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15 de novembro de 2019

O Império Contra-Ataca.


    No sábado, coincidindo casualmente com o trigésimo aniversário sobre a queda do muro da vergonha na Europa, o Muro de Berlim, estive presente na conferência da Nova Portugalidade, O Império Contra-Ataca, na Casa de Goa, perto do Palácio das Necessidades. Já lhes falei anteriormente da Nova Portugalidade, uma associação de defesa da nossa História e do nosso legado pelo mundo, com a qual colaboro periodicamente com alguns escritos. A Nova Portugalidade, doravante NP, tem por hábito organizar conferências, e esta foi a maior por eles já alguma vez organizada. Contou com a presença de um painel verdadeiramente de luxo, pessoas de craveira intelectual e carreira académica intocáveis. Posso-lhes dizer que o programa dava conta do início das actividades pelas 11h30, e começaram bastante depois, tal a afluência. Éramos cerca de cem pessoas. As acreditações pareciam não ter fim.




   A NP decidiu-se pela realização desta conferência num momento oportuno. Soubemos, há semanas, que o governo se prepara para introduzir uma nova disciplina de História no Ensino Secundário, com conteúdos programáticos que contêm uma nítida linha militante e ideológica. Não será difícil imaginar que a alteração à grelha de disciplinas se pautará por políticas revisionistas, que tudo quanto pretendem é retratar-nos como pífios exploradores e genocidas, branqueando o papel que desempenhámos nos Descobrimentos, diminuindo o sentimento de amor e apego à pátria nas nossas crianças e jovens e, por conseguinte, influenciando decisivamente as novas gerações. Acresce a tudo isto aquele epifenómeno da esquerda mais populista no discurso odioso e que agora se faz representar no parlamento.

   Encarando-o como uma investida contra Portugal e o orgulho nacional, a NP decidiu não ficar indiferente. Era tempo de uma resposta pronta e eficaz, que só peca por tardia. Indo ao passado, os oradores não se detiveram demasiado nele, não, que os tempos não estão para isso. Importou-lhes, sobretudo, definir uma visão de futuro e propor soluções. A História deve estar ao serviço do conhecimento, com rigor científico, com precisão, com metodologia, e não ser alvo de manipulações que flutuam ao sabor das mudanças governativas, da dança de cadeiras nos gabinetes ministeriais.


Um painel de luxo



    A queda do Muro de Berlim acarretou a queda da dicotomia EUA / URSS, a mudança de uma era de tensão permanente entre o Ocidente e o Oriente, entre o capitalismo e o socialismo e respectivas áreas de influência. Portugal entrara há três anos na CEE, actual UE, que agora corre o risco de se desagregar. Confirmando-se a saída do Reino Unido, não será difícil supor que outros lhe seguirão os passos. E Portugal? Teremos uma saída de emergência caso o sonho europeu se transforme num terrível pesadelo? Na conferência da NP, falou-se da Portugalidade, esse conceito um tanto ou quanto místico que une os países de expressão e cultura portuguesas. Luísa Timóteo, a presidente da associação cultural Coração em Malaca, aludindo a uma realidade semelhante que eu conheci recentemente no antigo Sião, introduziu-nos entre a comunidade de descendentes de portugueses naquele antigo entreposto comercial, pessoas que mantêm viva a herança portuguesa através do folclore, dos apelidos de família, da gastronomia. Um património de afectos que não preservamos. Em jeito de curiosidade, a senhora Timóteo já escreveu cartas ao Presidente dos afectos, que nem a uma respondeu. É a este património que a Nova Portugalidade dá valor. São estas pessoas, que se sentem portuguesas, não porque um cartão de cidadão o diga, nesse conceito jurídico-administrativo de cidadania importado directamente de França, mas porque o sentem. Porque há uma nacionalidade portuguesa, secular, ancestral, fundada no apego a Portugal e à cultura portuguesa. Será a cidadania mais forte. Tenho a certeza de que o padre António Colimão, nascido em Damão, na antiga Índia Portuguesa, que teve uma intervenção imediatamente antes da senhora Timóteo, concordaria comigo.


Where's Wally? Estou por ali. Find me.


  Além da riqueza das intervenções (deixo-lhes o painel com o programa, e encontrarão cada intervenção gravada na página de Facebook da Notícias Viriato) e da oportunidade da conferência, gostaria ainda de sublinhar o espírito de comunhão, de dever e a dedicação com que aquele grupo da NP se entregou à concretização prática d' O Império Contra-Ataca, que só foi possível com muito labor, muita ida e vinda, sempre com o propósito de que todos se sentissem parte daquilo que ali estava a ocorrer, da primeira à última fila, da primeira à última mesa, durante o almoço.

   Exortava a que todos os que sentem apego à pátria apoiassem a NP, uma associação que está ainda a dar os primeiros passos rumo ao reconhecimento e que conta apenas com a boa vontade dos seus membros, que, com sacrifício pessoal e profissional, se entregam inteiramente aos eventos que realizam e se sujeitam aos mais vis ataques de facções cujo único desígnio é o de destruir Portugal. Esse apoio pode passar apenas pelo acompanhamento e divulgação do projecto da NP, disponível no seu sítio oficial da internet (http://novaportugalidade.pt/) e nas suas páginas das redes sociais: incutir o respeito pela nossa História, repondo a verdade, combatendo o uso indigno da Universidade ao serviço do desensino, contra o conhecimento, a ciência e o esclarecimento honesto dos cidadãos e estimular à edificação da Portugalidade, a união fraterna, igualitária, transnacional, pluricontinental e multiétnica dos povos de expressão e matriz portuguesas.

10 de novembro de 2019

O galego e o português são a mesma língua?


   Na terça-feira, dia 5, participei de uma palestra na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade Nova de Lisboa. Em rigor, tratou-se da apresentação de um novo livro do linguista português Marco Neves, O galego e o português são a mesma língua?, um excelente pretexto para juntar um grupo simpático a discutir a situação sócio-linguística actual da Galiza, que como se sabe é delicada. Moderada por Gabriel André (se é que se pode falar de moderação), galego, contou com as intervenções de Carlos Calhão, também galego, conhecido nos circuitos reintegracionistas, além do autor do livro.

  Eu, à semelhança dos restantes presentes, pude intervir, e fi-lo sobretudo porque não consigo dissociar a questão linguística da política. Pedi licença e introduzi esse elemento, dando uma achega acerca daquele que me parece ser o caminho único possível à Galiza para escapar à aniquilação total da sua cultura e língua: a independência e a emancipação em relação a Madrid.

   Engoli em seco quando Calhão referiu, a determinado momento, que em pequeno comentava à irmã: "Vamos a hablar bien". Na sua cidade, o galego era falado pela totalidade da população. No presente momento, já não o é nas camadas mais jovens. Recentemente, o governo autonómico promoveu a substituição do galego pelo castelhano num desenho-animado dirigido às crianças de mais tenra idade. Qual o objectivo? Parece claro: gradualmente, homogeneizar linguisticamente a Galiza, assimilando-a através de um dos poucos instrumentos que a distinguem de Leão, Castela e das demais regiões da Espanha castelhana: o galego. Remetendo o idioma autóctone a um papel secundário, associando-o à velhice, à exclusão, à ruralidade, incute nos jovens a vergonha pelo seu falar. Não surpreende, no processo, que Calhão tenha crescido com esse preconceito.

   Achei por bem apontar culpas ainda à Xunta da Galicia e à Real Academia Galega, que acabam por compactuar com o governo central: a primeira, com medidas que visam a substituição progressiva do galego; a segunda, procurando aproximar o mais possível o galego da ortografia castelhana e afastando-o, simultaneamente, do português, idioma que deveria ser a verdadeira referência para qualquer norma oficial do galego.


Foto da palestra / apresentação. Sou o rapaz do meio, na primeira fila

   Na Galiza, como Calhão relatou, anos após a transición e já no quadro constitucional actual, escritores foram perseguidos, porque o reintegracionismo, e dentro dele o lusismo, é perigoso. Despertar uma consciência nacional na Galiza já seria terrível para o Estado espanhol; ancorá-la em Portugal, pior ainda.
   A perseguição a quem fala galego não terminou com o fim do franquismo, regime no qual usar qualquer das línguas minoritárias espanholas equivalia a ser preso, torturado, condenado sem garantias de um julgamento justo e equitativo. Livros eram queimados. Um verdadeiro Index, meras décadas atrás. A realidade mudou apenas na aparência e nos métodos. O preconceito e a perseguição continuam lá, porém, assumindo "vestes mais decentes". Calhão, nos inúmeros processos judiciais em que foi parte, teve de pedir vezes sem conta para que o intimassem em galego, que a prática judicial na Galiza é de o fazer em castelhano.

  A realidade galega é-nos próxima geograficamente e distante socialmente. Por lá, há quem lute para poder estudar no seu idioma materno, para poder educar os seus filhos no seu idioma materno, para poder receber informação no seu idioma materno ou aceder a serviços no seu idioma materno. Escrevi "idioma materno" quatro vezes. Não o fiz por acaso. A luta dos galegos pode ser política, mas muitas vezes é-o apenas no domínio do idioma. Estaria tentado a dizer que muitos tão-pouco se importariam de permanecer no Estado espanhol se houvesse garantias reais de protecção do galego, de estímulo ao seu uso pela população. Acontece que o idioma, que é uma arma dos galegos contra o Estado central, também tem sido uma arma de Madrid contra os povos de Espanha. Através do castelhano, procedeu-se a uma política linguicida, uniformizadora.

   Esta luta galega não nos deve ser indiferente. Nós, portugueses, aprendemos a reagir contra Espanha e a negar tudo o que venha de lá. Compreensivelmente. A nossa identidade nacional foi contruída por oposição àquela realidade política. Entretanto, não nos podemos esquecer de que num recanto do que hoje é parte do Estado espanhol nasceu a língua portuguesa, na antiga Gallaecia, que englobava o norte. Virar costas à Galiza será o mesmo que cometer matricídio.

   Felizmente, para nosso bem, tímidos passos vão sendo dados no sentido de uma cada vez maior aproximação entre galegos e portugueses. Da mesma forma que o preconceito e a perseguição não terminaram, apenas se refinaram, também hoje dispomos de meios humanos e tecnológicos que nos permitem trocar ideias e informações. Que nos permitem o que ali se fez naquela sala: conversar, questionar, estimular. Permitir que todos formem uma opinião fundamentada sobre o reintegracionismo, apoiando-o ou rejeitando-o. Galegos e portugueses, nos seus dialectos, com os seus sotaques. Num mesmo idioma. Com um mesmo propósito.

10 de junho de 2019

Salazar e a Restauração da Monarquia.


   Olá! Agora que posso respirar de alívio, após mais de uma semana complicada, entre fazer um teste, um exame, receber três, receber notas finais e passar tardes e noites na sala de estudo, sendo que se prolongarão até pelo menos ao final do mês, lembrei-me de que já não dava notícias há algum tempo. Não há realmente muito para contar, também, que não tenho feito nada. Só o trajecto costumeiro: casa - faculdade / faculdade - casa. Na quinta-feira, sim, fui a uma conferência subordinada ao tema que consta no título da publicação. Teve lugar na Casa da Comarca da Sertã, na Rua da Madalena, e contou com a presença de Paulo Drumond Braga, historiador, e de Dom Miguel de Bragança, irmão de Dom Duarte Pio.

   Foi extremamente interessante, porque muito se diz sobre o relacionamento de Salazar com os monárquicos, e até, num exercício de direito comparado, comparamos com a solução da vizinha Espanha, em que Franco, nos anos 40, restaura a monarquia, deixando, porém, o nome do seu sucessor em aberto. Havia, à época, várias linhagens candidatas que não apenas os Borbón, na pessoa de Juan Carlos. O que parecia claro é que seria Juan Carlos, e não o pai, o sucessor de Franco.

   Por cá, Salazar, pelo simples facto de não ser chefe de estado, não nomeou sucessor, e, qual malabarista, na senda daquilo que foi o Estado Novo, um regime de consensos, procurou sempre encontrar a harmonia entre os militares, os veteranos da I República, os monárquicos, os proprietários, os trabalhadores. Enigmático como sempre, Salazar foi deixando claro que a questão da restauração ou não da monarquia, sobretudo após a morte do General Carmona, em 1951, no mesmíssimo ano do congresso da União Nacional, era uma não-questão. E terá sido em torno desse ano que os monárquicos, cuja maioria era salazarista, se convenceram de que, por ora, a monarquia não tornaria ao país. Em 1950, a lei do banimento, mais concretamente a Lei da Proscrição, que afastava os Bragança do país para todo o sempre, foi revogada, permitindo que Dom Duarte Nuno, os filhos, os irmãos e demais família pudessem regressar àquela que consideraram sempre ser a sua terra, e que não lhes era desconhecida, porquanto, sem alarido, mas com o conhecimento de Salazar, já cá tinham estado por diversas vezes em visitas à margem do que a lei estabelecia.

Sou a "oitava cabeça"

   Salazar nunca privou com Dom Duarte Nuno, mas manteve uma relação de grande proximidade com uma das suas irmãs, Dona Filipa, com quem trocou correspondência por anos. Dona Filipa de Bragança, na verdade, teve uma paixão quase platónica por Salazar, admirando-o, respeitando-o e rejeitando qualquer crítica ao estadista. Dom Duarte Nuno, igualmente, sempre manifestou apoio a Salazar. Como em tudo, o regime português foi muitíssimo diferente do espanhol, desde logo nas pessoas de Salazar e Franco, com estilos de governação distintos e personalidades também elas distintas.

   Quando se deu a morte política de Salazar, em 1968, há muito que não se falava em restauração monárquica. Marcello Caetano, republicano, havia sido, décadas atrás, um crítico acérrimo dessa ideia de retorno à monarquia. Já quanto a Salazar, embora haja monárquicos que gostem de alimentar alguma simpatia do professor de Finanças pela monarquia, a verdade e tudo quanto se sabe é que Salazar, independentemente de regimes, apenas se importava com a sua manutenção no poder. O regime que mais lhe convinha era a república, uma vez que um chefe de estado que só o era porque gozava da sua confiança, e foi assim com os três que o Estado Novo conheceu (quando Craveiro Lopes a perdeu, sabemos que já não se recandidatou…), podia ser completamente manietado. Era, efectivamente, uma mera figura protocolar. Numa monarquia, não seria assim. Um rei, desde logo pela sua legitimidade, não está sujeito ao escrutínio popular ou de parte alguma. Em Itália, Vítor Emanuel III participou da demissão de Mussolini, não nos esqueçamos.

    A conferência durou duas horas, e eu expus uma pergunta: se se conheciam cartas de Dona Filipa a Ramalho Eanes ou a Mário Soares. Pelo que parece, não. Com a morte de Salazar, Dona Filipa ter-se-á desinteressado da vida pública, recolhendo-se na sua moradia do Algarve, refúgio habitual à azáfama de Lisboa, que detestava.
   Dona Filipa não é uma figura conhecida em Portugal. Eu iria mais longe e diria que nem o pai de Dom Duarte Pio é conhecido pela generalidade das pessoas. O sentimento monárquico esfumou-se entre os portugueses. A actual família real, pretendente ao trono, goza de respeito, é certo, mas sobretudo de uma enorme indiferença. Os portugueses não sentem apego à monarquia ou aos Bragança. Eu, que me assumo como conservador, rejeito a monarquia. Da esquerda à direita, a república é consensual. Há ideia de paridade, de igualdade, que nos é cara. Gostamos muito de eleger os nossos representantes, incluindo o chefe de estado.

   Foi muitíssimo útil para mim aprofundar conhecimentos nesta relação específica entre o homem que governou o país por quarenta anos e os Bragança. Uma relação de desconfiança e de algum aproveitamento mútuo.