31 de julho de 2020

Salazar, cinquenta anos.

   No passado dia 27, completaram-se cinco décadas desde que Salazar morreu. A 27 de Julho de 1970, o homem que liderara os destinos de Portugal desde 1933 sucumbia, após dois anos de doença que o deixou profunda e irremediavelmente diminuído nas suas capacidades.

   Acerca de Salazar, há todo o tipo de literatura, de quem o detesta a quem o idolatra. Eu recomendaria as obras de Jaime Nogueira Pinto e Paulo Otero, designadamente, que procuram ter uma visão mais humana e íntima do homem. 

  Quando me deparo com grandes vultos, e Salazar encaixa-se plenamente na categoria, procuro sempre vê-los além da condição humana, como se a nossa vulnerabilidade os diminuísse. Como tal, é do Salazar estadista que gosto de lembrar, e é o líder que vou evocar.




 Salazar, de raízes humildes, vingou por mérito próprio, por ser um aluno de altíssimo gabarito, destacando-se como jurista e professor de Finanças. Chegou ao poder imbuído de uma visão para Portugal, que aplicou como soube e pôde, sujeito ao erro, evidentemente, que Salazar não se julgava a si próprio acima de Deus, muito embora Marcelo Caetano tenha dito, nas suas exéquias fúnebres, que estávamos acostumados a ser governados por um homem superior. Salazar foi-o.

  E como nunca é demais lembrar -e tanto incómodo causa porque vivemos entre gente desonesta, a quem a honestidade faz mossa-, Salazar representou, sim, a dedicação em prol da Nação sem qualquer interesse pessoal subjacente. Salazar serviu Portugal. Como o prelado dedica a sua vida às causas de Deus, Salazar descobriu a sua real vocação e dedicou-se às causas da Nação. 

  Há cinquenta anos, perdemos, sobretudo, um dos últimos grandes portugueses. A partir de Salazar, esfumou-se a dignidade na política. Tudo o que veio depois, e foi tão mau, apenas vem ajudar à exaltação -lúcida e esclarecida- deste homem. Homenagem lhe seja feita.

25 de julho de 2020

Sylvester (1947-1988).


   Sylvester James foi um cantor da disco sound e um activista pelos direitos da comunidade LGBT. Eu tê-lo-ei descoberto provavelmente nalguma das minhas incursões pelo Youtube. Sendo sincero, não me recordo. O que me atraiu na sua figura foi o pioneirismo que encabeçou, assumindo-se como homossexual muito antes de que outras figuras públicas o fizessem, e a morte trágica por que passou.
 
    Em 1987, no talk-show da comediante Joan Rivers, Sylvester anunciou que se iria casar com um homem. Uma revelação bombástica e ousada para a época, como se depreenderá. Por um terrível infortúnio, Sylvester viria a falecer no ano seguinte, em 1988, vitima de complicações decorrentes do VIH/SIDA.
 
   Sylvester, que se recusava a ver a si mesmo como drag queen (a Joan Rivers, quando confrontado com o rótulo, exclamou somente: "I'm not a drag queen. I'm Sylvester!"), será mais conhecido pelo seu sucesso musical de finais dos anos 70, que ainda hoje é um dos maiores êxitos das pistas de dança. Falo-lhes de You Make Me Feel (Mighty Real). A partir de então, a carreira de Sylvester não conheceria outro sucesso tão estrondoso, muito embora o cantor tenha gravado vários álbuns até ao final da sua vida. O último dos quais foi Mutual Attraction, de 1986, que justificou então a comparência do performer no programa de Rivers, por forma a promover o trabalho.
 
Sylvester, algures por 1986
 
    Não há muito material de Sylvester na internet. Tive imensa curiosidade em ver entrevistas suas no Youtube e nada encontrei. A única que há, a Joan Rivers, mostra uma pessoa feliz, delicada no trato e na postura, profundamente enamorada do seu companheiro, Rick Cranmer. Aliás, outro facto caricato é que Sylvester acabou por revelar, à nação americana, a sexualidade do seu parceiro, arrancando risadas da plateia e proporcionando uma brincadeira de Rivers. Por aqueles dias, estávamos na passagem de ano de 1986 para 1987, e Cranmer, o companheiro de Sylvester, já se sabia doente de VIH. Morreria ao largo de 1987. A Sylvester, entretanto, ao menos não parecia haver qualquer inquietude. Vislumbra-se apenas uma pessoa que se diverte em palco, confortável na sua pele e na sua sexualidade, vivendo uma história de amor.
 
    Sylvester, que foi uma das primeiras pessoas a falar do VIH e a actuar na recolha de fundos para a doença, sucumbiria dela. É fatídico. Foi a triste realidade de muitos homossexuais, transexuais, travestis e por aí fora naqueles tempos. Sem qualquer medicação realmente eficaz e sob um enorme preconceito social, o único caminho era a união de todos os que por aquela tormenta passavam. Recorde-se que Ronald Reagan só falara pela primeira vez da SIDA (AIDS, em inglês) um ano antes, em 1985, após a morte de Rock Hudson, um conhecido actor que inclusive pertencia ao núcleo de amigos do Presidente. O desconhecimento acerca da doença imperava.
 
    Julguei conveniente dar-lhes a conhecer um artista que não devia ser tão ignorado quanto presumo que seja.

23 de julho de 2020

Amália, o centenário.


   Assinala-se, hoje, o centenário de Amália Rodrigues. Desde o dia 1 de Julho, decorre um ciclo de espectáculos, iniciativas e encontros evocativos do legado da Rainha do Fado que, pelos próximos doze meses, dará a conhecer mais da faceta pessoal e artística do nome maior que Portugal, pelas artes musicais, exportou.

   Como se tal fosse determinante na avaliação do seu percurso, discute-se actualmente qual a verdadeira convicção política de Amália. Mais uma evidência de um país minúsculo (em todas as acepções) que ainda não está em paz com o seu passado. Certo e relevante é que Amália conseguia chegar aos corações de todos quantos a ouviam, independentemente de idiomas e proveniências. Foi assim com soviéticos e japoneses, emocionados sem entender nada daquilo que a cantora exprimia nas suas actuações. Dispensam-se atitudes redutoras, e nem Amália as merece.




   Por um tempo, houve quem se intitulasse herdeiro de Amália. Verdade se diga, muitas vezes o rótulo era-lhes atribuído sem qualquer manifestação de mera intenção das suas partes. Amália, entretanto, foi mais do que o género musical; Amália foi -é- a personificação do fado. Não deixou descendência. 

  Recordamo-la não apenas pela sua voz, única, como pela sua graciosidade espontânea e postura pública. Amália era toda uma persona singular, nos trejeitos, nas gargalhadas, nos trajes, sem nunca ter perdido a humildade e inclusive ingenuidade de menina que cantarolava e encantava os bairros de Lisboa enquanto vendia laranjas com a mãe e os irmãos.

   Da minha parte, descobri-a no dealbar de uma adolescência que se viria a verificar terrível, e, longe de enjeitar tudo o que fosse popular e nacional, deleitava-me ao som dos belíssimos poemas que entoava, alguns escritos por si. Seria injusto nomear canções. Nas palavras de um dos seus poetas favoritos, David Mourão-Ferreira, os mais belos versos cantados por Amália eram aqueles que haviam saído do seu punho. Uma faceta de cançonetista que muitos desconhecem.

   Amália, enfim, um nome irrepetível que soará para sempre nos nossos corações.

22 de julho de 2020

Um breve ponto de situação.


   A minha estadia em Espanha está prestes a completar cinco meses. Cidadãos comunitários, inclusive, necessitam de dar conta às autoridades espanholas de que passaram a residir em território nacional. Tal implica a emissão de um N.I.E -número de identificación de extranjero-, que já possuo.

  Gosto do meu apartamento aqui. É amplo, arejado, ensolarado. Disponho, aliás, de um escritório confortável e bem decorado (é subjectivo), do qual lhes escrevo. Comprámos dois móveis em bordeaux para os livros. Às paredes, que encontrámos de um verde-alface que nos desgostou, imprimimos uma cor cinzento-claro. O aparador e a mesa de escritório são em preto. Duas reproduções, uma de Sorolla e outra de Delaunay, conferem vida e cor ao espaço. Um antúrio e um apontamento de flores secas dão o toque final. Esta divisão foi completamente idealizada e decorada por nós. Era, com efeito, a única que considerámos mal-aproveitada e manifestamente feia. Não sendo um apartamento luxuoso, é moderno, bem apetrechado, com umas vistas lindíssimas sobre o maciço ourensano.

  A vizinhança é simpática. O lugarejo, como referi noutros momentos, é pequeno. Em todo o caso, há quatro supermercados, várias cafetarias (já sabemos que os espanhóis a levam melhor), duas papelarias-livrarias e algum outro comércio. Vive-se bem. Viver aqui, aliás, é um desafio para mim. Vindo de uma cidade como Lisboa, passar para o meio rural envolverá sempre um período de adaptação, facilitado na medida em que não possa afirmar que tenha sido propriamente feliz ao largo dos últimos anos, admitindo que alguma vez o fui. Para lhes ser sincero, experiencio uma tranquilidade como há muito não conhecia.

  Foi uma reviravolta, absolutamente. Inusitada, porque não programada. Há detalhes a acertar que se prendem ao meu percurso académico, nomeadamente, e a outros aspectos. Resquícios de coisas que deixei para trás, e algumas exigirão uma resposta pronta. Nada de muito difícil, acredito eu. Estou a ser lacónico de forma deliberada.

   O que aperta o meu coração, claro está, é a minha mãe, que ficou por lá. Gostaria de a ter comigo, o que não é possível por ora. Falamos várias vezes ao dia, às vezes por mais de uma hora. Ajuda a matar as saudades. E foi aí que se deu a outra mudança brusca: o corte do cordão umbilical. Está a ser mais fácil do que supus, também porque tenho um apoio bastante forte deste lado. O que não deixa de ser curioso é que a vida se encarrega de nós. Por tantas e tantas vezes me queixei aqui, neste mesmo espaço, de que precisava de um safanão, passo a expressão, e ele lá se deu. No fim de contas, foi bom para ambos, para mim e para ela.

  Desde que aqui estou, leio mais, passo menos tempo na internet. Tenho outras responsabilidades. O cãozinho. E é interessante ir tendo a percepção da mudança. Longe de passar despercebida, quase que a apalpo com os dedos. É uma sensação estranha e simultaneamente excitante, afinal, sou capaz de mais do que julgava. O meu eu virtual deu lugar ao meu eu real, e o eu virtual ocupa o tempo que saudavelmente deve ocupar. 
  É bastante provável que este processo todo tenha pouco de surpreendente e seja comum a muitos, contudo, é algo que me merece esta reflexão.

14 de julho de 2020

Allariz, ¡qué pueblo bonito!


   No domingo passado, a convite de um casal amigo, fomos a uma das vilas mais encantadoras que pude conhecer recentemente: Allariz. Não dista muito daqui, mas ainda exige um percurso razoavelmente moderado de carro para se chegar lá.

   O que mais me seduziu em Allariz foi a sua atmosfera vibrante, natural, com um rio que a atravessa - o Río Arnoia. Por lá, jovens e menos jovens aproveitavam a claridade daquelas águas e banhavam-se. 



  
  As ruas estão impecavelmente limpas. Vim a saber, a posteriori, que Allariz foi, durante anos, governada por nacionalistas galegos, pelo BNG. Compreende-se que o discurso nacionalista aluda ao caso bem sucedido da vila para fazer propaganda pela independência da Galiza.



  Após um mui simpático lanche numa esplanada de jardim, onde pudemos beber algo refrescante e comer gelados de fruta fresca, escolhemos um restaurante à beira-rio, convidativo. A comida, excepcional; o atendimento, bom... A um português, habituados que estamos ao nosso trato formal e distante, os jeitos espanhóis poderão parecer rudes, agressivos. Eu também sou levado, e mal, a pensar assim. São apenas e tão-só diferentes de nós.



  "Primeiro estranha-se, depois entranha-se", diz o povo e digo-o eu. Para o final, o empregado já se desfazia em simpatia, convidando-nos, até, a ficar um pouco mais, assim o quiséssemos, que ainda demorariam a fechar. Os seus derradeiros gestos de acolhimento tê-lo-ão salvado, provavelmente, de uma crítica minha mais contundente pelas redes sociais. Digamos que se redimiu bem.



    Chegámos bastante tarde a casa, contudo, o passeio mais que valeu a pena. Também o Diesel se divertiu com as suas orelhas ondeando ao sabor do vento. Na viagem de regresso, mal se mexia. O cansaço havia igualmente tomado conta de si.



   Se andarem pela província de Ourense, não deixem de conhecer Allariz. Garanto-lhes de que não se arrependerão.

7 de julho de 2020

Tempos difíceis.


     Andava eu perdido nas minhas memórias, hoje à tarde, e dei por mim a reflectir no quão dramático tem sido este século, logo desde 2001, com o ataque ao World Trade Center. No mesmo ano, mais tarde, a Guerra do Afeganistão. Em 2002, tivemos o desastre ecológico aqui na Galiza. No ano seguinte, a invasão do Iraque. Em 2004 e 2005, mais ataques jihadistas na Europa, em Londres e Madrid. Perdi-me. Sei que, pelos anos seguintes, tivemos a intervenção na Líbia, ataques em Paris, na Bélgica, uma crise económico-financeira global que nos levou à bancarrota e à intervenção externa... Um sem-número de peripécias. Não bastando, agora, uma pandemia de um vírus misterioso. Ontem mesmo, li sobre ameaças de surtos de peste negra na China, uma doença bacteriana que actualmente é facilmente curável. Aonde iremos parar?

    Há um ano por estes dias, imaginávamos que estaríamos assim? De máscaras sanitárias na cara e gel nas mãos (e que tanto pão têm dado a comer a quem vive disso)? Temos mais do que razões para temer o futuro próximo. O apocalipse, retratado na sétima arte e na literatura, cada vez mais é uma fantasia que assumimos como possível, vistas as coisas. Não querendo ser fatalista, que epidemias, crises e guerras houve muitas, o que temos, efectivamente, é a escalada galopante na sucessão de acontecimentos. E ainda só levamos vinte anos! Nas guerras, dispomos hoje de arsenal bélico capaz de destruir o planeta em menos de nada. As crises levam ao endividamento praticamente crónico das famílias, ao surgimento de bolsas de pobreza que torturam as pessoas e as impedem de competir num sistema tão exigente, impiedoso e avassalador. As doenças, bom, pense-se no globalismo e na facilidade com que qualquer vírus, à mercê da democratização no acesso às viagens, tem de se propagar de um continente para o outro e o outro em poucas horas.


  Acreditávamos -os que perdiam tempo com isso- que provavelmente desapareceríamos como os dinossauros, devido ao impacto de um meteorito; quiçá quando o Sol deixasse de consumir hidrogénio, aumentasse de tamanho e, por fim, explodisse e engolisse a Terra; ou ainda com o dito aquecimento global, que inviabilizaria a manutenção da vida tal qual a conhecemos. Afinal, a hipótese parcamente especulada de doença pandémica começa a ganhar forma. Quando surge uma doença nova, multiplicam-se as exigências de vacinas. E se elas nem sempre chegarem? Veja-se o VIH/SIDA, cuja cura foi dada como garantida durante anos, e que só ao fim de mais de 30 milhões de mortos conseguimos torná-la crónica, não obstante, com todos os condicionamentos.

   De um lado, gozamos de liberdade como nunca antes se vira. Saímos e gostamos de sair. Vivemos melhor, o que se traduz em férias que os nossos avós nem sonhariam, idas a restaurantes, bares, ginásios. Do outro, é bastante provável que tenhamos de aprender a viver com restrições, mais isolados. É nesse confronto e nessa contradição -liberdade e reclusão?- que se jogará a nossa sobrevivência.

5 de julho de 2020

Nintendo Switch.


   Em Março, ainda antes do confinamento forçado e forçoso, comprei uma Nintendo Switch, a última consola de jogos da Nintendo. A bem dizer, última porque é a mais recente, que a consola já tem uns anos. Recentemente (2017/2018), a Nintendo (re)lançou a Nintendo e a Super Nintendo Classic Mini. Adquiri ambas.

    As consolas de jogos da Nintendo fizeram parte da minha infância. Tive várias, desde as velhinhas NES e SNES até à (também velhinha já) Nintendo 64. Em 2003, por pouco não comprei a Nintendo GameCube. Acabei por não o fazer porque o funcionário do El Corte Inglés nos aconselhou, a mim e aos meus pais, a comprar a PlayStation 2. Uma escolha errada, como se viria a verificar. Nessa consola da Sony, apenas joguei um único jogo, o Ratchet e Clank 2. Comprei o terceiro jogo da saga, contudo, não o terminei. Adiante. Mais tarde, afastei-me das consolas, e perdi aquele período da Wii e da Wii U. Acredito francamente que a separação dos meus pais e toda a instabilidade  e turbulência emocional do período 2006/2010 para isso tenham contribuído. A faculdade e as novas exigências levaram a que, definitivamente, deixasse de me interessar por jogos. As redes sociais serão outro motivo.



  Interiorizei que, afinal, a minha cena, em linguagem juvenil, é a Nintendo e os seus jogos, particularmente, ou apenas, os do Super Mario. Adoro o universo do Mario e dos seus companheiros. Neste momento, desde Março porque acumulo o jogo com leituras, brincadeiras com Playmobil e outras actividades, ando a jogar o New Super Mario Bros U Deluxe, uma versão moderna do Super Mario Bros 3, considerado pela crítica especializada como um dos melhores jogos de sempre (da lista, entre mais um ou outro do Mario, consta ainda o Super Mario 64, que adorei igualmente). No New Super Mario Bros Deluxe, temos, como noutros jogos da saga Super Mario, de salvar a Princesa Cogumelo das garras do arqui-inimigo do Mario, o Bowser. Para isso, claro está, há que ultrapassar uma série de níveis inseridos num universo de mundos.

   O que me atrai tanto nos jogos do Mario é a continuidade que a saga mantém desde o primeiro jogo, lançado lá por 1985. Há as eternas semelhanças nos inimigos (os Goombas, entre tantos outros), nos itens que se ganham (os cogumelos, que nos permitem crescer; as flores, que nos conferem a capacidade de lançar bolas de fogo...), nos personagens, no design... Cada jogo parece -e é- uma versão refinada e nova dos antigos, o que à primeira vista pode parecer aborrecido, mas que para mim, no inverso, é altamente estimulador. 

   Logo que termine o NSMBD, tenho outros dois à minha espera, e são eles o Super Mario Maker 2 e o Super Mario Party.

   A avaliação que faço da Nintendo Switch é positiva. Foi excelente a ideia de tornar a consola num 2em1: fixa e portátil, ou seja, é tendencialmente portátil; quando a inserimos no carregador, torna-se fixa, e assim podemos ligá-la ao televisor. Apenas me aborrece a multiplicidade de comandos quando queremos jogar com mais um jogador. A parte do tira-comandos e põe-comandos é um tanto ou quanto stressante, uma vez que há que configurá-los. Claro, o lado bom é que, caso algum se estrague, podemos comprar outro sem que isso afecte a consola em si. O NSMBD é um jogo 2D. Temos mais um motivo que nos leva a regressar ao passado, isto para quem, como eu, tem uma estória com os jogos do Mario.

    Há mais fãs do universo Nintendo e, em particular, do Super Mario por aí?

2 de julho de 2020

Da intolerância e da democracia.


   Uma actriz da nossa praça desfilou pelas avenidas de Lisboa com um deputado conotado à extrema-direita. Uma artista que se queixa de não lhe permitirem trabalhar há dois anos por ter decidido expressar livre e publicamente as suas convicções político-ideológicas. Uma actriz cujo talento é frequentemente posto em causa tão-só por se expressar nos seus espaços de opinião. Parece causar perplexidade em qualquer um. As perseguições movidas pela intolerância com posturas contrárias às maioritárias, admitindo-se que o são, comprometem a convivência saudável em democracia. Fala-se em revolução, em liberdade de expressão, de opinião, e percebemos que verdadeiramente existe, sim, uma ditadura da maioria

   Portugal tem um déficit democrático conhecido. Os portugueses foram criados em meio do medo, da censura, e aprenderam a dar uso às mesmas armas. Em Abril de 1974, fez-se uma revolução contra um regime autoritário, e por pouco não se instalou outro. Em 1975, elegeu-se uma assembleia que redigiu uma Constituição democrática de fortíssimo teor socializante, que inclusive colocava a então embrionária democracia sob tutela militar, num quadro que se manteve até 1982. Propriamente dita, a democracia portuguesa não tem nem quarenta anos. As décadas de repressão deixaram o seu rasto na ausência de uma cultura democrática. Assim mesmo, mais de quarenta anos de um regime conservador e autoritário originaram anti-corpos que se manifestam em torno de qualquer um que se identifique com o conservadorismo ou que perfilhe uma linha ideológica apartada do socialismo, inclusive da social-democracia.

   O fenómeno das redes sociais, sobretudo após 2010, ajudou a incrementar uma intolerância que tem as suas raízes na falta de cultura democrática e na longeva ditadura conservadora e autoritária. Confunde-se reacção política com desmerecimento e insulto, como se um pressupusesse o outro, como se o combate político se fizesse necessariamente às custas do achincalhamento, e nas redes sociais, para exponenciar o alcance e obter apoios.

  Não haverá democracia perfeita, sem vícios, no entanto, cabe-nos a nós, diariamente, aperfeiçoá-la. A democracia não é uma ideia que se teoriza, uma palavra que se profere e se inscreve na lei. A democracia concretiza-se na tolerância e na consagração, protecção e defesa das liberdades individuais e colectivas. Por todos, constantemente, ainda que o uso dessas liberdades por outros colida com a nossa sensibilidade e o nosso entendimento. Caso contrário, criamos uma sociedade que pretensamente se intitula de democrática, sem que contudo o seja. Fala-se de uma ditadura com vestes de democracia, que se alimenta da perseguição nas colunas dos jornais, nas redes sociais. Fala-se das novas minorias, perseguidas pelas antigas. Afinal, não assentará a história da humanidade na substituição contínua entre vítimas e verdugos?