20 de setembro de 2010

Anti-Praxes



Hoje foi o dia das praxes na minha faculdade. Como escrevi anteriormente, eu sou totalmente contra essa tradição que considero obsoleta e arcaica. Mas, desafiado por uma amiga que vai para o mesmo curso que eu, decidi ir para assistir a uma (uma vez que nunca tinha visto) e, se quisesse, talvez participar. Ela disse-me que tinha ouvido dizer que era tudo muito soft...
Pois bem, aqui vão as minhas considerações sobre o «soft» (direito que me assiste no meu blogue): vi um ritual de humilhações consecutivas, em que «caloiros» eram sistematicamente abusados pelos «veteranos» (da falta de educação e respeito...). Obrigados a fazerem coisas que não queriam, coajidos com ameaças de idas a «Tribunal de Praxes» (ridículo!). Ao obterem o diploma que certifica a aprovação nas praxes, ainda são obrigados a assistir a uma cerimónia dispensável, com discursos lidos por «veteranos» que mal sabem ler!... Entretanto, há um Corredor da Morte (figura sinistra), em que «caloiros» são sujeitos a perguntas indiscretas e a sevícias que me indignaram, nomeadamente o acto de beber uma bebida duvidosa por uma concha de sopa que passou por dezenas e dezenas de bocas (imaginem-se as doenças). No meio disto tudo, o mais levezinho foram as pinturas, farinhas no cabelo, tintas, rebolarem no chão, na terra molhada, etc, etc, etc.
Numa das cerimónias, os «caloiros» foram obrigados a jurar de mão no peito serem - e passo a citar - «bestas, seres inferiores», etc (não decorei mais).
É isto o espírito de fraternidade, companheirismo e altruísmo?
Claro que eu, indagado por uma «veterana», assinei o manifesto anti-praxes. Fui a única pessoa em todas aquelas dezenas que por ali passaram. Alguma vez deixaria que me humilhassem de forma cruel e desumana? Era o que faltava! Ainda me disseram que desta forma iria ser olhado com desdém... Ai, estou tão preocupado! Não queriam que eu assistisse, devido ao facto de não participar. Mas eu defendi bem a minha posição. Que raio de «veterana», não teve conversa para mim!... Pude observar. Queria ver ao que as pessoas se sujeitam. Olha eu a rebolar no chão frio, levar com balões d'água, cheirar terra molhada... Para ficar doente, provavelmente, porque sou asmático desde bebé.
A minha amiga saiu de lá enjoada, a tossir e toda suja. Acabou por me dar razão.
Para concluir: eu sou contra as praxes, creio que já deu para entender. Respeito quem faz e quem gosta de participar, mas vi - vi - pessoas a quererem desistir e a serem literalmente ameaçadas por «veteranos», o que as levava a continuar. Também vi pessoas a tomarem atitudes contrárias à sua consciência à sua dignidade pessoal (uma ambientalista foi obrigada a cortar plantas, mesmo dizendo que não queria!!!).
Isto é horrível. Não há nada que pague a nossa honra, a nossa liberdade e o nosso direito à não participação num espectáculo degradante, imoral e inquisitorial.

6 comentários:

  1. Eu concordo ctg. Eu por acaso fui às praxes mas tb não gostei muito daquilo. Mandaram-nos fzr ´n´ cenas, tipo flexões e comer pão embebido em vinho e tal. Eu fiz na boa pq tou habituado a desporto por causa de jogar futebol. Mas haviam lá uns gajos que tavam-se a passar =)

    Bom blogue. Continua.

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  2. Aproveitem, é a melhor fase da vida académica. Depois vêem as regras.

    Eu também não gostei de algumas das coisas que me mandaram fazer e não morri; quando pude praxar limitei-me a não fazer aos outros o que não gostei que fizessem comigo.

    Mas a fase de caloiro foi sem dúvida espectacular.

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  3. Concordo plenamente. É um espectáculo tão degradante e ridículo. Onde é que já se viu tratar-se os “praxantes” por “doutores”? E essa do código das praxes e do tribunal é muito engraçada. Isso não tem qualquer valor aos olhos da lei, até porque pelo seu conteúdo é inconstitucional.
    Eu fiquei profundamente chocado com o que vi hoje e com relatos de colegas. É pura humilhação, como disseste, e é ainda uma coisa que eu reparei hoje – tem um extremo carácter sexual, onde os “doutores” dão largas às suas fantasias. Ao que parece as praxes também não escapam a um certo sexismo e homofobia.
    Mas na minha opinião os caloiros são tão maus como os “praxantes”. É que muitos, apesar de não gostarem, deixam-se humilhar, deixa-se tratar abaixo de cão. Para irem às festas e para trajar, vendem a sua dignidade e a sua honra. Mas que gente é esta que se vende assim? É este o futuro de Portugal? É que se for, vou já reservar passagem para o Reino Unido ou assim. É que parecendo que não, isto reflecte-se no futuro do país, em parte já se reflecte porque estes “cidadãos” já podem votar. É que não são as infra-estruturas e uma boa economia (que nem é o caso) que fazem um país desenvolvido e civilizado, é o seu povo.
    Há ainda a actuação do governo. O ministro Mariano Gago limita-se a enviar cartas alertando os reitores para estas práticas a que chega a apelidar de fascistas, no entanto não tem coragem de as proibir. Já têm morrido pessoas, já foram violadas caloiras… não sei mais o que é preciso para isto ser proibido.
    A imagem do post foi muito bem escolhida.
    Um bem-haja, Mark. Enquanto houver pessoas lúcidas e civilizadas em Portugal, há esperança.

    P.S - Desculpa o testamento.

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  4. Tomás: Pão embebido em vinho? Ugh! Para além de ridículas, as praxes são de gosto duvidoso. :) Lol

    Eu: Não estou a gostar muito da fase de "caloiro", mas vou esperar uns tempos para dizê-lo convictamente. :) Não gostei das praxes, todavia, posso vir a gostar do ambiente, no geral. :)

    Francisco: O teu testamento é sempre bem-vindo e está correctíssimo. Nada há a acrescentar ao que disseste. E a homofobia e o sexismo de que falas também eu pude observar: um dos caloiros foi claramente chamado de (nunca usei esta expressão no blogue) "paneleiro". É revoltante e repugna. Em relação ao "Tribunal de Praxes" e aos seus "códigos": é tão ridículo que dá vontade de gargalhar. É totalmente inconstitucional. Nem podia existir. Mas, para eles, tamanha é a lavagem cerebral, isso existe mesmo! 'Tadinhos...

    Obrigado pelas tuas últimas palavras. Se me permites, és um querido. :))

    Um bem-haja e um abraço.

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  5. Quando entrei para a universidade, ia cheio de medo. Felizmente, houve pessoas civilizadas no meu curso. A praxe durou apenas umas breves horas, meteu pelo meio uma aula fantasma, e terminou com um almoço na cantina para integrar o pessoal. Breve e simpático, apesar de tudo.

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  6. Essa sim é uma praxe soft, Blog Liker. :) Para mim, as praxes - quanto muito - deveriam ser apenas um almoço ou algo do género. Nada, mas nada do que se vê actualmente.

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