25 de fevereiro de 2014

Guiné Equatorial.


   Venho falar de África. Não do Uganda, esse paraíso para os homossexuais e que tanto dá que falar por estes dias, mas da Guiné Equatorial. O pequeníssimo país africano, do golfo da Guiné, há anos que vem pedindo a adesão à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). De todas as vezes em que formulou esse pedido, o mesmo foi recusado, sobretudo por Portugal, alegando-se questões de direitos humanos, manifestamente problemáticas na Guiné Equatorial, a par de uma suposta não relação histórica, cultural ou linguística com a lusofonia.

    É pertinente desmistificar um pouco os argumentos invocados. Primeiramente, e analisando os Estatutos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, é verdade que no artigo 5º, nº 1, alínea e) a organização enuncia claramente que a Comunidade se rege pelos primados, entre outros, da Democracia, do Estado de Direito, da Boa Governação e dos Direitos Humanos. Estando em falta, e tratando-se de um país que não cumpra com os requisitos, a adesão está, à partida, vedada. Efectivamente, a verdadeira ditadura de Teodoro Obiang é uma das mais longevas do mundo. O senhor tem os destinos da Guiné Equatorial nas suas mãos desde 1979. Será o único? Descendo pelo belo continente berço da humanidade, deparamo-nos com um membro de pleno direito da CPLP desde o seu surgimento, em 1996. Angola. Se ninguém, fundamentadamente, poderá invocar que Angola não tem um passado histórico, cultural ou linguístico com a CPLP, já será de repensar se trouxer à colação a questão dos direitos humanos. José Eduardo dos Santos governa Angola como um verdadeiro déspota desde... 1979, o curioso ano que marca o início do regime equatoriano de Obiang. Um pormenor interessante.
   Para sermos justos, se a Guiné Equatorial não pode aderir à CPLP por não respeitar os princípios acima referidos, Angola não deveria ter sido aceite na organização, ou, sendo-o, a suspensão assemelhar-se-ia lógica. Muitos dirão que em Angola não há pena capital e na Guiné sim. Todavia, a existência de pena de morte não é o único critério para aferirmos do desrespeito pelos direitos fundamentais do ser humano. Um desses indicadores, que verificamos em Angola, é a inexistência de liberdade de expressão ou de oposição. Há pouco tempo, várias manifestações anti-regime foram severamente sufocadas e punidas. Em jeito de curiosidade, o Brasil continua a prever a pena de morte por crimes militares em época de guerra, algo claramente afastado da realidade da população brasileira; importa que consta e a abolição não é total e incondicional. O Brasil é membro da CPLP.
  Na nossa breve excursão pelo continente africano, e de forma a que ninguém entenda tantas referências a Angola como perseguição, podemos falar da situação na Guiné-Bissau, por mero exemplo. No artigo nº 7 dos Estatutos da CPLP, está expresso de que em caso de violação da ordem constitucional num Estado-membro, os demais Estados-membros promoverão visitas de modo a poderem acompanhar de perto a situação e, no nº 2, estabelece-se possíveis sanções a aplicar, que incluem a suspensão total de participação nas actividades da CPLP. Há muito que a ordem constitucional da Guiné-Bissau vem sendo violada e, ao que sei, o país mantém-se como membro de pleno direito no seio da Comunidade, apesar de partilhar de muitos dos problemas de Angola.


   O segundo argumento invocado diz respeito à língua portuguesa. Na Guiné Equatorial não se fala português, todos o sabemos. Além das línguas tribais, a língua castelhana é a mais utilizada e propagada e consta como oficial ao lado da língua francesa, esta última por questões meramente estratégicas relacionadas com o espaço que o país compartilha com muitos países de língua oficial francesa. De novo, os Estatutos da CPLP, desta vez no artigo 6º, nº 1, expressam que qualquer Estado, mediante o uso do português como língua oficial, poderá tornar-se membro. Ora, daqui retiramos algumas conclusões: primeira, para se aderir basta a adopção da língua portuguesa como oficial; segunda, o mesmo independe do português ser ou não falado pela população. Desde que o país em questão oficialize o idioma, o critério linguístico está preenchido. Passando pelo site oficial da Guiné Equatorial, não encontramos nem uma palavra em língua portuguesa, contudo, a Comunicação Social vem referindo, e com razão, parece, que a Guiné Equatorial já terá tornado a língua portuguesa oficial há alguns anos. O argumento não procede.

   Por último, fala-se da relação histórica. Em parte alguma dos Estatutos encontramos alusões a um passado comum com qualquer dos Estados-membros, logo, o Butão, oficializando a língua portuguesa e cumprindo com os princípios da CPLP, poderia pedir a adesão e tê-la como garantida. O mal, se discordarmos, é dos Estatutos. Ainda assim, se houvesse uma menção a um passado histórico, a Guiné tê-lo-ia. O território que hoje faz parte da Guiné Equatorial pertenceu a Portugal desde os finais do século XV, quando os navegadores portugueses, nomeadamente Fernando Pó, reclamaram para a coroa portuguesa várias das ilhas que compõem aquele país africano. Portanto, a partir de 1494, o que hoje é a Guiné Equatorial era parte integrante do império colonial português, mantendo-se até 1777, quando Portugal entregou a Espanha o controlo daquele espaço no célebre Tratado de  Santo Ildefonso, que renegociou as fronteiras brasileiras, confirmando-se a entrega dos territórios no ano seguinte com a assinatura do Tratado d'El Pardo. A Guiné Equatorial, na sua génese, pertenceu a Portugal durante quase trezentos anos. O Brasil esteve na posse de Portugal por trezentos e vinte e dois anos. Terceiro argumento inválido.


   Nos últimos dias, os Ministros dos Negócios Estrangeiros dos vários países da CPLP recomendaram a adesão da Guiné Equatorial à organização, acordo conseguido graças a um dispositivo que suspende a pena de morte. Não se trata de uma abolição inequívoca e inderrogável, mas de uma suspensão. Vago, vago demais. Não me querendo repetir, relembro apenas que por si só não chega. Há mais a fazer na Guiné Equatorial. E esse bocadinho que falta aplica-se também aos Estados que já aderiram à CPLP. Um verdadeiro Estado de Direito não é apenas aquele que se limita a abolir a pena de morte. Aprovar-se um documento, um pedaço formal de papel, é fácil. Do que adianta estar explícita a abolição nos textos fundamentais se, na volta, se executam opositores políticos?

   A Guiné Equatorial tem lugar na CPLP e concordo com a sua adesão. Juntar-se-á a Angola e à Guiné-Bissau que pertencem ao clube dos países-irmãos de Portugal. E se os oito acreditam que a adesão da Guiné Equatorial é o primeiro passo para a abertura política do país, exige-se, de futuro, uma revisão dos Estatutos ou imparcialidade nos critérios. Um peso, uma medida.

22 de fevereiro de 2014

Último semestre.


   O segundo e último semestre da licenciatura começou na passada segunda-feira. Estar sem fazer nada tornava-se insustentável. Às tantas, pedia por aulas, algo que nunca pensei que ocorresse. Ainda assim, baldei-me desavergonhadamente às primeiras aulas de segunda, só pondo os pés na faculdade no dia seguinte. As aulas práticas têm início nesta semana que se aproxima.

   Já comprei os livros. Era dispensável gastar tanto dinheiro com uma biblioteca dentro da faculdade que tem todos os manuais de que necessitamos. Também nos possibilitam tirar fotocópias para uso pessoal. Prefiro adquirir. Faço uma espécie de colecção. Até já pensei em mandar fazer uma estante bonitinha para pôr no quarto. De facto, o escritório da mãe está pejado de livros meus. Tive de improvisar e arrumá-los numa divisão com portinhas que os deixa ocultos. Não é nada do meu agrado.


  Tenho o dom de atrair as pessoas. Recordo-me de combinar comigo que iria manter-me afastado da maioria dos meus colegas. Sei lá, queria ficar sozinho. Irrita-me um bocadinho ver o seguidismo, e é um que vai ao bar e todos vão atrás, chegando ao ponto de ver, ontem, quatro rapazes a irem juntos ao banheiro. Gosto muito de estar sozinho. Sou assim de pequeno. Nunca consigo. Provavelmente, sentir-se-ão bem na minha companhia. Quando dou por mim, já ando com um ou outro colega.
   Na quarta, fui ao bar acompanhado de uma amiga de subturma. Estivemos a analisar o horário. Ela anda a frequentar cursos intensivos que lhe permitem dispensar as optativas do quarto ano. Seria bom para mim, caso tivesse paciência. À saída do bar, vi que um gigante a interpelou. Ela parou, cumprimentaram-se e começaram a falar. Discretamente, dei uns passos até à porta do bar, ficando à sua espera. Visto que não se despachava, recuei até eles. O gigante reparou em mim e, à medida em que explicava umas coisas à dita colega, desviava o seu olhar sobre mim a cada segundo. Senti-me constrangido. É altíssimo. Deve ter perto de um metro e noventa, meio gordinho, pouco, que aquela altura esbate qualquer gordura. Usa barba de uns quatro dias. Lá se despediram.
    Já em casa, à tarde, ligo o pc, entro naquela rede social que cada vez me enjoa mais e tenho um pedido de amizade do rapaz. Tendo praticamente a certeza de que a minha colega não pronunciou o meu nome, pelo menos durante os minutos em que estive com eles, só encontro uma explicação: foi à sua lista de amigos, que está visível, e andou a ver se me encontrava. Bom, ela poderá ter referido o meu nome enquanto estive à porta... Até o achei fofinho. :) CLARO (e o caps é propositado) que não meti conversa. Ele é que o fez. Falámos um bocadinho no chat. Está claramente interessado e eu, olhem, eu, nem sei o que diga. Se me convidar para um café, aceitarei. É meu colega de curso. Parece-me recatado e sossegado. Passei pelo seu perfil e vi tudo muito arrumadinho. O pai tem perfil na rede, os irmãos. LOL É algarvio. Não fossem os olhares e jamais deduziria. Parece completamente heterossexual.

   Ontem, enquanto esperava por uma aula teórica da noite, foi a vez de um fotógrafo. Na faculdade há uma sala de audiências. Sentei-me num dos banquinhos do corredor e o fotógrafo estava num desses bancos imediatamente à frente. Um fotógrafo de, no máximo, trinta anos. Um estilo muito swag e tal. Olhava com tanta insistência que tive de fugir para a sala de estudo. Será possível que não consigam ser mais discretos?

  Tenho falado com uns estudantes de mestrado e a ideia vai ganhando consistência. Há um mestrado em ciências forenses que deve ser giríssimo! E sempre enriqueceria o currículo. Se tiver de ver cadáveres, nem pensar! Sou muito sensível a isso.
    Em princípio, sim, seguirei mestrado. Estou a começar a gostar do curso. A meses de acabar, mas antes tarde do que nunca, não é mesmo? :)

18 de fevereiro de 2014

Sebastião José de Carvalho e Melo.


   Interroguei-me sobre esta dissertação, dado o trabalho que implicaria e o tamanho do resultado final. Este texto ficou excepcionalmente longo, pedindo, desde já, as minhas desculpas. Pensei em dividir em duas partes. Optei por não o fazer. Não há limite de linhas no Blogger, creio, e a ideia não me agradou. Como calculam, falo de alguém que viveu uns incríveis oitenta e três anos, com uma vida riquíssima e muito que explanar. Deparei-me com a factualidade de poder suprimir apenas parcos detalhes. É tudo tão importante...

  Escrever sobre Sebastião José de Carvalho e Melo não se afigura uma tarefa fácil. Sendo uma figura apaixonante, mesmo considerando a distância que nos separa, o homem que ficaria conhecido graças ao título nobiliárquico que D. José lhe conferiria, em 1770, continua a suscitar sentimentos diversos, nomeadamente em Portugal, onde é visto como um estadista exemplar, ou no Brasil, que o têm como tirano.

   Pombal teve, de facto, as rédeas do país por um período de longos vinte e dois anos, onde fortaleceu o poder do rei, considerado divino, sujeitando tudo e todos à autoridade régia. Não só: a implacável perseguição da família Távora e do padre Malagrida, a supressão da Companhia de Jesus, a reforma do sistema educacional (com consequências devastadoras de que ainda hoje o país se ressente...), as atitudes tomadas em relação à velha aliança luso-inglesa, a problemática dos judeus e da discriminação racial, que prontamente resolveu, tornam-no numa figura incontornável e enigmática.

    Nascido em 1699, a vida de Sebastião José decorreria por mais de três quartos do século XVIII. Era oriundo de uma família da pequena nobreza rural, crescendo e vivendo as primeiras décadas em alguma penumbra. Fontes da época atestam o seu porte de um metro e oitenta, sobrevivendo a uma vida sedentária e a diversos ataques de doenças, o que era comum naqueles tempos.

    Em 1733, consegue casar-se com uma viúva aristocrática bem mais velha, contudo, este matrimónio não lhe permitiu alcançar um papel de destaque na sociedade joanina. D. João V, aliás, não nutria grande consideração por Sebastião José, recusando terminantemente em atribuir-lhe um importante cargo no governo, sob o pretexto de que Pombal tinha "cabellos no coração". Em 1738, Sebastião José conseguiu ser nomeado embaixador de Portugal no Reino Unido. Por essa altura, não possuía quaisquer qualificações diplomáticas, nem experiência em outros países. Estudara Direito em Coimbra, uma instituição tida como atrasada quando comparada com o prestígio de Oxford ou Cambridge. Enquanto permaneceu na corte londrina jamais aprendeu a falar inglês, mas as fontes da época dão-nos conta da sua extraordinária fluência em língua francesa. Segundo consta, era um leitor ávido de livros, relatórios e documentos de Estado ingleses em tradução francesa. Os despachos que enviava eram pouco elaborados, demonstrando desconhecimento quanto à sociedade e economia britânicas. Era afável e informal quando falava com as pessoas, se bem que vários diplomatas referissem a sua loquacidade e verbosidade.

   Pombal ficou impressionado com o poder marítimo inglês e a prosperidade da economia da Grã-Bretanha. Perturbava-lhe a desigualdade entre a posição dos ingleses em Portugal, nomeadamente em Lisboa e no Porto, e no modo incorrecto com que os portugueses eram recebidos em Londres. Queixava-se frequentemente de que os inofensivos marinheiros portugueses eram apedrejados por ingleses.
    Reclamou para si próprio a isenção de impostos, com base no artigo quinze da Aliança Luso-Inglesa de 1703, à semelhança do que sucedia aos diplomatas ingleses em Lisboa. Já constrangido e embaraçado com as contínuas críticas de Pombal, o duque de Newcastle, secretário de Estado para os Assuntos Estrangeiros, explicou-se argumentando que o rei Jorge II era um monarca constitucional, estando sujeito a modificações à Aliança que o parlamento inglês aprovasse, enquanto que D. João V era um rei absoluto, estando preso à letra da mesma. Mostrando determinação e deixando a sua marca, o governo inglês nem sequer presenteou Pombal quando este partiu de Londres para Viena em nova missão diplomática.

   Na Áustria, Sebastião José ficaria por quatro anos, sem resultados de relevo. Falecida a sua primeira mulher, desposou a sobrinha do marechal de campo Duan, casamento que lhe abriu as portas à fina flor da sociedade vienense. A senhora tinha metade da sua idade, não obstante, o enlace duraria por toda a vida de Pombal. Este era um homem de família, sendo afectuoso com a mulher e os filhos e recebendo destes igual carinho. Regressaria a Lisboa no leito de morte de D. João V e, graças à rainha, D. Maria Ana de Áustria, conseguiu o acesso ao então herdeiro da Coroa, o infante D. José. Após a subida ao trono, D. José nomearia Pombal como Secretário de Estado da Guerra e dos Negócios, depositando nele mais confiança do que em qualquer dos seus ministros, mas foi o grande terramoto de Lisboa, de 1755, que aceleraria a ascensão de Sebastião José à categoria de verdadeiro estadista de Portugal até 1777. D. José a ele se socorreu aquando da catástrofe, tendo Pombal agido com mão de ferro e elevada determinação, persuadindo o monarca na reconstrução da capital e não na sua transferência para Coimbra, como muitos sugeriam. Parcas três semanas depois, já o embaixador inglês em Lisboa relatava os planos da reconstrução da cidade, o que, nas suas palavras, "se conseguirá facilmente com as minas de ouro e diamantes do Brasil".

   A comunidade britânica em Lisboa sofreu bastante com os reveses do terramoto. A maior perda foi o não pagamento das dívidas por parte dos lojistas portugueses a quem os ingleses haviam vendido mercadorias. Apesar destas queixas, o volume do comércio anglo-português aumentou consideravelmente nos anos seguintes ao terramoto, não faltando quem dissesse, cinicamente, de que a tragédia seria proveitosa para os súbditos de Sua Majestade britânica, devido ao fornecimento de matérias-primas para a reabilitação de Lisboa. A partir da década de 1760, o comércio entre os dois países diminuiria devido à queda abrupta da extracção de ouro brasileiro e às crises açúcareiras, no negócio dos diamantes e no tráfico esclavagista. Da parte inglesa, culparam Pombal da diminuição de exportações para Portugal. Efectivamente, dada a contracção na colónia brasileira, Sebastião José procurou diminuir a dependência portuguesa de produtos estrangeiros, tentando reabilitar a indústria nacional. Criou companhias que tinham a protecção real e verdadeira precedência sobre as feitorias inglesas em caso de conflito. Assim, fundou duas companhias para monopolizar o comércio da região amazónica (Maranhão-Pará e Pernambuco-Paraíba) e uma terceira para concorrer com os comerciantes de vinho ingleses na região do Douro. Estas companhias não seriam bem recebidas por todos os portugueses. Alguns comissários volantes ou vendedores ambulantes, que trabalhavam com base em comissões no Brasil, foram mais atingidos do que os mercadores ingleses, todavia, Pombal suprimiria qualquer eco de descontentamento de forma implacável. Como exemplo, a Mesa do Bem Comum, que ousou criticar a formação das companhias do Brasil, foi imediatamente extinta. Os seus membros foram presos, exilados ou ainda reoganizados numa Junta do Comércio, de 1755, sob apertado controlo da Coroa. No outro extremo, alguns trabalhadores da Companhia do Vinho do Douro que se manifestaram contra esta de um modo um tanto ou quanto ébrio, digamos, foram selvaticamente punidos. Dezassete executados.


   O Marquês rejeitou as críticas inglesas relativamente aos interesses britânicos em Lisboa e no Porto, no entanto, jamais pôs em causa a velha aliança com o Reino Unido, refutando peremptoriamente em alinhar com a 'união familiar' das coroas Bourbon de França e de Espanha dirigida contra os ingleses.

   Pombal detestou a Companhia de Jesus. Não há indícios de que esse ódio existisse antes de 1750. Dez anos mais tarde, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, governador do estado brasileiro do Maranhão-Pará, fazia chegar ao seu irmão, Pombal, denúncias relativas aos missionários jesuítas na Amazónia que, em palavras suas, zombavam constantemente da autoridade da Coroa. Estas desconfianças, verdadeiras ou falsas, recrudesceram o sentimento antijesuíta de Pombal, se é que não estiveram na sua origem. Pombal convenceu-se de que os jesuítas estavam a manipular os ameríndios no sentido de os revoltar contra os ajustes territoriais firmados com Espanha no Tratado de Madrid, de 1750. Sebastião José não gostava do próprio tratado, mas desconfiar da relutância dos jesuítas em cumpri-lo, enfureceu-o e, desde então, viu a mão oculta da Companhia de Jesus por todo o lado.
    A sua lealdade à aliança com os ingleses só tremeu quando o ministro dos Negócios Estrangeiros francês lhe confidenciou, em 1767, de que os ingleses estavam a preparar um plano para conquistar o Brasil com, imagine-se!, a ajuda dos jesuítas! Pombal sabia, como todos, de que os jesuítas eram bastante influentes e ricos. Em boa verdade, possuíam enormes fazendas e plantações de açúcar na Bahia, ranchos em Marajó e no Piauí, enormes propriedades agrícolas em Angola; fala-se ainda de muito ouro e prata que, supostamente, teriam. Por 1759 e 1760, quando Sebastião José mandou confiscar todos os bens da Companhia de Jesus, nenhum desses minérios apareceu. O ministro de D. José conseguiu convencer o monarca de que os jesuítas, na pessoa do velho e louco padre Malagrida, estavam implicados na conspiração que o tentou assassinar em 1758. A par da família Távora, que o Marquês executaria sem piedade, num dos seus actos mais célebres, o padre Malagrida seria também ele condenado ao garrote e à fogueira em 1761. O eco das execuções, tidas como violentas até para os padrões da época, chegaram a Voltaire, que descreveu a condenação do velho padre como "uma combinação suprema do ridículo e do horrível". Em duas assentadas, Pombal pôs cobro a qualquer acto de rebeldia da velha nobreza, que odiava, e do clero.

   A obsessão antijesuíta de Pombal encontra a sua explicação no pendor altamente absolutista dos meados do século XVIII. Pombal quis, e com sucesso, sujeitar todas as esferas da sociedade, desde a Igreja passando pelos aristocratas, à Coroa. Destituía, sem mais, qualquer prelado sem consultar Roma, o que aconteceu com o bispo de Coimbra em 1768. Nos decretos oficiais, chamava ao rei 'Grão-Mestre da Ordem de Cristo e de Avis e Santiago', apesar de, pela lei canónica, o rei ser apenas 'Governador e Administrador Perpétuo'. Num decreto de 1757, atribuiu à Coroa o poder de fundar igrejas e mosteiros sem ser necessária qualquer autorização do Papa. Diminuiu drasticamente o poder do Tribunal do Santo Ofício, mais conhecido por Inquisição, proibindo-o de perseguir os cristãos-novos. Expulsou um cardeal de Roma por mero pretexto de protocolo, em 1760, seguindo-se um corte completo de quaisquer relações diplomáticas com a Santa Sé. Só reatou as relações no início de 1770, após o Papa Clemente XIV transigir nos pontos de discórdia. Houve quem pensasse que Pombal seguiria os passos de Henrique VIII e Thomas Cromwell, abrindo uma cisão entre Portugal e o Papado, mas Pombal considerava-se um bom católico romano. Foi, de facto, o absolutismo régio elevado a grau máximo.

   É interessante analisar este paradoxo: Pombal lidou de modo arrogante com os privilégios da Igreja numa sociedade em que a maioria, do rei ao homem do povo, era mais dominada pelos padres do que em qualquer outro país do mundo. Num regime destes, de terror, proliferavam os delatores e espiões e ninguém estava a salvo. Não se podia fazer qualquer observação crítica a Pombal e não havia nenhuma oposição visível ou organizada.

   Há uma controvérsia em determinar o balanço do ministério de Pombal. O cónego António Ribeiro dos Santos, contemporâneo de Pombal, vivendo entre 1745 e 1818, foi claro num dos seus escritos: "O ministro tentou seguir uma política impossível; quis civilizar uma nação e, ao mesmo tempo, escravizá-la (...) quis espalhar a luz das ciências filosóficas e, ao mesmo tempo, elevar o poder real ao despotismo. (...) Não compreendeu que deste modo instruía o povo, levando-o a compreender por esse meio de que o poder do soberano era instituído para o bem da nação e não para o benefício do governante, havendo limites inultrapassáveis".

  O Marquês não tolerava oposição, é certo, apesar de, regra geral, estar pronto para ouvir todas as críticas construtivas que o ajudassem a perceber os fenómenos e a melhorar as suas ideias. Os seus opositores, posteriormente, criticaram as reformas que implementou, designando-as de arbitrárias e contraditórias. Com efeito, se algumas das reformas de Pombal falharam ou demonstraram a sua perniciosidade, houve realizações notáveis: aboliu a escravatura em Portugal entre 1761 e 1773, figurando o país num dos lugares pioneiros nesta matéria. Claro que o ministro não se moveu por compaixão ou razões humanitárias, mas sim de forma a impedir que os escravos trabalhassem como domésticos nas casas dos senhores em vez de estarem nas minas do Brasil. Aboliu a discriminação entre cristãos-novos e cristãos-velhos, enfraquecendo o poder da Inquisição ao extinguir o objecto de luta desta, tornando-a um mero tribunal subsidiário da Coroa; pôs cobro à discriminação racial, argumentando que "Sua Majestade não distingue os vassalos pela cor, mas pelo mérito", chegando a estimular a miscigenação entre colonos brancos e ameríndios; reformou profundamente a Universidade de Coimbra, antiquada, modernizando o ensino do direito, da matemática e da medicina. As companhias monopolistas que fundou no Brasil, acima mencionadas, conheceram um êxito de salutar, pese embora fossem extintas após a sua queda do poder. A exportação de cacau aumentou e estimulou-se a exportação de algodão, peles e arroz. O Maranhão, uma das regiões mais atrasadas do império português, vinte anos depois era uma das mais avançadas graças às políticas de Pombal. Transferiu a capital do Brasil de Salvador da Bahia para o Rio de Janeiro e conseguiu a confirmação das fronteiras ocidentais do Brasil, em 1777, com o Tratado de Santo Ildefonso.

   Sebastião José, no seu zelo reformador, não esqueceu as possessões portuguesas em África e na Ásia. Entre 1764 e 1772, Pombal tentou dinamizar a economia de Angola, tornando-a mais do que um mero fornecedor de escravos para o Brasil. Mandou criar fundições de ferro, fábricas de cabedal e de sabão, extracção de sal e vários projectos agrícolas, além de defender o estabelecimento de colonos brancos. Fundou uma academia em Luanda para formar engenheiros militares e uma câmara de comércio para os comerciantes. Na África Oriental, libertou Moçambique da dependência administrativa de Goa e aumentou a influência portuguesa no vale do Zambeze. Na Índia portuguesa, estimulou a reocupação e reconstrução da velha cidade de Goa, que fora abandonada devido à sua insalubridade. Aboliu o ramo goês da Inquisição e terminou com a discriminação contra os cristãos indianos.

    É discutível até que ponto o rei D. José foi um mero fantoche nas suas mãos. Falecido o monarca, em 1777, a rainha D. Maria I aceitou a demissão pedida por Pombal. Abriu-se uma investigação e os opositores do Marquês exigiam a sua condenação e execução. O processo que foi instaurado concluiu que todos os actos do ministro foram sancionados por El-Rei. A rainha D. Maria I, que ficara profundamente traumatizada com o processo da família Távora e do padre Malagrida, prontamente libertou os presos políticos, num número que rondava oitocentas pessoas. Presume-se de que os presos ascenderam a quatro mil durante o reinado de D. José!
   Em sinal de respeito para com a memória do seu falecido pai, a rainha contentou-se em exilar o deposto ministro em Pombal, para onde já se tinha retirado, morrendo este de doença prolongada em Maio de 1782.

    Hoje em dia, Sebastião José de Carvalho e Melo é uma das figuras mais emblemáticas da História de Portugal, eclipsando o próprio D. José I, a sucessora D. Maria I e vários dos monarcas portugueses das quatro dinastias. Numa das praças mais importantes de Lisboa, ergue-se uma estátua em sua homenagem, imponente, mandada construir por ordem expressa de Oliveira Salazar, enquanto D. José ficou com uma bem mais pequena, e antiga, no Terreiro do Paço.
    Jamais o Marquês poderia imaginar tamanho impacto da sua obra, boa ou má, que para todos os efeitos o perpetuou na memória dos portugueses.

15 de fevereiro de 2014

You're Mine (Eternal)


   A minha Diva quer regressar à ribalta e lançou o primeiro single do seu novo álbum, que sairá no dia 6 de Maio (isto é, se não adiar novamente a data como tem feito nos últimos tempos). A música é moderna e creio que tem potencial. No primeiro dia, atingiu a posição #11 no iTunes dos Estados Unidos, obtendo igual sucesso no programa da Apple em outros países. Definitivamente no seu registo R&B, afastando as colaborações já excessivas, é um tema fresco, com o brilho suficiente e sem vocais exagerados (é difícil para uma das melhores cantoras do mundo não abusar do poder da sua voz...). 

  A Mariah, neste momento, é a artista com mais números #1 da história da música nos States (tem 18), ultrapassando Elvis Presley (com 17), só ficando atrás dos Beatles (que têm 20). Michael Jackson tem 13, a Madonna 12 e a Whitney Houston ficou com 11. A Rihanna aproxima-se perigosamente, com 13, tendo apenas 25 anos!...
   
    Espera-se um bom lugar na próxima actualização da Billboard Hot 100, a principal tabela musical dos E.U.A.

   A quem não é fã ou não quer ver / ouvir, aconselho a que o faça, pois no videoclipe aparece um mulatinho definido que fará as delícias de muitos de vós. :D



12 de fevereiro de 2014

Epopeia das Línguas.


    O El País é um dos jornais de maior prestígio em Espanha. Com vista à sua internacionalização no mercado brasileiro, decidiram há bem pouco tempo criar uma versão, em língua portuguesa, de forma a chegar a milhões de falantes lusófonos, sobretudo brasileiros, mas também portugueses, que diariamente buscam informações no periódico.

    A versão em português conta com um sem-número de colaboradores brasileiros, possuindo o que também existe por cá e que já se verificava na versão em castelhano: crónicas e artigos de opinião. Num deles, e em resposta a um texto de Juan Arias, cronista espanhol que até foi relativamente imparcial e justo na apreciação que fez desta convivência entre a língua portuguesa e o castelhano, antevendo o futuro, o ex-Presidente da República brasileiro, José Sarney, escreve uma pérola que registei e que considero inadmissível. Aliás, a meu ver, compromete a seriedade e a credibilidade do El País.

     José Sarney. O seu nome não deixa boas lembranças entre os brasileiros. Tendo sido presidente do seu país entre 1985 e 1990, Sarney é especialmente apegado à política. Dizem, amigos brasileiros, que já no tempo da ditadura militar a apoiava com veemência (por cá temos um Cavaco Silva que até teve ficha na PIDE, não como opositor...). A sua reforma do activo parece não chegar e muitos o chamam de dinossauro pelas terras de Vera-Cruz...

     Na sua crónica, José Sarney começa por referir que o português e o espanhol são línguas irmãs. Certíssimo. De facto, ambas vindas de uma raiz latina, podemos considerá-as irmãs, uma vez que nasceram e cresceram no mesmo espaço geográfico circunscrito, a península ibérica, passando pelos mesmos períodos de romanização, assimilação pelos povos pré-romanos ao latim, que o transformariam em vulgar, embriões das várias línguas que hoje compõem Portugal e Espanha. O substrato árabe enriquecê-las-ia. Passaram pela Diáspora por terras longínquas. 

    Seguiu-se um início de frase com um curioso 'Me encanta', que muitos poderiam considerar normal, tratando-se de um falante do dialecto brasileiro da língua portuguesa, tão válido como o português, ou o angolano, mas que efectivamente é proibido pelas gramáticas do Brasil. Num início de frase, e não estando presente o pronome pessoal, como foi o caso, mesmo no Brasil a solução adoptada é a da colocação do pronome oblíquo átono depois do verbo. O correcto seria 'Encanta-me'. Não. Não sou um purista da língua, tão-pouco um crítico de quem se engana a escrever, todavia esta observação é importante para percebermos da ilegitimidade de Sarney em opinar sobre assuntos nos quais revela uma ignorância gritante.

  No segundo parágrafo, José Sarney começa por dizer que a língua portuguesa teve uma aventura impressionante e que, transcrevo, "embora Camões diga ser a última flor do Lácio, na verdade era um dialeto do espanhol". Fim de citação. Sim, meus senhores, isto dito por um ex-presidente da República brasileiro e, pior, membro da Academia Brasileira de Letras (congénere da nossa Academia de Ciências de Lisboa, órgãos especializados em matérias linguísticas).

   O senhor Sarney, pese embora queira à força tornar o Brasil num país bilíngue, objectivo que perfilha, esquece-se, e é com pesar que o digo (custa-me ver uma pessoa com um currículo tão vasto a patinar em algo tão primitivo), que a língua portuguesa não é, nem nunca foi, um dialecto do castelhano. Vejamos, eu não teria quaisquer problemas em assumi-lo caso se tratasse de uma verdade inequívoca. Se há algo que aprendi com bons mestres, no colégio e na faculdade, é que a história não se apaga e somos o que fomos. O português é uma língua originária do latim, e se acredito que o senhor Sarney não teve más intenções com o que escreveu, deveria informar-se melhor. Qualquer leigo, não sendo preciso ascender-se a uma Presidência da República, sabe que o português não deriva do castelhano. O próprio catalão, o galego!, não têm qualquer relação com o castelhano. Em jeito de curiosidade, quem afirmou que a língua portuguesa era a última flor do Lácio, inculta e bela, foi Olavo Bilac, um poeta brasileiro, e não Luís de Camões. Lamento que José Sarney conheça tão mal a literatura do seu país.

    No terceiro e último parágrafo, Sarney utiliza metáforas muito (pouco) interessantes que só servem para esconder a falta de rigor técnico e científico do seu artigo. Que o português só parou "nos Andes", depois de matar as línguas dos índios e a língua geral. Desnecessário. A História é o que é. E, chegada ao final do continente sul-americano, aí encontrou o "espanhol" de onde "se tinha separado". Sem palavras. Estas considerações falam por si mesmas.

    Não sei se algum dia o senhor José Sarney terá acesso à minha contra-crítica. Provavelmente, não. Há que manter a esperança. Se já fui lido por uma reconhecida escritora e por um político portugueses, que saiba, tudo é possível. Seria importante dizer a esse senhor que as peculiaridades do Brasil são aliciantes e que elas são as responsáveis pelo interesse e fascínio que o país suscita. O Brasil é o único país lusófono da América, rodeado que está, na sua maioria, por países hispânicos. A colonização portuguesa fê-lo "gigante pela própria natureza", como tão bem o hino brasileiro evoca. A língua portuguesa, no Brasil, país de imigração fortíssima pelos séculos XIX e XX, é símbolo de unidade entre a amálgama de nacionalidades que encontraram o seu porto de abrigo por lá. Mais do que a religião, do que cultura marcadamente influenciada por Portugal, a língua uniu o que muitos não conseguiram com federações forjadas. Querer que o Brasil passe a ser bilíngue é um atentado contra a singularidade e a génese do povo brasileiro e nem todos os interesses económicos, que são muitos, deveriam se sobrepor à manutenção da identidade nacional brasileira. Portugal, ei-lo aqui tão pequenino e indefeso, dá uma bela lição de força e carisma. Por cá, o castelhano não é sequer língua estrangeira obrigatória. E estamos rodeados por uma Espanha enorme, sedenta, e sempre feroz, olhando para a sua esquerda com cobiça, como um pedaço que lhe pertence. Sendo o Brasil o quinto maior país do mundo, por que motivo há que sujeitá-lo ao domínio implacável do castelhano, havendo tanto que fazer quanto ao ensino da língua portuguesa?

   Não é horrível caminharmos para o portunhol, como Sarney argumenta na sua crónica. As línguas são organismos vivos. As gramáticas ajudam a ensiná-las e a compreendê-las. Nada podem fazer no sentido de travar a sua natural evolução. Não sei se caminharemos para o portunhol, esse "monstro" para José Sarney. Se assim tiver de ser, sê-lo-á. A História a isso proverá. As línguas românicas vêm do latim vulgar, mal falado, que os soldados romanos fizeram questão de levar por todos os meandros do Império. Nem por isso são menos belas e válidas. As línguas são do povo, não dos governantes. Pela Europa, duvido que esse portunhol se concretize. Tem pouca expressão e a identidade portuguesa é demasiado forte para se deixar levar. Se tanto, na fronteira. Porque num cenário de portunhol, a língua portuguesa estaria condenada à extinção. Na América, vingando, é de lamentar. Há movimentos emancipacionistas no sul do Brasil. Tornando-se bilíngue, não poderei adivinhar o que espera ao país-irmão. E isso sim é uma monstruosidade.

Quem quiser ler o texto de José Sarney, no El País, pode fazê-lo aqui.

8 de fevereiro de 2014

Melhorias.


   Estou a uma semana de retomar as aulas. Contrariamente ao que previ e aos planos que tracei, fiz muito pouco durante estas semanas. Inscrevi-me a três melhorias de nota, uma das quais uma catástrofe. Subi um valor. Em parcas palavras, meti os pés pelas mãos, o júri reparou e achou que não merecia sair de nota reforçada. Dormira mal na noite anterior. O dia não estava a correr muito bem. Às restantes disciplinas, duas, melhorei significativamente. Creio que não me preparei como deveria. Algum desânimo apoderou-se de mim, levando a que relaxasse o estudo.

   Fato... Dado o curso e o protocolo, temos de usá-lo em todas as orais. Não está escrito no regulamento; compreende-se à luz do que a faculdade representa. A gravata é um acessório que uso com alguma frequência, desde pequenino, estando habituado. O fato, sim, desagrada-me, além de que tenho de vestir um casaco por cima. Com o frio e a chuva destes dois primeiros meses do ano, só um casaco quente, e impermeável, garante que não chegue a casa ensopado e gelado. Acrescente-se que odeio guarda-chuvas. Levo um modelo miniatura na mala, dos mais pequenos que existem no mercado. Qualquer pé de vento o leva pelo ar. É mais pequeno do que todos os pequenos que possam imaginar.

   O bom deste tempo é poder apreciar a chuva miudinha pela janela ou do lado de fora da faculdade, por exemplo, à entrada da porta traseira, enquanto se (des)espera. Há sempre os fumadores de plantão, mas antes fora do que dentro, como acontecia aqui há uns largos anos. Até os taxistas fumavam em serviço, atirando com as suas toxinas para cima dos passageiros. Sim, sim, aconteceu-me, até chamar à razão o anafado homenzinho que se desfez em mil e uma desculpas. Quem disse que não há crianças com atitude?

    
   Levarei a mesma pasta arquivadora. Perdi a paciência para comprar material novo a cada semestre. Se está boa, não há motivos para deixá-la de parte. Conto as semaninhas todas. Março aproxima-se, o Abril tem trinta dias, em Maio já posso dar um pulinho à praia, se dispensar exames, feito. 

    Oh tempo, passa! (ainda hei-de pedir para que volte atrás, que corra devagar...).

5 de fevereiro de 2014

Ask.fm


   Há uns quatro anos, esteve muito em voga um determinado site de questões, o Formspring. Embalado na onda, recordo-me de ter aderido e colocado um widget. Gosto das aplicações simples que não desvirtuam o sentido dos blogues. À época, fez sentido e ajudou a que revelasse mais sobre mim. Retira o peso excessivo de um email e possibilita que se fale de outras coisas. Entretanto, o site foi perdendo popularidade (até que se extinguiu). 

   Pensei, então, em criar uma conta no seu substituto, quando este surgiu: o ask.fm. A lógica é a mesma. Fi-lo anteontem e cá está ele, aqui ao lado. Permito as perguntas anónimas (de outra forma só poderia perguntar quem tivesse conta), na senda do que já faço no blogue. Há quem comente anonimamente e seja educado e correcto. Não escolhe nome porque não quer, não se lembra, enfim.

   Estão convidados a fazer-me perguntas, se quiserem, através do ask.fm, dentro dos limites do razoável. Claro que não responderei a obscenidades, dados pessoais, entre outras. Vejam lá. LOL Apelo ao bom senso. A experiência com o Formspring foi bastante agradável e proveitosa, daí repetir. :)


Sinto-me um "tinaija' (teenager) indefeso", como diria a Maria Vieira num sketch do Herman, mas, pronto, não podemos falar só dos contratos para pessoa a nomear, dos crimes de perigo e afins. :)

2 de fevereiro de 2014

Diana.


   Sábado à noite, nada para fazer, decidi procurar algum site para ver um filme. Não tenho por hábito fazer downloads de filmes. Não sou fanático por cinema; gosto, porventura, de ver um ou outro filme, mas só o faço, geralmente, passado algum tempo sobre a estreia. Pesquisei e consegui dar com um site que tem filmes disponíveis, recentes, evitando-se descarregar no pc. Confrontado com as várias opções, escolhi o filme Diana, com meses, um fracasso na crítica.

   Os filmes que são fiascos suscitam-me a curiosidade. Os bons têm o selo de qualidade; os maus levam a que os queira ver para tirar as minhas próprias ilações. O site não travou, contrariamente ao que esperava; a imagem é bastante boa e o som também. Premi f11 e ali fiquei. Um copo de leite morno, uma tosta, paz inquebrável.


   A crítica destruiu o filme, com destaque para a imprensa inglesa, naturalmente. Todos sabemos do peso de Diana de Gales no imaginário dos britânicos, esperando-se que, mesmo decorridos dezasseis anos sobre a sua morte, uma interpretação tão intimista provocasse reacções polémicas e negativas. Os norte-americanos, dado o distanciamento afectivo, conseguem, aqui, ser bem mais racionais. Creio que o que impulsionou a má recepção no Reino Unido foi o facto de se tratar da Princesa do Povo, do mito, a única capaz de fazer tremer o sólido reinado de Isabel II. Se a Rainha temeu, temeu quando os ingleses questionaram o silêncio da Casa Real naquele fatídico último dia de Agosto.

   Muito se falou acerca da prestação de Naomi Watts. Dito por si, a actriz procurou dar um ar o mais realista possível à sua Diana, e no meu entender conseguiu. Não convenceu. Péssima interpretação, dizem. Não partilho dessas opiniões. Em boa verdade, era muito pequeno aquando da morte de Diana, mas vendo - e já vi - vídeos seus, analisando os seus olhares, semblantes, posturas, diria que Naomi se aproximou muito da falecida Princesa. Momentos houve em que parecia uma Diana de Gales ressuscitada, e não apenas fisicamente. Numa das cenas, quando Diana aterra na Austrália, caminhando na passadeira vermelha, cri que estava a ver Diana. A altura, o vestido, o cabelo imaculadamente arranjado, reportaram-me de imediato à Princesa. Disseram ainda que Naomi "transformou a princesa em alguém da plebe sem interesse". Convinha perguntar, digo eu, se Diana não seria uma mulher desinteressante. Não está em causa o seu activismo social, a sua bondade. Nas relações pessoais, muitos a consideravam uma mulher fútil. Não posso esquecer uma entrevista de Cavaco Silva, num dos programas de Herman José, em que o na altura ex-Primeiro-Ministro diz claramente que Diana, vendo o Drº Mário Soares de suspensórios, numa visita oficial, desatou às gargalhadas. Qualquer um de nós reagiria assim, não direi que não; ninguém espera uma reacção destas da então futura Rainha-consorte da Commonwealth.

   O filme em si não é bom, assuma-se. O enredo é fraco, demasiado centrado na suposta relação de Diana com um cirurgião paquistanês, de seu nome Hasnat Khan. Dodi Al-Fayed aparece perto do final, quando Diana já não mantém o namoro com o médico, procurando esquecê-lo. O que mais estranhei foi o pormenor de Diana cozinhar quase por obrigação. Tendo assessor de agenda, mordomo, seguranças na sua residência oficial, por nenhum momento vemos as empregadas de Diana. Pelo filme, há imensas cenas de Diana na cozinha a fazer o café da manhã, o jantar. Duvidoso.

   Perturbou-me o assédio dos paparazzi. Aí, creio que houve um realismo impressionante. As fotos que todos conhecemos de Diana a fugir pondo a carteira à frente do rosto, correndo carregada de sacos, são primorosamente retratadas no filme. É a violação sistemática do direito à reserva da vida íntima elevada a grau máximo. Não sei como seria aqui em Portugal.
   Não esqueceram os pequenos príncipes, que aparecem no filme despedindo-se da sua mãe após uma estadia com ela. O olhar de Diana vendo o avião particular a descolar é tocante.

   Se o objectivo era o de recriar Diana de Gales, foi atingido, quanto a mim. A história poderia ser outra, mais convincente e interessante, todavia Naomi Watts esteve razoavelmente bem. Como Diana, agradou-me. Nem todas podem ser uma Meryl Streep, uma Glenn Close ou ainda uma Kate Winslet (a última com interpretações desastrosas...).

    É um filme que se vê. Já vi bem, bem piores.