21 de setembro de 2023

Seremos sempre uma eterna promessa.


   É com tristeza que acompanho as notícias que me vão chegando de Portugal. Rendas altíssimas, salários baixíssimos, inflação galopante, alimentação caríssima. É impossível viver-se sozinho. Às vezes penso nos jovens que, como eu, já não têm pais. Como farão? Como se aguentarão sozinhos num país que não dá oportunidades? A única solução é emigrar. 

  Portugal é uma eterna desilusão. Sim, é um país pacífico, sim é seguro, sim é bonito, mas de que vale isso tudo se condena os seus à pobreza? Em Portugal já nem se é remediado; é-se pobre. As pessoas andam a contar os tostões nos supermercados, nas lojas, a fazer das tripas coração para chegar ao final do mês. Pessoas com estudos, pessoas que dedicaram grande parte da sua vida a obter um diploma que depois não lhes vale de nada. Absolutamente nada.

   Seremos sempre uma eterna promessa de bem-estar. Um promessa que não se cumpre nem se irá cumprir.

17 de setembro de 2023

Museu do Prado.


    Na quinta-feira (regressámos a casa na sexta-feira), estivemos em Madrid; a segunda vez na capital do Estado para mim e a terceira para o M., que lá estivera anos antes quando foi escolher a especialidade médica.

   Adoro Madrid. Ainda não conheço Barcelona, porém, em Madrid sinto-me livre, tal como me sentia em Lisboa. Nasci e cresci numa cidade. Nas cidades sou quem quero ser, e nestes meios pequenos sou aquilo que posso ser. Como sabem, vivo desde há três anos e meio em meios pequenos, primeiro numa vila com dois mil habitantes e, de momento, e seguramente pelos próximos anos, numa vila com catorze mil habitantes. Não tão claustrofóbica, ainda assim, com gente do rural, com uma mentalidade de rural, que colide com a minha forma de ser e estar.


A porta principal do Museu do Prado, Puerta de Velázquez 


  Falemos de Madrid. Saímos das Canárias em direcção ao aeroporto de Barajas, na quarta à tarde. Passeámos um pouco pela Puerta del Sol, mas quisemos reservar o dia seguinte para visitar o Museu do Prado, já que no início de 2022 pudemos conhecer as principais atracções da cidade, como o Retiro e a Gran Vía, designadamente. Os museus, todavia, não nos foi possível ver na altura, por uma questão de gestão de tempo.

  Bilhetes comprados com antecedência, online, (ainda nas Canárias), estivemos no Prado desde as 10h até às 19h30, exactamente meia hora antes do encerramento. É, seguramente, uma das melhores pinacotecas do mundo, junto ao Louvre, ao Metropolitan, ao Hermitage, etc, etc. Para lhes ser sincero, o Prado exige dois dias para ver tudo em condições: um dia para cada planta. São duas, enormes, pejadas de salas, e uma terceira, mais pequena, que se vê em relativamente pouco tempo. Estivemos 9 horas para ver tudo… Contem com centenas de turistas, incluindo hordas de japoneses…

      Não lhes poderei passar fotos do espólio do museu uma vez que estão proibidas. Uma parvoíce do seu director. No Louvre, cada um fotografa o que quer. Enfim, deixo-lhes uma foto do exterior. 

     As pinturas de Goya, El Greco, Velázquez, El Bosco, Rubens, e por aí fora, são deslumbrantes. Ir ao Museu do Prado é obrigatório para todos quantos gostem de arte. E também podem contar com uma excelente livraria na planta baixa, onde poderão adquirir vários livros de arte (o que fizemos).

15 de setembro de 2023

Canárias.


     Uma vez mais, decidimo-nos pelas Canárias para estas férias de Verão. O mau tempo abateu-se sobre a península justamente no dia em que fomos, e apesar de não ter chegado ao arquipélago (a depressão DANA), a sua aproximação fez-me temer que nos arruinasse os dias de praia. Não aconteceu. Tivemos dias excelentes, às vezes um pouco nublados, mas sobretudo de muito calor, e geralmente bastante soalheiros.


Eu adoro praia. 


    Ficámos na mesma ilha pela terceira vez. Prefiro jogar pelo seguro e repetir o que já conheço, entretanto, encerro por uns anos a Gran Canaria. Três vezes seguidas é quanto baste. Alojámo-nos em Maspalomas, uma das maiores estâncias gays da Europa, mas o curioso é que não o sabíamos da primeira vez que lá estivemos, em 2021. Foi pura casualidade.


A lindíssima praia de Anfi del Mar.


      O ambiente é fantástico. Há noite há sempre festas, muitos gays, bares de cruising… Nem no Príncipe Real (Lisboa) vi tal coisa. A noite gay espanhola não tem nada que ver com a portuguesa. Estão muito à frente. Até têm um centro comercial totalmente LGBT (Yumbo Centrum).


Muito à frente.


     As praias, já sabemos: água morna. As Canárias são Norte de África. 

      Adorei, como em 2022 e 2021, porém, como disse acima, para o ano que vem irei mudar de ilha (Tenerife ou, mais provavelmente, Fuerteventura, onde dizem estar as melhores praias de todas as ilhas).

9 de setembro de 2023

Por Quem os Sinos Dobram.


   Embora esteja de férias -neste exacto momento, escrevo-lhes desde o meu iPad, na piscina do hotel-, antes de que a memória comece desvanecer-se com as novas leituras, venho falar-lhes de Por Quem os Sinos Dobram, uma das obras imortais de Ernest Hemingway.

    Queria poder dizer que adorei o livro, e não é assim. São 500 páginas de uma guerra de guerrilha na Guerra Civil Espanhola, onde acompanhamos o dia-a-dia duma facção republicana que combate nas montanhas. É um retrato cru da guerra, e das relações que se estabelecem (que se podem estabelecer…) num ambiente tão pouco propício. Dos planos que se fazem e não se cumprem, das desconfianças, da obstinação num propósito, da determinação. 

     Hemingway esteve em Espanha aquando do conflito, e daí terá vindo a inspiração para esta obra que é, antes de mais, a guerra tal como ela é, sem lugar a romantizações, não obstante, sem cair no vulgarismo das piores descrições. 

       E, afinal, as ciganas terão razão no que vêem quando nos lêem as mãos?

4 de agosto de 2023

As Jornadas Mundiais da Juventude, uma vez mais.


   Tenho acompanhado estas Jornadas Mundiais da Juventude (nunca antes acompanhara outras) através da plataforma digital da RTP. Não o faço de modo permanente, nem como crente; mais bem como curioso. Gosto de saber tudo, de estar informado, de estar, como se diz vulgarmente, por dentro.

    Independentemente dos custos associados, que qualquer pessoa razoável condena e critica, do que tenho visto têm sido eventos bonitos, cheios de simbolismo, de comunhão e partilha, espiritualidade e alguma transcendência. Hoje mesmo assisti à Via Sacra no Parque Eduardo VII, e foi bonito ver aquelas 800.000 pessoas a comungar dum mesmo propósito com um homem de 86 anos, que sob um sol tórrido também fez a sua Via Sacra diante de milhares em êxtase. 

    Francisco é um reformista. E é isto que os jovens católicos lhe exigem. Os tempos são outros. O Papa disse que a Igreja deve ser de todos. Parou. E voltou a repetir: de todos. Estava subjacente a referência à comunidade LGBT+, que tem necessariamente de incluir. Ouvimos e vemos vários padres e mesmo fiéis e apercebemo-nos -porque nós, homossexuais, sabemos identificar-nos uns aos outros- que a Igreja, enquanto instituição, tem imensos gays. Estamos dentro da Igreja. A Igreja está implantada em países nos quais a comunidade LGBT+ já goza de todos os direitos, e não vale a pena continuar a resistir à marcha do progresso. Este Papa tem feito o possível. Há a ala dura da Igreja e há, naturalmente, católicos que insistem na retórica da exclusão. A meu ver, entretanto, já nada poderá travar o processo de aceitação que Francisco iniciou e que o mundo, pelo menos o católico, espera da Igreja.

30 de julho de 2023

Jornadas Mundiais da Juventude.


   A polémica está instalada, e eu associo-me. Desde os gastos milionários aos transportes públicos, a Câmara Municipal de Lisboa preocupa-se mais com um evento extraordinário do que com a qualidade de vida dos lisboetas. Palcos de custos astronómicos, transportes públicos gratuitos para os peregrinos, ao passo que viver em Lisboa é cada vez mais uma tarefa impossível, incomportável para a carteira do português médio. Não tem que ver com nenhum sentimento anti-religioso; tem que ver com a hipocrisia: para um evento religioso, sim, tudo; para os lisboetas, para as pessoas que vivem na cidade, nada, ou pouco.





   Por parte da Igreja, não esperaria mais. Sabemos como tudo funciona no seio daquela instituição. Luxo e ostentação, sapatos da Prada para o Papa, muito ouro, dinheiro, interesses. Ascetismo e sobriedade apenas na teoria, e sempre desde que se aplique ao fiel. Os números da Igreja, porém, não se resumem apenas às cifras. Há outros, de que todos se parecem esquecer.


29 de julho de 2023

As eleições espanholas.


  No domingo passado, aqui em Espanha realizaram-se as elecciones generales, que em Portugal equivalem às eleições legislativas. Sei, porque assino o jornal Público e vou lendo vários outros jornais portugueses online, que o acto eleitoral foi acompanhado exaustivamente no nosso país. É habitual; os portugueses interessam-se por política internacional, e sendo Espanha um país vizinho e amigo, mais ainda.

    Eu participei eleitoralmente. Adquiri a cidadania espanhola em 2021. Estas foram as primeiras legislativas após a minha vinda para o país, e coincidiu que já tivesse adquirido a nacionalidade. Votei nos nacionalistas galegos, o BNG, um partido com pouca expressão a nível nacional, e inclusive na Galiza. Manteve o deputado que elegera anteriormente.

    Os resultados contrariaram todas as expectativas e sondagens. O PP de Alberto Feijóo não conseguiu a maioria absoluta, e nem com o apoio do VOX, de extrema-direita, consegue os 176 deputados necessários para consegui-la. Esperava-se um desastre para o PSOE de Sánchez, após 4 anos de dura governação (com uma pandemia e a guerra da Ucrânia), todavia, os socialistas não se saíram mal. É verdade que não necessitam apenas do Sumar (a quarta força política que saiu do escrutínio popular), estando também nas mãos dos nacionalistas catalães, incluindo do Junts, o partido de Puigdemont, que pode vir aqui a desempenhar um papel decisivo.

   Adivinha-se um impasse. A governabilidade do país vê-se custosa à esquerda e à direita. As alianças são difíceis e pouco prováveis, dum lado e do outro, e já são muitos os que vaticinam novas eleições para o final do ano…

2 de julho de 2023

Dia Mundial das Bibliotecas (01/07).


  Adoro comprar livros. Antes de viver aqui (em Portugal ainda), tinha-os meio espalhados por todas as partes. Quando finalmente arrendámos um apartamento, decidi montar uma biblioteca/escritório. E agora que o comprámos, a biblioteca/escritório é definitivamente uma realidade (excepto se o arrendamos um dia e nos mudamos, o que de momento não equacionamos).

   Continuo com livros pela sala (no móvel), na estante do corredor, mas agora há o escritório, com um sofá e um candeeiro, um espaço que quis de leitura, embora nunca lá tenha lido. E são vários os títulos. Não me dei ao trabalho de os contar, se bem que são centenas (quando a minha mãe faleceu, fui a Portugal buscar os livros que deixara lá).

  Tendo a privilegiar os clássicos da literatura universal e os ensaios. Também os livros históricos. Meti na cabeça a ideia que iria comprar todos os grandes clássicos da literatura, e já só me falta um por outro. Outra coisa é que dedique tanto tempo a lê-los como a comprá-los, porque… já não há espaço.

23 de junho de 2023

Mais uma morte.


   Perdi o meu pai. Depois da minha mãe, da minha avó, o meu pai foi encontrado morto esta tarde, em casa. Em menos de dois anos, perdi todas as minhas referências, os meus progenitores, as pessoas que cuidaram de mim durante anos. Quando é que a morte decide abandonar-me de vez ou, pelo contrário, levar-me com ela, independentemente de onde vá parar? Já não aguento mais.

12 de junho de 2023

A liberdade de expressão em Espanha.


   Ainda pensei em se escreveria este post em castelhano, no entanto, decidi-me pelo português, afinal, o público-alvo deste texto é o português. E porquê falar de liberdade de expressão em Espanha? Terá algo assim de tão especial? Sim, respondo, tendo em conta que não se parece em nada àquela de que desfrutamos em Portugal. Urge voltar atrás.

  Portugal, em 1974, teve uma revolução, que expurgou da sociedade os traços do antigo regime. Espanha, em 1975, com a morte de Franco, iniciou um processo a que se viria a chamar de transição. Esta transição, contudo, foi lenta. Começou com Juan Carlos (designado herdeiro e chefe de estado após a sua morte, por Franco) a jurar respeitar as leis franquistas. Gradualmente, o monarca foi-se afastando desse modelo e preparou o país para a democracia. Em todo o caso, ela não se consolidou como em Portugal. Há restos, sobras, resquícios do franquismo nas instituições e, inclusive, nas atitudes e comportamentos das pessoas. Aqui, não se respira tanta liberdade como em Portugal. Refiro-me particularmente às liberdades de expressão e opinião (há organizações internacionais que perfilham exactamente do mesmo entendimento, colocando Espanha muito por baixo de Portugal na sua lista de países livres).

   Desde que vivo no Estado espanhol, tenho passado, a nível pessoal, por episódios de censura e intimidação, o último dos quais nas páginas públicas, de redes sociais, do concelho onde resido. Perante um comentário inócuo, levemente irónico, respeitoso, num tom normal em democracia, fui bloqueado, e não somente na plataforma onde me manifestei como nas demais. Proscrito, isso mesmo. Foi um exemplo. Tem-me sucedido um pouco de tudo, até mesmo com vizinhos.

   Espanha não é um bom país para se viver, remato. O pouco mais que se ganha, em termos salariais, não justifica o retrocesso e recuo na nossa liberdade, ao fazermos uma mudança a partir de Portugal. Como costumo dizer, é um país com todos os problemas que Portugal tem e outros que não tem. Aparentemente belo, quando passamos a viver aqui, vamo-nos dando conta de que tudo assenta numa fina camada de verniz, que estala sem a menor dificuldade, revelando-se uma sujidade antiga, difícil de sair.


5 de junho de 2023

Pontevedra.


    Neste fim-de-semana, aproveitando dois dias livres que teve (são tão raros), surgiu-lhe, ao M., a ideia de fazermos uma escapadinha até Pontevedra, uma vez que se tratava da única cidade galega, de entre as mais importantes, que me faltava conhecer. E assim foi. Sem grandes planos, munimo-nos das mochilas e fizemos os tais duzentos e picos quilómetros até à costa galega (vivemos exactamente no ponto oposto, já perto de Castela e Leão).


A Praza da Pedreira


   Pontevedra é uma cidade bonita, sobretudo no centro histórico, todo em pedra. Com Lugo, é a cidade galega que mais se considera como bela, e de facto não lhe faltam atributos. À diferença de Lugo, tem mais vida. O casco histórico estava cheio de gente de todas as idades (o que é comum em Espanha), tomando algo e confraternizando.


A Praza da Ferraría com o Santuário da Virgem Peregrina ao fundo


   No primeiro dia, sábado, privilegiámos percorrer a cidade. Faz-se bastante bem. É pequena. Visitámos as praças e os monumentos mais emblemáticos. No domingo, então, antes de voltarmos, fomos ao museu municipal, dotado que está de um espólio rico e diversificado (inclusive de Castelao, um dos principais vultos das letras galegas e, inclusive, do nacionalismo galego). Haveremos de voltar, seguramente.


Uma das inúmeras galerias do Museu de Pontevedra



3 de junho de 2023

A Peste.


   Terminei ontem A Peste, de Albert Camus, considerado a sua obra-prima. É uma narrativa que nos dá conta de um assomo de peste bubónica numa cidade da então Argélia francesa. Determina-se o isolamento da cidade, e somos convidados, através de um narrador que se identifica a si próprio como tal, a percorrer o dia-a-dia daquelas gentes confinadas: as suas angústias, obsessões, identificações. Uma realidade que, agora, depois da pandemia de COVID-19, não nos é tão difícil de conceber. 

    Camus faz-nos olhar para o interior do ser humano, com as suas angústias e defeitos, como se aquela cidade fosse um microcosmos do individualismo da sociedade moderna, afinal, cada habitante zelava por si e por quem deixara, não obstante houvesse uma aflição comum que perpassava todos quantos viviam ali. O homem reduzido à sua condição miserável, sem saber o que o amanhã lhe traria: a absolvição, na paz, ou a morte.

31 de maio de 2023

A Praia 19.


   Estive a falar com um amigo português que andou aqui nos blogues durante muitos anos (o Horatius, do Aqui no Campo), e calhou em conversa o tema das praias e do nudismo. Nunca fiz nudismo; ele sim. E acabei por comentar-lhe que estive duas vezes, salvo erro, na famosa Praia 19, ou simplesmente a 19. Fui com um amigo de há muitos anos (que não é aqui dos blogues), um dos meus melhores amigos -um rapaz excelente, diga-se, com um coração d'ouro-, e que tem queda para o cruising. Ele gosta, como tantos e tantos na comunidade gay, e eu, felizmente, deixei-me de moralismos. As coisas são como são. O cruising foi importante para muitos homossexuais durante os anos da repressão, aqui e em todos os países. Eram os únicos locais de encontro, onde, além das práticas sexuais, se podia conhecer alguém igual, semelhante nos gostos e preferências. Até um amigo. Não era apenas uma imoralidade, um “vício contra a natureza”, um atentando ao pudor público. Era muito mais que isso: era um tubo de escape para o ostracismo, a perseguição social e legal, o isolamento. 


Foto na 19, e já tenho saudades do Verão! (Setembro 2019)


    Sim, estive na Praia 19. Sim, fui pelos arbustos e pelas dunas com o meu amigo. Não, não fiz nada com ninguém. Ninguém me perturbou. As pessoas estão nas suas vidas. Querendo, fazem; não querendo, não fazem. Mas vi. Vi práticas sexuais, algumas, e não me choca dizê-lo, ao contrário do que me chocou na altura ao vê-lo. Na inversa, é bom conhecer tudo o que há no mundo -isso é cultura-, e não viver numa bolha, indiferente ao que se passa. Assim, depois de conhecer, posso dizer com propriedade que não é o tipo de praia que goste de frequentar, não me sentindo à vontade, porém, lá está, há que conhecer para se saber, e há que conhecer antes de se criticar.

28 de maio de 2023

Elecciones municipales 2023.


   Hoy, aquí en España, se celebran las elecciones municipales, es decir, vamos a votar por nuestros representantes en los municipios. Sin embargo, en otras comunidades autónomas, hay también quienes votan por sus autonomías. Eso no pasa aquí en este momento. Es un momento único para mí. Son mis primeras elecciones en Galicia y en el Estado español desde que vivo aquí. Es siempre un momento especial. Recuerdo mis primeras elecciones en Portugal. Fueron las europeas de 2004, había cumplido 18 años hace sólo un par de meses.

  Como sabéis, ahora vivo en una pequeña ciudad de 14.000 habitantes. Aquí en España, el consumo de droga está mucho más normalizado, padronizado, que en Portugal, y eso atrae también a la delincuencia, a la marginalidad, así que voté por la derecha. Necesito sentirme más seguro. Os doy un ejemplo: en mi portal, tuve, durante meses, drogadictos fumando porros, hasta que todos los propietarios decidimos cerrarlo con un otro portal de seguridad. Vivía mucho más tranquilo en el otro pueblo, pequeñito, de 2.000 personas. A veces no sabemos lo que tenemos hasta que los perdemos. Pasa frecuentemente. Fue por eso que voté por la derecha, que generalmente se preocupa más con la seguridad de los ciudadanos. A la diferencia de la derecha, la izquierda aboga por la liberalización de las drogas. A mí me da igual que la gente fume droga, mientras no me molesten, que era lo que pasaba. 

    España es el país de la OCDE con la mayor tasa de paro, de desempleo. Hay mucha gente (treintañeros, incluso) que no hace nada todo el día, así que se dedica a consumir droga y a cometer delitos. Además, donde vivo, hay muchos inmigrantes de Latinoamérica y del Magrebe (norteafricanos).

    Es muy probable que gane el cacique local, del PSOE (sería como el PS portugués), que sigue gobernando desde el 1999. Yo cumplí con mi parte.

26 de maio de 2023

O limite do humor é a piada.


   Não sei se alguma vez se deram conta, mas o humor mudou em Portugal. Mudou nos últimos vinte anos. Mais ou menos na altura daquele programa extremamente popular na televisão, onde os comediantes subiam a um palco e contavam piadas e anedotas, era muito comum fazer-se piadas com as pessoas LGBT. Na altura, as vítimas eram sempre os mesmos: Cláudio Ramos, Carlos Castro, José Castelo Branco. Tinha piada -para eles, naturalmente- satirizar em torno da feminilidade das pessoas. Sem nos darmos conta, estávamos a propagar a homofobia. Para mim, um miúdo então com dezasseis, dezassete anos, não era fácil chegar a casa, ligar a televisão e até num programa dum humorista de que eu gostava, o Herman, ter de ouvir piadas sobre homens apenas por serem mais femininos. Isto após um dia inteiro de ofensas, humilhações e achincalhamentos na escola, e inclusive onde vivia, por conta daquilo que eles julgavam saber, a minha sexualidade.

   Hoje em dia, já não é politicamente correcto fazer-se piadas com a sexualidade, ou a feminilidade (no caso, de homens). E não o é não apenas porque despertámos, em termos de consciência social, para a necessidade de respeitar, senão também porque simplesmente perdeu a piada. Já não tem graça. E esse é o verdadeiro limite do humor.

24 de maio de 2023

Priscila, A Rainha do Deserto (1994).


   É um clássico LGBT, um filme de culto. Efectivamente, quando (re)vemos -e eu vi-o pela segunda vez, que a primeira fora há muitos anos-, percebemos que foi um filme avançadíssimo para a época (1994 parece estar já ali, mas foi há quase 30 anos). Há pouca caricatura, o que era comum naqueles tempos, e uma vontade honesta de mostrar três amigos nas suas desventuras. Há duas cenas que creio que são memoráveis: a dança drag no meio do deserto, com e sem os aborígenes, e, perto do final, quando um dos personagens principais fala com o filho, e falam sobre a sua vida íntima, o facto de poder vir a ter um namorado. A naturalidade com que a criança encara o facto de ter um pai gay ainda nos surpreende. O que se dirá de 1994!




20 de maio de 2023

Caso Galamba.


   Vocês estão a entender alguma coisa daquilo? Eu não. Como sempre, políticos a fazer política: versões contraditórias, mentiras, suspeitas. O que interessa às pessoas é saber quanto dinheiro terão de continuar a injectar na TAP, mais do que saber se houve ou não roubo de computador, quem agrediu e foi agredido. Se o governo cai ou não, já parece mais relevante. Marcelo preferia não ter de dissolver a Assembleia da República. Bem distinto é se a realidade o poderá levar a não ter outra opção, e tudo parece encaminhar-se nesse sentido. São casos e casinhos, o PSD esfrega as mãos e fala-se, inclusive, duma possível carreira europeia para Costa. Não seria o primeiro a abandonar o barco.

16 de maio de 2023

Bem Bom (Doce).


   Com algum atraso, é certo (estreou em 2021), ontem vi o filme sobre as Doce, Bem Bom, que recebeu o nome de uma das suas canções mais conhecidas, justamente a que, em 1982, foi à Eurovisão - e ter visto o filme agora foi pura casualidade. Tentei, como se diz, fazer o download há uns meses, sem êxito, e descobri há dias que estava disponível no YouTube.

   As Doce são dos meus conjuntos portugueses favoritos. Em 2003, contava eu dezassete primaveras, comprei uma antologia que saíra por aquela altura, onde constavam os seus eternos sucessos e versões remasterizadas dos mesmos. Naturalmente que o ouvi vezes sem conta. Eu sou daquelas pessoas que não tem preconceitos musicais. Ouço de tudo, desde que goste. Vou da música ligeira portuguesa, conhecida de forma pejorativa como pimba, até à música clássica. Eclético, é como dizem. 




    As Doce não tinham nada de pimba, mas tão-pouco conseguiram escapar a esse rótulo maldito que persegue tantos artistas portugueses. Pelo contrário, as suas canções eram de excelente qualidade. Aquelas quatro raparigas, a par do talento musical (três delas tinham formação na área), ousaram, provocaram, num país saído há escassos cinco anos de uma ditadura moralista e cinzenta. Abriram caminho, de certa forma, para outras artistas que lhes seguiram os passos.

     O filme gerou polémica entre as ex-integrantes do grupo ao não expressar a história verdadeira do quarteto. No início, somos imediatamente avisados de que se trata de uma recriação livre da realizadora que mistura elementos de ficção com factos reais. Eu gostei. Destaca-se entre os filmes portugueses, que geralmente são lentos, de planos estáticos, com músicas e interpretações enfadonhas, e este vem no seguimento de uma melhoria da qualidade do cinema português. Contanto que se diga, como Fátima Padinha disse, que não é a história das Doce, é quanto baste. O filme está bem feito. Se calhar, se retratasse fielmente a história das Doce, seria uma chatice.

14 de maio de 2023

Eurovisão 2023 (A Final).


  A Eurovisão é um clube de compadrios e vizinhanças que se votam entre si. Só isso explica o mau desempenho de canções boníssimas como as de Portugal e Espanha. A fórmula é conhecida: aqueles espectáculos visuais, com músicas plásticas, de consumo fácil, que foi exactamente o que apresentou a Suécia. Portugal ganhou em 2017 com uma canção fora do esquema habitual, de qualidade, e este ano também o fez. Que não o saibam apreciar, é outro assunto. A RTP continua a defender as nossas tradições musicais e, acima de tudo, a nossa língua. 

  Eu senti-me bem representado pela Mimicat e pela sua canção, cheia de alegria e originalidade. Haverá quem reconheça o nosso mérito em levar boa música. O mesmo se aplicará, pelo menos este ano, a Espanha, que de igual modo apresentou uma canção de inspiração flamenga, com uma letra bastante bonita. Não há vitórias morais, é certo, mas tão-pouco há motivo para nos culparmos seja do que for. Cumprimos, e bem, o nosso papel.

10 de maio de 2023

Eurovisão 2023.


   Ontem vi a primeira semi-final da Eurovisão. Este certame nunca me suscitou grande curiosidade, porém, nos últimos anos, talvez devido à vitória de Sobral -não descarto a hipótese-, passei a acompanhá-lo com mais atenção. Não o faço pelas músicas ou pelo estilo, que me dizem pouco, senão sobretudo pela competição de países - mais ou menos o que me leva a acompanhar os campeonatos europeus e mundiais de futebol profissional. 

   Este ano, há a vantagem de ter adorado a canção que Portugal levou (já a conhecia; há semanas que a tenho na minha playlist da Apple Music): a Ai Coração, da Mimicat, que é giríssima, e que passou à grande final, no sábado. Tinha de passar. Não só é uma canção animada como tem características que, a meu ver, a levariam à final, designadamente partes altas que demonstram o alcance vocal da intérprete e um ritmo apelativo, catchy, que fica no ouvido e nos faz querer dançar. É uma música eurovisiva sem entrar no esquema tradicional das canções que são apresentadas por lá. As concorrentes também eram mais para o fraco. Das quinze que estiveram na disputa pelos primeiros dez lugares da final, “gostei”, relativamente, de uma por outra.

   Outra das canções que me prende a atenção, até por ser a do país onde resido, é a espanhola, de Blanca Paloma. Uma canção que aqui se chama de nana, com influências evidentes do flamengo. 

    No sábado, portanto, a torcer por Portugal e Espanha. Pelo meio, há a segunda semi-final, já na quinta à noite.

3 de maio de 2023

XV Aniversário.


  Jamais imaginei que este blogue atingisse quinze anos de longevidade. Contra ventos e marés. Contra pessoas que gostam de mim e do que escrevo, e outros que não gostam (e no seu direito estão). Contra tragédias pessoais, que me levaram a abrandar o ritmo e, talvez, até pensar em abandonar o projecto. Vai-se mantendo pelo meu gosto pela escrita e, sobretudo, pela necessidade que tenho de exprimir o que sinto e penso através da palavra, escrita ou oral. Eu sou um comunicador. 

   Quinze anos é tempo. São muitas palavras, reflexões, vivências. Acho que ir escrevendo aqui já faz parte de uma rotina que criei inconscientemente. E o blogue reflecte o que sou e a tendência que tenho de me manter naquilo que construo, sem inovar demasiado, sem alterar. Talvez seja antiquado. Eu prefiro pensar que sou avesso à mudança e que tenho carinho ao que crio, já que crio tão pouco. Sou apegado às minhas coisas, que considero extensões de mim, e o blogue é uma coisa minha.

     Resta-me agradecer-vos, uma vez mais, a companhia. Vemo-nos por aqui.


27 de abril de 2023

1984.


  Mais uma falha, quiçá. O 1984 é um daqueles clássicos que devemos ler logo assim, à primeira, quando nos iniciamos nas leituras sérias do período pós-adolescência, no entanto, no meu caso, provavelmente pelas convulsões de dito período e pelo assédio das redes sociais mais tarde, acabou por não acontecer.

   Orwell cria uma sociedade distópica e totalitária que, julgamos, já não faz muito sentido com o fim da União Soviética. Mas faz. A Rússia continua um autoritarismo, temos a China, e temos tantas outras sociedades espalhadas pelo mundo onde se desrespeitam os direitos humanos mais elementares. Na Oceânia de Winston, o indivíduo não existe como tal. Ou é força de trabalho (prole), ou trabalha na máquina do estado. Ainda assim, o que me perturbou mais de todo aquele terror não foram, curiosamente, as torturas e assassinatos políticos, senão a eliminação da História e de todos os factos embaraçosos para o Partido. Eliminava-se e já está. Não se limitavam a, suponhamos, eliminar uma pessoa; eliminavam tudo o que lhe dissesse respeito, toda a memória histórica, e era como se nunca tivesse pisado a Terra. Manipulavam todos os factos históricos, destruíam os que não serviam os propósitos do Partido. Foram além disso, criando uma língua tão primitiva que, no limite (e aí sim vi a sátira de Orwell), os levaria, àquelas gentes do superestado, a emitir simples grunhidos. Eliminando-se palavras, eliminava-se o que elas significavam; reduzia-se o pensar ao máximo. A própria ideia de transgressão deixava de fazer sentido, ao se perderem os instrumentos que nos podem levar a maquinar, engendrar, a transgressão. Entrava-se, como nunca se fez, no último recôndito intransponível do indivíduo: a sua consciência do seu estado e entorno.

   Só não direi que ler esta obra-prima teria quase que ser obrigatório porque não - devemos ter a liberdade de escolher o que queremos e não queremos fazer.

16 de abril de 2023

Direito à Habitação vs. Direito à Propriedade.


   Não irei tornar esta experiência numa coisa chata de se ler, nem irei recorrer ao Direito (que já deixei há imenso tempo, e os livros só não ganham pó porque os limpo). 

  Tenho acompanhado toda a polémica que as novas medidas do governo português quanto à habitação têm suscitado. Aqui em Espanha, há muito tempo que o problema da falta de habitação digna, que se agrava ao (continuar a) ser o país da OCDE com a maior taxa de desemprego, se coloca, levando até ao fenómeno da ocupação de casas abandonadas e inclusive segundas casas de pessoas que podem ter uma segunda casa: chamam-se ocupas, e em Portugal começa a haver uma tendência nesse sentido (que a bem ver até me estranhava que não houvesse ainda). Tivemos, sim, nos tempos conturbados do PREC, ocupação de casas e apartamentos, porém, tudo se deu num momento histórico mui particular, ao passo que aqui, em Espanha, é um problema social e político grave com o qual toda a sociedade se debate: a princípio, ocupavam-se as casas abandonadas dos grandes grupos financeiros (o mesmo que se dizer bancos), e não raras vezes há pessoas que chegam às suas casas e as têm ocupadas, e não se pense que é fácil tirá-las de lá, como o bom senso crê. Não é. O imbróglio jurídico pode durar anos.

   Quiçá tenha sido tendo a situação do país vizinho em conta, e para não permitir que ganhe em Portugal a dimensão que tem aqui, que o governo português adoptou as medidas mais recentes quanto à política habitacional. Eu estou confortável para falar do assunto porque não sou um grande proprietário: mais do que “obrigar” a que os proprietários arrendem, o Estado deve cumprir aquilo que a Constituição determina, e para o qual o incumbe, e construir fogos para que os cidadãos mais carenciados possam aceder a uma habitação digna a rendas razoáveis: há programas desses, porém, continua a não haver casas suficientes. É um problema do Estado, e não do cidadão que, à custa do seu esforço, ou por herança, seja como for, tem o seu património imobiliário, que é seu, e cujo direito tem de ser respeitado.

27 de março de 2023

Pete Burns (1959-2016).


  Há já algum tempo que vos queria falar de um artista britânico falecido anos atrás, o Pete Burns, vocalista dos Dead or Alive. Burns surgiu no panorama musical inglês no final dos anos 70, fundando algumas bandas, até que se estabeleceu como vocalista dos Dead or Alive. O grupo obteve grande sucesso no seu país-natal e resto do continente europeu, e relativo nos EUA, na era do synth pop, com influências notórias do punk. O maior êxito do conjunto foi o clássico das pistas de dança You Spin Me Round (Like a Record), cujo vídeo me influenciou decisivamente. Embora já o fizesse antes, Burns foi o responsável, em larga medida, por ter recuperado o uso do eyeliner quando saio. Não o faço todos os dias; faço-o quando me sinto mais sensual, quando me apetece.



   Nessa altura, começaram a surgir rumores de uma rivalidade com Boy George, que também ganhava popularidade à frente dos Culture Club. George arrojava com o seu visual fortemente marcado pelas cores, o uso de maquilhagem chamativa e vibrante e roupas andróginas. Tudo o que Burns fizera anteriormente, e segundo consta chegou a acusar George de o imitar.

   Os anos 80 passaram, a influência de ambos também, e começaram a ser mais comentados pelos seus excessos pessoais. Centremo-nos em Burns. Plástica após plástica, a carreira foi ficando para trás. O dinheiro ganho nos anos de sucesso foi gastado a retocar aqui, corrigir erros dali. Burns ficou irreconhecível após tantas idas ao cirurgião. Fala-se em centenas de operações estéticas que o deixaram arruinado (em meados da década passada, admitiu-se na bancarrota). Para conseguir dinheiro, entrou em formatos televisivos como reality shows e vendeu a sua história a documentários de canais de televisão. Faleceu em 2016, de insuficiência cardíaca decorrente, muito provavelmente, das intervenções cirúrgicas que lhe arruinaram os órgãos vitais.


   

  Especulou-se imenso sobre a sexualidade de Burns, que nos anos 80 mostrava toda a sua excentricidade. No vídeo de You Spin Me Round, e noutros, há vários elementos associados ao feminino, nos gestos, poses, atitudes, e tudo isso reportou-me à minha própria exuberância quando era mais pequeno e, em adolescente, me maquilhava e usava sandálias de plataforma, bem assim como o uso de cores mais quentes, num Portugal de início do século XIX ainda bastante imerso no cinzentismo social, que se reflectia na moda e nos costumes. À minha maneira, fui precursor, pagando o devido preço, claro, quando os iguais se juntam para nos julgar.


19 de março de 2023

A Baleia.


   Julguei que estaria perante um título pejorativo. Equivoquei-me. Depois verão de que baleia se trata, e do simbolismo que essa baleia adquire na narrativa. Este filme emocionou-me, quiçá pela minha fragilidade -sou frágil, fui frágil-, que se agudizou na actual conjuntura, e embora não seja de chorar com filmes, saí de tal forma comovido da sala de cinema que não consegui segurar as lágrimas, que me inundaram o rosto, caindo sem parar, como numa crise compulsiva.

   A Baleia é uma estória da fragilidade da condição humana, do amor, da redenção. Também da aparente maldade, que poderá não o ser; da fronteira entre a honestidade, a transparência e a maldade. Uma estória de gente desafortunada, por um ou outro motivo. Muito emotivo. Não há enredos complicados (como no desastre Everyting Everywhere All at Once), nem deles precisa, porque nós somos mais comuns do que julgamos. Num simples apartamento, conectam-se traumas e desgraças pessoais, que afinal são as nossas - podem ser as nossas.

   A Baleia entra no meu contido catálogo de filmes preferidos de sempre, e mereceu-me a pontuação 9 no IMDB.






12 de março de 2023

The Fabelmans.


   Um filme que tem muito de biográfico. As interpretações são de excelência, sobretudo de Michelle Williams. Spielberg seguramente saberá destrinçar entre o que há da sua experiência e o que resulta da inegável capacidade criativa a que nos acostumou, transportando-nos aos anos 60 com maestria; a uma família de classe média tão normal nos hábitos, nos “pecados”, nos anseios, nos desejos, incidindo no crescimento de um miúdo entre as câmaras de filmar e um terrível segredo capaz de abalar o núcleo aparentemente tão comum e inabalável, e afinal é-o, comum, porque inabalável, nem tanto. Não há estórias completamente felizes.




10 de março de 2023

Um ano.


   Um ano. Um ano de dor, de adaptação a uma nova realidade. Quando perdemos alguém que esteve sempre presente nas nossas vidas, há que aprender a viver com esse vazio, com essa falta. Cresce-se com o sofrimento. Vejo-o em mim. 

    Se fosse eu que tivesse feito isto, provavelmente faria com que as pessoas crescessem sem ter de sofrer, mas, como não sou, sujeito-me às leis universais.

27 de fevereiro de 2023

Lugo.


   Há umas semanas estivemos em Lugo. O M. já conhecia a cidade, mas eu não. Junto a Pontevedra, era a única cidade galega, das mais importantes, em que nunca tinha estado.

   Lugo é a capital da província homónima. Lucus Augusti, no seu nome romano, está circundada por uma muralha que se pode percorrer por cima, e assim ter uma visão privilegiada pela maior parte do seu perímetro. A muralha tem dois mil anos e mantém-se praticamente inalterada desde então.


A muralha romana de Lugo


    No centro, podemos encontrar a praça composta por uma coluna e uma enorme águia; é a praça do bimilenário de Lugo, construída aquando da comemoração dos seus dois mil anos de história. Li que a águia que decora o topo da coluna, de asas abertas, substituiu a de asas fechadas, transposta para o Parque Rosalía de Castro.


Uma praça que nos remonta a Roma


  O Parque Rosalía de Castro é amplo, luminoso, com um miradouro. Evoca a memória de uma das maiores escritoras nacionais, responsável pelo renascimento das letras galegas. 


Luminoso


   Perto do miradouro está a ponte romana de Lugo, engenho clássico que foi sofrendo inúmeras alterações durante a Idade Média e já mais recentemente, quando passou apenas a receber o trânsito peatonal.


Aqui vê-se um pôr-do-sol magnífico.


    Outro dos atractivos de Lugo é a sua catedral, que embora não seja tão magnânima quanto a de Santiago, é bonita.


Desde o alto da muralha, a catedral al fundo


      Lugo é uma cidade tranquila, entre o rural e o urbano, de gentes amáveis e bastante mais sossegadas do que a generalidade dos galegos, e é tida como uma das mais formosas da Galiza. Gostei bastante.

21 de fevereiro de 2023

Uma igreja (pouco) católica.


  Nunca como agora dois mil anos de história se viram tão ameaçados. As pessoas cansaram-se do controlo sobre as suas vidas, sexualidade, e finalmente dos crimes da instituição, os crimes sexuais, que todos conhecíamos de ouvir falar, e que se juntam aos crimes de maus-tratos e outros que tais. É que aqueles homens (e mulheres) que fazem a igreja podem (e são) ser tão maus como quaisquer outros. Durante demasiado tempo abusaram da sua posição de poder, de influência junto do poder político, da sociedade. Neste momento já não gozam desse poder; não podem silenciar os que os denunciam, travar as investigações, os processos criminais. Ainda bem que assim é. 

    É-me difícil encontrar um lado positivo na existência da Igreja. Sem querer trazer à colação o tema “Deus”, essa entidade é tão pessoal que não vejo a necessidade de haver intermediários na relação humanidade-entidade criadora, existindo. Como no tempo em que não nos permitiam ler a Bíblia -ler, em geral, pois tinham o monopólio do conhecimento-, e tudo quanto sabíamos, sabíamo-lo filtrado. Esse tempo terminou, o que lhe sucedeu também, e antevejo uma mudança social (e religiosa) significativa, que este escândalo não despoletou, tendo vindo ajudar a concretizar.  

16 de fevereiro de 2023

Crime e Castigo.


   Escandalosamente, só agora terminei de ler este clássico da literatura universal. E comecei-o há meses. Entretanto, entre as mudanças para a nova casa e as minhas crises de saúde mental, fui deixando a leitura de lado.

    O que se poderá dizer de Crime e Castigo que ainda não tenha sido dito? É uma obra sobre os dilemas morais e filosóficos das condutas humanas, das más condutas humanas; os tormentos psicológicos entre o que é e o que devia ser. A narrativa está repleta de acontecimentos comuns do quotidiano, porém, todos revestidos de uma enorme tensão. Não se vislumbra um único momento de paz de espírito nas personagens. Há, além do medo, uma ansiedade, como se estivesse algo de pior por acontecer. Será esse, enfim, o castigo que cada um carrega quando a consciência nos condena permanente e perpetuamente. No final, contudo, Dostoievski é cínico o suficiente para nos abrir a porta a um cenário de esperança que, a cada palavra que escreve, desmente, por tudo aquilo que vocês também terão lido e saberão, suponho. 

25 de janeiro de 2023

Que futuro?


    Embora viva longe (e vai entre parêntesis porque a distância é relativa, sobretudo nos dias que correm, com os meios de informação de que dispomos), continuo a acompanhar a actualidade social e política em Portugal. A sensação que me dá é a de que tudo vai muito mal. No governo, os casos de corrupção sucedem-se abruptamente, perante a parcimónia do Chefe de Estado e dos cidadãos. O custo de vida aumenta a um ritmo impressionante, a especulação imobiliária também. A gestão das finanças torna-se o mais difícil dos desafios. Há fome. Há frio. Muitos não conseguem aquecer as suas casas pelos valores exorbitantes das facturas da luz. Aonde iremos parar? Não há prazer algum na vida das pessoas. Procuram ultrapassar cada dia da melhor forma sem daí retirar nenhum proveito. É por isso que compreendo a euforia com vitórias desportivas, citando. Realmente há que encontrar um escape para uma realidade diária tão complicada. Uma ilusão. Algo que faça com que cada um se evada dos seus problemas. 

    Os portugueses não são pessimistas, tristes e melancólicos por que queiram; são-no porque não têm motivos para sorrir. Venderam-lhes sonhos que não se concretizam. Os avanços e as conquistas são tão lentos e escassos que não originam nenhuma satisfação. Olhamos para trás e constatamos que melhorámos, mas a comparação temos de a fazer não relativamente ao nosso passado, senão àqueles que nos servem de referência, e que já nesse passado gozavam de melhores condições do que nós naquele então. Teremos sempre de nos contentar com o poucochinho, quase nada, com o espólio e o engano?

19 de janeiro de 2023

Uns fazem inimigos; outros, amigos.


   Eu não sei se a canção está a ter algum impacto em Portugal. A Shakira lançou um tema no qual arrasa com o ex-companheiro, pai dos filhos, Piqué, e com a sua actual namorada. Em Espanha, não se fala doutra coisa, e já está a bater recordes no streaming. Estas “coisas” incomodam-me, ainda que como espectador. Creio que as querelas se devem resolver civilizadamente. Até há crianças no meio, e eu sei o quão doloroso pode ser um processo de separação (não era criança, tinha vinte anos, mas sofri como se fosse).

   Enquanto aqueles dois se matam, estes dois, o Goku e a Mia, tornam-se amigos inseparáveis. Quem disse que cão e gato não se podem dar bem?




16 de janeiro de 2023

O Balneário de Mondariz.


    Eu adoro termas e águas medicinais. As minhas primeiras termas não foram em Espanha (e vivo na província das termas), nem em Portugal, senão na Hungria. 

    Já há meses que queríamos ir ao Balneário de Mondariz, vontade que não se concretizou por todas as peripécias do ano passado e também (talvez o principal motivo) pelo trabalho do M., que raramente dispõe de dois dias livres (excepto quando tira férias). Este fim-de-semana foi uma excepção, e depressa nos propusemos a fazer as tais ansiadas termas em Mondariz. Desde já, um aviso: a afluência é muita, pelo que os aconselho a reservar com antecedência. Eu reservei na antevéspera (com o trabalho do M., nunca podemos fazer planos antecipados) e quase que não conseguia uma vaga. 


A Fonte de Gándara, cuja água, com uma concentração elevada de bicarbonatos, é utilizada no tratamento da pele e de distúrbios digestivos, sobretudo


  O Balneário de Mondariz é o mais afamado de Espanha, considerado em 2012 o melhor spa do país, entre numerosas outras menções honrosas. Por lá encontrarão várias instalações, reformadas em 2020, dedicadas ao ócio termal. O que esteve na origem deste balneário foi a descoberta em 1872 da Fonte de Gándara, uma fonte de água medicinal. O Balneário entrou em funcionamento em 1873 e depressa se converteu num ponto de referência, epicentro da vida social e medicinal da região. Cem anos depois, justamente em 1973, um incêndio de enormes proporções destruiu-o, sendo que a actividade termal foi retomada apenas em 1993.


Um dos três edifícios que compõem o Balneário de Mondariz, com 194 quartos no total


    A par de toda a oferta, eu recomendar-lhes-ia duas actividades: o Circuito Celta [que consiste em: 1) duche com efeito peeling; 2) banho interior com jactos de água; 3) sauna celta; 4) jactos a pressão com efeito de choque e, por último, 5) banho de contraste ao ar livre, ou seja, numa piscina de água quente no exterior] e o Palácio da Água (composto por piscina de spa, jacuzzis e várias saunas). Não necessitam levar toalhas, que o Balneário fornece-lhes robes e até chinelos (quanto a estes últimos, pela qualidade, será melhor que levem os seus). 


As recordações que trouxe: um livro sobre a história do Balneário, um conjunto de fotos antigas do conjunto termal, um sabão dermatológico e um gel de banho composto por água mineral medicinal


    O Balneário dispõe de alojamento próprio e de dois restaurantes, um dedicado à gastronomia galega e o outro de comida italiana. O último serve refeições até às 0h, pelo que poderão estar no spa até às 23h (última hora), subir ao quarto, tomar um duche e ir jantar (foi o que fizemos). A partir das 21h, não podem entrar crianças na piscina. Das 21h às 23h é o horário ideal para quem não tem miúdos.


10 de janeiro de 2023

O saque de Roma, perdão, Brasília.


  As imagens das invasões populares aos órgãos de soberania brasileiros são impressionantes. Independentemente dos motivos. Lembraram-me o saque de Roma pelos bárbaros. Admiro sempre quando um povo se mobiliza, e o uso deste verbo não deve ser mal-interpretado. Admirar não significa que apoie ou condene. Admiro a coragem. Condeno os motivos, neste caso, e os modos. A imagem que passa é a de selvajaria, desordem total, descontrolo, de democracia em fanicos. Agora repare-se: segundo o meu pai (eu não vou a Portugal há quase um ano), o tempo de espera por lá nos hospitais públicos é de vinte horas, há cerca de 10.000 (em numeração assusta mais) pessoas a viver na condição de sem abrigo e metade da população portuguesa está em risco de pobreza. O pais bateu no fundo. Só que ali não há colhões para fazer o mesmo em São Bento e arredores.

7 de janeiro de 2023

I Wanna Dance with Somebody.


   Nunca tinha vivido tão perto de um cinema, que me lembre. E há tantos anos que não podia ir à sessão das 22h. Recuperei un petit peu das minhas rotinas urbanas. O filme é que… meh. É um argumento fraco, embora Naomi Ackie tenha estado francamente bem. A vida de Whitney Houston não deve ter sido tão aborrecida, e ela tão desinteressante. São duas horas e meia de um enredo superficial e entediante. Salvam-se os velhos clássicos de uma geração e a mímica da actriz.