20 de setembro de 2018

The Silk and the Flame.


   Jordan Schiele trouxe-nos, dos confins da China, um documentário a preto e branco. Nas sociedades orientais, sabemos que a família tem uma importância acrescida. E é aí, numa pequena localidade do interior daquele país imenso, que conhecemos a estória de Yao, um rapaz oriundo de uma família humilde que, a custo, consegue emprego em Pequim. De tempos em tempos, no caso do documentário para festejar o Ano Novo chinês, visita a família, hospedando-se na casa dos pais. O pai, de bastante idade, passou por dois ataques apopléticos que o deixaram incapaz de cuidar de si próprio e a mãe sofre de surdez desde pequena. Não é um ambiente fácil para Yao. Há a acrescer as expectativas que depositam em si: a mãe pressiona-o imenso para que case e constitua família, só que Yao é gay.

  Yao ama profundamente os pais. Sofre por não corresponder às expectativas da sua família e da sociedade chinesa em geral, num país onde mais de 90 % dos homossexuais acabam por se casar com mulheres (pelo menos, foi a informação que Jordan Schiele, que esteve presente e falou sobre o documentário, no final, em pessoa, veiculou). O documentário nasceu precisamente desse conflito entre o seu "eu" e as convenções sociais. A determinado momento, Yao vê-se obrigado a mentir para contornar, ainda que por tempo limitado, as pressões.


   Em jeito de monólogo, e só aí em inglês, que o documentário é todo em mandarim (com legendas em inglês), Yao vai-nos contando o seu percurso desde criança. Descobrimos que não é o filho predilecto e que, inclusivamente, o seu nascimento resultou de uma violação da lei. Vigorava, na China, a política do "filho único". Os pais de Yao já tinham dois filhos.

   Essa angústia é visível no seu olhar, na mão trémula enquanto pega no cigarro, no discurso vago e pausado. Se não será fácil ser-se gay em países da Europa ocidental, o que diremos numa sociedade tradicional como a chinesa.
   A fotografia, realçada pelo "preto e branco", é outro dos pontos altos do documentário. O "preto e branco" quase que nos despe as personagens. Torna-as mais nítidas aos nossos olhos, porque os contornos do rosto e as expressões faciais ganham outra dinâmica, que as cores roubam.

   Foi-me igualmente engraçado ver o choque cultural. Na aldeia de Yao, Jordan - que grava o documentário - é o primeiro estrangeiro. A mãe de Yao, astuta, faz sucessivas referências ao seu fenótipo ocidental.
   Embora relativamente distante de tudo, alguns familiares de Yao demonstravam estar bem informados sobre a política norte-americana. Senti essa politização, quando mais não fosse pelas múltiplas fotografias de Mao Tsé-Tung espalhadas pelos cómodos da casa.

   O documentário não correspondeu às minhas expectativas, mas surpreendeu-me. Votei-o e dei-lhe 7 pontos. Merecidos, no meu entender.

   Amanhã, há mais Queer.

4 comentários:

  1. Aprecio muito a sétima arte de países alternativos ...

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    1. No caso, o realizador é norte-americano, e não é um filme; é um documentário. :)

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  2. Infelizmente não consegui ir ver :( excesso de trabalho

    abraço amigo

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