamente no ponto oposto, já perto de Castela e Leão).


A Praza da Pedreira


   Pontevedra é uma cidade bonita, sobretudo no centro histórico, todo em pedra. Com Lugo, é a cidade galega que mais se considera como bela, e de facto não lhe faltam atributos. À diferença de Lugo, tem mais vida. O casco histórico estava cheio de gente de todas as idades (o que é comum em Espanha), tomando algo e confraternizando.


A Praza da Ferraría com o Santuário da Virgem Peregrina ao fundo


   No primeiro dia, sábado, privilegiámos percorrer a cidade. Faz-se bastante bem. É pequena. Visitámos as praças e os monumentos mais emblemáticos. No domingo, então, antes de voltarmos, fomos ao museu municipal, dotado que está de um espólio rico e diversificado (inclusive de Castelao, um dos principais vultos das letras galegas e, inclusive, do nacionalismo galego). Haveremos de voltar, seguramente.


Uma das inúmeras galerias do Museu de Pontevedra



3 de junho de 2023

A Peste.


   Terminei ontem A Peste, de Albert Camus, considerado a sua obra-prima. É uma narrativa que nos dá conta de um assomo de peste bubónica numa cidade da então Argélia francesa. Determina-se o isolamento da cidade, e somos convidados, através de um narrador que se identifica a si próprio como tal, a percorrer o dia-a-dia daquelas gentes confinadas: as suas angústias, obsessões, identificações. Uma realidade que, agora, depois da pandemia de COVID-19, não nos é tão difícil de conceber. 

    Camus faz-nos olhar para o interior do ser humano, com as suas angústias e defeitos, como se aquela cidade fosse um microcosmos do individualismo da sociedade moderna, afinal, cada habitante zelava por si e por quem deixara, não obstante houvesse uma aflição comum que perpassava todos quantos viviam ali. O homem reduzido à sua condição miserável, sem saber o que o amanhã lhe traria: a absolvição, na paz, ou a morte.

31 de maio de 2023

A Praia 19.


   Estive a falar com um amigo português que andou aqui nos blogues durante muitos anos (o Horatius, do Aqui no Campo), e calhou em conversa o tema das praias e do nudismo. Nunca fiz nudismo; ele sim. E acabei por comentar-lhe que estive duas vezes, salvo erro, na famosa Praia 19, ou simplesmente a 19. Fui com um amigo de há muitos anos (que não é aqui dos blogues), um dos meus melhores amigos -um rapaz excelente, diga-se, com um coração d'ouro-, e que tem queda para o cruising. Ele gosta, como tantos e tantos na comunidade gay, e eu, felizmente, deixei-me de moralismos. As coisas são como são. O cruising foi importante para muitos homossexuais durante os anos da repressão, aqui e em todos os países. Eram os únicos locais de encontro, onde, além das práticas sexuais, se podia conhecer alguém igual, semelhante nos gostos e preferências. Até um amigo. Não era apenas uma imoralidade, um “vício contra a natureza”, um atentando ao pudor público. Era muito mais que isso: era um tubo de escape para o ostracismo, a perseguição social e legal, o isolamento. 


Foto na 19, e já tenho saudades do Verão! (Setembro 2019)


    Sim, estive na Praia 19. Sim, fui pelos arbustos e pelas dunas com o meu amigo. Não, não fiz nada com ninguém. Ninguém me perturbou. As pessoas estão nas suas vidas. Querendo, fazem; não querendo, não fazem. Mas vi. Vi práticas sexuais, algumas, e não me choca dizê-lo, ao contrário do que me chocou na altura ao vê-lo. Na inversa, é bom conhecer tudo o que há no mundo -isso é cultura-, e não viver numa bolha, indiferente ao que se passa. Assim, depois de conhecer, posso dizer com propriedade que não é o tipo de praia que goste de frequentar, não me sentindo à vontade, porém, lá está, há que conhecer para se saber, e há que conhecer antes de se criticar.

28 de maio de 2023

Elecciones municipales 2023.


   Hoy, aquí en España, se celebran las elecciones municipales, es decir, vamos a votar por nuestros representantes en los municipios. Sin embargo, en otras comunidades autónomas, hay también quienes votan por sus autonomías. Eso no pasa aquí en este momento. Es un momento único para mí. Son mis primeras elecciones en Galicia y en el Estado español desde que vivo aquí. Es siempre un momento especial. Recuerdo mis primeras elecciones en Portugal. Fueron las europeas de 2004, había cumplido 18 años hace sólo un par de meses.

  Como sabéis, ahora vivo en una pequeña ciudad de 14.000 habitantes. Aquí en España, el consumo de droga está mucho más normalizado, padronizado, que en Portugal, y eso atrae también a la delincuencia, a la marginalidad, así que voté por la derecha. Necesito sentirme más seguro. Os doy un ejemplo: en mi portal, tuve, durante meses, drogadictos fumando porros, hasta que todos los propietarios decidimos cerrarlo con un otro portal de seguridad. Vivía mucho más tranquilo en el otro pueblo, pequeñito, de 2.000 personas. A veces no sabemos lo que tenemos hasta que los perdemos. Pasa frecuentemente. Fue por eso que voté por la derecha, que generalmente se preocupa más con la seguridad de los ciudadanos. A la diferencia de la derecha, la izquierda aboga por la liberalización de las drogas. A mí me da igual que la gente fume droga, mientras no me molesten, que era lo que pasaba. 

    España es el país de la OCDE con la mayor tasa de paro, de desempleo. Hay mucha gente (treintañeros, incluso) que no hace nada todo el día, así que se dedica a consumir droga y a cometer delitos. Además, donde vivo, hay muchos inmigrantes de Latinoamérica y del Magrebe (norteafricanos).

    Es muy probable que gane el cacique local, del PSOE (sería como el PS portugués), que sigue gobernando desde el 1999. Yo cumplí con mi parte.

26 de maio de 2023

O limite do humor é a piada.


   Não sei se alguma vez se deram conta, mas o humor mudou em Portugal. Mudou nos últimos vinte anos. Mais ou menos na altura daquele programa extremamente popular na televisão, onde os comediantes subiam a um palco e contavam piadas e anedotas, era muito comum fazer-se piadas com as pessoas LGBT. Na altura, as vítimas eram sempre os mesmos: Cláudio Ramos, Carlos Castro, José Castelo Branco. Tinha piada -para eles, naturalmente- satirizar em torno da feminilidade das pessoas. Sem nos darmos conta, estávamos a propagar a homofobia. Para mim, um miúdo então com dezasseis, dezassete anos, não era fácil chegar a casa, ligar a televisão e até num programa dum humorista de que eu gostava, o Herman, ter de ouvir piadas sobre homens apenas por serem mais femininos. Isto após um dia inteiro de ofensas, humilhações e achincalhamentos na escola, e inclusive onde vivia, por conta daquilo que eles julgavam saber, a minha sexualidade.

   Hoje em dia, já não é politicamente correcto fazer-se piadas com a sexualidade, ou a feminilidade (no caso, de homens). E não o é não apenas porque despertámos, em termos de consciência social, para a necessidade de respeitar, senão também porque simplesmente perdeu a piada. Já não tem graça. E esse é o verdadeiro limite do humor.

24 de maio de 2023

Priscila, A Rainha do Deserto (1994).


   É um clássico LGBT, um filme de culto. Efectivamente, quando (re)vemos -e eu vi-o pela segunda vez, que a primeira fora há muitos anos-, percebemos que foi um filme avançadíssimo para a época (1994 parece estar já ali, mas foi há quase 30 anos). Há pouca caricatura, o que era comum naqueles tempos, e uma vontade honesta de mostrar três amigos nas suas desventuras. Há duas cenas que creio que são memoráveis: a dança drag no meio do deserto, com e sem os aborígenes, e, perto do final, quando um dos personagens principais fala com o filho, e falam sobre a sua vida íntima, o facto de poder vir a ter um namorado. A naturalidade com que a criança encara o facto de ter um pai gay ainda nos surpreende. O que se dirá de 1994!




20 de maio de 2023

Caso Galamba.


   Vocês estão a entender alguma coisa daquilo? Eu não. Como sempre, políticos a fazer política: versões contraditórias, mentiras, suspeitas. O que interessa às pessoas é saber quanto dinheiro terão de continuar a injectar na TAP, mais do que saber se houve ou não roubo de computador, quem agrediu e foi agredido. Se o governo cai ou não, já parece mais relevante. Marcelo preferia não ter de dissolver a Assembleia da República. Bem distinto é se a realidade o poderá levar a não ter outra opção, e tudo parece encaminhar-se nesse sentido. São casos e casinhos, o PSD esfrega as mãos e fala-se, inclusive, duma possível carreira europeia para Costa. Não seria o primeiro a abandonar o barco.

16 de maio de 2023

Bem Bom (Doce).


   Com algum atraso, é certo (estreou em 2021), ontem vi o filme sobre as Doce, Bem Bom, que recebeu o nome de uma das suas canções mais conhecidas, justamente a que, em 1982, foi à Eurovisão - e ter visto o filme agora foi pura casualidade. Tentei, como se diz, fazer o download há uns meses, sem êxito, e descobri há dias que estava disponível no YouTube.

   As Doce são dos meus conjuntos portugueses favoritos. Em 2003, contava eu dezassete primaveras, comprei uma antologia que saíra por aquela altura, onde constavam os seus eternos sucessos e versões remasterizadas dos mesmos. Naturalmente que o ouvi vezes sem conta. Eu sou daquelas pessoas que não tem preconceitos musicais. Ouço de tudo, desde que goste. Vou da música ligeira portuguesa, conhecida de forma pejorativa como pimba, até à música clássica. Eclético, é como dizem. 




    As Doce não tinham nada de pimba, mas tão-pouco conseguiram escapar a esse rótulo maldito que persegue tantos artistas portugueses. Pelo contrário, as suas canções eram de excelente qualidade. Aquelas quatro raparigas, a par do talento musical (três delas tinham formação na área), ousaram, provocaram, num país saído há escassos cinco anos de uma ditadura moralista e cinzenta. Abriram caminho, de certa forma, para outras artistas que lhes seguiram os passos.

     O filme gerou polémica entre as ex-integrantes do grupo ao não expressar a história verdadeira do quarteto. No início, somos imediatamente avisados de que se trata de uma recriação livre da realizadora que mistura elementos de ficção com factos reais. Eu gostei. Destaca-se entre os filmes portugueses, que geralmente são lentos, de planos estáticos, com músicas e interpretações enfadonhas, e este vem no seguimento de uma melhoria da qualidade do cinema português. Contanto que se diga, como Fátima Padinha disse, que não é a história das Doce, é quanto baste. O filme está bem feito. Se calhar, se retratasse fielmente a história das Doce, seria uma chatice.

14 de maio de 2023

Eurovisão 2023 (A Final).


  A Eurovisão é um clube de compadrios e vizinhanças que se votam entre si. Só isso explica o mau desempenho de canções boníssimas como as de Portugal e Espanha. A fórmula é conhecida: aqueles espectáculos visuais, com músicas plásticas, de consumo fácil, que foi exactamente o que apresentou a Suécia. Portugal ganhou em 2017 com uma canção fora do esquema habitual, de qualidade, e este ano também o fez. Que não o saibam apreciar, é outro assunto. A RTP continua a defender as nossas tradições musicais e, acima de tudo, a nossa língua. 

  Eu senti-me bem representado pela Mimicat e pela sua canção, cheia de alegria e originalidade. Haverá quem reconheça o nosso mérito em levar boa música. O mesmo se aplicará, pelo menos este ano, a Espanha, que de igual modo apresentou uma canção de inspiração flamenga, com uma letra bastante bonita. Não há vitórias morais, é certo, mas tão-pouco há motivo para nos culparmos seja do que for. Cumprimos, e bem, o nosso papel.

10 de maio de 2023

Eurovisão 2023.


   Ontem vi a primeira semi-final da Eurovisão. Este certame nunca me suscitou grande curiosidade, porém, nos últimos anos, talvez devido à vitória de Sobral -não descarto a hipótese-, passei a acompanhá-lo com mais atenção. Não o faço pelas músicas ou pelo estilo, que me dizem pouco, senão sobretudo pela competição de países - mais ou menos o que me leva a acompanhar os campeonatos europeus e mundiais de futebol profissional. 

   Este ano, há a vantagem de ter adorado a canção que Portugal levou (já a conhecia; há semanas que a tenho na minha playlist da Apple Music): a Ai Coração, da Mimicat, que é giríssima, e que passou à grande final, no sábado. Tinha de passar. Não só é uma canção animada como tem características que, a meu ver, a levariam à final, designadamente partes altas que demonstram o alcance vocal da intérprete e um ritmo apelativo, catchy, que fica no ouvido e nos faz querer dançar. É uma música eurovisiva sem entrar no esquema tradicional das canções que são apresentadas por lá. As concorrentes também eram mais para o fraco. Das quinze que estiveram na disputa pelos primeiros dez lugares da final, “gostei”, relativamente, de uma por outra.

   Outra das canções que me prende a atenção, até por ser a do país onde resido, é a espanhola, de Blanca Paloma. Uma canção que aqui se chama de nana, com influências evidentes do flamengo. 

    No sábado, portanto, a torcer por Portugal e Espanha. Pelo meio, há a segunda semi-final, já na quinta à noite.

3 de maio de 2023

XV Aniversário.


  Jamais imaginei que este blogue atingisse quinze anos de longevidade. Contra ventos e marés. Contra pessoas que gostam de mim e do que escrevo, e outros que não gostam (e no seu direito estão). Contra tragédias pessoais, que me levaram a abrandar o ritmo e, talvez, até pensar em abandonar o projecto. Vai-se mantendo pelo meu gosto pela escrita e, sobretudo, pela necessidade que tenho de exprimir o que sinto e penso através da palavra, escrita ou oral. Eu sou um comunicador. 

   Quinze anos é tempo. São muitas palavras, reflexões, vivências. Acho que ir escrevendo aqui já faz parte de uma rotina que criei inconscientemente. E o blogue reflecte o que sou e a tendência que tenho de me manter naquilo que construo, sem inovar demasiado, sem alterar. Talvez seja antiquado. Eu prefiro pensar que sou avesso à mudança e que tenho carinho ao que crio, já que crio tão pouco. Sou apegado às minhas coisas, que considero extensões de mim, e o blogue é uma coisa minha.

     Resta-me agradecer-vos, uma vez mais, a companhia. Vemo-nos por aqui.


27 de abril de 2023

1984.


  Mais uma falha, quiçá. O 1984 é um daqueles clássicos que devemos ler logo assim, à primeira, quando nos iniciamos nas leituras sérias do período pós-adolescência, no entanto, no meu caso, provavelmente pelas convulsões de dito período e pelo assédio das redes sociais mais tarde, acabou por não acontecer.

   Orwell cria uma sociedade distópica e totalitária que, julgamos, já não faz muito sentido com o fim da União Soviética. Mas faz. A Rússia continua um autoritarismo, temos a China, e temos tantas outras sociedades espalhadas pelo mundo onde se desrespeitam os direitos humanos mais elementares. Na Oceânia de Winston, o indivíduo não existe como tal. Ou é força de trabalho (prole), ou trabalha na máquina do estado. Ainda assim, o que me perturbou mais de todo aquele terror não foram, curiosamente, as torturas e assassinatos políticos, senão a eliminação da História e de todos os factos embaraçosos para o Partido. Eliminava-se e já está. Não se limitavam a, suponhamos, eliminar uma pessoa; eliminavam tudo o que lhe dissesse respeito, toda a memória histórica, e era como se nunca tivesse pisado a Terra. Manipulavam todos os factos históricos, destruíam os que não serviam os propósitos do Partido. Foram além disso, criando uma língua tão primitiva que, no limite (e aí sim vi a sátira de Orwell), os levaria, àquelas gentes do superestado, a emitir simples grunhidos. Eliminando-se palavras, eliminava-se o que elas significavam; reduzia-se o pensar ao máximo. A própria ideia de transgressão deixava de fazer sentido, ao se perderem os instrumentos que nos podem levar a maquinar, engendrar, a transgressão. Entrava-se, como nunca se fez, no último recôndito intransponível do indivíduo: a sua consciência do seu estado e entorno.

   Só não direi que ler esta obra-prima teria quase que ser obrigatório porque não - devemos ter a liberdade de escolher o que queremos e não queremos fazer.

16 de abril de 2023

Direito à Habitação vs. Direito à Propriedade.


   Não irei tornar esta experiência numa coisa chata de se ler, nem irei recorrer ao Direito (que já deixei há imenso tempo, e os livros só não ganham pó porque os limpo). 

  Tenho acompanhado toda a polémica que as novas medidas do governo português quanto à habitação têm suscitado. Aqui em Espanha, há muito tempo que o problema da falta de habitação digna, que se agrava ao (continuar a) ser o país da OCDE com a maior taxa de desemprego, se coloca, levando até ao fenómeno da ocupação de casas abandonadas e inclusive segundas casas de pessoas que podem ter uma segunda casa: chamam-se ocupas, e em Portugal começa a haver uma tendência nesse sentido (que a bem ver até me estranhava que não houvesse ainda). Tivemos, sim, nos tempos conturbados do PREC, ocupação de casas e apartamentos, porém, tudo se deu num momento histórico mui particular, ao passo que aqui, em Espanha, é um problema social e político grave com o qual toda a sociedade se debate: a princípio, ocupavam-se as casas abandonadas dos grandes grupos financeiros (o mesmo que se dizer bancos), e não raras vezes há pessoas que chegam às suas casas e as têm ocupadas, e não se pense que é fácil tirá-las de lá, como o bom senso crê. Não é. O imbróglio jurídico pode durar anos.

   Quiçá tenha sido tendo a situação do país vizinho em conta, e para não permitir que ganhe em Portugal a dimensão que tem aqui, que o governo português adoptou as medidas mais recentes quanto à política habitacional. Eu estou confortável para falar do assunto porque não sou um grande proprietário: mais do que “obrigar” a que os proprietários arrendem, o Estado deve cumprir aquilo que a Constituição determina, e para o qual o incumbe, e construir fogos para que os cidadãos mais carenciados possam aceder a uma habitação digna a rendas razoáveis: há programas desses, porém, continua a não haver casas suficientes. É um problema do Estado, e não do cidadão que, à custa do seu esforço, ou por herança, seja como for, tem o seu património imobiliário, que é seu, e cujo direito tem de ser respeitado.

27 de março de 2023

Pete Burns (1959-2016).


  Há já algum tempo que vos queria falar de um artista britânico falecido anos atrás, o Pete Burns, vocalista dos Dead or Alive. Burns surgiu no panorama musical inglês no final dos anos 70, fundando algumas bandas, até que se estabeleceu como vocalista dos Dead or Alive. O grupo obteve grande sucesso no seu país-natal e resto do continente europeu, e relativo nos EUA, na era do synth pop, com influências notórias do punk. O maior êxito do conjunto foi o clássico das pistas de dança You Spin Me Round (Like a Record), cujo vídeo me influenciou decisivamente. Embora já o fizesse antes, Burns foi o responsável, em larga medida, por ter recuperado o uso do eyeliner quando saio. Não o faço todos os dias; faço-o quando me sinto mais sensual, quando me apetece.



   Nessa altura, começaram a surgir rumores de uma rivalidade com Boy George, que também ganhava popularidade à frente dos Culture Club. George arrojava com o seu visual fortemente marcado pelas cores, o uso de maquilhagem chamativa e vibrante e roupas andróginas. Tudo o que Burns fizera anteriormente, e segundo consta chegou a acusar George de o imitar.

   Os anos 80 passaram, a influência de ambos também, e começaram a ser mais comentados pelos seus excessos pessoais. Centremo-nos em Burns. Plástica após plástica, a carreira foi ficando para trás. O dinheiro ganho nos anos de sucesso foi gastado a retocar aqui, corrigir erros dali. Burns ficou irreconhecível após tantas idas ao cirurgião. Fala-se em centenas de operações estéticas que o deixaram arruinado (em meados da década passada, admitiu-se na bancarrota). Para conseguir dinheiro, entrou em formatos televisivos como reality shows e vendeu a sua história a documentários de canais de televisão. Faleceu em 2016, de insuficiência cardíaca decorrente, muito provavelmente, das intervenções cirúrgicas que lhe arruinaram os órgãos vitais.


   

  Especulou-se imenso sobre a sexualidade de Burns, que nos anos 80 mostrava toda a sua excentricidade. No vídeo de You Spin Me Round, e noutros, há vários elementos associados ao feminino, nos gestos, poses, atitudes, e tudo isso reportou-me à minha própria exuberância quando era mais pequeno e, em adolescente, me maquilhava e usava sandálias de plataforma, bem assim como o uso de cores mais quentes, num Portugal de início do século XIX ainda bastante imerso no cinzentismo social, que se reflectia na moda e nos costumes. À minha maneira, fui precursor, pagando o devido preço, claro, quando os iguais se juntam para nos julgar.


19 de março de 2023

A Baleia.


   Julguei que estaria perante um título pejorativo. Equivoquei-me. Depois verão de que baleia se trata, e do simbolismo que essa baleia adquire na narrativa. Este filme emocionou-me, quiçá pela minha fragilidade -sou frágil, fui frágil-, que se agudizou na actual conjuntura, e embora não seja de chorar com filmes, saí de tal forma comovido da sala de cinema que não consegui segurar as lágrimas, que me inundaram o rosto, caindo sem parar, como numa crise compulsiva.

   A Baleia é uma estória da fragilidade da condição humana, do amor, da redenção. Também da aparente maldade, que poderá não o ser; da fronteira entre a honestidade, a transparência e a maldade. Uma estória de gente desafortunada, por um ou outro motivo. Muito emotivo. Não há enredos complicados (como no desastre Everyting Everywhere All at Once), nem deles precisa, porque nós somos mais comuns do que julgamos. Num simples apartamento, conectam-se traumas e desgraças pessoais, que afinal são as nossas - podem ser as nossas.

   A Baleia entra no meu contido catálogo de filmes preferidos de sempre, e mereceu-me a pontuação 9 no IMDB.






12 de março de 2023

The Fabelmans.


   Um filme que tem muito de biográfico. As interpretações são de excelência, sobretudo de Michelle Williams. Spielberg seguramente saberá destrinçar entre o que há da sua experiência e o que resulta da inegável capacidade criativa a que nos acostumou, transportando-nos aos anos 60 com maestria; a uma família de classe média tão normal nos hábitos, nos “pecados”, nos anseios, nos desejos, incidindo no crescimento de um miúdo entre as câmaras de filmar e um terrível segredo capaz de abalar o núcleo aparentemente tão comum e inabalável, e afinal é-o, comum, porque inabalável, nem tanto. Não há estórias completamente felizes.




10 de março de 2023

Um ano.


   Um ano. Um ano de dor, de adaptação a uma nova realidade. Quando perdemos alguém que esteve sempre presente nas nossas vidas, há que aprender a viver com esse vazio, com essa falta. Cresce-se com o sofrimento. Vejo-o em mim. 

    Se fosse eu que tivesse feito isto, provavelmente faria com que as pessoas crescessem sem ter de sofrer, mas, como não sou, sujeito-me às leis universais.