13 de outubro de 2013

Rumo.


    Os últimos dias têm passado lentamente. Passarão à velocidade de todos os outros. Parecer-me-ão maiores pelo uso que lhes dou, mais centrado nos livros e nos apontamentos do que em pura distracção com trivialidades. Não consigo explicar o motivo que me leva a dedicar-me mais. Não sei se será revolta ou ambição. Pressa em acabar, talvez. Mal encaro aquelas paredes sufocantes. Ora acredito que gosto mais, ora apercebo-me de que procurar o mínimo de interesse por ali será em vão.

   A bibliotecária teve de me chamar à atenção. Não dei pela hora. Restava eu, ela, e a noite lá fora. Pelos corredores, alunos novos e menos novos, professores e funcionários. Há vida a horas tardias. A movimentação surpreendeu-me desde o início, embora conhecesse o horário nocturno. Não voltar imediatamente para casa ajuda a que não pense em detalhes que só me atormentariam. Ficar numa secretária, por entre os livros, é um isolamento consciente, seguro, controlável. Pouco cansativo. Mantenho a matéria em dia, o que não me leva a aumentar o ritmo. Chego a antecipar capítulos.


    O P. conseguiu um lugar numa residência universitária. Habitará um espaço com mais oitenta pessoas. Está preocupado com o acesso à internet, que soube lenta, e com a adaptação. Dividirá o quarto com um rapaz. O dia de hoje foi todo ele preenchido com os últimos preparativos para a viagem e acomodação. É, sem dúvida, bem mais aventureiro e ousado. Não conseguiria ter aquela determinação. Esforço-me pelo que quero, afinal, estudo, dedico-me, mas ele faz sacrifícios substancialmente maiores. Não será fácil deixar o conforto do lar, a comida da mãe, o cão que adora. Conhecendo-o como o conheço, já o vejo sentado ou deitado a fazer os trabalhos de casa, empenhado. Não é de festas. Cederá, não sem um grande esforço, a alguma noitada. Disse-me que o ambiente com os colegas é tão bom que já poderia considerá-los como uma grande família...

   Em contrapartida, tenho procurado resguardar-me de contactos com colegas. Relaciono-me com o grupinho de sempre, restrito, fazendo ainda assim um esforço com vista à progressiva desvinculação. Não sou de grandes conversas. Sendo auto-suficiente, prefiro dirigir-me a um professor caso tenha dúvidas acerca de um manual, de um artigo, de uma palavra que perdi do discurso. E descubro a cada dia um prazer enorme em estar só. Tem sido muito gratificante.
    Na biblioteca, há dias, um rapaz, que sei do terceiro ano, reparou com insistência em mim. Ambos esperávamos por vaga nos computadores. Olhando, chegou a anuir com a testa, franzindo-a, tentando comunicar comigo por estarmos à espera de lugar. Falei dele por aqui, num episódio no refeitório pelo ano lectivo passado, creio. O radar dele apitará, certamente, bem como o meu. Levo por aí. Bom, o tal radar apita imensas vezes, tal a quantidade. Somos mesmo muitos e, curiosamente, ao que sei, dos melhores. Faz recordar o papel das mulheres, discriminadas, que, tendo acesso à educação, suplantaram os homens no ensino superior. Há quem canalize o preconceito para se destacar, para vencer. Continua a fazer sentido.

        Terei de reflectir com muito cuidado em relação ao meu futuro, nos aspectos profissional e pessoal.
 
        Descobrir um rumo.

24 comentários:

  1. tenho a certeza que esse rumo te surgirá naturalmente... não penses muito, segue apenas o teu coração! ;-)

    Abraço

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    1. Trocaria tudo o que sei por uma certeza qualquer...

      abraço, Rúben.

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  2. Vc tem que se divertir mais. Acho que tá estudando demais. Vc é aplicado, estudioso mas a vida é bem mais que isso :) Não fique triste pelo seu amigo sair fora da cidade. Senti isso em suas palavras :/

    Abraços!

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    1. É o meu feitio. Sempre fui aplicado. Não ando triste; ando meio que perdido, enfim.

      E sim, sinto a falta dele. Muita.

      Obrigado.

      abraço.

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  3. Tu fazes-me lembrar um pouco eu, na adolescência e início de juventude, muito dedicado aos estudos e quase anti-social. Depois a vida deu-me uma volta de 180º.
    Desejo o mesmo para ti, mas só se não fores agora feliz.

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    1. Nunca fui 'anti-social', excepto por estes dias... Dedicado tenho sido desde sempre, mais agora.

      Custa-me afirmar que não sou feliz porque sei de pessoas que não têm dinheiro para estudar, para comer, para vestir. Sou um privilegiado. Mas não basta, não é...

      Obrigado, Alex. ^^

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  4. Querido Mark, que cerebral! Às vezes é preciso ir com a maré e a alguma praia havemos de chegar. Tenho mais-que-certeza que tudo está compostinho e guardado para ti, demore o tempo que demorar.
    E, se estudas onde penso que estudas, qualquer dia ainda nos cruzamos. xD

    Abraço! :)

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    1. Espero que tenhas razão. :)

      Oh, será um prazer. Se me reconheceres, fica à vontade e aborda-me. Quem me conhece sabe que tento ser simpático e, olha, até rima, afável.

      abraço. :)

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  5. Sabias que és fantástico?
    Não tens que recear.

    Um teu fiel leitor de há muito, mas sem coragem para fazer um blog.

    Diogo

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    1. Olá Diogo.

      Obrigado pelas palavras, mas devo dizer que não sou nada fantástico. Tenho imensos defeitos. :) O carinho de pessoas como tu, esse sim, é fantástico e aumenta, de certo modo, a minha responsabilidade por aqui.

      um abraço.

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  6. Eu vendo mapas lolololololololol

    Mas, posso te oferecer um no dia 19 ;)

    Abraço

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    1. Não sei se poderei ir no dia 19. :| Este sábado não estive com o P. e quero ver se estou no próximo. Ainda não confirmei com o João, todavia, tudo farei para estar presente.

      abraço, Francisco.

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  7. lembras-te no jantar? disseste algo parecido com a frase que está no fim: 'há quem canalize o preconceito para se destacar, para vencer.'
    revejo-me muito no P. e já agora em ti, eu também queria acabar o curso rapidamente. bom, passaram-se vinte anos num piscar de olhos.
    vai correr tudo bem, encontrarás o teu rumo, o P. parece-me um bom pólo magnético ;)
    bjs.

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    1. O tempo passa realmente muito depressa. Por incrível que pareça, já começo a senti-lo...

      Sim, recordo-me vagamente de ter dito algo do género. Quero terminar rapidamente. A rotina começa a perturbar-me...

      É, ele é bastante determinado e isso torna-se uma alavanca. :)

      beijinho.

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  8. Bem, diz ao P. que os receios dele sobre a internet numa residência se irão confirmar. Na residência de estudantes onde vivi a net era da U+ e era uma verdadeira porcaria (para não utilizar outro termo, que iria macular o teu blog... lol). Webcams é uma das coisas que simplesmente não dá...

    Quanto ao quereres acabar rapadimente, acho que já to disse várias vezes: ainda vais ter saudades desse tempo!

    Grande Abraço :)

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    1. Sim, para mais é wireless. Outra coisa não se esperaria...

      Duvido que venha a ter saudades. Não estou realmente a gostar desta etapa universitária. Eu sou um pouco diferente da maioria dos estudantes, sabes. Não retiro prazer em copos e noitadas.

      abraço grande. :)

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    2. Olha que não é dos copos e noitadas que sinto falta. Também não era muito disso (duas, três saídas por semestre, e não mais que isso).

      Sinto falta dos amigos essencialmente. Do levantar-me e saber que ia encontrar aquelas pessoas, que iamos almoçar juntos e muito possívelmente jantar. Erámos uma família. É disso que tenho saudades: daquela família :)

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    3. Compreendo e é excelente quando é assim. Na minha faculdade, pelo menos com quem me relaciono, não há esse espírito. Somos colegas. O P., por exemplo, disse-me que no politécnico que frequenta há esse espírito. :)

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    4. Sim, talvez ajudado pelo facto de tu não estares "fora de casa", ou seja, não precisas de criar laços, como eu e outros (e possivelmente o P.) necessitam.

      Sempre ouvi dizer que os amigos da faculdade são os que ficam para a vida por essa razão. E cada vez tenho mais a certeza disso, apesar de estarmos longe e já não estarmos juntos como estávamos dantes!

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    5. Exacto, é isso mesmo. Quem está fora sente essa necessidade.

      Eu acredito que as amizades universitárias perdurem. São diferentes das do liceu, por exemplo. Ele está muito entusiasmado com os novos colegas, e eu, bem, eu estou cheio de saudades e com um pouco de medo de perder o lugar...

      :/

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  9. pensa, mas não penses demais, pensar demasiado traz problemas!
    Força e boa sorte!

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    1. É verdade, a vida deve fluir naturalmente. Sou demasiado metódico...

      Obrigado e igualmente!

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  10. Tudo tem o seu tempo certo, se ainda não encontraste o teu rumo é porque ainda não estás pronto para saberes exactamente o que queres fazer. Mas na altura certa, vais ver que ele surgirá como uma epifania e tudo se encaixará como num puzzle perfeito. :)

    Abraço Mark.

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