Midsommar é um filme muitíssimo bem dirigido que conjuga elementos do paganismo nórdico com o folclore sueco. No solstício de Verão, um grupo de jovens estudantes viaja dos EUA até uma localidade sueca para estudar os hábitos daquelas gentes e, no caso de Dani, procurar esquecer um pouco a tragédia que se abateu sobre si. O que eles não esperavam era que os membros daquela comunidade praticassem ritos tão escabrosos e tivessem tradições tão estranhas. Ninguém consegue sair daquele acampamento. Embora seja amplo, disperso, luminoso, colorido, é demolidor.
É uma longa ambiciosa, com uma fotografia de excelência e ambientada nas deslumbrantes paisagens de uma Suécia natural, na qual o sossego se aproxima da espiritualidade e nos permite reflexões sobre o passado e o futuro. Quando embarcamos nesta aventura tenebrosa, julgamo-nos estar a entrar num sonho (ou pesadelo…) luminoso e colorido com aqueles quatro turistas americanos, talvez também, como eles, sob o efeito de substâncias alucinógenas. É tudo real e simultaneamente fantasioso. Aquelas pessoas funcionam em grupo, seguem escrupulosamente uma qualquer religião ou seita que desconhecemos, e não encaram aquilo a que se dedicam como anormal e bizarro. Lembraram-me dos povos da América, que praticavam sacrifícios humanos e que chocaram a moral dos europeus.
De certo modo, também nós nos vemos confrontados com os nossos costumes. O que será mais ético: um idoso, que atingiu o último patamar em ciência e espiritualidade na sua comunidade, decidir atirar-se de um penhasco ou ser confinado, como nós fazemos, num lar, até morrer? O que será mais digno? São questões que Ari Aster deixa em aberto e nos faz reflectir acerca.
Florence Pugh tem uma interpretação de excelência. Vemo-la sofrer desmesuradamente pela perda da família, por se sentir perdida, querendo agir naturalmente sem forçar a paciência de um namorado, interpretado por Jack Reynor. O seu desespero confunde-se com o nosso. Pessoas sem esperança, sem raízes, facilmente são aliciadas, e o olhar final de Dani, a sorrir, alienada, ou anestesiada, é o de alguém que encontrou uma família, alguém que a acolha. É das partes mais perturbadoras. Até que ponto podemos ceder ao sofrimento, deixando-nos levar por algo que mitigue a nossa dor. O desfecho trágico foi quase uma consequência necessária numa relação que já evidenciava sinais de desgaste.
Em Midsommar, a aparente alegria (a festa da Rainha de Maio) mistura-se com o horror e a loucura. Finalmente, Dani pôde ver a sua dor amparada por aquelas raparigas, que gritaram consigo e exorcizaram todo aquele sofrimento. Agora, ela era parte da família. As sequências em que a sua mãe e irmã surgem, produto da sua psique alterada, só tornam a longa ainda mais inquietante. É, efectivamente, dos melhores filme género, superior a Hereditary, do mesmo realizador.
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