18 de junho de 2013

Humor & Preconceito.


    É raríssimo ver televisão. Já em criança, antes do boom da internet verificado no final dos anos 90 do ido século XX, não era comum ficar na sala de estar em frente ao aparelho que mudou o mundo. Preferia ficar a ver a mãe a tratar das suas papeladas, ou o pai. Em todo o caso, se me dessem um livro para as mãos tinham sossego garantido por horas, isto quando não estava entretido com as sociedades que criava com os meus bonecos. Posso garantir de que eram melhor organizadas do que as actuais. 
  
   Ontem, liguei a televisão do quarto. Oh, espanto e admiração! Não estivesse ainda a recuperar da entrega do trabalho e o aparelhito não conheceria qualquer interesse da minha parte. Mudo para o canal do Estado e acho piada àquele programa apresentado pelo humorista Luís Filipe Borges. Gosto de humor e gosto daquele que, sendo inteligente ou não, me faça rir. Essa é a premissa e rio da anedota mais patética quanto da história mais subtil. Gargalhar urge. O que não tolero é machismo e sexismo. Azar o meu, que no dia em que ligo a televisão após meses, dou com uma das situações que mais repugnância me causa. No início do dito talk-show, à entrada de uns senhores acompanhados dos respectivos filhos, o dito Boinas dá um beijinho às meninas; mas, quando confrontado com a presença de um rapaz, igualmente pequenito, que confundiu com um menina, diz a típica frase hedionda que me agonia:

   «Ah, é um rapaz, então é um 'passou bem'!»

   Eu sou do tempo, em pequenino, em que os amigos homens da mãe, tios, avôs e demais me davam um beijinho, independentemente de eu ser um menino. 
    Não beijam um rapaz porque é do sexo masculino, tratando-o como se estivessem perante um homem adulto. São estes preconceitos enraizados profundamente na sociedade que me arrepiam até ao último centímetro da minha pele. Céus, é uma criança pequena. Não foi a primeira vez que vi algo semelhante. Já vi, inclusivamente, ao vivo e a cores. Nestas atitudes é visível o preconceito, o machismo ridículo e o estímulo para que aquele menino reaja de igual forma quando chegar à maioridade. Também ele achará apenas aceitável a demonstração de afecto para com o sexo oposto. Já chegámos ao cúmulo de distinguir o género das crianças para efeitos de um mero cumprimento.

    Chegará o dia em que um pai só dará um beijo às suas filhas, optando pelo aperto de mão aos filhos homens, não vão eles dar em amaricados. É melhor mesmo não ligar a televisão.

24 comentários:

  1. Compreendo te e também me faz confusão os pais tratarem os filhos pequenitos na terceira pessoa....

    Abraço

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    1. Sim, mas é substancialmente diferente. Isso é uma questão de tradições familiares, um mero pronome. Não dar um beijo a um menino porque é do sexo masculino, optando-se por um aperto de mão, é terrível. Consigo, contudo, entender a confusão que possa provocar. :)

      abraço.

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  2. e imagina ouvir a resposta de um avô à pergunta de que um bebé tinha olheiras (têm, mesmo que durmam muito); quis ser brincalhão e saiu isto: 'é que na noite passada foi às gajas com o avô...'
    mas, vá lá, pelo menos, enche o menino de beijos e carinhos e é uma ternura vê-los :)
    bjs.

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    1. Essa, apesar de tudo, dá para rir. :D

      beijinhos.

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  3. Bem comum isso em nossas sociedades, aqui passa igual :( Acho ridículo também! Criança tem que ser acarinhada independente do sexo. Pior que elas crescem com esses preconceitos..

    Abraços!!

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    1. Pois, as repercussões mais tarde ainda agravam... :s

      abraço.

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  4. Já conheço vários pais que cumprimentam os filhos, homens, com um aperto de mão. Eu nunca o fiz, e mesmo ao meu irmão cumprimento sempre com um beijo.
    Já nalgumas situações vejo um pouquinho de evolução: é mais vulgar hoje, ao ver um jogo de futebol, ver dois jogadores beijarem-se, sem quaisquer conotações homossexuais, mas de uma forma carinhosa e amiga.

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    1. Eu creio que nunca vi entre pais e filhos. Deve ser algo horrível. Tão impessoal e feio! Enfim, não encontro palavras para descrever a atitude de um pai que não beija o SEU filho apenas porque este é homem.

      Eu cumprimento os meus tios com um beijinho, nem todos, confesso, mas já não sou uma criança. Beijo o meu irmão, os meus avôs e o meu pai, naturalmente.

      É curioso e em nada está relacionado com o que abordei, mas vi, há dias, dois jogadores de um desporto qualquer a beijarem-se efusivamente após a conquista de um título, algo assim. E foi cá em Portugal. :)

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  5. Não considero que o Boinas o tenha feito por machismo, mas sim por brincadeira a meu ver normalíssima. "Afinal já não és um menino, és um homem grande!"

    Mark, estás mesmo a precisar de ver mais televisão. Larga a internet, os livros, as sebentas e acorda para a actualidade. Não olhes tudo em tua volta como se fosse realmente mau. Há que dar desconto aos mais "descuidados".

    Há vida lá fora...

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    1. Pois, mas eu não o entendi assim e tenho quase a certeza de que não o fez com esse intuito, até porque analisei a sua reacção e nem são atitudes insólitas. Há homens que não beijam crianças do sexo masculino, preferindo apertar-lhes a mão.

      Quanto à segunda parte do teu comentário, falas sem qualquer conhecimento de causa. Se pensas que passo a vida a estudar, como a maioria dos meus colegas, enganas-te. Mas, se queres saber, deveria. Assim teria ainda melhores notas. ^^ E, não, não estou a precisar de ver mais televisão, de todo! LOL

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    2. Eu subscrevo o Ribatejano.
      Conheço o Boinas há muitos anos, dos tempos primevos da 'Revolta dos Pastéis de Nata', hoje uma lenda dos programas alternativos, de que o atual é sucessor. Ele é uma pessoa muito consciente dos preconceitos, e um senhor 100% gayfriendly. Apresenta, igualmente, um programa de história de portugal, que te interessaria imenso, pois é visualmente muito bem produzido e muito assertivo na profundidade da abordagem dos detalhes menos conhecidos. Curiosamente, também estudou Direito, e é um açoreano muito estimado aqui no continente. Sobre o episódio que referes, penso que ele agiu como qualquer outro apresentador, por exemplo Jorge Gabriel, o Malato, etc, teria cumprimentado e brincado com o menino. Só o João Baião teria, na certa, dado o beijinho (ou pelo menos as probabilidades são maiores) - o que não deixa de fazer pensar, visto que o João é mais desinibido quanto à presunção da sua 'mariquice', mais confortável com o seu lado feminino (entendendo-se ser-se meigo como característica proeminente feminina versus a masculinidade agressiva e formal). O que se passou foi um mero episódio de papéis sociais. E a tua análise está correta. Mas a tua reacção é uma 'overreacting' desnecessária. Confesso que também me importuna mais ouvir um pai a tratar um filho por 'você', coisa a que deves estar habituadíssimo na tua classe social. Portanto, é preciso relativizar. E sobre o papéis sociais masculinos, já vão mudando. Lentamente, mas vão.

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    3. Eu conheço o Boinas, também não estou tão alienado do mundo. x) Apenas sabia que era açoriano e recordo-me perfeitamente desse programa, 'Revolta dos Pastéis de Nata'. Desconhecia a sua passagem pelo Direito e o seu carácter gayfriendly. Fico sinceramente feliz por saber disso. :) Em relação ao programa de História, devo dizer que não fazia a menor ideia. Certamente interessar-me-ia.

      Provavelmente esses apresentadores que mencionaste teriam o mesmo procedimento e, mais uma vez, choca-me. E choca-me porque já estereotipam algo tão natural neste mundo: beijar uma criança. Beijar uma criança transcende o género das mesmas. É algo, a meu ver, primitivo no ser humano. Para quê puxar da mão? Lá está o preconceito, por menor que seja, a funcionar.

      "Os homens não se beijam e é melhor começar a incutir isto desde cedo."

      Queiramos ou não, simpatizemos com o Boinas ou não, é assim que tudo se passa. Compreendo quando referes que talvez o João Baião beijasse o menino por estar mais seguro da sua feminilidade, e lamento isso. É sinal de que os outros estão pejados de preconceitos, aliás, o que vem ao encontro deste meu texto e justifica-o cada vez mais, a meu ver.

      Assumo que a minha reacção seja, mais do que exagerada, surpreendente. Talvez porque tenha pouca experiência, talvez porque não consiga guardar para mim o que tenho vontade de dizer, talvez porque ainda mantenha alguma lucidez no meio de tanta coisa errada que nos rodeia. Por fim, talvez porque acredite que ainda é possível voltar atrás em alguns aspectos e tornar o mundo mais 'limpo' deste 'lamaçal' no qual vivemos.

      O 'você' é usado e não é. A televisão ajudou muito a propagar isso. Não corresponde inteiramente à verdade. Depende muito das famílias e das pessoas.

      Espero que tenhas razão quanto aos papéis masculinos e espero contribuir de alguma forma nesse sentido, mais não seja insurgindo-me. :)

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  6. Não vejo muita televisão, e diria que 65% das vezes são noticiários e canais de notícias, 30% é o Discovery e o NatGeo, e 5%... é o 'Portugueses pelo Mundo', lol...

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    1. Eu não ligava a televisão do quarto há meses, porque na sala de estar costumo ver de vez em quando. Quando o faço também são noticiários e canais de notícias que me prendem a atenção. Um filme, uma reportagem, uma entrevista, um debate e pouco mais. :D

      Pois, 'Portugueses pelo Mundo' condiz, é verdade, ahah. :DD

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  7. 100% de acordo: é mesmo MUITO melhor não ligar a televisão :)

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  8. Mark, não fosse eu um homem comprometido, pedia-te em casamento. Pelo simples facto de conseguires passar meses sem ligar uma televisão. É de Homem (com H maiúsculo, como espécie animal racional, sem conotações sexistas).

    Abobino essa "coisa". Mesmo para as noticías é tudo tendencioso e falacioso. Prefiro ler os jornais (online). Apesar de serem também tendenciosos, uma pessoa consegue gerir muito melhor e ler nas entrelinhas os factos puros que estiveram na origem da notícia.

    Quanto ao "boinas", confesso que não conheço muito o seu trabalho, apesar de saber quem é, lá está, porque vejo pouquíssima televisão, e a que vejo é à hora das refeições, com os meus pais. Não tenho uma opinião formadada.

    Mas posso dizer que concordo contigo nos beijinhos com crianças, sejam meninos ou meninas...

    Grande Abraço! (porque já és muito grande para beijinhos xD)

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    1. Leio jornais online e vejo imensos programas pelos sites dos canais televisivos. Também costumo ir ao videoclube da box e vejo os programas dias depois de serem emitidos, especialmente debates e aqueles talk-shows tipo "Eixo do Mal". :D

      abraço grande, ahah :D

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  9. Também vivia sem televisão, e tanto me chateavam com isso que acabei por comprar uma (que raramente ligo).
    Quanto ao aperto de mão, também não me deixa chocado. Concordo com o alex e com o ribatejano.
    Há irmão que desde pequenos começam a cumprimentar-se com apertos de mão, e há outros que mesmo em adultos se beijam. Conheço os dois casos e nenhum me surpreende. Penso que também é uma questão cultural e que deve ser aceite da mesma forma que aceitas o tratar por "você" entre pais e filhos.
    Abraço

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    1. Eu aceito tudo, ahah. Só dei a minha opinião. :D

      Eu compreendo a tua perspectiva, mas não me referia a dois irmãos, adultos, que se cumprimentam com um aperto de mãos; mais, acho mais do que normal e aceitável que dois homens adultos se cumprimentem com um 'passou bem'!! Gosh, não estou a fazer a defesa do beijo entre homens, nem um ataque feroz ao 'passou bem'. O que eu disse foi, e repito, que acho estranhíssimo um homem cumprimentar um menino pequenito com um aperto de mãos, enquanto que às meninas dá um beijinho. Beijar uma criança é algo humano, primitivo, independentemente de ser menino ou menina. É apenas o que acho.

      abraço. :)

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  10. Eu aqui em casa é impossível estar sem televisões acesas. A avó adora ver televisão e muitas vezes até me refugio no quarto para poder estar em paz e sossego, senão dou em doido com aquilo! xD

    Abraço :3

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    1. Aqui, pelo contrário, é difícil ver-se uma televisão ligada. :)

      abraço, João. :)

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  11. Bem verdade, Mark. A sociedade está de um jeito que, sinceramente? Não sei se tem volta. Começa pequeno e assim cresce. >.>
    »»» Emilie Escreve

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    1. Sinceramente, começo a acreditar que não tem volta. :(

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