São as duas últimas críticas a filmes do MOTELX, antes de uma final publicação em jeito de balanço. Devo dizer que as críticas aos filmes não seguiram sempre a ordem em que os vi. Críticas houve que julguei merecerem uma publicação autónoma. São caso disso The Golden Glove e Plan 9 From Outer Space.
Get In (não confundir com Get Out, um filme de terror do ano passado, que detestei) é uma produção francesa. Do que mais tenho gostado nesta edição do MOTELX é que os filmes têm todo um conteúdo subjacente, o que é excelente. O protagonista é negro, está casado com uma mulher branca. Oliver Abbou, o director, soube pô-lo em situações do quotidiano que demonstram o racismo encapotado, em forma de paternalismo, sobre os negros que moram em França e inclusive aquele que ocorre dentro da própria comunidade negra (numa das cenas, o protagonista, que é professor, adverte um aluno também negro, que o confronta, chamando-lhe "Oreo", bolacha que é preta por fora e branca por dentro; noutra cena, quando convidado a sair pelo funcionário público, o segurança, também negro, diz-lhe: "acalma-te, irmão"). A par dos problemas raciais, Paul vive em meio de crises de virilidade. Em parcas palavras, é um homem apático, que alguns considerariam "frouxo", o que contrasta sobremodo com a nossa representação do homem negro, forte, impenetrável, sexualmente insaciável. Houve, ainda, uma inversão dos papéis: os antagonistas são brancos, jovens, fisicamente atractivos.
O argumento gira em torno de uma casa, ocupada à revelia dos donos, precisamente os protagonistas, mas está longe de ser o que lhe subjaz. As questões que são trazidas, como referi num parágrafo anterior, têm outra densidade. Saliento a referência cultural ao porco, o animal, que é usado em máscaras pelos antagonistas. O porco é tido por um animal degradante, rasteiro, sujo, podre, justamente a associação que fazemos com aqueles sujeitos, que, em grupo, agem com uma enorme violência. O tema da violência em grupo é, assim, também abordado.
A determinado momento, há um volte-face. Os antagonistas primários passam quase a alvo da nossa comiseração, ou não será assim? Quanto a mim, vi ali justiça a ser feita, com um tanto de exagero. Ninguém esperaria aquela desenlace.
Das crises conjugais às falsas amizades, Get In é mais denso do que parece, e foi uma boa surpresa naquele sábado de festival. Defini-lo-ia como um bom filme de terror psicológico.
No que concerne a The Wind, esta longa é ambientada no século XIX, nas planícies do sul-sudoeste dos EUA, conjugando elementos dos westerns com algum do folclore americano, bem assim como a fé cristã com a demonologia. A fotografia adensa a sua beleza natural, a daquelas planícies, e ajuda a criar a atmosfera de suspense e terror. Um silêncio perpassa o filme, só quebrado pelos diálogos, curtos, concisos, e pelo ruído do vento, que agita o horizonte.
O filme trata o fenómeno do sobrenatural com contenção de fantasia. Só por aí, caiu de imediato nas minhas boas graças.
Reparei em claras inspirações no clássico de Brian de Palma, de 1976, Carrie, designadamente quando a protagonista, Lizzie, surge à porta, ensanguentada, com os seus longos cabelos lisos sobrepostos à túnica branca. Lizzie é atormentada por uma depressão pós-parto pela morte do bebé, o que vai ficando claríssimo à medida em que a narrativa se desenrola. Paranóia ou possessão demoníaca? O que se passará naquela casa, ou, melhor dizendo, naquele monte isolado em que mora com o seu marido e um casal recém-chegado?
O século XIX foi particularmente conturbado para os norte-americanos. Passariam por uma guerra civil, inclusive. Até hoje, o porte de armas é uma garantia constitucional por lá. Numa cena, o marido de Lizzie, antes de se ausentar, pediu-lhe que, se visse um demónio, disparasse. O americano médio, lá está, que julga poder enfrentar tudo e todos com a sua arma. É só uma curiosidade.
Acima de tudo, vemos uma mulher que vai enlouquecendo, pela solidão, pelo desgosto, pela sua mente impressionável. E nós vamo-la acompanhando nas suas tarefas diárias, tendo-se apenas a si por companhia. Uma solidão que se adequa àquele interior do estado do Novo México. Bem rodado, sombrio, é um bom filme de terror.
O filme trata o fenómeno do sobrenatural com contenção de fantasia. Só por aí, caiu de imediato nas minhas boas graças.
Reparei em claras inspirações no clássico de Brian de Palma, de 1976, Carrie, designadamente quando a protagonista, Lizzie, surge à porta, ensanguentada, com os seus longos cabelos lisos sobrepostos à túnica branca. Lizzie é atormentada por uma depressão pós-parto pela morte do bebé, o que vai ficando claríssimo à medida em que a narrativa se desenrola. Paranóia ou possessão demoníaca? O que se passará naquela casa, ou, melhor dizendo, naquele monte isolado em que mora com o seu marido e um casal recém-chegado?
O século XIX foi particularmente conturbado para os norte-americanos. Passariam por uma guerra civil, inclusive. Até hoje, o porte de armas é uma garantia constitucional por lá. Numa cena, o marido de Lizzie, antes de se ausentar, pediu-lhe que, se visse um demónio, disparasse. O americano médio, lá está, que julga poder enfrentar tudo e todos com a sua arma. É só uma curiosidade.
Acima de tudo, vemos uma mulher que vai enlouquecendo, pela solidão, pelo desgosto, pela sua mente impressionável. E nós vamo-la acompanhando nas suas tarefas diárias, tendo-se apenas a si por companhia. Uma solidão que se adequa àquele interior do estado do Novo México. Bem rodado, sombrio, é um bom filme de terror.
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