29 de julho de 2013

Serão.


   A quinta-feira passada foi diferente. Especial, arriscaria em dizer. Tanto a Margarida como o Francisco já relataram nos seus espaços tudo o que aconteceu, de uma forma mais pormenorizada e até satirizada, com pitadas de boa disposição à mistura. Eu, naturalmente, não poderia deixar passar em branco tal noite.

   Não tenho muito a acrescentar, logo, pretendo atingir fins distintos. Sobre a peça a que fomos assistir, O Grande Salão, posso garantir que vale a pena. Asseguro gargalhadas do primeiro ao último minuto. Numa época em que as redes sociais, sobretudo o facebook, invadem a privacidade da maioria dos utilizadores da internet, uma sátira bem conseguida é sempre recomendável. Mais ou menos, todos acabamos identificados naqueles estereótipos. Apreciei o método utilizado para abordar uma questão preocupante na actualidade sem descurar a parte cómica.

    Antes da peça, no Tivoli, pudemos confraternizar, ficando a conhecer melhor cada um. Não éramos estranhos. O primeiro encontro ocorreu no célebre jantar de blogues, contudo, a três, num ambiente mais intimista, os risos brotaram quase de forma imediata, instantânea. E foram imensos. Esqueci-me, por momentos, de que estava na presença de duas pessoas que poderiam, a julgar pela idade, ser os meus pais. Sem cair em clichês (aliás, desnecessários), não tive a percepção dos anos que nos separam. A Margarida é uma senhora extraordinária. Sabe escutar e sabe conversar. Não deixa de ter um magnífico sentido de humor, sempre pautado por uma seriedade que transmite confiança. É a amiga que, no fundo, todos ambicionam. O Francisco é um excelente rapaz. Imune a críticas, afirma-se e ao seu estilo sem pestanejar, ousando ser diferente, coerente e honesto consigo, quando exigem de nós um véu que, na maioria das vezes, não passa de pura hipocrisia.

    No final, e já a caminho de casa, fizemos um balanço positivo. Os blogues não conseguem demonstrar a realidade de cada um tal qual ela é. Há meandros e partes que permanecem ligeiramente ocultas. Para tiozinho pedante (brincadeirinha), até sou um rapaz suficientemente informal, creio. Assim espero. :)

24 de julho de 2013

Quando os corpos se tocam.


    Neste fim de semana, saí com um amigo. Já nos conhecemos há algum tempo, embora haja entre nós apenas uma relação de cumplicidade. Vagueámos pela cidade ao longo do dia. Ele tem por hábito andar, e anda imenso, sempre em passo acelerado. Admiro a sua descontracção e informalidade. Já eu, naturalmente, caminho devagar e gosto de abrandar o ritmo, sentando-me com frequência. O facto de ser asmático ajuda a que mantenha alguma cautela. Não consigo determinar com rigor a última vez que nos vimos, mas sinto - sentimos - que a distância não diminui a vontade de estarmos juntos.

    Gostei de o ver. Está mais maduro. Deixou crescer os poucos pêlos faciais que tem como se de barba cerrada se tratasse. Detesta-a. Fá-lo pouco homem, garante. Digo-lhe que os homens não são os brutos de barba rija; os homens são os que usam o que de bom têm para mudar o mundo. Basta que se convençam disso.
    Cuida de mim. Ao atravessarmos as avenidas e as ruas agitadas, quase que estende a sua mão na direcção da minha. Controla-se. Avisa-me do degrau; sabe-se lá se poderei cair e quebrar a porcelana toda. Faz com que me sinta seguro. Protege-me dos males de um mundo que deveria conhecer tão bem quanto o conhece. Não, eu tive a sorte de ter um pai que zelasse por mim. Ele é órfão. Aprendeu a comunicar com cada pedaço de betão, trocando as horas de monotonia por passeios agitados. Corre do seu infortúnio, deixa-o para trás, quem sabe se o enfrenta à sua maneira.
    Pacientemente, ouve-me e acerca-se do que digo. Ri das tontarias que falo, ri da imaturidade e até de um mau humor pontual. Em troca do 'Pol Pot' (que não conhecia), salvo seja, e das correcções inusitadas do seu péssimo inglês, faz com que veja a cor do Tejo como raramente a vi. Faz com que sinta a vida a correr-me nas veias, faz com que acorde do torpor que me leva os sentidos e me torna irreal. Ah, fala-me do exame nacional de Matemática e, inocentemente ou não, pergunta-me se percebo algo daquilo. Como explicar que alguma da tabuada ficou lá pelo 4º ano e nunca mais voltou?

    Por acidente ou descuido, o beijo aconteceu nos jardins da Gulbenkian, depois de me ajudar a atravessar as pedrinhas que se sobrepõem ao pequeno charco que corre debaixo. As copas das árvores são testemunhas da não intencionalidade. A carne é fraca, já diz o povo em sábia voz.
    Foi bom; não deveria ter sido porque se tratou de um erro. Vingou o desejo, e ao primeiro seguiu-se outro e mais outro, e às tantas já não éramos dois, mas um, e tudo veio à tona como o azeite que jamais se dilui na água.

    Esgotaram-se as palavras. O retorno foi mudo. Confundiram-se os sentimentos como nunca antes. Tudo se perdera.


     O telemóvel acordou-me mais cedo. Tinha uma sms de 'bons dias' e um obrigado. Passou um pano. Passei uma borracha, de leve, bem de leve, porque ainda tenho em mim o seu sabor e isso não pretendo apagar.

16 de julho de 2013

Incompletude.


    Concluídas as orais de melhoria, as quais abordei num texto anteriormente publicado, chegaram, por fim, as férias, ou lá o que isso é. O cansaço que se foi apoderando de mim nas últimas semanas era, sobretudo, psicológico. Não direi que algumas horas de estudo a mais tenham sido inteiramente benéficas, assim como não negarei que houve algum desgaste físico, contudo, o peso residia sobretudo no meu intelecto. Muitos preenchê-lo-iam com uns mergulhos, embora eu saiba que isso, ao menos este ano, não chegará. Sinto falta de ser útil, numa perspectiva pouco pessoal, altruísta. Que o sou para mim mesmo, já o sei; sempre o soube.

   Conforta-me saber que tenho inteira consciência do que se passa - e vontade de fazer algo. Estar numa estância balnear, contemplando o mar, é tão previsível que não deixa de me sufocar. Queria ser mais do que isso e ter mais a contar no amanhã. Teria de ser algo real, palpável, concreto, e não a caridade de sexta-feira por alguns, sem pudor. É um eterno descontentamento. Como diria Camões, um «contentamento descontente», bem como o amor. Não... não tão trágico.

  Numa outra perspectiva, não sei o que poderia fazer, visto não saber fazer muita coisa que possa verdadeiramente ser importante para outrem. Talvez aliar alguns conhecimentos a uma boa-vontade que terei de descobrir e puxar ao de cima.

   Vejo uma lacuna e ainda não sei como completá-la. Quando falo com a avó, nomeadamente sobre estes assuntos, entende o meu lado, sim, dizendo-me que estou no bom caminho e que tudo passa por dar tempo ao tempo. Confio na sua experiência, mantendo o alerta de que apesar de saber que faço bem mais do que muitos da minha idade, conheço vários casos de outros que já aproveitaram o triplo do que eu desfrutei. Sou sensível a ambas as realidades. E sei, também, que muito dependerá do meu sucesso profissional, afinal, tenho décadas pela frente (terei? sempre senti que morreria jovem, mas isso são assuntos à parte). É um misto de inconformismo e impaciência. Um vazio, a sensação de que falta um pedaço.

     É provável que esteja perante resquícios de uma adolescência, eu diria, peculiar. Ou não. Sou, efectivamente, muito diferente e complicado.

8 de julho de 2013

Bolívia.


    Tenho acompanhado com alguma apreensão os desenvolvimentos do conflito que envolve a Bolívia e alguns países europeus, a par dos Estados Unidos da América. Mais do que uma crise diplomática, medem-se poderes e influências, em verdadeiros jogos de interesse onde as ideologias políticas têm sempre a última palavra.

    Desconfiando de que Edward Snowden poderia estar a bordo do avião presidencial boliviano, alguns países europeus recusaram a Evo Morales a possibilidade de sobrevoar e aterrar em Portugal, França e Itália, tendo a Espanha, posteriormente, acedido a que o presidente da Bolívia pudesse reabastecer em solo das Canárias, mais numa manobra estratégica do que por razões humanitárias ou no cumprimento do direito internacional. Manobra inteligente, diga-se, que tem resguardado o país vizinho das críticas mais ferozes que ecoam contra os restantes países envolvidos. Cabe perguntar se o procedimento destes países tem alguma justificação ou se, de facto, se tratou de uma violação clara dos preceitos estabelecidos quanto a estas matérias. Com grande gosto pelo direito internacional público, devo dizer que Evo Morales tem imunidade diplomática e livre trânsito, com ressalva da devida autorização. Confirmando-se o que alegou, nomeadamente de que lhe foi pedida a fiscalização do seu avião, o mesmo é ilegítimo. Contudo, é sabido que Evo Morales sofre de um anti-americanismo primário, inconsequente, sendo que a possibilidade de o ex-agente da CIA poder estar a bordo do seu avião não seria totalmente infundada, acrescentando-se ainda que provinha da Rússia, onde Snowden se encontrava. Parece-me mais do que razoável a atitude dos E.U.A em avisar os seus aliados. As alianças contemplam estas situações e é este também o seu fundamento. De outra forma seriam inúteis. Não creio que exista subserviência, até porque estando a França envolvida, é tudo menos provável de que acatasse directa ou indirectamente ordens de Washington. Veja-se o histórico de relações entre os Estados Unidos e a França e o mesmo falará per si.

    Ao que tudo indica, Snowden não estava no avião de Morales, daí todo o imbróglio diplomático. Em certa medida, há parcelas de razão distribuídas por todos os intervenientes da quezília. Nenhum país, para mais pertencendo a alianças de cooperação policial, é obrigado a ser conivente com a passagem pelo seu espaço áereo de alguém que é procurado internacionalmente, não querendo aqui tecer considerações sobre a natureza da perseguição a Snowden, a meu ver alguém desleal para com os serviços que desempenhava no seu país. Espanha já admitiu que recebeu informações claras de que o ex-espião estaria na aeronave; Lisboa mantém as 'considerações técnicas' que não convencem uma criança de cinco anos. Há que ser honesto e tomar partido. Agradar aos dois lados da bancada será hipocrisia.

    No pós-incidente, as reacções agudizaram o que já era grave. As críticas oriundas da América Latina pecam por excesso de zelo e alguns ressentimentos seculares. Ouvi declarações acerca da velha Europa, pejorativamente falando, totalmente desnecessárias, incluindo argumentos rácicos! Evo Morales afirmou que as suas origens indígenas estariam também por detrás de todo o conflito. Apenas ridículo. Em contrapartida, as relações tensas entre a Bolívia e os E.U.A poderão justificar o que se passou, ganhando aqui a desconfiança norte-americana algum sentido.

    As queixas e denúncias têm lugar nas Nações Unidas e nos órgãos judiciários internacionais, não na praça pública com extremismos e xenofobia. Outrossim, não compreendo as posições dos países da América do Sul, tomando as dores alheias como se estivéssemos perante uma guerra de blocos regionais Europa vs América Latina, Velho vs Novo, pró-E.U.A vs anti-E.U.A. Os pedidos de desculpas, formais ou informais, têm de ser requeridos pela Bolívia através dos seus representantes e tão somente, bem como a expulsão dos diplomatas dos países envolvidos (a meu ver, totalmente desnecessária).

     Que haja bom-senso.

3 de julho de 2013

Finalista.


    Após um mês de avaliações, posso agora dizer, com toda a propriedade, que sou finalista. Já o era não o sendo, todavia, quis aguardar pela confirmação de todas as notas. O facto é que havia concluído as disciplinas necessárias para transitar de ano lectivo. Sinto orgulho pelo trabalho que desenvolvi e pela dedicação. Num mundo em que nem sempre o esforço é recompensado, é mais do que gratificante demonstrar o contrário: o empenho pode originar bons frutos. Não passa tanto pelas horas que se estuda, mas sim pelo método. Devo dizer que, nos dois primeiros anos da licenciatura, estudava bastante. Creio que cheguei a afirmá-lo aqui: umas quatro horas ininterruptas por dia. Era gratificante, sem dúvida. Estudar, para mim, nunca foi um sacrifício. Cresci a encarar o dever de o fazer como isso mesmo: um dever para com o meu futuro e, evidentemente, para com a mãe e o pai, este último que, apesar de longe, contribui financeiramente para a minha educação. Embora o fizesse com esse sentido de dever, procurei ter mais método e organização, retirando algumas horas de estudo em tentativas de esquematizar a matéria. Consegui manter o nível que impus a mim mesmo e retirei algum peso de cima.

   Nesta recta final, tive algumas surpresas. Não contava com o facto de figurar entre os melhores alunos a direito penal, de todo o terceiro ano, daquela instituição de ensino superior. Quando a professora-assistente mo comunicou, alertando-me no sentido de me preparar para uma conversa com a professora-regente, ex-juíza do Tribunal Constitucional, fiquei num estado de ansiedade indescritível. Não diria nervoso; expectante. Nada disse à mãe, aos avós, aos manos, as pessoas que me são mais próximas. A mãe só notou algo quando me viu sair de casa de fato e gravata, estranhando o motivo. Inventei uma desculpa. A conversa foi, na verdade, uma oral de confirmação (às quais já estou habituado) com contornos especiais. A senhora professora quis desvendar quem éramos, o que pretendíamos... quiçá se seríamos futuros colegas. Pela primeira vez, senti uma responsabilidade enorme:

«O que pretende fazer de futuro, senhor Mark? Já pensou na magistratura?»

    Não poderia disfarçar sem que ela o percebesse. Sabe mais na ponta do dedo indicador do que eu no corpo todo. Quis mostrar alguma segurança, afinal, os outros alunos tinham um rol bastante determinado quanto aos seus futuros profissionais... Por que não ser sincero? Disse que não sabia, calmamente. Falei no mestrado, doutoramento, adiando o mais possível. Sorriu e acenou na minha direcção, satisfeita.

    Quando contei em casa, por fim, o que se passara, a mãe quis dar um jantar informal para os mais íntimos. Rejeitei a sugestão porque, sinceramente, não vejo nada a ser comemorado. Não era o que esperavam de mim desde pequeno? Voltamos à parte do dever. Cumpri com a minha obrigação, não deixando de fazer algo por mim mesmo. É uma junção de ambos.

   O último ano do curso aproxima-se e, de certo modo, conforta-me saber que há outros níveis para além de. Adio por mais uns anos o inevitável. Sou péssimo a tomar decisões, desde sempre. Descarto por completo a hipótese de dar aulas. Ando com ideias no campo do jornalismo, já que História, enfim... Sim, jornalismo. Nomes como Miguel Sousa Tavares, Manuela Moura Guedes, Carlos Pinto Coelho... Paulo Portas (neste aspecto!), inspiram-me um pouco. Entre outros. É uma área abrangente. Sinto que será por aí.

   Quem sabe e ainda me vêem como jornalista político na televisão ou num jornal... Seria engraçado. 
   Por agora, orais de melhoria e férias.