16 de junho de 2019

Rocketman.


   Continuo embrenhado no estudo, acreditem, mas, a par da Feira do Livro 2019, cujas visitas lhes darei conta em publicação ulterior, ontem fui ao cinema ver o mais recente filme biográfico sobre Elton John.

   Filmes biográficos sobre cantores e actores estão na moda. Recordem-se do recente Bohemian Rhapsody, sobre Freddie Mercury, e teremos, já em Agosto, Variações, sobre o nosso portuguesíssimo António Variações, precocemente falecido. Entretanto, ontem soube que, brevemente, irá estrear um filme sobre July Garland. Hollywood e a indústria nacional apostando em peso em biográficos, que geralmente não são grandes arrasos nas bilheteiras, ou não eram, que o filme sobre Freddie vendeu como ginjas. 

   Elton John, Sir excêntrico Elton John, nasceu no seio de uma família tradicional inglesa de classe média. Como muitas destas estrelas que, mais tarde, despontam em toda a sua excentricidade, a sua infância não foi fácil. A mãe, mal amada pelo marido, dedicava-se a escapadelas fortuitas, e o pai era de uma frieza e distanciamento emocional doentios. Negava um abraço ao próprio filho. Essa falta de afeição imprimiu as suas marcas em Elton John, a ponto de este manifestar certa fúria quando ouvia referências ao seu verdadeiro nome, Reginald Kenneth Dwight, porque provavelmente o faziam recordar a dura infância, mitigada apenas pela existência de uma avó que o apoiava e incentivava nas primeiras incursões pelo mundo da música. Mais tarde, Elton, pese embora a mãe o tivesse avisado de que não encontraria o amor levando uma vida de homossexual, pensou que seria num determinado produtor que encontraria a paz e o equilíbrios necessários, apercebendo-se, a tempo, que não passava de números para o calculista homem que dele se aproximou.

  Tentativas de suicídio depois, a Elton, à revelia do que se passava a nível pessoal, profissionalmente nada podia correr melhor. De canção em canção, ia pondo o mundo rendido aos seus pés, incluindo a difícil América. Com o sucesso, vieram a riqueza e os excessos. Droga, álcool, amantes. Sabemos que, hoje, Elton vive um relacionamento feliz, antigo, tendo constituído família e manifestando intenções de, em breve, deixar os palcos para se dedicar mais aos seus.




   Contrariamente a Bohemian Rhapsody, de argumento duvidoso e só salvo pelo desempenho de Rami Malek, Rocketman tem uma prestação fenomenal do actor principal na pele de Elton John, Taron Egerton, e um argumento bom, dinâmico, o que ajuda a tornar o resultado final positivo, para mais sendo um musical.

  O filme tem algo de surrealista e mágico, pela postura de Elton, pelas sua caracterização e roupagens, com cenas bem idealizadas, dramáticas o suficiente e bem interpretadas. Destaco uma, e agora com poucos spoilers, em que Elton, em criança, se vê a dirigir uma orquestra. Há uma perspectiva de sonho que o motivou, que o levou a correr atrás da sua projecção e reconhecimento. 

  É uma excursão pela vida do artista, e a sexualidade, a sua sexualidade, é explorada sem grandes moralismos. Elton não se aceitava bem de início, porque, a partir do momento em que passa a fazer sucesso no mundo da música, descobre-se. E o sucesso vai sendo desflorado com passagens pelos seus maiores hits. Senti a falta de alguns clássicos, contudo, como Nikita. Ponto alto também para a abordagem à sua amizade e colaboração de cinquenta anos com Bernie Taupin, que se mantém até aos nossos dias. Ainda em comparação com Bohemian Rhapsody, senti algo de profundamente íntimo e real, sem o hedonismo de Freddie Mercury, ou que quiseram imprimir à personagem de Malek no grande biográfico que antecedeu Rocketman. Elton John parece mover-se por circunstancialismos da sua infância traumática, ao passo que Freddie Mercury busca apenas a satisfação pessoal, o que é mais do que válido, evidentemente. Ambos terão sofrido, direi eu, com a falsidade e o imediatismo da indústria, onde ninguém se demora.

  Rocketman é como uma paleta de cores. Elton, um poderoso pincel, de concretização imprevisível, mas sempre fantástica.

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