31 de agosto de 2016

O processo de destituição de Dilma Rousseff. (II)


    Meses após ter dedicado dois artigos ao processo de destituição, ou de impeachment, da ainda Presidente da República Federativa do Brasil, dar-se-á, hoje, o último passo que poderá levar, no limite, ao afastamento de Dilma Rousseff ou à sua reabilitação, reassumindo esta a Presidência da República confirmando-se a última hipótese. O processo, que foi previamente desencadeado pela Câmara dos Deputados, será decidido pela câmara alta do ordenamento constitucional brasileiro, o Senado Federal, onde oitenta e um senadores votarão em consciência.

    A minha experiência com este assunto não tem sido a melhor. Felizmente, tenho um leque apreciável de amigos brasileiros: alguns apoiantes de Dilma, para os quais tudo configura um golpe perpetrado pelos inimigos de Lula e da Presidente e por uma classe social que vê no governo do PT a perda dos seus privilégios, e outros que vêem na Presidente uma mulher corrupta, culpada do crime de responsabilidade, que abordei previamente, tendo incumprido com a lei orçamentária e tendo praticado as designadas pedaladas fiscais, que tanto burburinho têm gerado, e que consistem, sucinta e brevemente, numa operação em que se prorroga o prazo das verbas devidas às instituições de crédito, vulgo bancos, públicos, por forma a apresentar um quadro positivo nos indicadores económicos.

    Procurei manter a devida equidistância por não ser brasileiro e por não querer transmitir a ideia de que pretendo imiscuir-me nos assuntos internos do Brasil ou afrontar a sensibilidade dos meus amigos de além-mar. A verdade é que, no meio de uma calorosa discussão, perdi um, que demonstrou ser deveras intransigente, e tenho a sorte de contar com o bom senso dos demais.

     Convém deixar assente que não ganho e nem perco nada se Dilma for destituída ou reabilitada. Enquanto estrangeiro, mas sendo lusófono e mantendo laços afectivos, alguns familiares, com o Brasil, não consigo ficar indiferente a toda a crise política que tem afectado a credibilidade do país irmão. O clima de falta de transparência e teatralidade, com episódios que, ainda que considerando o facto de a política latino-americana ser mais intensa e acesa, me reportaram a uma comédia circense, não conferem qualquer margem para que se confie na pertinência deste processo. E não me alongarei. Os trâmites estão a ser cumpridos e, aparentemente, tudo está a processar-se na normalidade constitucional e legal. A última palavra caberá aos senadores.

     Seja qual for o desenlace, importa referir que o Brasil, em menos de trinta anos, passou por dois processos de impeachment: com Collor de Mello, no início dos anos noventa do século passado, e agora com Dilma Rouseff. Antevejo a necessidade de uma reflexão profunda no país, pelos brasileiros, e de uma reforma estrutural que recupere a confiança do povo nos seus dirigentes políticos, porquanto a corrupção e o clima de impunidade são comuns e transversais aos variados quadrantes partidários.

* Às 18, hora de Lisboa, soubemos que o Senado aprovou a destituição de Dilma Rousseff.



14 comentários:

  1. Meu caro Marco, o "amigo"(?) que perdeste, eu "assisti" à discussão no FB e até participei nela, não te merecia. Disse-te coisas que mostravam que não te conhecia de todo e é muito bom, acredita, perder "amigos" desses.
    Abraço amigo.

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    1. Querido amigo João,

      Ainda bem que se foi. Não tenho a menor paciência para pessoas assim, que desconhecem a cordialidade e a pluralidade de opiniões e convicções.

      um grande abraço.

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  2. Golpe "sofisticado", camuflado pelos trâmites de um processo de impedimento, confirmado por senadores que votaram a favor e admitiram em entrevistas que não houve crime de responsabilidade, por isso mantiveram os direitos políticos da presidente. Golpe similar ao sofrido por Fernando Lugo em 2012 no Paraguai. Em seus 193 anos de existência, o que não falta são golpes na história do Brasil, o que não falta são presidente impedidos de concluírem seus mandatos. Novamente, os políticos brasileiros adotaram o parlamentarismo e esqueceram de consultar a população se ela o queria. As consequências são já são sentidas e continuaram a ser.

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    1. 193 enquanto Estado soberano. :)

      Dilma alegou que foi afastada por não ter a maioria no Congresso e que tudo não passou de um golpe do «usurpador» Temer. Efectivamente, todo o processo de destituição é muito suspeito. Anularam-se os votos de mais de cinquenta milhões de eleitores, num assomo parlamentarista que a Constituição da República não prevê. Bom, Dilma pode sempre recorrer, como anunciou que faria, para o Supremo Tribunal Federal.

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  3. Bacana os portugueses estarem antenados neste assunto...

    De certa forma repercutiu o mundo, que de fato, com a saída da cúpula de ladrões, há uma pequena esperança de melhoria, afinal políticos são conduzidos pelo roubo e pela ganância compulsória...

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    1. Sim, a crise teve bastante repercussão por Portugal.

      Como referi, a corrupção não será exclusiva do PT, havendo; encontrar-se-á no PMDB e em outros. Aliás, o próprio Temer tem uma idoneidade muito discutível.

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  4. Todo o processo foi revestido de plena legitimidade e respaldado pelo Supremo Federal. O seu desenlace apenas reafirmou a vontade do povo brasileiro em sua maioria demonstrada nas ruas. Tão somente os sectários e as militâncias profissionais alojadas nos sindicatos pelegos e nos movimentos sociais também pelegos e alimentados pelo PT que os abastecia com dinheiro público. Cumpriu-se a constituição e a posse foi dada ao Vice de Dilma, eleito pelos mesmos eleitores que elegeram Dilma [e por duas vezes - dois mandatos]. Eu nunca votaria em Temer [eles o elegeram] e agora temos que tê-lo como presidente por dois anos e 4 meses. O lastimável foi o golpe final na decisão, perpetrado por aqueles que sempre defenderam Dilma. O fatiamento da votação da sentença e a não condenação com a perda dos direitos políticos pena estipulada pela constituição em seu parágrafo 52 como pena associada. Este aspecto sim, será levado aos tribunais e com certeza será revisto.

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    1. É interessante, amigo Paulo, porque o processo dividiu o Brasil. Não podemos afirmar que haja qualquer consenso nesta matéria. Milhões de brasileiros clamam pela ilegitimidade do impeachment. Ele é legal, disso não reste dúvida. Cumpriram-se os preceitos constitucionais e legais. A ilegitimidade poderá levar-nos a outras considerações. Dilma foi eleita pelo povo e destituída por uma conjura parlamentar.

      A inelegibilidade para cargos públicos é, como referiu, uma pena acessória. Se os senadores se pronunciaram desfavoravelmente à aplicação dessa medida, terão os seus motivos.

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    2. Dividido sim mas não nesta proporcionalidade a que vc se refere. Milhões sim ... a favor.
      Alguns poucos milhares de militantes contra.
      Só observar as manifestações, as conversas de rua, as pesquisas, etc etc etc ...

      Beijão amigo

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    3. Amigo Paulo, considerando que a maior parte dos órgãos de Comunicação Social brasileiros é favorável a Temer, não duvidaria que quisessem fazer crer de que tudo tem decorrido na mais absoluta tranquilidade. Mas não é assim. Temer é impopular. Serão apenas milhares que se posicionam favoravelmente a Dilma? Seria preciso fazer um estudo isento.

      um abraço grande.

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  5. Um Golpe de Estado num país democrático em pleno século XXI

    Ás vezes eu pergunto se as pessoas sabem que vivem em Democracia ou debaixo de Governos Corruptos que são as cara das famílias mais abastadas e que não querem perder o seu quinhão?!

    Dá-se pão, sardinha e musica e o povo sai à rua cantando e dançando

    Grande abraço amigo

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    1. Não acredito que tu, um homem de direita, és solidário com o governo petista de Dilma Rousseff, hahah.

      um abraço grande.

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  6. Lá porque sou mais de Direita. Afinal as Ditaduras de Esquerda sempre mataram mais gente que as Ditaduras de Direita. Mas, falamos mal do Hitler porque matou tantos judeus. Não foi ele. Foi um General que lhe ofereceu como prenda de aniversário lololololololol O Povo fala o que ouve...

    O que foram os Judeus mortos ao pé do povo russo morto por Estaline e outros que tais...?!

    E continuo a acreditar que não morreram assim tantos milhões de Judeus. De pessoas (ciganos, gays, opositores alemães, deficientes etc etc) acredito. Os Judeus foram perseguidos porque eram ricos, e para financiar uma Guerra, é preciso ter dinheiro.

    O que fez o Marquês de Pombal após o terramoto?! Não mandou matar os Távoras para financiar as obras?!

    Já viste alguma manifestação ou museu em honra dos Távoras?!

    Claro que não, vives num país de "burros" lolololololololol

    Grande abraço amigo

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    1. Sabes, amigo, eu não costumo distinguir tiranos. Para mim, Estaline e Hitler foram iguais, bem como Pol Pot, Idi Amin, etc.

      Qualquer regime que desrespeite o valor da vida humana é execrável, e para tal basta que desconsidere uma única vida humana.

      Não comento as tuas demais considerações. :)

      um abraço.

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