2 de novembro de 2023

Dia de Finados.


   Hoje pus-me a pensar em todas as pessoas que perdi. Foram muitas. Com trinta e sete anos, não tenho mãe, pai, avós (excepto uma avó velha com quem não me relaciono). Em ano e meio perdi toda a minha família, uns para o cancro, outros de morte “súbita”. E sinto-me como aqueles velhotes que já não têm ninguém. Tenho o meu marido, que me ama e cuida de mim. É tudo. Não me resta mais ninguém. Há umas ramificações colaterais que não têm importância, é como se não existissem (refiro-me a tios, primos).

    Não quero que ninguém tenha pena de mim (“olha, coitadinho, não tem família”). Nem tão-pouco o digo para surtir esse efeito. Digo-o como forma de me lamentar, porque, no fundo, é triste. Eu sabia, pelo estilo de vida que levavam, que não teria pais por muitos anos, e admito que sinto inveja quando vejo alguém com a sua mãe. Já não tenho a quem possa chamar mãe. O bom é que não choro. Fiquei impenetrável. Seco. Creio que nada mais me assusta nesta vida, miserável vida, e que me perdoe se peco, quem de direito.

6 comentários:

  1. Como te compreendo, não é fácil
    É ir vivendo um dia de cada vez
    Abraço amigo

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    1. Não é nada fácil dares-te conta de que estás sozinho no mundo.

      Um abraço, amigo
      Mark

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  2. Mark, a vida fez-se para ser vivida da forma como se nos apresenta. Temos poucas hipóteses de poder alterá-la ou escolher outros percursos, pois parece-me sempre que as coisas estão mais ou menos planeadas de antemão.
    Quantas vezes planeio coisas e, no final, elas seguem percursos que me são estranhos e até dolorosos.
    Tento, sempre que posso, dar a volta por cima, quando não consigo, limito-me a viver o dia-a-dia e esperar por dias melhores.
    Eu sou um desses velhotes que se encontram isolados e solitários. Não me resta muito mais gente, paciência, continuarei a seguir o caminho que se planeia por um destino que se compraz em fazê-lo à minha revelia.
    Fico muito satisfeito e tranquiliza-me sabê-lo com quem gosta de si. Ainda bem e um bem hajam.
    Manel

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    1. Olá, Manel.

      Acredita no destino? Julgava-o muito pragmático quanto a isso. Eu, se quer que lhe diga, nem sei no que acredito. Às vezes parece-me que há coisas que fogem ao nosso controlo e que parecem “programadas” por alguma força que nos supera. Certezas, ninguém as tem, sobre nada.

      Quanto à vida… É um percurso de sobrevivência diária, uma selva. Enquanto temos quem nos cuide, vai-se “tocando para a frente”, e isso leva-me a pensar naquelas pessoas que não têm realmente ninguém que olhe por elas. Há-as. É verdade que temos de continuar mesmo se estamos sozinhos.

      Simultaneamente, sinto raiva dos meus pais. Foram egoístas, em certa medida, porque deveriam ter previsto que o seu estilo de vida culminaria assim, em mortes precoces (64 e 73 anos). Quando temos filhos, mesmo sabendo que crescem, temos o dever de olhar por nós sabendo que, ao fazê-lo, estamos a olhar por eles.

      Não gostei de saber que o Manel está sozinho. É ridículo da minha parte dizê-lo, bem sei, mas olhe, eu estou aqui, longe, mas estou aqui.

      Cumprimentos,
      Mark

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  3. Há gente que denomina de destino, outros predestinação (o que vai dar ao mesmo), outros acaso, outros, usam outros nomes relacionados com contextos religiosos.
    Eu sei que há coisas sobre as quais, por mais que tente, não tenho controlo, e, nestas, pois está-se à mercê de forças do acaso, ou o que quer que se lhe queira chamar.
    Mas são coisas que me parecem mais fatalidades, e, se não se pode dominar este contexto, o melhor será deixar que se desenrolem à sua forma, e eu tentarei remediar da minha, mas sei que pouco posso fazer.
    Mas isto não me tira o sono, se quer que lhe diga. Estou habituado.
    O que é importante é que se saiba as coisas que se podem dominar e as que nos escapam ao controlo.

    Sozinho, sozinho, ninguém está, todos temos pessoas que nos rodeiam, e que fazem o favor. e nos dão o prazer, de gostar de nós.
    Quando me refiro ao termo "sozinho", quero com isto denominar uma situação em que não resta mais família de sangue, nem pessoa a quem se esteja ligado, ou com quem esteja a partilhar uma vida.
    Não é grave, nem é drama, e é a situação de milhões de pessoas em torno de nós.
    Temos de viver enquanto esta forma de estar nos não é dolorosa, o que não é o meu caso. Sou uma pessoa relativamente tranquila, e, creio, mais ou menos equilibrado (é a minha opinião, e posso estar a fazer mau juízo, as pessoas que me rodeiam talvez não estejam de acordo, nunca mo referiram, nem eu o procurei saber tão pouco).
    O estar "sozinho", presentemente, não me afeta especialmente. Houve tempo em que esta situação me era problemática, hoje nem tanto. O futuro, bem ... aqui já não lhe sei dizer. Ver-se-á, e será o que tiver de ser (cá temos novamente o que nos escapa ao controlo, apesar de haver uma antevisão do que será), mas há sempre um escape!!!
    Sou um fala-barato ... e encho-lhe o blog de "ruído". Tem de desculpar esta invasão toda.
    Sinta o prazer de viver uma vida como gosta de o fazer, se tal lhe for possível. Carpe diem
    Manel

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    1. Manel, que “ruído”? Já lhe disse várias vezes que é um prazer enorme conversar consigo, explorar tantos e bons temas.

      Às vezes também me parece que tudo se encaminha num sentido, mesmo que não o tenhamos programado. Já me sucederam situações que me escaparam ao controlo. De repente, seguiram aquele rumo inesperado. Quiçá esteja alguém no comando.

      Não sabia que já não tinha pais. Pensei que pudesse ter uma mãe, ou mesmo um pai (digo mãe porque geralmente as mulheres morrem mais tarde e mais velhinhas). Eu, infelizmente, não pude ver envelhecer a minha mãe. Às vezes falávamos -ela gostava muito do seu uísque depois do almoço- que, quando fosse velhinha, a levaria a beber o seu uísque, já de bengalinha. Não aconteceu. Jamais irá acontecer. Resta o consolo de saber que a minha mãe viveu a vida à sua maneira; gostava dos pequenos prazeres da vida: o seu uísque, o seu tabaco.

      As antevisões podem falhar. A vida dá muitas voltas. Num ápice, tudo muda, e o que parecia vir a ser, não o é mais. O Manel, sendo mais velho e mais experiente, sabe isso melhor que eu.

      Não, eu tenho-lhe a agradecer a sua presença. Ela faz este blogue. Do que seria dele sem as suas observações? Gosto muito de saber que está desse lado. O Manel sabe-o.

      Cumprimentos,
      Mark

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