22 de setembro de 2018

Danny (1987) & La Pudeur ou L' Impudeur (1991).


   No meu sétimo dia de Queer, escolhi dois documentários sobre o HIV / SIDA, na Cinemateca, um tema preferencial nesta vigésima segunda edição do festival de cinema, por ocasião do ano em que se assinala o trigésimo aniversário sobre o primeiro Dia Mundial de Luta Contra a SIDA (1 de Dezembro de 1988).

   Danny, de 1987, é uma curta realizada por Stashu Kybartas. Não é um filme; é um documentário de 20 minutos sobre um amigo de Kybartas que morria de SIDA (em itálico porque, como sabemos, ninguém "morre de SIDA"). Danny Sbrochi, de seu nome, passava os dias na praia, com amigos, até ao pôr-do-sol, tinha um bom apartamento e conduzia o carro dos seus sonhos. O consumo de cocaína, que o levava a partilhar a mesma seringa com mais cinco rapazes, ou a promiscuidade, uma das duas, estiveram na origem da infecção pelo HIV que o vitimaria em 1986. O documentário ficou incompleto e saiu ao público no ano seguinte, em 1987.

  No que respeita ao impacto visual, é fortíssimo. Danny está já no estágio de SIDA, com múltiplas lesões na pele causadas pelo Sarcoma de Kaposi, um raro cancro que afecta aquele órgão do corpo humano. Faz tratamentos de quimioterapia que o enfraquecem mais. A Kybartas, vai partilhando receios e revelando pequenos sonhos, nomeadamente viver uma grande paixão sem ser atormentado pelo vírus terrível. Lembrou-me o Robert, personagem de Geoff Edholm em Buddies (1985), que vi há dias e cuja crítica publiquei aqui. Em comum, todos aqueles rapazes tinham um desejo: viver o suficiente para poder experienciar a cura, que hoje, quase quarenta anos desde os primeiros casos, em 1981, continuamos sem conhecer. No caso em concreto, Danny quer voltar para casa dos pais, para morrer junto da família. Teme a reacção dos progenitores, que não sabem da sua orientação sexual e ainda menos que está com SIDA.
  É um documentário interessante também pelas técnicas de realização. Imagens, algumas das quais de Danny saudável, que se detêm, fixas no ecrã, enquanto o som corre normalmente, talvez com o intuito de redobrar o impacto que a deterioração física do rapaz produz em nós.


   La Pudeur ou L'Impudeur  seguiu-se a Danny. Aliás, foram ambos exibidos como um único corpo. É um documentário de 1991, realizado pelo escritor, novelista e guionista francês Hervé  Guibert (1955-1991), que também veste as peles de actor principal numa campanha solitária que encabeçou por breves meses antes de morrer. Nele, Guibert, com a sua própria câmara, amadoramente, mostra-nos cenas do quotidiano, inclusive da sua intimidade. Vemo-lo a cuidar da higiene, na cama, nas consultas médicas, com as tias-avós. É, no fundo, o olhar de um homem que sabe que vai morrer e que quer deixar algo para a posterioridade. O que mais perturba, devo dizer, é vê-lo cadavérico, bastante combalido pelos efeitos do vírus e dos tratamentos, agressivos e ineficazes, já em fase final de SIDA - todo o documentário acompanha as suas derradeiras semanas. La Pudeur ou L'Impudeur é, também, uma obra de extraordinária motivação. Sem nunca desistir, ainda que por vezes fale em suicídio, Guibert procura exercitar os músculos, fazer ginástica, mexer-se, dizendo-nos, a determinado momento, que todos os dias descobre mais um movimento corporal que não consegue executar.

Hervé Guibert (1955 - 1991)

   Este documentário foi realizado simultaneamente com a escrita de Le Protocole Compassionel, onde Guibert também aborda a SIDA, e precedido por um outro, À l'ami qui ne m'a pas sauvé la vie, no qual revela a sua condição clínica. Mon vale et moi encerrou a trilogia literária dedicada à infecção. Podemos, então, inferir que a mesma o ocupou nos últimos dois anos de vida.
   É um diário muito, muito pessoal. Vemos um homem que se despe e que mostra, sem pudor, o seu corpo raquítico, pondo-se nu e pondo a nu, perante todos, os horrores da morte pelo HIV / SIDA. HIV que, sete anos antes, em 1984, vitimara outro grande vulto das letras francesas e  seu amigo pessoal, Michel Foucault.

   Sábado, 22, é o último dia de Queer. Esperam-me dois filmes.

4 comentários:

  1. Para mim, foi uma doença criada em laboratório... Os Gays nos EUA já estavam a ganhar muito poder... Brevemente virá aí outra :) A Europa caminha para lá a passos largos... Conheço alguns seropositivos que foram contaminados de propósito... Onde anda a solidariedade entre os gays?!

    Ainda bem que tens gostado do queer, infelizmente não tenho podido ir :(

    Abraço e diverte-te para os mais dois filmes de logo ;)

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    1. Eu acompanho a teoria da transmissão do vírus para os humanos através dos símios. Não faz grande sentido essa teoria da conspiração, até porque o HIV pode afectar qualquer um. Os grandes símios têm um vírus semelhante. Isso não faz grande sentido. Também criaram um vírus de laboratório para os macacos?

      Tenho adorado!!

      Um abraço, e obrigado. :)

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