15 de outubro de 2022

Contas simples, Senhor Presidente.


   Marcelo Rebelo de Sousa deu um tiro no pé. O maior, direi eu, desde o momento em que tomou posse como Presidente da República, no seu primeiro mandato, com a diferença de que está no segundo, o último, permitindo-se a estas e outras afirmações, estas e outras atitudes, que não o dignificam nem ao cargo. Falo-lhes, como imaginarão, das declarações do Chefe de Estado a respeito das investigações a abusos sexuais cometidos por clérigos. A dita comissão independente chegou ao número aproximado de 400 casos, tendo Marcelo dito que não lhe pareciam muitos, ipsis verbis.

  Nem a sua extrema religiosidade justifica uma afirmação tão infeliz e infame. Tínhamo-lo como um homem inteligente e sensato. Não ponho em causa o primeiro, duvido do segundo. Marcelo esteve mal. Qualquer um tem dias maus e diz parvoíces irreflectidas. Contudo, no dia seguinte, e após auscultar a revolta no país, Marcelo, longe de pedir desculpas, como se anunciou na imprensa, saiu à tangente: se -se- alguma vítima de sentisse ofendida, ele desculpava-se.

   Marcelo ofendeu não apenas as vítimas da Igreja Católica - as milhares (milhões?) de crianças que tem a seu cargo e que maltrata e abusa; Marcelo ofendeu-nos a todos, até a quem, como eu, felizmente nunca caiu no leito de um padre ou um bispo pervertidos. Porque a sua patética dedução -o Presidente comparou os casos investigados em Portugal com os dos demais países europeus- baseia-se em números, e aquelas vidas não são números, e a censurabilidade daquelas condutas também não diminui por serem 400, 200, 100 ou 10 casos. Ainda que fosse 1, como se diz por aí. São contas simples de se fazer, inclusive para um jurista.

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