21 de abril de 2017

A tirania turca.


     É uma síndrome que percorre a Europa, não de uma ponta à outra, que Portugal tem-se sabido comportar condignamente, e damos uma lição à Europa dita civilizada. O extremismo recolhe poucos frutos no mais ocidental dos países do Velho Continente. Não conhecemos os discursos xenófobos, extremistas, que diabolizam minorias. Da Europa dita civilizada não faz parte a Turquia, que ainda é Europa, geograficamente, e que dirige a sua política externa para o ocidente. Aliado de primeira linha dos EUA, a Turquia é membro fundador da NATO, em 1949; do Conselho da Europa, no mesmo ano, e há perto de trinta anos acalenta o sonho de aderir à União Europeia. Em matéria de direitos humanos, o país retrocede, muito embora a abolição da pena de morte, num primeiro momento, tenha surgido como um sinal positivo que a Turquia parecia querer dar aos seus futuros parceiros.

      A Europa olha-a com desconfiança, e motivos não lhe faltam. Erdogan, o actual Chefe de Estado, sujeitou uma lei de revisão constitucional a plebiscito, por imperativo constitucional. O povo votou-a e fê-la aprovar. A partir de 2019, a Turquia, até então regida por um sistema parlamentar - em que o Governo depende do Parlamento -, tornar-se-á numa república presidencialista, ultrapresidencialista, eu diria, com um Presidente que acumulará os poderes legislativo, executivo e ainda terá a prerrogativa de nomear grande parte dos juízes dos tribunais superiores. O que teremos, em suma, será o fim da divisão tripartida de poderes e do sistema de checks and balances, em que os poderes se autocontrolam e autolimitam. A democracia sucumbiu aos devaneios autoritários de Erdogan. A Turquia, que contrastava com os demais países de maioria muçulmana pela sua relativa abertura, pelo Estado laico, pelo multipartidarismo, adensará a longa lista de Estados fanáticos.

     O país está dividido. Erdogan, que pede respeito pelo resultado, terá de lidar com a oposição, que não reconhece a vitória, já contestada e marcada por suspeitas de ilegalidade. Não me admiraria que o resultado do escrutínio tivesse sido obtido às custas de fraudes nas urnas. O Sim obteve pouco mais de 50 %. A sociedade turca está manifestamente dividida, e os poucos pontos percentuais que afastavam Erdogan do resultado que lhe seria favorável estão longe de convencer os analistas internacionais acerca da transparência no processo de contagem.

     Este retrocesso agudizará o preconceito ocidental contra o Islão. A Turquia é um ponto de passagem dos refugiados, lida há anos com revoltas na sua parcela do Curdistão. É frequentemente acusada de etnocídio do povo curdo.

      A adesão da Turquia à UE é improcedente. Não estão reunidas quaisquer condições. O regime turco demonstra rumar em sentido oposto aos princípios e aos valores que sustentam o bloco europeu. Bem assim, a deriva extremista na Turquia não auspicia nada de bom. Está em estado de emergência por um período indefinido, com sucessivas prorrogações. Há perseguições políticas. Pela sua importância estratégica e pela proximidade à Síria e ao Iraque, temo que o caos naquela região, tradicionalmente instável, aumente. A ventura de Erdogan será um estímulo aos populistas europeus que em breve enfrentarão a decisão popular. No ano de Trump e compinchas, nada me surpreende.

8 comentários:

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    1. É verdade.

      Veremos, agora, qual a escolha dos franceses neste domingo...

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  2. A Turquia está a um passo de se tornar um Irão ou Arábia Saudita...

    Vai ser um momento complicado quando a Europa quiser fechar as fronteiras e os turcos a quererem fugir...

    Verdade! Já leste o que os Otomanos fizeram em 1400 e qualquer coisa quando invadiram o Chipre, Grécia e Itália?!

    Grande abraço amigo

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    1. Faz-me lembrar o Irão antes e depois da revolução.

      O massacre de cristãos? Sim...

      um abração, amigo.

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  3. A Turquia já uma ditadura há muito tempo. Esse senhor quer ser um Sultão dos tempos modernos... vais algo me diz que lhe vai correr mal a vida.

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    1. Tenho um conhecido lá, em Ancara.

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    2. E qual é a perspectiva dele sobre o assunto? Está assustado?

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    3. Nada. xD Eu falei-lhe da instabilidade política lá, pelo Skype, e vê a reacção dele: "Não me digas que comparas isto com o Brasil?".

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