Desde que me perguntaram se o «Winston Churchill era francês» que eu não duvido de nada. Não sei!, foi como uma vacina qualquer contra um vírus que me poderia atormentar a qualquer instante. Fiquei preparado para tudo. Ainda me recordo de que, tomado de um nervosismo latente pelo início do teste, a pergunta surgiu-me como algo bastante pertinente.
"Se o Winston Churchill era francês, claro, uma pergunta válida como qualquer outra... O quê?!!!!"
Por isso, fiquei menos incomodado do que supostamente ficaria, há umas semanas atrás, com uns olhares constantes no meu teste, como nesta quinta-feira passada. Não que fique revoltado por saber que estão a copiar integralmente o meu teste; desde que não me perturbem, se bem que continuo a incluir na categoria de situações verdadeiramente escandalosas o facto de alguém me pedir para virar a página, de novo, para que possa copiar uma parte que não conseguiu. É um bocadinho de falta de vergonha a mais, se acrescentarmos o detalhe de que não conhecia, de todo, a pessoa. Ao que o desespero leva.
Murmurando-me minuto após minuto, já sob o olhar desconfiado de uma professora que, vigilantemente, inspeccionava os alunos, apeteceu-me riscar-lhe a ponta do nariz com o meu marcador azul-claro. Era o quadro perfeito. Veio-me à cabeça o que o rapaz sentiria se eu fizesse isso. A sua reacção, meio de desespero, meio cómica, levou-me a conjecturar esses supostos cenários. Aquele olhar de "olha-desculpa-mas-diz-me-a-resposta", com um sorrisinho pejado de sarcasmo, não deixou de ser engraçado.
Como nós somos, pegando na definição mais conhecida, animais sociais, o estranho desconforto que senti de início, roçando a repulsa, transformou-se numa piedade e até, vá, numa empatia. Deixei-o aproximar-se de mim para que pudesse copiar melhor. Copiou, parando apenas para mudar o léxico das frases, de modo a que os testes não ficassem muito parecidos - imposição minha.
A poucos minutos de acabar o teste - e mesmo após o término do tempo limite - já lhe ditava o resto, num regime de total solidariedade. Abafados pelo som de fundo de alunos que partilhavam informações entre si, perante o olhar dos professores que, impotentes, não podiam fazer nada, acabámos o teste.
O seu «obrigado» e a sua piscadela de olho foram de uma piroseira atroz. Senti-me desnudo. Agradeceu-me como se o fizesse a uma rapariga. Pelo canto do olho, ainda o vi a olhar para mim ao fundo do anfiteatro, mas naquele momento arrumar o dossier e sair dali o mais depressa possível era tudo o que queria.