As diferentes perspectivas que pode ter o mesmo quadro traz-me à memória de que cada um vê aquilo que lhe é nítido aos sentidos. E, mudando-se os tempos, muda a vontade de estar do lado de lá ou de cá da mesma cena, irrepetidamente vivida, como um disco que teima em passar a mesma música. Antes fizera sentido.
Pela janela, quando a madrugada deu lugar à luz pálida da manhã, vi a chuva enquanto o reflexo da luz do candeeiro tornava as gotículas em pequenos prismas reluzentes de cores que variavam entre o rosa e o amarelo. Quis fechar o trabalho no computador, já em modo stand-by, e sair à rua. Agir como em criança, quando erguia a cabeça e deixava que a água molhasse toda a roupa, para desespero da mãe que não conseguia domar a minha impaciência. Enquanto desfiava lembranças pelo filtro ilusório das recordações que teimam em estar presentes, decidi que iria sair de casa mais cedo do que o previsto.
As poças, enlameadas, pediam para que as pisasse, num gesto de rebeldia que não me pertence. A tempo, consegui afastar-me de um carro que, impetuosamente, passou com as suas rodas pela berma que acumulava a chuva pela falta de um bueiro. A intensidade que abrandara, recomeçara de novo, levando a que procurasse abrigo por baixo de um toldo vermelho, roto, que pouco demorou para que começasse a trespassar a água, desbotando a cor da tinta dos apontamentos que levava na mão. Algumas palavras ficaram imperceptíveis, numa estranha coincidência com o teor da matéria a decorar. Também ela desaparece para dar lugar a detalhes mais significativos.
Arrependi-me de não esperar pela mãe. E o metro que está tão longe... Quis ter a liberdade de soltar os apontamentos à rajada de vento suão que se fez sentir no momento. A consciência não mo permitiu. Se alguém me resgatasse com um guarda-chuva, a única premissa seria a de não ser eu a levá-lo.
Conformado com a ideia de que não poderia esperar mais, saí em direcção à estação, no momento em que o temporal deu lugar, de novo, à chuva fina.
Para quebrar esta monotonia da chuva, só me apetecia ouvir o fado do mesmo nome, da Marisa...
ResponderEliminarSim, o fado "Chuva" é lindíssimo. (:
ResponderEliminarMuito bom gosto, João. *.*
^^
Claro que como quase toda a gente, detesto andar à chuva. Mas gosto de guiar à chuva, dentro da cidade.
ResponderEliminarCoelhinho: Também adoro estar à chuva dentro do carro. Sentir a chuva no vidro, agitadas as águas pelo pára-brisas. (:
ResponderEliminarTudo é mutável e está em constante movimento, meu caro...
ResponderEliminarBlog Liker!!! :), sê bem-vindo. :p
ResponderEliminarJá tinha saudades tuas. <3
:):)
ResponderEliminar:)))))
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