O historial da generalidade dos Estados que vieram suceder às antigas províncias ultramarinas portuguesas em África tem sido marcado por convulsões políticas que se seguiram às respectivas declarações de independência, na maioria dos casos, mergulhando os recentes países, ainda de débeis contornos políticos, em guerras civis que se prolongaram pelo tempo. Enquanto que na Europa a história recente ensina-nos de que a uma guerra se seguem períodos relativamente estáveis de prosperidade e acalmia, Angola apenas conheceu, e recentemente, uma afirmação das suas inegáveis potencialidades, conquanto persista, dentro das suas fronteiras, um regime inominável.
Angola enquadrar-se-á nas chamadas ditaduras modernas, mascaradas, até numa análise pelo seu ordenamento jurídico, de democracias plurais, com a tónica nos direitos humanos. O que vemos, contudo, na excursão pela Lei Fundamental angolana, de dois mil e dez, é uma cópia dissimulada de ordenamentos que verdadeiramente cumprem, mal ou bem, os seus preceitos constitucionais. Diz-nos a Constituição da República de Angola, no seu artigo 21.º, alínea b), que é tarefa do Estado, e transcrevo, «assegurar os direitos, liberdades e garantias fundamentais». À frente, prosseguindo, encontramos, no título respeitante aos direitos e deveres fundamentais, o rol de direitos de que os cidadãos, na letra da Lei, se podem munir diante da opressão estatal, e são eles, a liberdade de expressão e de informação, no artigo 40.º; a liberdade de imprensa, no artigo 44.º, e a liberdade de reunião e de manifestação - por quantas vezes violado - no artigo 47.º, os que nos interessam por ora. Os recentes casos de repressão policial a activistas e manifestantes que apenas denunciam as arbitrariedades do governo angolano, clamando por uma maior abertura do regime, inclusive no cumprimento da sua lei máxima, à qual o Estado se subordina, demonstram o total desrespeito dos dirigentes angolanos pelos direitos que fizeram aprovar em Assembleia Nacional. As detenções e prisões arbitrárias sucedem-se impunemente, à revelia da lei, que no artigo 56.º da Constituição, uma vez mais, obriga o Estado a reconhecer como invioláveis os direitos e as liberdades fundamentais consagrados na Constituição. Não será difícil de prever que, munindo-se de um hipotético, mas pouco convincente, perigo para o Estado, as autoridades angolanas procurem restringir os direitos dos cidadãos ao abrigo de dispositivos legais e constitucionais que o permitem, alegando fundamentos manifestamente desfasados da realidade, que é a de pessoas que se manifestam, que reivindicam, no pleno uso dos seus direitos.
Ana Gomes, eurodeputada e membro de uma subcomissão de Direitos Humanos - e também, diria eu, como cidadã portuguesa - que a posição de Portugal, aqui, não pode ser neutra, ainda que respeitando a autodeterminação do povo angolano e a independência do país, alerta para situações de claríssima violação de direitos basilares do indivíduo. Alguma Comunicação Social angolana, que não é difícil presumir fortemente condicionada no exercício da sua função - que é exactamente a de denunciar abusos por parte de autoridades estatais - intimida, criticando num tom desproporcional, quando o que está em causa são direitos concretos do povo angolano que sistemática e impunemente são desrespeitados.
Por seu lado, a Constituição angolana, a par dos direitos que enuncia, reforçou, sobremodo, os poderes presidenciais. O Presidente da República de Angola, no novo quadro constitucional, é o primeiro nome da lista partidária das legislativas, que acumula, dessa forma, com a chefia do Governo. Os seus poderes, neste regime ultrapresidencialista, quedam reforçados ao limite. O Presidente da República é Chefe de Estado e detém o poder executivo. Se o que indigna não é tanto o carácter presidencialista, que encontramos noutros Estados, já o mesmo não poderá ser dito da sua eleição em listas partidárias para a Assembleia Nacional. É uma manifesta deturpação da teoria da separação de poderes, imprescindível em qualquer Estado de Direito, onde o poder executivo e legislativo se emaranham.
É revoltante perceber que a comunidade internacional vê a realidade angolana com um olhar de relativa indiferença, sem prejuízo de quem, por vezes em perigo para a sua vida e integridade física, continua a difundir o que se passa dentro daquelas fronteiras. Compete-nos, pelos laços históricos e culturais que nos unem a Angola, manter especial atenção e proximidade, contribuindo, no que nos for possível, para a democratização premente daquele país.
Ouvi dizer que a Angola trocou petróleo por mão "escrava" da china...
ResponderEliminarBem vindo ao Império dos Diamantes
Grande abraço amigo Mark
Parece que até portugueses por lá trabalham sem receber... Angola não é o paraíso que muitos imaginavam...e é pena, tratando-se de um país de enormes potencialidades.
Eliminarum abraço, amigo.
Não sei muito de Angola. Sei que foi uma colônia portuguesa, sei que fica na África mas não sabia que era uma ditadura. Bom nem é difícil imaginar isso, se até aqui tem abuso de autoridade e repressão policial. O povo se manifesta sai, sai nas ruas mas a polícia pega bem pesado. Acho que vou tentar saber mais sobre eles lá.
ResponderEliminarAbraços!!
A democratização é ainda um processo muito precário por África. A generalidade dos países africanos é governada despoticamente. José Eduardo dos Santos, o Presidente de Angola, está no poder, salvo erro, desde 1979. Quanto à América Latina, os resquícios ainda persistem. E sempre temos o triste caso da Venezuela... Há muito a fazer.
Eliminarum abraço.
uma vergonha tudo isto ... e assim caminha a humanidade ...
ResponderEliminarGrande verdade, amigo Paulo.
EliminarObrigado pela atenção ao ler este meu artigo. :)
Há países africanos, incluindo Angola que se fossem bem "tratados" poderiam ser grandes potências, têm tanto de rico como de pobre.
ResponderEliminarSem dúvida, isto se a corrupção não fosse uma "doença crónica" que grassa por aqueles países. No caso de Angola, tudo tem para ser uma potência regional.
EliminarBela análise da situação angolana.
ResponderEliminarFaz-se o que se pode. Obrigado por ter acompanhado.
EliminarVê com relativa indiferença porque lhes convém os negócios que daí possam resultar. É como a questão do "comunismo": é tudo contra mas todos fazem negócios com a China.
ResponderEliminarNamorado, vê a hipocrisia: o MPLA era marxista-leninista; actualmente é social-democrata e todo virado para os E.U.A. Na sua génese, o partido que governa angola defendia o "comunismo".
EliminarSim é verdade Mark. Mas mais do que apregoar esta ou aquela ideologia, Angola defende uma família. Nem as monarquias absolutistas, foram tão absolutistas como esta dita República Angolana.
EliminarOs angolanos, coitados, é que nada defendem. São vítimas das maiores das opressões.
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