Lembro-me de quando viajava até à Praia das Maçãs, num tempo que guardo com carinho. Era tão pequeno ainda, mas recordo-me das estradas circundantes que nos conduziam até lá. Do verde das árvores, do cheiro a mar e da linha do eléctrico que estava desactivada. Talvez o meu fascínio pelos eléctricos venha daí. Lembro-me de olhar para os carris, velhos e enferrujados, consumidos pelo matagal que os envolvia num abraço fatal. Os postes eléctricos, velhos e usados, erguiam-se moribundos nas beiras das estradas, com fios de electricidade, provavelmente desactivados, que pendiam sobre si.
Gostava de ir até à Praia das Maçãs. A senhora do colégio colocava-me o chapéu na cabeça, de forma a proteger-me do sol, e eu brincava, solto e leve, como um peixe que nada no mar. Por vezes, íamos até às piscinas. Existiam duas ou três, uma para os adultos e outra para as crianças. Tinha uma ligeira predilecção pela piscina dos adultos, talvez por estar mais perto dos adultos e das crianças com mais idade do que eu. Eram dias de tanta felicidade... Depois, da parte da tarde, fazíamos um piquenique num jardim público em Sintra. Ainda sinto o cheiro das árvores, do verde brilhante da Natureza. Ainda sinto os trilhos que percorria com os coleguinhas do colégio. O campo onde os meninos brincavam. As meninas, essas, não, preferiam ficar a dançar ou a brincar com bonecas. Eu sentia-me à parte deles. Não era como os meninos, no fundo, e apesar de ser muito pequenino, sabia-o. Não tinha a sua virilidade, a sua agressividade e não procurava impressionar as meninas. No entanto, também não brincava muito com as meninas. Ainda ouço a sua voz...
"Oh Helena, o que é que o menino tem? É tão diferente. Não se dá com os meninos e fica a apanhar umas pinhas e umas flores. O que se passa com esta criança?"
No fundo, elas não sabiam que eu as escutava. E não imaginavam de que eu lembrar-me-ia destas palavras tantos anos depois. Mas era tão feliz, assim, único. Tinha inveja da Ana Cristina porque o Rui gostava dela... Que inocência e perspicácia, mesmo com cinco anos. Por vezes, colocava algumas flores na minha mochila para dar à mãe, quando chegasse a casa.
Ainda fui, todos os Verões, à Praia das Maçãs, nas férias do colégio. Depois, como num passe de magia, deixei de ir. Voltei, contigo, há uns anos atrás. Pedi e levaste-me até lá. O sonho e o passado misturaram-se com o presente feliz e ideal. Foram os melhores dias da minha vida. Foste mais do que um herói; trouxeste-me a minha infância de volta. O eléctrico já funcionava, o ambiente era outro, mas nada estragou aquele quadro imaculado que estava lá atrás. Por tantos e tantos motivos, ainda acredito em ti, na pessoa que és. Tiveste esse dom de me tornar novamente na criança que fui. E se a minha infância foi feliz...
São momentos como estes que vivi que me fazem recordar de tudo com imensa saudade. Afinal, quando fui contigo, também já é passado. Mas as imagens, essas, ficam para sempre.
Um lugar especial, um pouco de mim, um pouco de nós, ficou escrito na Praia das Maçãs.
Há lugares assim, que ficam marcados para sempre nas nossas recordações.
ResponderEliminarO meu chama-se Figueira da Foz.