Timor-Leste comemora os dez anos da sua independência. Historicamente, para sermos correctos, há dez anos assistiu-se a uma restauração da independência da antiga colónia portuguesa. Em 1975, aproveitando a onda de descolonizações que se fazia sentir em todo o decrépito império português, Timor proclamou unilateralmente a sua independência, sendo invadido, dias depois, pela Indonésia, que anexou o recente país ao seu território, reclamando-o como mais uma das suas províncias.
Timor-Leste em nada estava relacionado com a Indonésia, dividindo com esta apenas o mesmo espaço geográfico, a mesma ilha, a ilha de Timor. A Indonésia foi colonizada pelos holandeses, que aí formaram a sua colónia vastíssima, as Índias Orientais Holandesas. Por seu turno, Timor-Leste manteve-se como território português, o que lhe preservou uma identidade própria, distinta, equiparável a outros antigos domínios portugueses. Timor, desde logo, tinha a sua língua própria, com influências da língua portuguesa, o tétum; tinha a sua religião, católica, inversamente à Indonésia, de larga maioria muçulmana. Todas estas características únicas demarcavam as diferenças: Timor era uma realidade distinta da Indonésia.
Ignorando a situação frágil de uma pequena nação cobiçada por um vizinho ambicioso - e aproveitando o clima de Guerra Fria que se vivia pelo mundo - a comunidade internacional fechou os olhos à ocupação ilícita e a todos os títulos reprovável por parte da Indonésia. Houve uma condenação formal, da Assembleia-Geral das Nações Unidas, num pedido encabeçado por Portugal, mas, na prática, nada foi feito para que os indonésios se retirassem imediatamente do território timorense.
Após décadas de repressão e de violência atrozes, a comunidade internacional foi olhando para a causa timorense. Organizou-se um referendo e, finalmente, o povo timorense escolheu o seu caminho, optando pela independência total e incondicional, o que se veio a verificar em Maio de 2002.
O mais recente país do mundo (até perder o lugar para o Sudão do Sul) tinha - como tem - vários desafios por enfrentar. Reconheceu oficialmente a língua portuguesa como sua língua oficial, ao lado do tétum, num gesto de reconhecimento e amizade incondicionais para com Portugal. A língua portuguesa, fortemente reprimida e praticamente extinta nas camadas mais jovens da população timorense durante a ocupação indonésia, foi reabilitada, sendo este reconhecimento como um agradecimento implícito a Portugal. A língua indonésia foi ensinada aos jovens, todavia, os guerrilheiros da FRETILIN e os mais velhos recusaram-se a usá-la, mantendo o português como a língua da guerrilha, da resistência. Hoje em dia, professores brasileiros e portugueses têm como missão o ensino da língua aos mais jovens. O número de falantes aumenta gradualmente, embora os jovens educados na língua indonésia resistam em aprender o português. A título de curiosidade, no caso de dúvidas na interpretação de alguma lei, entre o tétum e o português, prima o português.
Não deixo, por fim, de salientar a responsabilidade de Portugal em cada segundo de ocupação indonésia em Timor. Abandonado pela sua metrópole, e longe desta, Timor foi ocupado devido à negligência portuguesa, num território em que tinha a obrigação de defender contra qualquer invasão externa. Assim como nos antigos domínios africanos - cujas guerras civis subsequentes às independências são da total responsabilidade portuguesa - também em Timor podemos imputar todo o sofrimento à má administração de Portugal.
Os anos que se aproximam são de um enorme desafio. Timor-Leste é um país pobre, carecendo de infraestruturas a todos os níveis, incluindo o mais elementar. Porém, que ninguém duvide da força do seu povo. A força não se mede no tamanho, no número de habitantes ou nos apoios que se consegue: a força habita na coragem, na determinação, na vontade de se ser soberano.
Timor acreditou; Timor venceu.
Desculpa não ter vindo cá muitas vezes Mark,não tenho estado muito pela blogosfera,mas obrigada pelos comentários anteriores e tudo =)
ResponderEliminarE já agora: porra que conhecimento não te falta =O
Sabes mesmo muito de história (e eu que estudo história em línguas e humanidades.. isto é uma vergonha para mim lol).
Gosto de ver assim conhecimento,e ainda por cima,de forma a dar motivação a nós,ao povo português!
Post de 5 estrelas =)
Beijinho*
Portugal pelas ex-colónias nada podia fazer na altura, nós tinha-mos os nossos próprios problemas e sinceramente acho que na altura o processo de descolonização foi uma confusão e devia ter sido com mais calma e mais organizado, mas nós pelo menos ajudamos Timor tarde mas ajuda-mos bem.
ResponderEliminarMark:
ResponderEliminarGostei muito de ler o que escreveste sobre Timor.
Mas foi derramado muito sangue até que aquele amargurado povo conquistasse a sua independência.
Portugal pouco olhava por aquela colónia, até 1974.
O povo português foi muito solidário com o povo de Timor aquando da invasão indonésia.
Mas houve tanta coisa mal explicada, tanto sofrimento...
E agora o interesse internacional existe porque existe petróleo...
Deixo um nome para, se assim o entenderes, pesquisar sobre o que terá acontecido... "Maggiolo Gouveia".
Um abraço com muito apreço :3
Mark:
ResponderEliminarColoquei o vídeo do Represas sobre Timor mas... remeti o texto para este teu espaço que tanto gosto.
Desculpa fazê-lo sem te ter pedido autorização.
Mas as tuas palavras são... imprescindíveis.
Abraço com todo o carinho :3
Belo texto e excelente análise fáctica.
ResponderEliminarAdoro este teu espaço :)
ResponderEliminarAbraço amigo
Qualquer descolonização portuguesa foi uma confusão política e social, com excepção feita a Macau. No caso de Timor, simplesmente não tinhamos a estrutura necessária.
ResponderEliminaresqueci-me de mandar abracinhos :)
ResponderEliminarComo sempre, exímio nas explanações dos dados históricos que conduziram a um determinado facto.
ResponderEliminarExcelente!
Sonhadora: Obrigado, querida. :)
ResponderEliminarBeijinho. *
Antony: Sim, ajudámos, não existam dúvidas acerca disso. Ajudámos após a ocupação indonésia. Eu apenas culpabilizo a má administração colonial e a descolonização apressada e mal feita. Também é inadmissível que Timor estivesse praticamente abandonado em 1975. :(
Pedro: É uma honra que faças referência ao meu artigo. :)
Sim, a cobiça nas riquezas naturais de Timor-Leste também ajudou ao impasse. Não nos esqueçamos do reconhecimento da ocupação indonésia por parte da Austrália. Atitude, aliás, que me magoa. A Austrália é um país que aprecio. Depois lá alterou a sua posição...
Abraço e muito obrigado por tudo. <3
Anónimo: Obrigado. :)
Francisco: Obrigado. :3
Abraço. ^^
Speedy: Disseste tudo. As descolonizações foram uma confusão! Compreendo que não tivéssemos militares suficientes para assegurar uma boa cobertura do território, mas, se Timor não estivesse abandonado aquando do 25 de Abril, quem sabe as coisas não teriam sido diferentes... :/
Abracinhos. :33
João: Muito obrigado. <3
toda a descolonização processou-se com violência, física e psicológica, em 75, Portugal estava em rebuliço total, Timor, o velho e cansado crocodilo, estava muito longe. a Indonésia invadiu e Portugal e a comunidade internacional calaram-se. lembro-me de uma reportagem de uns jornalistas australianos que foram mortos pelos indonésios em 75. existiram muitas reportagens sobre isso, mas só há poucos anos, após a independência de Timor, é que voltaram a ter importância.
ResponderEliminaro massacre de Santa Cruz em 91 foi o mote para abertura de olhos, mas passariam anos até, efectivamente, ser um país livre.
e precisa da nossa ajuda.
bjs.
Margarida: Sim, disseste tudo: foi após o Massacre de Santa Cruz que a comunidade internacional passou a olhar para a causa timorense. Até lá - e devido ao facto da Indonésia ser um importante parceiro estratégico dos E.U.A naquela zona do globo - ninguém se preocupou com o genocídio em Timor. A muito se deveu, também, o fim da Guerra Fria e a extinção da U.R.S.S e de todo o bloco de leste, porque, mesmo com o massacre, se não tem terminado a Guerra Fria, duvido que Timor-Leste fosse um país independente...
ResponderEliminarBeijinho. *