4 de outubro de 2016

A corrida ao secretariado-geral da ONU.


   António Guterres, ex-Primeiro-Ministro de Portugal e ex-Alto-Comissário para os Refugiados, decidiu-se a apresentar uma candidatura ao secretariado-geral das Nações Unidas. A ONU, que conta presentemente com 193 Estados-membros, surgiu da nova ordem internacional emanada com o fim da II Guerra Mundial; o seu Conselho de Segurança, órgão máximo, espelha a hegemonia de cinco Estados sobre os demais 188, totalmente alheada da realidade actual, não faltando vozes que se ergam defendendo uma reforma que inclua uma representação mais abrangente e igualitária.

    A eleição do Secretário-Geral não é democrática. O Conselho de Segurança conta com quinze membros, sendo que cinco são permanentes, sendo eles a Rússia, a China, os Estados Unidos da América, o Reino Unido e a França. Com o veto de um deles, o candidato não consegue obter a unanimidade exigida para ser recomendado ao cargo; um cargo que, refira-se, assenta mais no protagonismo e na influência do seu titular. Tendencialmente, espera-se que um Secretário-Geral seja uma figura idónea, moderada, discreta e que saiba utilizar o protagonismo do cargo em benefício da organização, isto é, do bem comum.

    Guterres granjeou a simpatia internacional e tem-se posicionado como favorito. A bem ver, venceu cinco votações, embora com alguns votos de "desencorajamento". O Conselho de Segurança já se pronunciou numa primeira votação e, ao que tudo indica, Guterres terá alcançado o apoio de doze dos quinze membros, o que aponta para a aprovação de, pelo menos, três dos membros permanentes. Para ver o seu nome aprovado na Assembleia Geral das Nações Unidas, o candidato terá de obter nove votos positivos entre os membros do Conselho de Segurança, sendo que nenhum membro permanente poderá obstar à sua recomendação.

    Gostaria de evitar dar ênfase à polémica em torno da candidata búlgara surgida inesperadamente, e que contará com o apoio implícito de Jean-Claude Juncker, Presidente da Comissão Europeia, e de Angela Merkel, a chanceler alemã, de quem se diz ter tentado persuadir a Rússia a apoiar Georgieva.
   Sabemos, ou pelo menos suspeitamos, como são os meandros destas negociações que visam assegurar a tranquilidade necessária que aproveite às potências. Georgieva é mulher, tem ciente que se espera um Secretário-Geral do antigo leste europeu, mas também tem presente o carácter tardio e inusitado da sua candidatura que, embora não seja ilegal e nem ilegítima, será injusta. A substituição de Irina Bokova foi oportuna; Kristalina Georgieva, sendo Vice-Presidente da Comissão Europeia, reúne o apoio daquele órgão comunitário e, seguramente, de uma ala do Partido Popular Europeu.

     Ser eleito Secretário-Geral das Nações Unidas não implica qualquer favorecimento ao país do qual o candidato escolhido é nacional. O nomeado, ou a nomeada, assegurará que os seus actos visarão acautelar o bem-estar no seio da comunidade internacional. Exige-se, assim, que seja alguém ponderado, sem polémicas que possam melindrar o seu mandato. Entre os candidatos que, verdadeiramente, estão na disputa, Guterres e Georgieva, creio que não será difícil vislumbrar qual preenche os requisitos impreteríveis para um responsável exercício do cargo. A campanha de Guterres tem sido tão prudente e recatada como o próprio. A tradicional mesquinhez político-partidária faz com que, dentro de fronteiras, haja algum desconforto com a possibilidade de um socialista ser o mais alto dignitário das Nações Unidas - e só o nega quem é leviano ou, na melhor das hipóteses, ingénuo e incrédulo.

     O dia de amanhã, 5 de Outubro, em que assinalamos mais um aniversário sobre a República implantada em 1910, poderá ser determinante para António Guterres. Uma decisão que se lhe fosse favorável acarretaria, por inerência, prestígio ao nosso país. A visibilidade de um Secretário-Geral das Nações Unidas não encontra paralelo para lá dos Chefes de Estado e de Governo dos países mais poderosos. O meu optimismo é moderado. Em expectativa, faço votos para que impere o discernimento.

13 comentários:

  1. Só tenho a dizer o seguinte, acho um desprestígio para a ONU aceitar candidaturas "fora de prazo". É como se a instituição apoiasse países autoritários, ao dar o mau exemplo.

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    1. É... Digamos que se trata de um cozinhado entre a Alemanha, a UE e, parece, a Rússia. Vamos ver.

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  2. Vamos ver o que acontecerá :)

    Grande abraço amigo

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    1. Não creio muito numa "vitória" de Guterres. A não ser o escolhido, a maior derrotada será a transparência no processo.

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  3. Essa votação poderia ser feita de uma forma menos complexa, tantos votos e nada decide. Estranho diria eu.

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    1. Concordo. Mas, sabes, é um processo árduo e meticuloso...

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  4. Digam eles o que disserem, a entrada tardia da tal concorrente é uma verdadeira "batota". Que exemplo estão os altos dirigentes a dar ao povo? Ela está a ser imposta pela Alemanha. Porque não entrou logo no início da corrida? Porque esperou até agora para ser conduzida? Francamente, fiquei aborrecido por ver que até numa organização respeitável como a ONU se deixa levar por jogos de bastidores e de poder.

    Abraço :3

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    1. Sim, é uma "batota"; no entanto, repara, saiu-lhe "o tiro pela culatra", a ela e à chanceler alemã. Oito votos negativos.

      No final, fez-se plena justiça.

      um abraço. :)

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    2. Foi uma vitória bem merecida! Mesmo sendo algo infantil, apetece-me pôr a língua para fora e dizer à senhora Merkel: "Bem feito!" [risos]

      Um abraço. :)

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  5. Bem, verbalizaste o que eu sempre pensei, que a ONU não era uma coisa lá mt democrática xD

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