29 de setembro de 2018

O Retorno.


   As aulas começaram há quinze dias. Estive três anos fora. Sim, três anos, por motivos alheios à minha vontade. Regressei, por fim, e julgo ser oportuno escrever um pouco sobre estes momentos iniciais.

   Emocionei-me da primeira vez em que entrei num dos anfiteatros, após os mil dias. Foi emotivo para mim. Depois, estranhei não conhecer ninguém. Sim, há caras que reconheço, mas de pessoas com quem nunca tive qualquer contacto.

   A faculdade conheceu obras nestes três anos. Está diferente. É quase uma experiência nova. Já não escrevo à mão; levo o meu Surface. Já sou mais disciplinado, presumo eu. Ganhei outro sentido de responsabilidade.

   Estou ainda a acostumar-me às dinâmicas. Como sempre, sento-me na fila da frente dos anfiteatros ou das salas. É algo que me caracteriza.

   Entretanto, ontem, soube do falecimento de um professor que também foi meu docente numa das disciplinas, o Professor Doutor Eduardo dos Santos Júnior. Faleceu em 2016, com 59 anos, e eu soube-o ontem, imprevisivelmente, quando comentava com um colega - um colega antigo que ainda por lá anda - sobre a cadeira de Direito das Obrigações, justamente aquela em que fui seu aluno. Recordo - e não são palavras de circunstância - um homem bom, amável, de trato fácil. Sorria frequentemente para os alunos. Explicava bem as matérias. Uma pena, uma pena. Sentava-me sempre defronte de si, a meio do anfiteatro. Não raras vezes olhava para mim enquanto falava. Eu limitava-me a admirá-lo, anuindo. Foi consigo, também, que fiz uma oral, uma saudosa oral, que me correu bem. Ajudou-me bastante, mesmo nos momentos em que me atrapalhava. Ao contrário de alguns professores que por lá andam, cujo intuito é massacrar, passo a expressão, os alunos, o Professor Santos Júnior estava ali para ajudar. Fiquei realmente consternado.

   Têm sido dias bons. Sinto-me útil, válido. Estes três anos, de certo modo, estupidificaram-me. E isso também se notou no blogue. Nós somos uma engrenagem: quando não exercitamos o corpo, perdemos a massa corporal; quando não exercitamos o cérebro, emburrecemos. Creio que ainda vou a tempo.

26 de setembro de 2018

Queer Lisboa 22.


   Bom, o Queer terminou e, como prometido, vou fazer um pequeno balanço do festival. Foi o meu primeiro Queer, em rigor, porque todos os dias, ou no São Jorge ou na Cinemateca, acabei por lá estar. Desafortunadamente, ou não, com centenas de fotografias que a produção do festival tirou, não surjo em nenhuma. Já me queixei. (risos)

   Passo, então, a enumerar os filmes que vi (em filmes, genericamente, incluo os documentários também):

- Kids;

   Se clicarem em cada título, serão reencaminhados para as respectivas críticas. De um modo geral, gostei da organização e do espírito do certame. Senti inclusão e fraternidade entre as pessoas. Muitos até se conheciam, não é?, do Queer, que já cumpre vinte e dois anos, e de outros Carnavais. Como diz um amigo meu, blogger, « o mundo gay é um bidé onde todos se lavam ». Brejeira, pouco eloquente, sem dúvida, não deixa de ser assertiva. E, bem a propósito, eu não me identifico minimamente, repito, minimamente, com a dita comunidade LGBT. Fui ao festival pelos filmes, e tão-só. Gosto de cinema, gosto de filmes desta temática, gosto de ocupar o meu tempo com actividades. Não pedi, como muitos (implorar até se aplicaria melhor aqui), que me cedessem bilhetinhos em troca de parcerias. Paguei-os, a todos, do meu bolso. Fui porque quis, escrevo sobre os filmes porque gosto, e não porque me tenha comprometido com isso.


   Como referi na publicação anterior, repetirei, sem dúvida alguma, o Queer, talvez sendo mais esmerado na escolha dos filmes. Houve três de que, manifestamente, não gostei muito. São eles: Diamantino, The Silk and the Flame e L'Amour Debout. Em contrapartida, adorei os restantes. Houve ali um documentário, logo no dia inaugural, que, tivesse eu sabido, teria trocado pelo Diamantino: o Bright Eyes, de 1986, sobre o HIV / SIDA (a ver se o encontro online). Aliás, devo dizer, adorei os documentários sobre a epidemia, inseridos no ciclo O Vírus-Cinema: Cinema Queer e VIH-SIDA. Interessam-me filmes e documentários dos anos 80, e tenho uma enorme curiosidade em saber mais sobre a realidade dos seropositivos naqueles fatídicos anos, quando tão pouco se sabia.

  Dos filmes que vi, Marylin arrecadou o prémio na categoria de Melhor Longa-Metragem, e bem atribuído. É uma estória verídica e arrebatadora do ponto de vista emocional.

  Para o ano que vem, é provável que pesquise mais sobre os filmes - não me cingindo às sinopses - e que compre os bilhetes antecipadamente, beneficiando do desconto e evitando preocupações. 
  Tive uma semana com sessões diárias. Adorei ir à Cinemateca. Foi um espaço que me cativou, intimista, sossegado. Estou em crer que serei visita costumeira. Gosto dos filmes que exibem. Gosto de cinema antigo e alternativo, se for o caso. O cinema dito comercial, massificado, de Hollywood, vai-me aborrecendo. Queer é que, esse, só para o ano.

23 de setembro de 2018

L'Amour Debout et Les Nuits Fauves (1992).


   Dois filmes a encerrar a vigésima segunda edição do festival de cinema LGBT Queer e o meu primeiro Queer. Não, não foi uma estreia. Já havia ido ao Queer, porém sem esta assiduidade. Foram nove sessões, sendo que três delas na Cinemateca (as restantes, como sabem, no Cinema São Jorge). Fiquei fã? Sim, sem dúvida, ao contrário do Motel X, que não me cativou. Bom, mas as considerações finais ficarão para ulterior publicação. Quero deter-me apenas nestes dois filmes, por ora.

   O L'Amour Debout foi uma enorme decepção. É pena que não sejam um pouco mais densos nas sinopses. O filme é terrivelmente enfadonho, aborrecido, com um guião péssimo e interpretações que também não o salvam. Chegamos ao fim sem saber qual o mote do filme. Um rapaz e uma rapariga, ex-namorados, que redescobrem o amor: ele, com um homem (parece que já tinha aventuras pontuais com homens); ela, com um homem mais velho. E então? Nem sequer há nada na narrativa que justifique o filme. É somente chato e desinspirado. As personagens são igualmente mornas e apáticas. Acho que até já me excedi para o que vi.

   Le Nuits Fauves é bom filme. Não pelas interpretações, que, exceptuando a de Romane Bohringer, vão de medianas a más, mas pela narrativa. Um rapaz, Jean, interpretado por Cyril Collard, que descobre ser seropositivo. Apaixona-se por uma modelo fotográfico de 17 anos, com a qual enceta uma relação amorosa possessiva e tremendamente desequilibrada. Jean tem uma amizade colorida com Samy (Carlos López) e costuma escapulir-se para locais de cruising gay, onde se entrega às mais loucas fantasias. É uma estória biográfica. Cyril Collard, realizador e actor principal, faleceu em 1993, com 35 anos, vítima de SIDA. No filme, a sua personagem acaba em Lisboa, curioso, completamente em paz com a doença, aceitando-a, entendo-a como parte do seu corpo a partir de então. Havia, em Jean, essa desconformidade, o que o levou a esconder a sua situação clínica de Laura; não por prazer em contaminar uma miúda inocente, mas por se recusar a aceitar a sua nova condição. No final, sabemos que Laura não está contaminada.

Cyril Collard e Romane Bohringer, numa das cenas

   Aquando da sua estreia nos cinemas franceses, o filme que viria a arrecadar quatro prémios Césares suscitou logo imensa polémica. Cyril Collard já não pôde viver o suficiente para receber os seus prémios, mas deixou-nos uma obra sobre a fúria orgânica por viver. Há uma raiva - a tal "fauve" - ao vírus, às condições em que o terá contraído. 
   Encontra-se, todavia, uma justificação para o que vai sucedendo no filme fora daquilo que a narrativa e os actores nos transmitem. A SIDA é quase como um fantasma que tudo manieta. O que acontece no filme, acontece porque o protagonista é seropositivo, e nunca porque ele seja mais um entre os demais. A magia da estória está fora dela, surpreendentemente, numa ideia estruturada do vírus. Este é o grande óbice, junto à debilidade das interpretações, para que Les Nuits Fauves seja um clássico. Cyril Collard não era um realizador fora de série.

  Uma palavra para as cenas finais do filme, gravadas em Lisboa e na Arrábida, no Santuário de Nossa Senhora do Cabo. Também a empregada de Jean era, aparentemente, portuguesa.

22 de setembro de 2018

Danny (1987) & La Pudeur ou L' Impudeur (1991).


   No meu sétimo dia de Queer, escolhi dois documentários sobre o HIV / SIDA, na Cinemateca, um tema preferencial nesta vigésima segunda edição do festival de cinema, por ocasião do ano em que se assinala o trigésimo aniversário sobre o primeiro Dia Mundial de Luta Contra a SIDA (1 de Dezembro de 1988).

   Danny, de 1987, é uma curta realizada por Stashu Kybartas. Não é um filme; é um documentário de 20 minutos sobre um amigo de Kybartas que morria de SIDA (em itálico porque, como sabemos, ninguém "morre de SIDA"). Danny Sbrochi, de seu nome, passava os dias na praia, com amigos, até ao pôr-do-sol, tinha um bom apartamento e conduzia o carro dos seus sonhos. O consumo de cocaína, que o levava a partilhar a mesma seringa com mais cinco rapazes, ou a promiscuidade, uma das duas, estiveram na origem da infecção pelo HIV que o vitimaria em 1986. O documentário ficou incompleto e saiu ao público no ano seguinte, em 1987.

  No que respeita ao impacto visual, é fortíssimo. Danny está já no estágio de SIDA, com múltiplas lesões na pele causadas pelo Sarcoma de Kaposi, um raro cancro que afecta aquele órgão do corpo humano. Faz tratamentos de quimioterapia que o enfraquecem mais. A Kybartas, vai partilhando receios e revelando pequenos sonhos, nomeadamente viver uma grande paixão sem ser atormentado pelo vírus terrível. Lembrou-me o Robert, personagem de Geoff Edholm em Buddies (1985), que vi há dias e cuja crítica publiquei aqui. Em comum, todos aqueles rapazes tinham um desejo: viver o suficiente para poder experienciar a cura, que hoje, quase quarenta anos desde os primeiros casos, em 1981, continuamos sem conhecer. No caso em concreto, Danny quer voltar para casa dos pais, para morrer junto da família. Teme a reacção dos progenitores, que não sabem da sua orientação sexual e ainda menos que está com SIDA.
  É um documentário interessante também pelas técnicas de realização. Imagens, algumas das quais de Danny saudável, que se detêm, fixas no ecrã, enquanto o som corre normalmente, talvez com o intuito de redobrar o impacto que a deterioração física do rapaz produz em nós.


   La Pudeur ou L'Impudeur  seguiu-se a Danny. Aliás, foram ambos exibidos como um único corpo. É um documentário de 1991, realizado pelo escritor, novelista e guionista francês Hervé  Guibert (1955-1991), que também veste as peles de actor principal numa campanha solitária que encabeçou por breves meses antes de morrer. Nele, Guibert, com a sua própria câmara, amadoramente, mostra-nos cenas do quotidiano, inclusive da sua intimidade. Vemo-lo a cuidar da higiene, na cama, nas consultas médicas, com as tias-avós. É, no fundo, o olhar de um homem que sabe que vai morrer e que quer deixar algo para a posterioridade. O que mais perturba, devo dizer, é vê-lo cadavérico, bastante combalido pelos efeitos do vírus e dos tratamentos, agressivos e ineficazes, já em fase final de SIDA - todo o documentário acompanha as suas derradeiras semanas. La Pudeur ou L'Impudeur é, também, uma obra de extraordinária motivação. Sem nunca desistir, ainda que por vezes fale em suicídio, Guibert procura exercitar os músculos, fazer ginástica, mexer-se, dizendo-nos, a determinado momento, que todos os dias descobre mais um movimento corporal que não consegue executar.

Hervé Guibert (1955 - 1991)

   Este documentário foi realizado simultaneamente com a escrita de Le Protocole Compassionel, onde Guibert também aborda a SIDA, e precedido por um outro, À l'ami qui ne m'a pas sauvé la vie, no qual revela a sua condição clínica. Mon vale et moi encerrou a trilogia literária dedicada à infecção. Podemos, então, inferir que a mesma o ocupou nos últimos dois anos de vida.
   É um diário muito, muito pessoal. Vemos um homem que se despe e que mostra, sem pudor, o seu corpo raquítico, pondo-se nu e pondo a nu, perante todos, os horrores da morte pelo HIV / SIDA. HIV que, sete anos antes, em 1984, vitimara outro grande vulto das letras francesas e  seu amigo pessoal, Michel Foucault.

   Sábado, 22, é o último dia de Queer. Esperam-me dois filmes.

21 de setembro de 2018

Marilyn.


   Antes de vos falar do filme a que assisti, hoje, no Queer, deixem-me abrir aqui um pequeno parêntesis para o meu direito de resposta. Não que já não devesse estar habituado a posts que me dedicam, mas, de facto, tantas manifestações de amor deixam-me comovido. Ontem, aqui na blogo, tive outra. Então, resumindo-vos, um tipo comprou uns livros, e eu, que até já tinha um deles em inglês, e na brincadeira, disse que tinha ficado com inveja dos dele. Uma piada minha, um desabafo sem qualquer significado. Ora, a criatura acreditou e tratou de me visar na sua última publicação. Se fosse inteligente, teria ficado satisfeita por terem “inveja” dela, ou, no máximo, rir-se-ia disso. Não. Ficou empertigada. Vamos lá então esclarecer: primeiro, não tenho inveja de ninguém. Segundo, jamais teria inveja de um tipo que, e podem confirmar tudo no blogue em questão, tem uma vida sexual do mais promíscua que há, gosta de ser agredido por homens que têm idade para ser seus pais, diz que é feio e escanzelado e mais um sem-número de disparates que leio para me rir. A ter inveja, não seria certamente de um fulano destes, que, a par de tudo o que citei, ainda garante que não gosta de mim. Sem me conhecer. Não admira que não me conheça. Sendo tão deprimente, não vai mesmo ter esse prazer.

   Dito isto, vamos ao que interessa e ao que vos traz aqui. Marilyn foi o filme escolhido para este sexto dia de Queer 22, e um dos melhores da vigésima segunda edição do certame. Um filme ambientado na Argentina rural, com um toque de western, numa família de pequenos criadores de cabeças de gado. Uma existência árdua, como verão, que raro é o dia em que não desaparece uma vaca. E é neste contexto que vive Marcos, interpretado por Walter Rodríguez, um miúdo especial, que gosta de se vestir com roupas femininas às escondidas. No meio que o envolve, é vítima de todo o tipo de agressões: verbais, físicas e sexuais. A morte do pai piora a situação económica da família, que também não o poupa a abusos. A mãe e o irmão dissimulam mal desconhecer a sua verdadeira identidade de género.



   É no Carnaval que Marcos se pode expressar. No hedonismo que nos liberta, traja-se a rigor e atiça o desejo dos rapazes da terra. A violação, porém, retira, do filme, a alegria da festa e o brilho do olhar de Marcos. A paixoneta que vive, no novo bairro, não sobrevive à pressão da mãe, que não se compadece do sofrimento do filho. O desespero e o sentimento de abandono não poderiam conduzir a bons resultados. O final é extremamente impactante. Baseado em factos reais.

  O realizador, que esteve no Queer e que respondeu às perguntas que lhe foram feitas pela plateia, jogou com o factor imprevisibilidade. Marcos é aquele rapaz que arde de desejo por homens - na cena da violação, a amiga parte em silêncio, e Marcos, no fundo, quer ficar ali, sem saber, claro está, que iria ser forçado. Um menino que mal consegue pegar numa arma, no qual não se vislumbra qualquer tendência agressiva.

  Quer-me parecer que o desfecho também foi aquele porque o pai morreu, e o pai seria mais amigo de Marcos; se tanto, afectivamente mais próximo, carinhoso e preocupado com o seu bem-estar, porque  a mãe, bem interpretada por Catalina Saavedra, era rigorosa na educação dos filhos, ou pelo menos na de Marcos, que ela sabe diferente do irmão mais velho. Não que não o amasse, que o amava, não suportando a ideia de o saber assim, delicado, feminino.

  Não podemos justificar a ruralidade com a intolerância, dado que o namoradinho de Marcos, Federico, vive a sua sexualidade sem a esconder, inclusivamente perto dos pais. Podemos, sim, em contrapartida, imaginar que alguns dos rapazes que atacaram Marcos seriam, eles mesmos, gays, mais do que no armário; verdadeiramente enfiados em sótãos e arrecadações.

   Um retrato cruel da vivência LGBT em ambientes rurais da América Latina. Sem liberdade, é certo (se virem o filme, entenderão o porquê), mas o Marcos é, finalmente, a Marilyn.
    Amanhã, que é como quem diz, hoje, haverá mais Queer.

20 de setembro de 2018

The Silk and the Flame.


   Jordan Schiele trouxe-nos, dos confins da China, um documentário a preto e branco. Nas sociedades orientais, sabemos que a família tem uma importância acrescida. E é aí, numa pequena localidade do interior daquele país imenso, que conhecemos a estória de Yao, um rapaz oriundo de uma família humilde que, a custo, consegue emprego em Pequim. De tempos em tempos, no caso do documentário para festejar o Ano Novo chinês, visita a família, hospedando-se na casa dos pais. O pai, de bastante idade, passou por dois ataques apopléticos que o deixaram incapaz de cuidar de si próprio e a mãe sofre de surdez desde pequena. Não é um ambiente fácil para Yao. Há a acrescer as expectativas que depositam em si: a mãe pressiona-o imenso para que case e constitua família, só que Yao é gay.

  Yao ama profundamente os pais. Sofre por não corresponder às expectativas da sua família e da sociedade chinesa em geral, num país onde mais de 90 % dos homossexuais acabam por se casar com mulheres (pelo menos, foi a informação que Jordan Schiele, que esteve presente e falou sobre o documentário, no final, em pessoa, veiculou). O documentário nasceu precisamente desse conflito entre o seu "eu" e as convenções sociais. A determinado momento, Yao vê-se obrigado a mentir para contornar, ainda que por tempo limitado, as pressões.


   Em jeito de monólogo, e só aí em inglês, que o documentário é todo em mandarim (com legendas em inglês), Yao vai-nos contando o seu percurso desde criança. Descobrimos que não é o filho predilecto e que, inclusivamente, o seu nascimento resultou de uma violação da lei. Vigorava, na China, a política do "filho único". Os pais de Yao já tinham dois filhos.

   Essa angústia é visível no seu olhar, na mão trémula enquanto pega no cigarro, no discurso vago e pausado. Se não será fácil ser-se gay em países da Europa ocidental, o que diremos numa sociedade tradicional como a chinesa.
   A fotografia, realçada pelo "preto e branco", é outro dos pontos altos do documentário. O "preto e branco" quase que nos despe as personagens. Torna-as mais nítidas aos nossos olhos, porque os contornos do rosto e as expressões faciais ganham outra dinâmica, que as cores roubam.

   Foi-me igualmente engraçado ver o choque cultural. Na aldeia de Yao, Jordan - que grava o documentário - é o primeiro estrangeiro. A mãe de Yao, astuta, faz sucessivas referências ao seu fenótipo ocidental.
   Embora relativamente distante de tudo, alguns familiares de Yao demonstravam estar bem informados sobre a política norte-americana. Senti essa politização, quando mais não fosse pelas múltiplas fotografias de Mao Tsé-Tung espalhadas pelos cómodos da casa.

   O documentário não correspondeu às minhas expectativas, mas surpreendeu-me. Votei-o e dei-lhe 7 pontos. Merecidos, no meu entender.

   Amanhã, há mais Queer.

18 de setembro de 2018

Kids (1995).


   Um filme-documentário no meu quarto dia de Queer, e o primeiro na Cinemateca Portuguesa. Sim, foi a minha primeira vez na Cinemateca. Adorei o interior do edifício, os corredores, a decoração (alusiva à sétima arte, claro). Fui à sessão das 15h:30m. 

   Um excelente horário para um filme americano sobre adolescentes, na América que não consegue ultrapassar o seu complexo de potência mundial com um submundo terceiro-mundista / fanaticamente conservador. É um filme bom sobre vícios maus, sobre adolescentes de quinze anos que vivem na erraticidade, em meio de drogas, sexo e rap, que o rock & roll ouviam-no os seus pais.
   Estávamos em 1995, no auge da epidemia de HIV / SIDA. Com quinze anos, julgamo-nos imortais, mas o vírus não escolhe idades, e sim comportamentos de risco. O curioso é que o realizador e o guionista, Larry Clark e Harmony Korine, tiveram essa preocupação, ou pelo menos aparentam-na. Duas adolescentes, nas suas primeiras noites, quando perdem a virgindade, contraem a infecção. Bastou uma noite irreflectida com o rapaz errado.



  Os anos noventa também podem ser considerados loucos, como todos. Surgiam as primeiras reacções à propaganda pró-preservativo. Estes jovens encaravam o uso do método contraceptivo como uma censura social ao sexo, e sexo é o que mais vemos nas 24 horas que o filme retrata - sim, num único dia. Acompanhamos um dia da vida de jovens já profundamente imersos num mundo de droga e álcool, de sexo com múltiplos parceiros; alguns também com comportamentos criminosos. Antevê-se disfuncionalidade familiar - num deles, é evidente - e ausência manifesta de valores e de crença num futuro. Não há qualquer ideia de futuro; aqueles miúdos vivem o presente. O futuro nem sequer é um desconhecido. Ele não existe. Conta o momento, a satisfação dos prazeres, sejam eles quais forem.

   Nova Iorque é-lhes um parque de diversões. A SIDA, uma invenção. Não há adultos no filme. Vemos uma mãe, uma estranha mãe, com um bebé, progenitora de um dos miúdos, justamente aquele que transmite o vírus a duas outras miúdas da sua idade, num ciclo vicioso.

   O encanto deste filme também reside no modo como foi realizado, optando-se pela luz natural, pela câmara na mão, porém em movimento, e por actores inexperientes, longe dos vícios das grandes produtoras. Aparenta ser improvisado, porém está absolutamente bem delineado, e provocou as reacções esperadas: a puritana América não viu Kids com bons olhos. Sexo e HIV eram um tabu, temas que não convinham ser abordados.

   No final do filme, exactamente na cena final, Casper, um dos adolescentes, pergunta-se: « Jesus Christ, what happened? » O actor, curiosamente, já faleceu, com 25 anos. Suicídio. A interrogação de Casper, que teria, provavelmente, contraído HIV de Jennie, não se foca apenas na festa regada de excessos, que terminara há pouco, mas na própria epidemia, que então grassava pelo mundo e que os afectava, a todos, embora apenas ainda Jennie o soubesse.




   Acabei por comprar mais quatro bilhetes para o Queer: um filme na quarta-feira, outro na quinta e dois no sábado, sendo que um destes na Cinemateca, de novo. No cômputo geral, foram oito sessões de Queer. Depois, farei uma publicação do evento, na minha perspectiva.

17 de setembro de 2018

Buddies (1985) & Books.


   Tive, ontem, o meu terceiro dia de Queer 22, com um filme-documentário que julgava, sou-vos sincero, mais forte do ponto de vista visual. Totalmente restaurado, é de 1985, e mostra-nos o modo com que Nova Iorque e o mundo lidavam com uma epidemia ainda desconhecida. O HIV havia sido isolado um ano antes, em 1984, mas só haveria de ser assim designado um ano depois, em 1986. Os doentes eram despejados, que é o termo exacto, em camas de hospital, sujeitos a medidas que, nos dias que correm, nos parecem bizarras e totalmente desnecessárias. Por cá, dois anos antes, em 1983, António Variações partia. Foi o primeiro caso documentado de HIV em Portugal. Diz-se dele que foi enterrado a vários metros de profundidade, em caixão selado.

   A verdade é que pouco se sabia. Buddies é passado, quase todo, num quarto de hospital, quando David Bennett, um jovem de 25 anos, se voluntaria a acompanhar um doente terminal de SIDA, Robert Willow. David tem namorado, uma vida estável, uma família que, surpreendentemente para a época, o apoia; David, por seu lado, foi abandonado por todos, desde família, a amigos, a namorado. Entre eles, lentamente, estabelece-se uma relação que vai além da de voluntário-doente. David começa a sentir-se atraído por Robert, e vice-versa. Encontram-se, David vai tirando as suas notas, julgando vir a publicá-las (o que vem a suceder, de facto, com a devida autorização de Robert).



  Realizado por Arthur Bressan Jr., que, ele mesmo, vem a falecer devido a complicações relacionadas à SIDA, em 1987, presumo que se tenha querido evitar chocar os norte-americanos com uma caracterização mais realística dos efeitos do vírus no organismo. Vemos, em Robert, o sarcoma de Kaposi, é verdade, todavia esperava por algo que me deixasse mais perturbado, no ano que em falecia Rock Hudson - a primeira grande estrela a morrer de SIDA -, amigo da família Reagan, levando a que o Presidente dos EUA pusesse cobro ao ruidoso silêncio e proclamasse, à América e ao mundo, que a luta contra o HIV / SIDA era um imperativo nacional. Simultaneamente, Robert, aqui no filme, morria em 1985, deixando David desolado, pois finalmente havia percebido que se tinha deixado apaixonar. As notas saem, são publicadas, e pela primeira vez surge algo na imprensa escrita que não condena os homossexuais e a homossexualidade - previamente, Robert e David chegaram a indispor-se quando David mostrou a Robert certos escritos que demonstravam o que a sociedade americana pensava (e continuou a pensar…) sobre a relação HIV - Homossexualidade, com todos os preconceitos inerentes. Como Robert afirmou, a determinado momento, as pessoas julgam que Deus tem os seus preconceitos.

   O filme tem um enorme interesse porque vemos o que mudou nestes trinta e dois anos. Já ninguém veste fatos especiais para visitar doentes terminais de HIV, primordialmente por dois grandes motivos: sabemos as formas de transmissão do vírus e deixámos de ter doentes terminais de HIV. Os seropositivos levam, hoje, vidas completamente normais, com a carga viral indetectável e com uma sexualidade prazerosa e feliz. O HIV continua a trazer complicações, claro que sim, e é de se esperar que os efeitos da infecção sejam vários e penosos, contudo deixou de representar, como nos dias de Robert, uma sentença de morte. Robert acabou, como a esmagadora maioria, por sucumbir a uma pneumonia.

   Gostei muito da interpretação de Geoff Edholm, que encarnava o Robert. Estava lá tudo: a audácia, a esperança, o brilho no olhar, o desejo (inclusive sexual). Mas também a mágoa, a incerteza, o medo. É um grande filme sobre um vírus maldito que tantas vidas ceifou, e no seu início, tal como no fim, os nomes dos rapazes que faleceram são-nos apresentados um por um, desde 1981 até 1985.


   Uma palavra para dois livros que comprei, ontem, antes do filme. Com amor, Simon e Chama-me Pelo Teu Nome, que já tenho em inglês, este último, mas que quis adquirir também em português. Como gostei de ambos os filmes (podem ler as críticas ao Call Me By Your Name e ao Love, Simon), quero ter a perspectiva da narrativa, que não raras vezes difere. E sim, também os comprei porque os vi por aí noutro blogger. Não sabia que já haviam traduzido o CMBYN para português. Veio mesmo a calhar. É, quando vejo algo noutros, que quero, não desisto enquanto não compro para mim. Há quem lhe chame inveja.



    Para terminar, amanhã há mais Queer. Até lá.

16 de setembro de 2018

Sauvage.


   Se, ontem, a sessão inaugural correu mal, este Sauvage arrebatou-me completamente, no segundo dia de Queer 22. Uma longa fantástica, duríssima, de uma crueza que nos deixa um misto de sentimentos: pena, desolação, raiva. A vida do Léo, o prostituto de rua, trouxe-me à memória um livro que li em miúdo, mas de uma densidade talvez não aconselhada para um décimo sétimo ano de vida: Puta de Prisão, escrito por Isabel do Carmo, em co-autoria com outras senhoras, quando todas estiveram detidas com prostitutas de rua portuguesas. Tudo isto antes da descriminalização final da prostituição, em 1982, ano em que o Código Penal deixou de a prever. Elas eram presas por outros delitos, claro, ligados à política; as suas companheiras, mulheres desgraçadas, que faziam as suas vidas em ruinhas e ruelas, deitando-se com todo o tipo de homens, num quadro de degradação inenarrável.

   Encontrarão o mesmo em Sauvage, com a diferença de que estarão perante um rapaz de 22 anos que se deita com homens. Destruído física e psicologicamente, a morrer tuberculoso, arrasta-se numa existência subhumana a troco de dinheiro para sustentar os seus vícios. Não se pense que é um criminoso, não. Aquele rapaz, malgrado tudo o que de mau lhe sucedeu, e antevemos um passado difícil, que nunca é desvendado, tem os seus princípios. É de uma candura impressionante e impressionável, como se houvesse um núcleo dentro de cada um de nós absolutamente blindado a todo o tipo de erosão externa.




  Atreve-se a viver como quer, como um condenado pela vida. Vida que já pouco lhe diz. A sua inocência chega a ser enternecedora. Com os companheiros de rua, sujeita-se aos maiores riscos. Apaixona-se. Implora carinho, abandonado que está por uma família que nunca conhecemos. Busca protecção, quiçá um abraço, que pode vir inesperadamente de uma médica que lhe cura as maleitas, que já são várias para a sua idade.

  Félix Maritaud tem em Léo um grande papel da sua carreira, que desconheço qual seja. Acompanhando-o, o realizador, Camille Vidal-Naquet, estreia-se em grande nas longas-metragens. Este Sauvage dói-nos por dentro. Invade-nos a sensibilidade com o retrato real de um mundo mau, miserável e impiedoso, onde a lascívia ganha à humanidade. Os lampejos de esperança surgem de gestos de altruísmo entre os rapazes. Às vezes, ou na maioria das vezes, mais dá quem menos tem.

15 de setembro de 2018

Diamantino (Queer Lisboa 22).


   Como presumo que vos havia dito, fui à sessão de abertura do festival de cinema queer de Lisboa (e Porto). Comecei a frequentar o Queer há uns dois anos. Gosto da temática LGBT em filmes, e o festival consegue proporcionar-nos uma semana vocacionada às orientações sexuais minoritárias + perturbações de género. Enfim. Não podia era ter começado pior. O filme de estreia, esta co-produção luso-brasileira, Diamantino, foi um horror. Só não o considerei tortuoso porque me sacou, a mim e à plateia, risadas ininterruptas.

  É um filme de fantasia e de ficção científica, meio psicadélico, com abordagens políticas e sexuais manifestas. Desde logo, inspirada na vida de Cristiano Ronaldo, como salta logo à vista. O jogador, a família e o seu meio servem de pano de fundo. Diamantino é o jogador bronco, ingénuo e de bom coração, todavia de pouca cultura, que sustenta uma família inescrupulosa e sedenta pelo seu dinheiro. Duas irmãs em particular, que o pai morre no início. Há um misto de homo e transexualidade, de tentativa de nos fazer crer que é possível vestirmos outra pele, tudo extremamente fantasiado.



  Também é, no fundo, um retrato do país que sonha com dias melhores e com o quinto império. Uma crítica ao nosso provincialismo, ao nosso mau gosto, à nossa pequenez. A "capela cistina", adaptada, decorada com um enorme crocodilo em balão. A abordagem política surge nas sucessivas referências à União Europeia, à crise dos refugiados e ao aumento da representatividade de partidos da extrema-direita nos países europeus, inclusive num Portugal monárquico que vive de glórias no futebol.


  As interpretações estão razoáveis para o que esperamos do cinema português, que este cinema português não aparenta sê-lo. Aliás, e muito embora tenha saído com as expectativas bem defraudadas - esperava um coming out de um jogador de futebol ou algo que o valha - fiquei impressionado com a originalidade, incomum no cinema nacional ou pelo menos no cinema nacional a que venho assistindo.

   Amanhã, terei nova sessão, e no domingo. Será uma edição do Queer mui particular. Esperem pelas minhas críticas aos filmes!

12 de setembro de 2018

Vários em um.


    Pretendo tratar vários assuntos, e nada mais fácil do que compilá-los aqui. Começarei pelo Motel X - Festival de Cinema de Terror de Lisboa. Fui a duas sessões, sendo que a última coincidiu com a de encerramento do certame. Apreciação global: não gostei muito, devo dizer. Tudo muito desorganizado - como de costume neste país - e poucas sessões para a procura. Fizeram uma gala de entrega de prémios que empurrou o último filme para horas tardias, desrespeitando-se o horário. As pessoas que pagaram os seus bilhetes, que nem todas o fizeram, não compraram sessões de encerramento, infindáveis discursos e outros que tais. Não pretendo repetir, a menos que saiba de um filme extraordinário em cartaz.



  Netflix. Criei conta recentemente. Estou a adorar. Tem poucos títulos, sobretudo em filmes, comparando-a com a brasileira e com a norte-americana, todavia dá imenso jeito, e afasta-me das redes sociais. Estou a usufruir do primeiro mês gratuito e ainda a decidir se fico ou se cancelo. Como adoro terror, tenho-me deleitado com alguns filmes bastante bons do género.

   E por falar em terror, fui ver, ontem, o The Nun. Péssimo, péssimo. Sim, realmente é muito mau. Uma sucessão de clichés. Tanta propaganda para um filme fraquinho, fraquinho. O final assemelha-se à agua da minha banheira a descer pelo ralo - se se decidirem a vê-lo, entenderão. A narrativa é desinspirada, e os efeitos são em demasia. Os clichés, esses sim, abundam, tornando a história banal, corriqueira, vulgar mesmo. Humor (sim, tiveram essa pretensão) mal conseguido e interpretações para lá de ruins.



   Aulas e compras. Tenho comprado imensas coisas para a rentrée. Roupa, muita, um guarda-chuva giríssimo, um relógio, um perfume, enfim, que se juntam a tanto e tanto que comprei a pensar no tal regresso. Sinto um nervoso miudinho, como se estivesse a entrar, agora, pela primeira vez no ensino superior. Fi-lo há oito anos, e eventualmente poderão procurar pelas publicações de Setembro de 2010. O voltar, a rotina, o estudo. Sentir-me válido. Útil.
   É natural que - mas não quero com isto dizer que suceda obrigatoriamente - o blogue se ressinta, isto ao nível da periodicidade de publicações, que a bem ver nunca estabeleci nenhuma. Eu quero mesmo terminar aquilo. Quando digo mesmo, é realmente mesmo. Quero dar tudo o que não dei e que devia ter dado. Tive oportunidades e não as aproveitei. Fui leviano. Não quero que se repita. Muita merda - deve ser a primeira asneira em quase onze anos de blogue.

7 de setembro de 2018

Papillon (2018).


    Não ter visto o clássico de 1973 ajudar-me-á a uma análise imparcial, assim creio. Papillon conta-nos a estória verídica de Henri Charrière, que nos anos 30 foi condenado a prisão perpétua na então colónia penal da Guiana Francesa, deportado directamente da Franca metropolitana. É uma longa dura, duríssima, que nos mostra o horror dos tratos desumanos e degradantes naquele campo de concentração, porque o era. Havia, inclusive, trabalhos forçados. Com a ajuda de outros prisioneiros, um dos quais que o acompanharia até ao fim, Papillon protagoniza fugas inusitadas, sendo capturado e acabando por parar na solitária por duas vezes, a primeira por 2 anos e a segunda por 5, com períodos em total escuridão. Sobreviveu a tudo, rigorosamente a tudo, uma vez que consegue, após anos, evadir-se da terrível ilha do Diabo, último reduto da colónia penal, para onde iam parar os prisioneiros com pior comportamento.

    Dizem, os entendidos, que este filme fica aquém do original, de 1973. Pela minha experiência com remakes, a maioria deixa-nos a suspirar pelas versões anteriores. Acredito que este não seja excepção e que deixe os fãs decepcionados. Eu gostei das interpretações dos actores principais, Charlie Hunnam e Rami Malek, muito embora as considere um pouco frouxas para o que se pedia. Faltou-lhes envergadura. Não que tenham estado mal, mas, e sobretudo em Hunnam, o Papillon, faltou-lhe conseguir transmitir a destruição que anos e anos de cárcer, e naquelas condições, produziriam num homem.

   A fotografia é um dos pontos altos, o que se compreende, de facto, tratando-se de regiões do globo com relativamente pouca intervenção humana.

   A determinado momento, a relação que se estabelece entre Papillon e Louis aparenta ter subjacente algum homoerotismo. Eu, pelo menos, assim o terei entendido. A protecção que um dava ao outro, os olhares de cumplicidade. Amizade, talvez, mas porque não algo mais que nunca se chegou a consumar? Não seria de se estranhar, estando aqueles homens profundamente desprotegidos, sem afecto. Vejam o filme e tirem as vossas conclusões.

   O final, tendi a considerar fraco. Sabemos que Louis fica na ilha, nada nos sendo dito quanto ao seu fim. É o que chamo de final cozinhado em microondas. O filme merecia algo mais arrebatador.

6 de setembro de 2018

Regresso & Unsane.


   Cheguei ontem a Lisboa. Foi uma semana. Passou depressa. Deu, entretanto, para fazer praia, piscina, passear de noite, à beira-mar. Ajudou-me, sim, ajudou. Lisboa é claustrofóbica. Faz bem mudar de ares, ver pessoas diferentes, fazer coisas diferentes. Aliás, venho-vos falar de um duplo regresso. É que, concretamente na quarta que vem, de hoje a oito, retornarei às aulas. A ver se é desta que dou por concluído certo processo que teima em se eternizar. Em minha defesa, contudo, devo dizer que tive uns contratempos que me roubaram, lá está, tempo e vontade. E se não poderei dizer que sinta saudades da faculdade, sinto-as, sim, daquela dinâmica, e sobretudo de ser útil, quando mais não seja a mim mesmo (sim, quando mais não seja, e não "quanto mais", que é um erro).

A vista da varanda do aparthotel era deslumbrante


   No dia 4, e já a viver aquele período pré-regresso às aulas (parece que já vi isto, há oito anos, quando entrei na faculdade), o Motel/X - Festival de Cinema de Terror deu início à semana mais assustadora da capital. Adoro terror, e desconhecia o festival. Um contra-senso. Às vezes, é como se não vivesse neste mundo. Eu, um tipo sempre conectado às redes sociais, descubro eventos tão antigos quanto o Motel/X, que vai na sua 12ª edição. Estive lá ontem, dia 5. Fui ver o Unsane. Deus, que filme! Terror psicológico puro. Deixo-vos a breve sinopse, e uma pequena crítica, caso tenham curiosidade em vê-lo - não no festival, que não há repetições. 

Tive direito a desconto Yorn, o meu tarifário móvel


   Uma rapariga, perseguida por um psicopata / stalker, vê-se internada compulsivamente, contra a sua vontade, numa clínica de reabilitação para doentes mentais. Às tantas, o sujeito que a perseguia está lá a trabalhar, como auxiliar. Presumo que a intenção do realizador - já agora, Steven Soderbergh - tenha sido a de nos deixar na dúvida: o sujeito existiria ou seria apenas fruto da imaginação da rapariga? Seja como for, é uma narrativa extremamente claustrofóbica. Para onde quer que se vire, é como se todos conspirassem para que Sawyer visse o seu tempo de internamento prorrogado. 
  Gostei bastante do desempenho dos actores. Não é do meu terror favorito, devo dizer, que prefiro o que mexe com o sobrenatural. Veronica, precisamente, outro que está em cartaz. Os bilhetes esgotaram num ápice. Sendo o meu primeiro festival, desconhecia que devia comprá-los com alguma antecedência. Podiam pôr duas sessões em simultâneo, ou noutro dia, enquanto o evento decorresse. Enfim. Quero ver se ainda lá vou ver outro, antes do Queer, claro, que já conhecia - mas não há muitos anos também -, e que coincidirá com as minhas aulas. Terei de arrumar umas horinhas para passar pelo São Jorge, numa edição, a 21ª, creio, dedicada ao HIV / SIDA.