29 de setembro de 2013

Quem Quer Ser... tomado por parvo.


   Como se sabe, o famoso programa televisivo Quem Quer Ser Milionário voltou ao pequeno ecrã. Não saber seria impossível. A RTP fez questão de bombardear tudo e todos com o regresso do seu formato por excelência ao horário nobre. Desta vez, com um detalhe especial: o concurso não viria sozinho; com ele, Manuela Moura Guedes, o rosto afastado, censurado, banido de uma estação sensacionalista, especificamente de um noticiário mesquinho e de parca credibilidade. Convém referir de que nada tenho contra a Manuela Moura Guedes. Nada contra, nem nada a favor. Retenho uma das suas afirmações pós-saída da TVI: o jornalismo tem de ser contra poder. Ora eu que nem estudo jornalismo, mas que por acaso até nem me importaria nada de seguir uma carreira nessa área (aliás, penso nisso), fiquei, digamos, perplexo. Querida Manuela, o jornalismo não tem de ser contra poder, a favor do poder, ou seja lá o que for: o jornalismo tem de ser imparcial. A menos, claro, que nos refiramos à TVI ou aos falecidos 24 Horas Tal & Qual. Vá, convenhamos, seria uma ofensa para o bom jornalismo que por cá se faz.

   Gosto de concursos. Já miudito, testava os meus conhecimentos neste tipo de programas em que a RTP aposta de quando em vez. Têm interesse. Agora até poderia dizer que acerto em cerca de oitenta por cento das perguntas, mas não o irei fazer. Chamar-me-iam convencido e o elogio em causa própria é do pior que há. Participar também está fora de questão. Aparecer na televisão será a apresentar um noticiário ou um qualquer programa das tardes ou das manhãs. Sim, talk-shows incluídos, não me importo nada! Ganha-se bem, trabalha-se pouco (falar, fazer umas palhaçadas, não é trabalhar) e ainda se tem uma notoriedade incrível. Ah, e dá sempre para impressionar miúdas, han.

    Damos por barato de que há todo um processo rigoroso na escolha das perguntas, acreditando mesmo que são dados garantidos, e o contrário nem nos passará pela cabeça. Estaremos certos?
   Não vejo televisão, contudo, o interesse pelo programa levou a que fosse pesquisá-lo no sítio da RTP na internet (agora está na moda ser-se contra os estrangeirismos, sobretudo os anglicismos, qual febre pela pureza linguística). De uma assentada, vi todos os episódios, ou melhor, vi até ao penúltimo porque perdi a vontade de assistir ao último. O que se passou? Resumidamente, uma participante estava a jogar para a oitava pergunta, de dois mil euros, que era a seguinte:

   "Complete o provérbio: Dezembro frio, calor no... A: domicílio; B: aconchego; C: abrigo; D: estiLo"
   
   Nunca fui bom em provérbios. Ao ler a pergunta e as quatro opções, o estilo realmente dizia-me algo. A senhora fez um raciocínio lógico: domicílio não seria porque, à partida, os provérbios são o expoente da sabedoria popular que não costuma passar da simples gíria; abrigo remetia-a para os 'abrigos' dos Aliados na II Guerra Mundial (posição da qual discordei porque abarca também outro significado: o de abrigo propriamente dito, algo contra o frio onde nos 'abrigamos', passo a expressão); estilo não fazia qualquer sentido, logo, decidiu-se pela hipótese B, aconchego. Errou, claro. A resposta correcta foi a D, estilo, ganhando quinhentos euros.

   Fiquei com cócegas cerebrais e fui investigar junto da avó, que me disse imediatamente: "Dezembro frio, calor no ESTIO". Pesquisei na net e vi uma série de pessoas, indignadas, que reclamam junto da RTP para que corrija o enorme erro que cometeu, dando de novo uma oportunidade à concorrente injustamente afastada. Estio significa quente, calor; neste caso, Verão. Mais ridícula do que a situação em si foi a explicação de Moura Guedes perante a admiração da senhora e de um membro do público: estilo porque significa escolher a indumentária (vocábulo utilizado pela apresentadora, correcto, mas que numa situação desta natureza ainda torna tudo mais cómico) para... o frio. Então, não deveria ser algo relacionado com o calor? A expressão corporal de Manuela Moura Guedes, que acredito agora de que cedo se apercebeu de tudo, ainda é mais hilariante. Como se costuma dizer: se não fosse tão infeliz, teria piada.

   Não é algo inédito ali para os lados do Cabo Ruivo. Aqui há uns anos, a estação cometeu um erro semelhante numa das edições do, imagine-se!, mesmo programa, em que uma concorrente foi induzida em erro com a seguinte pergunta: "Qual das seguintes personagens de banda-desenhada foi mais vezes recriada no cinema? A: Zorro; B: Super-Homem; C: Tarzan; D: Batman."  A senhora escolheu a resposta C, Tarzan, no entanto, o programa diria que era a resposta A, Zorro. Deu em chatices. A senhora estava convencida da resposta, a qual sabia efectivamente, comprovando-se de que a opção correcta era a CEntrou na justiça com um pedido de indemnização. Eu sei disto porque fiz um caso prático na faculdade a propósito desta situação verídica. Resultado: o STJ, salvo erro, num acórdão extenso, considerou de que se tratava de uma mera obrigação natural, acrescida de um termo de participação que todos assinam antes, ao que parece. Baseando-se no artigo 1245º do CC, que nos diz que as apostas e os jogos não são contratos válidos nem constituem fonte de obrigações civis, com remissão para o 402º CC, que enuncia expressamente que as obrigações naturais fundam-se em meros deveres de ordem moral ou social, não sendo - e isto é muito importante - judicialmente exigíveis. Fez-se uma ressalva ao mero 'dever de justiça' que consta na última parte do artigo, o que não teve força por si só. Julgou-se a acção improcedente.

    Lamentável. Um erro igual nos mesmos moldes. Há quem não aprenda. Melhor, para quê emendar? A lei dá cobertura, inclusive...

    Pensem duas vezes antes de concorrer a isto.

34 comentários:

  1. a sério? que nojo. é a palavra que me ocorre. uma televisão pública, paga com o nosso dinheiro, uma senhora que pouco dignifica o jornalismo, com os comentários parciais que fazia pela tvi e as perseguições aos políticos. enfim, não vejo muita tv, excepto uma ou outra série nos canais por cabo. mais uma razão para não ver a 1.
    bjs.

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    1. A credibilidade da RTP, da produtora do programa e da apresentadora está nas ruas da amargura. Das duas, uma: ou se enganaram mesmo ou pensaram que um erro destes passaria despercebido...

      E a senhora até estava a fazer um bom jogo.

      beijinhos.

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  2. Realmente, lembro-me dessa polémica e já tinha ouvido falar também da pergunta do esti(l)o. Volta e meia também vejo esse tipo de programas, mas na maioria das vezes é alguém que me pergunta cá em casa: "Ó Inefável [calma, não é o meu nome xD], qual é a resposta certa?"
    E participar num está fora de questão!! lol

    Abraço! :)

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    1. Ahahahah, adorei! "Oh Inefável (...)" :DD Dei uma gargalhada! :D

      Eu vi na net o triste programa do 'estilo' e depois fui pesquisar as 'ondas de impacto'. De facto, há pessoas revoltadas e com razão. Aparentemente, o direito não tutela estas participações. :s

      abraço. :)

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  3. "(falar, fazer umas palhaçadas, não é trabalhar)" correção amigo, é um trabalho, um trabalho diferente, a maioria das coisas já são programadas e as que não são, são as mais difíceis porque exigem que escondamos as nossas verdadeiras emoções, como se nada de mau alguma vez se passasse, é um grande trabalho psicológico :)

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    1. Eu diria antes que é uma arte. É claro que nem todos terão aptidão para apresentar um programa, improvisar, entrevistar. Chamar-lhe de 'trabalho' é que não consigo. :)

      Quando escrevi, não me referia a um/a bom/a jornalista; referia-me àqueles senhores e àquelas senhoras que rebolam no chão, dizem 'meia dúzia' de disparates e ganham fortunas mensalmente; pelo contrário, há quem trabalhe, isso sim, no duro um mês inteiro e ganhe uma miséria.

      Parafraseando Amália Rodrigues: "Cantar, cantei muito; trabalhar, nada!"

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    2. "Cantar, cantei muito; trabalhar, nada!" é tão Amália Rodrigues lolol! Uma outra frase dela que me ficou foi: "Estive quase quase para ser bonita, estive quase quase para ser alta." Acho que era algo assim. :) Faz lembrar também o poema "Quasi" do Mário Sá-Carneiro.
      Já agora: és admirador de Amália?

      Abraço!

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    3. Sim, ahahah. Procura pela entrevista da Amália no 'Piano Bar', programa apresentado pela Simone de Oliveira. Está disponível no Youtube. Ela disse isso e provocou a gargalhada geral. :D

      Muito admirador. :) Em pequeno já trauteava os seus fados. A mãe e o pai adoram fado e incutiram-me esse gosto desde criança. Frequentemente íamos a casas de fados pela cidade. :)

      abraço. :)

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    4. Ao reler a sua biografia, encontrei isto: "Fiquei muito contente de me terem convidado, mas estava farta da América e vim-me embora. Eu nunca trabalhei na vida e para fazer um álbum com canções americanas tinha de ficar ali a ensaiar, a trabalhar. Eu gosto de cantar sem estar a pensar que estou a cantar. Não sei cantar de outra maneira. E bastava-me a preocupação de estar a falar em inglês para já perder muita espontaneidade." (pp. 108-9)

      :)))) Abraço!

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    5. Ora bem. :)

      A Amália era uma Diva como não houve e nem há em Portugal. Temos grandes senhoras como a Simone, por exemplo, mas falta sempre 'qualquer coisa' para se chegar a Diva. A Amália tinha uns trejeitos próprios, algo de muito especial na sua forma de estar informalmente e de cantar. Algo que foge ao comum dos mortais. E não era forçado. :)

      abraço. :)

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    6. Temos mesmo muito que falar! xDD

      Abraço!

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  4. KKKK que furada :D Engraçado isso, aqui também tem esses ditados populares :) Eu acho que a emissora e a apresentadora deveriam falar algo, corrigir o erro né... A lei não protege esses casos? Tá na hora de mudar :) rs

    Abraços!

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    1. Pelo menos um pedido de desculpas formal. É o mínimo que se exige! :/

      Infelizmente, analisando a jurisprudência, não protege. Um caso semelhante, como relatei, terminou desfavoravelmente para a concorrente.

      abraço. :)

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  5. Eu tive a sorte de crescer com a MMG no seu auge :)

    Ainda não era casada e tinha uma grande garra. Pena! Que esses tempos já vão longe, longe.

    Quanto a esses "Erros", até nem os considero muito graves, uma vez que ainda me lembro de ter saído a bola zero(o) no Totoloto.

    Estou com a Margarida, andamos nós todos a pagar a taxa de audiovisual na factura da EDP para andar a sustentar estas pessoas e programas...

    Abraço amigo Mark

    P.S - Concorre que ainda ganhas euritos. Se correr mal, amanhã já ninguém se lembra.

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    1. Sim, ela tem múltiplas facetas: apresentadora, política (foi deputada da AR pelo CDS/PP) e até cantora. LOL Aliás, um êxito notável: 'Foram Cardos, Foram Prosas'.

      São erros graves na medida em que a RTP e a produtora do programa não garantem um comportamento justo caso ocorram. E a lei, pelos vistos, não tutela situações destas. Faz parte do jogo ganhar e perder. O que não faz parte é errar tropeçando num erro da produção.

      Sou contra a privatização da RTP, mas já fui mais...

      Não, ahahah. Está fora de questão. :P

      abraço, Francisco. :)

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  6. Olha, eu acho, na sua base, o programa chato, e o formato gasto.
    Mas, por acaso (mentira - por coscuvelhice em ver o regresso da manuela) estava ligado na rtp nesse preciso momento e vi a pergunta - eu conhecia bem o ditado (que é antigo - e por amor de deus, quem lê literatura sabe o que é o estio) - e como todas as respostas eram, no mínimo, absurdas, mudei imediatamente de canal. A mim pouco me interessa a justiça neste caso (mas agradeço a explicação) - anotei simplesmente a má fé, do programa e da estação. E isso, para mim, é uma sentença sem direito a recurso.

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    1. Eu gosto do programa. Os formatos gastos têm muito que se lhe diga. A Oprah teve um programa no ar por vinte e cinco anos e sempre com sucesso. Critico é a escolha sobre MMG. Ela não tem jeitinho nenhum para aquilo.

      Alex, a hipótese 'estio' não apareceu. O que querias que a concorrente dissesse?

      'Olhe, não é estilo, é estio!'

      Põe-te na posição dela. Só poderias argumentar assim caso essa opção fizesse parte do leque e ela escolhesse outra. A senhora até me pareceu minimamente culta.

      Eu não pesquisei na net o significado de estio. Pesquisei na net o ditado que, de facto, não conhecia.

      É provável que a senhora conheça o vocábulo. Teve de responder escolhendo uma das hipóteses que lhe colocaram, estando debaixo da pressão normal de um programa televisivo.

      Além do programa e da estação, o legislador também estava de má fé quando decidiu não tutelar casos desta natureza.

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  7. isto já foi conversa do trabalho de hoje, é um pouco ridículo como cometem assim um erro, mas errar é humano, ridículo será mesmo se a senhora não tiver uma segunda hipótese ou pelo menos, pelo menos ganhar os quinhentos euros em questão.
    quanto a manuela boca guedes, sem comentários.

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    1. LOL, 'boca' Guedes! xDD

      A senhora ganhou os quinhentos euros, Aaron. O problema é que perdeu injustamente. Não se sabe, caso tivesse aparecido 'estio' na hipótese D, se ela teria ou não optado por essa. Imaginemos que teria. Continuaria no jogo.

      :/

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    2. então yah, devia no mínimo ter uma segunda hipótese!
      nunca tinhas ouvido a expressão manuela boca guedes? é que ela só tem boca xD

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    3. Sim... É que nem um pedido de desculpas. :/ Ao que parece, e segundo uma notícia que a Margarida gentilmente me fez chegar, o programa, através de MMG, diz que há uma versão alternativa do provérbio com a palavra 'estilo'. LOL Ridículo.

      Já tinha ouvido e concordo. Cabe lá um pão de quilo! LOOOL xD

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  8. Gosto muito do formato do programa, mas ainda não vi nenhum desta série com a MMG que acho devia não mais fazer televisão depois do que fez na TVI, mas isso é outra história.
    Não vi o programa, mas claro que conheço o provérbio e fácil me seria ver que havia um erro na palavra "estilo" (um "l" a mais). Se estivesse no lugar da concorrente e porque conheço o provérbio teria dito que não seria nenhuma das respostas pois a resposta correcta era "estio". Não sei o que daí teria resultado, mas estaria curioso em saber...
    Mas o que interessa aqui é a cretinice da explicação da MMG para justificar o injustificável.
    Um absurdo completo.

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    1. Sem dúvida, João, do pior jornalismo televisivo que já se fez por cá.

      O programa mantém o interesse. Continuo a gostar do formato após anos volvidos. Ainda me lembro da primeira edição apresentada pelo desditoso Carlos Cruz!

      Eu provavelmente erraria ou escolheria 'estilo' sem saber. LOL Teria acertado por puro golpe de sorte porque, efectivamente, desconhecia o provérbio.

      O pior é não remediarem a situação. Avolumam-se as desculpas esfarrapadas... :s

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  9. É de facto lamentável. E a Moura Guedes só piorou mais ainda as coisas com as tentativas que fez para defender o proverbio errado. A TSF fartou-se de gozar com isso, mas ela não desarma porque continua a defender que o proverbio está correcto na página dela do facebook :(
    Enfim...
    Abraço Mark.

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    1. É insistir no erro, Arrakis. :|

      Ah pois, já se esperava que gozassem com eles. :D

      abraço, Arrakis. :)

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  10. r: eu já não sei se tenho saudades dele, ou se tenho saudades do "nós".

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  11. Enfim, palavras para quê? Só mesmo no nosso país para acontecerem coisas destas, em que até a lei protege este tipo de situações...!

    Abraço :3

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  12. isto é uma corja d urubus que passam vida a f ...se uns aos outros mas quando cai a cara, protejem-se c o pior teatro k ja vi em tv. ate os jogadores da bola treinam fifias.
    esta parasitagem vive por dentro do escalpe do povo. pk os piolhos no pêlo,a gente mata!

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  13. Caros comentadores, apesar de não ter nada de pessoal contra a Manuela Moura Guedes, venho pôr uma acha na fogueira da parcialidade que se me afigura existir num programa cujo formato deveria, SEMPRE, pautar-se pelo rigor e justiça no tratamento dos concorrentes. Tal, infelizmente, não acontece, pois assisto a sessões em que a Sra. não olha duas vezes para a cara da pessoa que tem à sua frente, linchando-a logo que se lhe apresenta uma oportunidade, e a outras - aqui, relembro as emissões dos dias 21 a 23 do presente mês - a quem só falta perguntar se quer que lhe revele literalmente a resposta, aceitando as "boboquices" de uma pessoa meio-lerdinha, mas muito sortuda (pudera...) fazendo deste um jogo de regras contornáveis pela empatia/simpatia/ou outra coisa qualquer (quem sabe, diretivas da produção???) que leva a sra. a formatar e a conduzir o programa ao sabor de humores e óbvias tendências (e mais não digo...).
    Além desses erros grosseiros apontados por vós, deixo este apontamento... isto,porque gosto sinceramente do desafio que o formato lança. É pena vê-lo, assim, despojado da sua essência...

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    1. Eu costumava ver o programa através do site da RTP (quase nunca ligo a tv). Cansei. Não por culpa da apresentadora (até gosto do formato). Enjoei, ahah.

      Obrigado pela sua opinião. Participe sempre que queira. :) Bem-vindo!

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