A minha faculdade andou em período de eleições para os órgãos associativos. Que me lembre, só votei uma única vez: no primeiro ano, influenciado por uns colegas que foram votar e me desafiaram. Fazendo jus à ausência de qualquer espírito académico da minha parte, seria estranho se passasse quartos de hora intermináveis em filas para exercer um direito, é verdade, que me é totalmente indiferente. Não vejo que repercussões terá na minha vida de estudante, a mais agora, que termino.
Ainda assim, um rapaz veio meter conversa comigo através do facebook. Não sendo meu "amigo", descobriu-me através de uns comentários que fiz no grupo da faculdade e decidiu fazer campanha eleitoral através da caixa de mensagens. Achei de mau gosto. Alertou-me no sentido das inúmeras vantagens que teria se votasse na sua lista, desfiando-me o programa eleitoral, vá, quase por inteiro. Um verdadeiro caça-votos. Entretanto, disse-me algo como "eu já te vi por lá, eheheh". Pois, claro, é normal. Se estudamos no mesmo local. Foi o que lhe transmiti.
Na sexta-feira, enquanto descansava calmamente num dos bancos de jardim que há dentro da faculdade (sim, dentro), aproximou-se, cumprimentou-me, estendendo-me a mão, e sentou-se ao meu lado. Lá veio com a conversa do voto. Disse-lhe claramente que não estava interessado e que considerava deselegante enviar-me mensagens tentando conquistar o meu voto, visto que não nos conhecíamos. Pior, perto da mesa de voto, rigorosamente à frente, alunos interpelavam outros para que votassem nas suas listas. Bem, que respeito pelo processo eleitoral! Imaginemos o que seria haver membros de cada partido, perto das mesas a voto, a aliciar os eleitores. Comuniquei-lhe isso e, em jeito de curiosidade, perguntei-lhe se julgava aquele procedimento correcto e justo, acreditando que alguma lista nem estivesse representada por agentes infiltrados. Ficou sem reacção.
"Pois." Pedi-lhe licença, levantei-me e saí. À noite, adicionou-me. O pedido está lá, pendente. Ao que soube, ganharam. Chato o rapazinho.
Ontem, da parte da tarde, fui dar um passeio e apanhei o autocarro. Wow, raridade. Não andava de autocarro há... anos? À minha frente, uma miúda; miúda, como quem diz, da minha faixa etária, vinte e tal, ou pouco mais nova. De mochila, aspecto meio irreverente, roupa desbotada. Nada demais. Quase a chegarmos ao destino, entraram dois inspectores. Os indivíduos que andam com umas maquinetas a verificar a validade dos títulos de transporte. Ela estava naqueles assentos de costas. Não os viu. Quando a abordaram, disse que não tinha título. Brasileira. Um deles, coitado, teve pena dela. Deu-lhe a oportunidade de comprar o bilhete e fecharia os olhos. Abriu a carteira velha e mostrou-lhe uns míseros cinquenta cêntimos. Tudo o que tinha. Acrescentou ainda que nada tinha comido em todo o dia. A julgar pela sua magreza, é bem provável. O fiscal disse que nada podia fazer. Que lamentava. Pediu-lhe a identificação e ela, quase a chorar, timidamente e com a voz embargada, referiu que estava ilegal, que não tinha documentos. Pensei que cá para mim: "isto começa com o bilhete; acaba com a moça repatriada". Olhem, abri a mala, saquei da nota e disse ao inspector que lhe pagava a viagem. Eu, que não sou nada destas coisas. Sou totalmente normativista. Não tinha dinheiro para andar de autocarro, ia a pé ou não ia. É uma viagem. Não se trata de uma maçã que pega para comer e depois diz que não pode pagar. Viagens, não se compreende. No entanto, atendendo ao historial, à sua condição de imigrante ilegal, às consequências que uma porcaria de um título de transporte lhe traria, creio que agi bem. Aquele dinheiro não me faz falta nenhuma. Não perdi nada; se tanto, ganhei perante a minha consciência. Fiz o que qualquer pessoa faria.
Agradeceu-me, incrédula, e foi à sua vida. O homem aceitou, pronto. Assunto resolvido.
Agradeceu-me, incrédula, e foi à sua vida. O homem aceitou, pronto. Assunto resolvido.
Comprei uns phones novos, um tinteiro para a impressora, e ainda escrevi umas notas num caderninho que me acompanha há anos.
Encontrei uma paz que teima em fugir.
HAHAHAHAHAHAH Ainda bem que tocas no assunto do autocarro tenho uma história semelhante para contar no blog, depois vai ler xP
ResponderEliminarAssim farei. :)
Eliminarvotaste? xD fizeste bem quanto à miúda... pode ser que ela pense melhor duas vezes da próxima vez antes de se meter assim num autocarro sem bilhete!
ResponderEliminar... é CLARO que não votei. :)
EliminarPois, mas nem me preocupei com isso, tampouco se ela é reincidente ou não: fiz o que achei correcto. O resto é lá com ela.
"Imaginemos o que seria haver membros de cada partido, perto das mesas a voto, a aliciar os eleitores." - Mark, meu amigo, tens de vir às mesas eleitorais aqui ao campo, numas autárquicas. Em legislativas e presidenciais não acontece tanto, agora em autárquicas o PS e o PSD chegam a combinar horas para repartir os corredores de acesso às mesas de voto!
ResponderEliminarUm camarada nas de 2009 teve de reportar à CNE.
Fui ingénuo... é a tal experiência de vida que me falta. Realmente, em locais do interior, é previsível que isso aconteça. Inadmissível. Reportou e bem à CNE.
EliminarEu sei, por exemplo, que os idosos são altamente influenciáveis. :/
Há a célebre frase para os velhotes:
Eliminar"Votem na seta que está a apontar para cima. É a seta que os leva para o céu!"
Que horror! Esse "truque" social-democrata é sinistro.
EliminarSinistro, mas bem real Mark...
Eliminarhttp://dailyflafla.blogspot.pt/ já está xP
ResponderEliminarVou lá ver. :)
EliminarA histórias da faculdade não me espantou. O políticos (profissionais) fazem bem pior do que isso.
ResponderEliminarQuanto ao acontecimento do autocarro, discordo quando dizes que fizeste o que qualquer pessoa faria, mas se o fizeste em consciência, fizeste bem. Julgo que foi uma questão de empatia :)
Abc
Quero acreditar que qualquer pessoa minimamente "humana" o faria. Fiquei surpreso comigo, além de que sou um defensor do cumprimento intransigente das normas: quer viajar, adquire o título.
EliminarMas, sim, foi empatia. Senti uma vozinha qualquer cá dentro. Não me sentiria bem se seguisse em frente. A rapariga, em último caso, podia ser repatriada. Sei lá se um deles não chamaria a polícia...
um abraço. :)
R - Por lei até 20 euros são obrigados a aceitar mais que isso não xP
ResponderEliminarJá há lei para isso? LOL Nem sabia. Não haja sombra de dúvida: neste país legisla-se tudo. Pior é a eficácia.
EliminarE que já vinha todo lampeiro para te dar na cabeça porque és demasiado anti-social, fiquei derretido com a parte final da crónica e perdi a coragem. És tão fofinho Mark :D Boa! Gostei muito da atitude e ainda a admirar-te mais :)
ResponderEliminarO rapaz "dos votos" é que é demasiado chato. :D
EliminarOh, não fiz nada por aí além. É o dinheiro que gasto numas fotocópias na faculdade, às vezes, e nem chega. :)
Uhmmmmmmmmmmmmmmm
ResponderEliminarChato? Ou presistente?
Abraço amigo
Ambos. Lol
Eliminarum abraço, Francisco.
Isso dos votos é uma tristeza. Eu costumo trabalhar nas mesas eleitorais nos dias das eleições e por vezes tenho que me chatear com os "representantes" dos partidos... Até para contar os votos eles tentam "ajudar"...mas eu não deixo sempre que posso e se eles tentarem, faço a contagem e re-contagem se preciso for, porque já não é a primeira vez que apanho anomalias...nestas últimas eleições, o poder "mudou de cor" por meros 20 e poucos votos. :P
ResponderEliminarQuanto à situação da rapariga, deveras lamentável. Se estaria a mentir? Nunca o saberemos, mas pelo menos agiste como devias. Teria feito o mesmo. ^^
Gosh, as coisas que eu venho a saber. Isso é inadmissível! Não tinha ideia que situações dessas ocorriam nas mesas de voto. Autênticas fraudes ao sistema eleitoral. Pensei que num país da Europa ocidental, qualquer indício de intervenção ilícita seria imediatamente rechaçado. Afinal... Bom, tu és uma pessoa honesta, íntegra, com valores, mas nem quero imaginar o que acontecerá por esse país fora. Medo.
EliminarSim, lá está, isso é lá com ela. Não creio que estivesse a mentir. A degradação humana era visível. Ali há fome. :/
e não nos esqueçamos dos cadernos eleitorais, ainda há mortos que votam...
ResponderEliminarquanto às eleições na tua faculdade, fizeste bem, pouco vives a vida académica, não faria muito sentido isso. mas, atenção, não sigas esse princípio na vida, votar é um direito e um dever, :)
eu, provavelmente, faria o mesmo que tu no autocarro, seria teatro ou não, não sei, mas se tivesse uns trocos, sim, pagaria o bilhete. até quase cheguei a fazer isso há umas semanas quando uma rapariga procurava o passe na sua mochila enorme e não o encontrava e vi como estava aflita. por fim, lá o encontrou.
vá, o calor está a regressar, os dias estão maiores. viva a primavera :)
bjs.
É verdade! Os cadernos eleitorais nos quais constam pessoas que faleceram...
EliminarPor acaso, nunca me abstive de votar desde que o posso fazer, acho. Nem que seja para votar nulo (em branco tenho um pouco de medo), passo por lá. :)
Eu sou um bocadinho "agarrado", mas senti que devia fazê-lo. Na volta a rapariga ainda era expulsa.
Oh, o dia, hoje, já fechou a cara. O céu está cinza. :s
um beijinho.
Só fazer like na Margarida xD
EliminarMark, perdeste hoje a inocência no que diz respeito a eleições. Acredito que em Lisboa a câmara está quase tão distante como a Assembleia da República, porque é uma população muito grande. Agora num sítio onde existem 20 000 habitantes, e onde existem montes de associações, principalmente desportivas , que se sustentam como uma lapa na câmara, acredita que há uma grande dependência e quase desespero para dar mais votos...
EliminarAM: :)
EliminarHoratius: Sim, acredito que em Lisboa não façam uma romaria para votar nas autárquicas. Como é uma cidade grande, vive-se a outra velocidade, não necessariamente boa. Digamos que a promiscuidade "Câmara - associações desportivas - empresários da construção civil", etc, não é tão ostensiva. Creio eu! Na volta, estou redondamente enganado.
sabes aquela frase da Blanche Dubois, no Streetcar named desire: I've always depended on the kindness of strangers. fico muito orgulhoso por teres sido espontâneo e teres safo uma pessoa que está em apuros. espero que um dia que esteja na mesma situação, tenha o discernimento de fazer o que tu fizeste.
ResponderEliminarNão conhecia a frase. :)
EliminarSim, não pensei. Abri a mala e pronto. Só reflecti depois, mas não me arrependi.
um abraço, miguel!
ah, o fim do filme, adorei. gigante!
Eliminaraproveito para lembrar que os sábados à noite na 2 agora são dedicados a elia kazan, portanto, a gravar :P
vai-te interessar ;-) http://papelpop.com/2014/04/sim-eu-entrevistei-mariah-carey-em-nova-york-e-o-encontro-foi-inesquecivel/
ResponderEliminarEu vi ontem, Meia Noite e Um Quarto, mas obrigado. :) Seria interessante se ela viesse a Portugal. :)
EliminarO que é um auto carro? huahuaahuha, coitada dessa brasileira gente, foi querer se meter a besta no exterior e é nisso que dá... espero que acabe tudo bem pra ela, claro. Já que vc está tão gentil assim Mark me empresta um real? hauhuahaua Bjs!
ResponderEliminar"Autocarro" é o equivalente, no Brasil, ao "ônibus". :)
EliminarAhah, empresto. :)
um abraço!
huahuahuahuah valeu, to amando seu blog demais um bj ! Que boca linda meu deus e mais uma coisa: como eu falo que vc é um gato em portugues de Portugal? Vc é um giro?Me diz
EliminarObrigado. :)
EliminarBom, aqui usamos a palavra "gato" com esse sentido de bonito. Pode dizer "gato". "Giro" e "gato" são sinónimos. Nunca "você é um giro", mas sim "você é giro". Ou "você é gato". Aqui usamos "gato" também.
:)
foi uma boa ação :) parabéns!
ResponderEliminarR. devias visitar, ias adorar o Louvre, eu adorei :)
Absolutamente. :)
EliminarQuanto ao rapazinho, parece-me ser do género de quanto mais me bates, mais eu gosto de ti... lol
ResponderEliminarQuanto à rapariga, fizeste bem... apesar de pensar um pouco com tu nestas situações, foi uma atitude nobre e de certo evitou uma montanha de problemas a rapariga!
;D
Ufa, chato como tudo! Acabei por aceitar o convite porque pareceria mal...
EliminarSim, foi mais para evitar problemas maiores. Uma falta daquelas não justifica uma possível e provável repatriação.
Achei fofo você ter ajudado a moça brasileira. A gente nunca sabe do dia de amanhã... Vai que a gente tb fique sem grana pra pagar o bus e aparece uma alma bondosa para nos ajudar ?...
ResponderEliminarGentileza gera gentileza.
Uma vez aconteceu algo parecido comigo. Eu fui pegar um ônibus e na hora q fui passar o cartão magnético na máquina, ele não funcionou,não lembro o que aconteceu na hora, daí um senhor se ofereceu pra pagar a minha passagem,mas a moça que cobrava disse que eu podia ficar sem pagar, não lembro o motivo,mas ela deixou. Achei legal a atitude deles.
Sobre o rapaz chato dos votos. Que coisa mais inconveniente ficar perturbando os outros. em busca de votos.Esse aí ser "ótimo" (sic) político! ahahaha
Achei fofo você ter ajudado a moça brasileira. A gente nunca sabe do dia de amanhã... Vai que a gente tb fique sem grana pra pagar o bus e aparece uma alma bondosa para nos ajudar ?...
ResponderEliminarGentileza gera gentileza.
Uma vez aconteceu algo parecido comigo. Eu fui pegar um ônibus e na hora q fui passar o cartão magnético na máquina, ele não funcionou,não lembro o que aconteceu na hora, daí um senhor se ofereceu pra pagar a minha passagem,mas a moça que cobrava disse que eu podia ficar sem pagar, não lembro o motivo,mas ela deixou. Achei legal a atitude deles.
Sobre o rapaz chato dos votos. Que coisa mais inconveniente ficar perturbando os outros. em busca de votos.Esse aí ser "ótimo" (sic) político! ahahaha
Você deu sorte, ahah. :)
EliminarAh, sim, este rapaz dará um excelente político! Pelo menos tem descaramento para tal.
É... gentileza gera gentileza. Fiz o que gostaria que me fizessem caso fosse eu a estar no lugar da moça. :)
Primeiro que tudo, mea culpa, mea culpa, mea máxima culpa...
ResponderEliminarPelo anormal atraso dos meus comentários.
Há uma explicação, e que é crónica - leio e comento demasiados blogs e atraso-me sempre; quando vou recuperando começo ou pelo fim, alfabeticamente falando ou pelo princípio e agora comecei pelo fim.
Conclusão, já estou completamente em dia com as letras (de baixo para cima) até ao J, mas tem custado, e como por este caminho nunca mais chegava ao A, vou de vez em quando e lentamente pondo em dia para já o A e assim cheguei aqui, com mais de um mês de atraso e vou aqui estar algum tempo, pois os teus posts são sempre interessantes, mas longos e raras vezes não os comento e também me "estendo".
Dito isto que te devia, já não há muito tempo para falar do teu texto "duplo", mas também já tudo foi dito.
Acho que procedeste bem em ambas as situações.
Abraço amigo.