O período de apresentações orais e de entrega de relatórios está a terminar. Findo este ano lectivo, será correcto dizer que fico a meio caminho de uma pós-graduação, faltando, para a completar, a tese, que será o mais importante.
Recordo-me de por várias vezes referir que esta área surgiu por casualidade, quando confrontado com as únicas opções que tinha pela frente, atendendo àquilo de que gosto. Na altura, há cinco anos, pesou mais a razão do que a emoção, e uma das minhas paixões por excelência acabou por sucumbir diante de uma ciência mais ou menos desconhecida para mim, ainda que tenha juristas por perto. Fui bem sucedido, avançando cadeira ante cadeira, caso contrário teria mudado de imediato. Todavia, encarava o estudo, a necessidade de me formar, mais como uma obrigação do que como um gosto, um prazer, que verdadeiramente não tinha ao abrir os livros de milhentas páginas que tive de ler ao longo da licenciatura. Aprendi, enriquecia-me, mais do que enriquecer o currículo; folha morta, quantas e quantas vezes não justifica o que as pessoas sabem, a experiência ganha pela vida. Daí que tenha decidido, e sem hesitar, que não enveredaria por nenhuma profissão em Direito. Quando não estamos de corpo e alma no que fazemos, quando não sentimos o que designo por chamamento, o dito apelo, não vale a pena. Teria orgulho no que, porventura, viesse a conquistar, usaria em meu benefício, mas tão-só.
Já nas aulas de mestrado, sem a necessidade de saber para demonstrar conhecimento, preocupado inteiramente em aprender, contactei com um lado do Direito que me surpreendeu: afinal isto pode ser giro, bastando para isso estudar com alguma curiosidade, encanto, o que não revelei por anos. Tratando-se de me especializar num ramo do Direito que, de certa forma, me prendeu mais a atenção, volta e meia relacionei as vertentes e percebi o mundo de possibilidades que estava diante de mim. Mais do que útil, e mesmo estando já explorado, com muita doutrina elaborada, ainda há o que descobrir, contributos a dar. Não quer isto dizer que já me convenci em trabalhar na área - não, decididamente não o pretendo fazer, e os lugares a que me venho candidatando bem o evidencia.
Em semanas decisivas como estas - e lembrando-me da opção que fiz, precisamente há um ano, em seguir pelo mestrado em Penal - pondero talvez ficar com o que tenho, trabalhar, ou tirar uma pós-graduação em Jornalismo (não, não está esquecido). Conjugar as duas últimas, o que seria ouro sobre azul. Sem sombra de dúvida, não seria minimamente feliz exercendo qualquer profissão jurídica, tampouco seria um bom profissional, uma vez que não é suficiente ostentar um cv sem mácula; é preciso gostar, não ter objecções existenciais.
Vejo-me numa redacção, vejo-me como pivot de telejornal (com o revés da fama, que rejeito). Um noticiário qualquer durante as madrugadas ou no alvorecer, as horas em que ninguém os vê. Ter a minha vida pessoal escancarada na primeira capa de um jornal, mesmo sem "nabos na púcara", passo a expressão, é assustador. E sair à rua para comprar pão e ser abordado por x e por y, mesmo em dia manifestamente 'não', e ter de ser risos e simpatias, cinicamente, não faz o meu género. Que dilemas!, quando pouco se é de atrevido para a vida. Sou recatado, aprecio a calçada quando os demais atravessam a estrada principal, não procuro fama e nem dinheiro (não mais do que o essencial para ter uma vida digna e algo desafogada). Posso apresentar o noticiário e depois desaparecer?
Como queria ser como os demais, que estudam, começam a trabalhar, simples e felizes, cheios de certezas e de rectas a delimitar. Tudo em mim tem sido o caos. O ganha-pão não seria diferente.
Quando terminei a licenciatura senti-me feliz. Afinal de contas, tinha entrado numa área que à partida teria pouca, ou nenhuma, empregabilidade, mas fi-lo por paixão e realização pessoal. Era um sonho de criança. Embora não fosse um estudioso compulsivo, lá me ia dedicando, umas vezes mais, outras nem por isso. Satisfeito com o que consegui alcançar e ciente de que podia fazer mais, lancei-me para o mestrado numa outra universidade - ah e tal, é bom diversificar o CV, tretas! - e foi a desilusão derradeira. Fiz o primeiro ano com óptimas notas, mas não aprendi nada de novo... E a tese? Quase a terminar, menos de 20 páginas, imagine-se, desisti. Não me revia no que escrevi, embora tivesse o animismo dos meus orientadores por trás. Essa é a fase menos boa de uma dissertação e por isso fica o conselho: desenvolve um trabalho sobre algo que gostes mesmo, caso contrário, só terás dores de cabeça. Hoje, sou licenciado e com uma pós gradução - sim, o primeiro ano do curso de mestrado serve para isso -, mas arrependo-me de ter mudado de universidade. ;)
ResponderEliminarHá um ano, terminando a licenciatura, senti-me bem, claro está, mas sem aquelas euforias e manifestações de júbilo que muitos dos meus colegas não tentaram sequer esconder - e é natural que assim seja. Publicam nas redes sociais, enfim, como que soltando o grito de alívio. Eu senti esse alívio, moderada e recatadamente.
EliminarNunca tive "sonhos de criança". Dizia, em menino, que queria ser advogado. Mais por não saber bem o que dizer. Mal eu sabia.
Jornalismo seduz-me bastante, sobretudo nas vertentes que mencionei: redacção ou televisão. Jamais faria entretenimento - que sequer é jornalismo. Vejo-me, com efeito, num noticiário. Atrai-me.
Em Direito é ligeiramente diferente. Com um primeiro ano de mestrado não tens a pós-graduação. Informalmente tê-la-ás, mas de pouco te vale. A frequência de mestrado abre-te algumas portas, apenas. É preciso concluí-lo, apresentar a tese.
Eu acho que o mais importante é você seguir o que você gosta, é o mais importante. Estudar, fazer faculdade de uma matéria que não te deixará feliz não é o certo, só vai te trazer tristeza. Se você quer ser jornalista, pois tente, faça seu mestrado e procure um lugar que te deixe cada dia com um sorriso no rosto. Aí ganha seu dinheiro e ainda faz o que gosta. Tem melhor que isso? :)
ResponderEliminarAbraços!!
É isso que eu sinto. O certo seria ir à procura do que verdadeiramente gosto, mas depois temo "jogar fora", utilizando uma expressão comum por aí, anos de trabalho e de estudo. Sei que os anos são impiedosos e não dão margem a arrependimentos.
Eliminarum abraço. :)
Fiz o curso que fiz mais ou menos por coincidência, essencialmente porque entrei na faculdade com média de 11 valores e as opções não eram muitas. Ainda assim, terminei com 13 valores, num curso de engenharia onde, a média é (ou era) praticamente irrelevante na empregabilidade. Ainda assim fiz com entusiasmo e com a noção que os meus pais estavam a fazer um grande sacrifício e que, portanto, tinha que acabar nos 5 anos.
ResponderEliminarO percurso, foi uma sucessão de coincidências, sorte e muito trabalho (mesmo muito).
Fiquei muito feliz por concluir nos 5 anos. Gostava de vida de estudante mas queria ser independente. Comecei na mesma semana a dar aulas para não ficar parado. Ao fim de 6 meses fui empregado numa boa empresa de produção porque, tinha curso de engª, porque fruto do meu percurso pessoal falava bem francês (era empresa francesa) e porque o estado suportava 50% da remuneração dos estágios. A partir dai foi sangue, suor e lágrimas, mas compensou. Saltei sempre de empresa em empresa, numa evolução positiva nas responsabilidades e salário.
Hoje faço o que gosto (não o que alguma vez pensei gostar) e sinto-me realizado.
Tudo isto para dizer que apenas controlamos parte do nosso percurso (com trabalho e dedicação), tudo o resto é fruto do acaso, das coincidências e da sorte.
Mas também acho que quando se quer muito e se está disposto a abdicar de certas coisas, podemos controlar o nosso percurso na quase totalidade.
A minha sobrinha mais velha está por esta altura a candidatar-se à faculdade. Sempre me disse, " não sei o que hei-de escolher", "gosto disto mas não tem saída", etc. A minha resposta foi sempre, faz o que realmente gostares, o resto vem por arrasto!
Se tudo correr bem entrará em Relações Internacionais. Tem jeito natural para falar e motivar. Boa sorte sobrinha e boa sorte Mark.
Em tudo há os factores sorte e trabalho. Nem sempre o trabalho dá os frutos que desejamos - sobretudo na actual conjuntura em que vivemos. Era bem mais fácil ser bem sucedido nos anos noventa do século passado. Nos dias que correm, uma licenciatura não garante emprego. E a média, no escrutínio, revestiu-se de uma importância quase doentia!
EliminarObrigado, Goody, e boa sorte para a tua sobrinha. :)
Este país vai perdeu um grande juiz :(
ResponderEliminarForça nessas tuas motivações
Abraço grande amigo Mark
:))) Amigo Francisco, de uma forma ou de outra não seguiria a magistratura. Mas muito obrigado pela consideração!
Eliminarum grande abraço.
Se soubesse o que sei hoje, teria feito tudo de forma diferente, acho que a minha formação ficou logo condicionada quando em 92 vim para o continente. Por vezes penso muito nos "ses" da vida, não estou arrependido mas há uma infinidade de coisas que me despertam a atenção que quando tive que optar por algo, segui com a que estava no meu processo de escola...segue o que mais gostas :D
ResponderEliminarEstou disposto a isso, mas muito teria de mudar. Em primeiro lugar, comunicar aos pais, dado que ainda careço financeiramente deles; de seguida, redefinir a minha vida. E também estou ciente de que não é fácil entrar neste meio. :)
EliminarSabes, mesmo sendo um jornalista de sucesso, não quer dizer obrigatoriamente que viesses a ser abordado na rua assim tantas vezes. Muitas pessoas, pelo que conheço do ambiente das celebridades, respeita a privacidade das pessoas ditas "famosas". É certo que existem sempre aquelas pessoas que parecem "emplastros", mas isso será uma grande minoria. :P
ResponderEliminarSim, é verdade, e os jornalistas sempre passam mais discretos (bom, temos o caso da Judite de Sousa, cuja vida pessoal é explorada pelos media até à exaustão).
EliminarO que perturba mais é o assédio da imprensa. Muito invasivo.
Podes sempre interpor uma providência cautelar, para evitar esse tipo de situações. Sendo tu um doutor de leis, nada mais fácil! :D
EliminarNão tens obrigação de o saber, Mikel, mas o âmbito de aplicação de uma providência cautelar é restrito e a valoração, no caso, entre interesse público / livre expressão e dano do ofendido é sempre de um juiz. Claro que, evidentemente e em situações em que seja necessário acautelar o bem e prevenir uma lesão grave e irreparável, pode haver lugar a uma providência cautelar. :)
EliminarFiquei sem perceber se tudo ficou acertado ou se ainda estás no caos ;)
ResponderEliminarCuriosamente julgo a área de direito penal a mais atractiva, a mais bela e trabalhosa, a mais desafiante e enriquecedora! mas tens toda a razão quando falas em se estar de corpo e alma (seja no que for), muito embora, infelizmente, isso seja cada vez mais um ideal e não algo a que simplesmente possamos almejar e ter...
No que ao lado público diz respeito de determinadas profissões, sem dúvida que há um preço a pagar, mas pessoalmente prefiro a liberdade do anonimato...
Keep going... and think less ;) O que sentimos verdadeiramente, geralmente aparece com clareza...
Hugs
Nada ficou acertado por ora, mantendo-se o caos. Devo dizer que todos os anos por esta altura fico assim, sem saber que passo dar.
EliminarPenal é o ramo do Direito de que mais gostei, seguindo-se Constitucional. Não sei se será a mais trabalhosa, mas tem uns meandros que encantam facilmente. É complexo, como qualquer ramo do Direito. Mexe com os nossos piores instintos, não os explicando, mas desvendando-os e punindo-os.
Não há nada como o doce anonimato. :)
Obrigado, Daniel. Um abraço. :)
E já não és famoso Mark'zinho? :P Já tens muitos leitores por aqui!
ResponderEliminarGosto desta fase das pessoas, cheias de projectos, horizontes, ideias, dúvidas, estudos etc. Sabe tão bem fazer planos e sonhar :) Boa sorte para as tuas escolhas :) Acho que terias imenso sucesso no jornalismo, talvez não como pivot, mas assim num programa mais intimista ou então, quem sabe, num programa como o "Lugar da História".
Oh, alguns leitores. :)
EliminarSabes, mas shiiuuuu, é segredo: um deputado já deu com o meu blogue, bem como uma escritora, que até quis, em 2010, utilizar um texto meu num livro que pretendia publicar (com os devidos créditos, claro está). Recusei precisamente porque não quis ficar "conhecido".
Bem, um espectador já teria: tu. :) Obrigado, Namorado.