17 de abril de 2010

O Vento


Se há fenómeno que sempre suscitou o meu interesse, esse fenómeno é o vento. O vento tem uma misticidade própria. É sombrio, avança como uma força autoritária pela nossa pele como se quisesse desvendar os nossos segredos mais profundos. Eu nutro pelo vento um sentimento de amor/ódio. Amor, porque é mágico, selvagem e forte nas suas correntes poderosas; ódio, porque consegue colocar o meu cabelo imenso e comprido no ar, o que me desagrada e muito, chegando a colocar-me furioso pelo resto do dia. Sim, é um facto, sou terrivelmente vaidoso, mesmo sabendo que o excesso é o mal de todas as paixões (Ratzinger chamar-lhe-ia pecado mortal...).
O vento é assim, poderosamente devastador. Leva consigo as nossas palavras mais absurdas e falsas pelos seus caminhos de eternidade inalcançável. Também leva os nossos sonhos, tantas e tantas vezes desfiados nos miradouros, testemunhas dos sofrimentos humanos. Impõe as suas regras, ditando-as ao sabor da sua vontade. Arrasa florestas de betão se assim o quiser, mostrando a autoridade superior da Mãe Natureza. É um prenúncio fatal das chuvas que saciarão a sede dos campos que alimentam a fome de pão dos homens. O trigo é seu filho e as montanhas são a sua mãe. É o senhor das tempestades dos desertos e da fúria dos mares agitados que amedrontaram os Antigos. Ao passar por nós, leva consigo um rasto de sentimentos e de ideias. Leva a inspiração e o som doce e melodioso da música. É fácil observar a sua dança pelos ramos das árvores, fazendo balançar as folhas verdes.
É verdade que consegue irritar-me. Mas fá-lo como se brincasse ironicamente com alguém que não o pode deter. Ninguém pode. A paciência e a engenharia humanas são as suas maiores adversárias.
Quanto a mim, resta-me uma enorme dose de paciência e mãos suficientemente hábeis que consigam colocar o cabelo de novo da forma que eu gosto.
O vento é único na sua força brutal, profunda, temida e incontrolável. Os anos são impotentes à fúria da sua passagem. Com ela, vai um pouco de nós, das nossas vontades, dos nossos sonhos e da nossa vida.

4 comentários:

  1. Belo texto.
    Admiro a tua capacidade de descrever algo tão complexo como no fundo, algo tão relativo.
    É um dom. E acho que tu o tens :)

    ResponderEliminar
  2. Oh, obrigado, Marta.. :)
    Beijinho.

    ResponderEliminar
  3. Tudo o vento leva, tudo o vento tràs.
    É o destino que se mete em fúria em dias de tempestade e que depois acalma, proporcionando-nos uma brisa suave e fresca. Não tenhas medo ;)

    PS: Inspiras!

    ResponderEliminar
  4. O vento é eterno. Nós somos seres efémeros. Tens toda a razão; a vida também é feita de brisas suaves e frescas. :)
    Beijinho.

    ResponderEliminar